relações matemáticas entre a exposição a um patógeno e a probabilidade de infecção; e 4) caracterização do risco - processamento dos dados das três primeiras etapas para obter a probabilidade de infecção (Maimon et al., 2014).
Em que pese a grande utilidade dessa ferramenta, com vantagens relacionadas à estimativa de níveis muito baixos de risco de infecção ou doença, como também o baixo custo para prever o risco, algumas limitações inerentes aos pressupostos e bases dos modelos de AQRM podem ser levantadas (Pádua, 2009).
Segundo a WHO (2006b) as limitações estão relacionadas aos cenários de exposição que podem variar significativamente e são difíceis de modelar, como também a ausência de dados disponíveis para cada cenário de exposição e o fato dos riscos serem estimados para um agente patogênico por vez.
2.2 ORGANISMOS INDICADORES DA DESINFECÇÃO
Para se obter um efluente para uso urbano e agrícola, dentro dos padrões estabelecidos pelas legislações pertinentes, é necessária uma desinfecção eficiente das águas residuárias. O desempenho do processo se alicerça na sua capacidade de inativação de organismos, o que inclui os organismos indicadores de contaminação fecal.
De acordo com Metcalf & Eddy (2004), os organismos patogênicos encontrados nas águas residuárias podem ser classificados em quatro categorias: vírus, bactérias, protozoários e helmintos. Os organismos patogênicos de origem tipicamente humana causam diversas doenças de trato gastrintestinal, como febre tifóide, diarréias, disenterias e cólera, sendo estes responsáveis por milhares de mortes e pelos graves problemas de saúde pública em áreas com saneamento precário.
Os microrganismos indicadores são organismos que respondem ao processo de tratamento de esgoto e às condições ambientais de maneira similar que os patogênicos. O monitoramento do nível populacional desses organismos provê informação sobre a sobrevivência do grupo dos patogênicos (USEPA, 1992). Através dos microrganismos indicadores de contaminação fecal é possível analisar pequenos volumes de água, de forma simples, com baixo custo, e resultados rápidos.
Bastos et al. (2003) relataram que a avaliação da eficiência da desinfecção do esgoto não possui um único indicador que responda pela remoção de todos os organismos patogênicos que podem estar presentes.
23 A Organização Mundial de Saúde (WHO) estabeleceu, em 1989, a adoção de dois tipos de organismos indicadores da qualidade microbiológica dos efluentes de estações de tratamento de esgoto: o nível populacional de coliformes fecais (expressa em Unidade Formadora de Colônia – UFC 100 mL-1) e o número de ovos de helmintos (expresso em número de ovos.L-1).
Em 2006 a WHO publicou as novas diretrizes para utilização de águas residuárias na agricultura, incorporando as ferramentas de avaliação de risco, incluindo a AQRM e os conceitos de risco e de carga de doença toleráveis (WHO, 2006a), apresentado na Tabela 1.
Tabela 1. Monitoramento das águas residuárias domésticas e excretas, residual segundo diferentes tratamentos e metas de saúde para desempenho microbiano e de ovos de helmintos para uso na agricultura.
Agricultura Parâmetros de monitoramento
a da qualidade da água
E.coli por 100 mLb Ovos de helmintos por litrob
Irrigação irrestrita
≤1 Cultivo de raízes (tubérculos) ≤103
Cultivos de folhas ≤104 Irrigação por gotejamento, cultivo
elevados ≤10
5
Irrigação restrita
≤1 Agricultura com uso intensivo de
mão-de-obra ≤10
4
Agricultura altamente mecanizada ≤105
Tanque séptico ≤106
Fonte: WHO (2006a)
a
O monitoramento deve ser realizado no local de utilização ou no ponto de descarga de efluentes, de acordo com a frequência de monitoramento:
As áreas urbanas: uma amostra a cada duas semanas para E. coli e uma amostra por mês para ovos de helmintos.
As zonas rurais: uma amostra a cada mês para E. coli e uma amostra a cada 1-2 meses para ovos de helmintos.
Amostras compostas de cinco litros são necessários para ovos de helmintos preparados a partir de amostras simples tomadas seis vezes ao dia. O monitoramento de ovos de nematóides é difícil devido à falta de procedimentos padronizados. A inativação de ovos de nematóides deve ser avaliada como parte da validação do sistema.
b Para excretas, os pesos podem ser utilizados em vez de volumes, dependendo do tipo de excremento: 100 ml de águas residuárias é equivalente a 1-4 g de sólidos totais; 1 litro = 10-40 g de sólidos totais .
O sucesso na desinfecção de águas residuárias depende de criar condições adversas à sobrevivência dos microrganismos. Cada grupo de microrganismo patogênico apresenta diferentes tolerâncias às diferentes condições, por isso alguns processos de desinfecção podem ser eficientes na inativação de alguns patógenos, e não possuir nenhum efeito sobre outros (Cavalcante, 2007). A eficiência de um processo particular, também, pode variar dependendo das condições em que o sistema é operado. Por exemplo, o aumento de temperatura de águas residuárias pode ser crítico para inativar patógenos mais sensíveis, como as bactérias, aumentando o desempenho do sistema de remoção.
24 Ao se pensar em desinfecção de águas residuárias, visando seu possível uso, é fundamental a compreensão das características dos patógenos presentes, seu comportamento em condições ambientais diversas, e como as diferentes tecnologias de tratamento podem interferir no seu ciclo de vida de forma a evitar a transmissão das doenças por eles causadas (Cavalcante, 2007).
2.2.1. Coliformes totais e termotolerantes
De acordo com a WHO (2011), o grupo dos coliformes totais inclui gêneros que não são de origem exclusivamente fecal, limitando sua aplicação como indicador específico de contaminação fecal. O conhecimento deste fato, ainda segundo a WHO, levou ao desenvolvimento de métodos de enumeração de um subgrupo de coliformes denominados coliformes fecais (termotolerantes), os quais são diferenciados dos coliformes totais pela sua capacidade de fermentar a lactose em temperatura elevada, de 44° a 45°C. Na maioria das águas, o gênero predominante é a Escherichia, mas alguns tipos de Citrobacter, Klebsiella
e Enterobacter, também, são termotolerantes. Estas últimas, além de presentes em fezes humanas e de animais, também podem ser encontradas em solos, plantas ou quaisquer efluentes contendo matéria orgânica.
Já Escherichia Coli (E.coli) pode ser diferenciada dos outros coliformes termotolerantes, pela sua capacidade de produzir indol a partir de triptofano ou pela produção da enzima p-glucuronidase. A E.coli é considerada o melhor indicador de contaminação fecal, sendo o primeiro organismo de escolha em programas de monitoramento para verificação, incluindo a vigilância da qualidade da água potável. A
E.coli ocorre em números elevados nas fezes humanas e de animais, de esgoto e de água sujeito à poluição fecal recente (WHO, 2011).
No Brasil, o órgão competente ligado ao Ministério do Meio Ambiente, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) define, segundo Resolução nº 430/2011,
Escherichia Coli: bactéria pertencente à família Enterobacteriaceae caracterizada pela atividade da enzima ß-glicuronidase.
Ressalta-se que dentre os coliformes, a E.coli é a única espécie do grupo dos coliformes termotolerantes, cujo habitat exclusivo é o intestino humano e de animais homeotérmicos, onde ocorre em níveis populacionais elevados (Brasil, 2011), sendo, portanto, considerada como a clássica indicadora da possível presença de patógenos entéricos nas águas.
25 Nos últimos anos, tornou-se possível através de testes cromofluorogênicos baseados em expressões enzimáticas, a detecção simples e rápida de Escherichia Coli e de outras bactérias específicas para fins de monitoramento de águas e efluentes (Morgado, 2008).
A sobrevivência deste indicador de contaminação fecal pode ser afetada por diferentes fatores, como: temperatura da água, DBO, nutrientes, pH, competição e presença de predadores, oxigênio dissolvido, radiação solar e sedimentação (Javara, 2005).
2.2.2 Ovos de helmintos
Os helmintos são organismos eucariotas, pluricelulares, pertencentes ao reino Animália. Existem indivíduos de vida livre, mas a grande maioria são parasitas que apresentam, em geral, de forma completa ou incompleta, sistema digestivo, circulatório, nervoso, excretor e reprodutivo, sendo, portanto, altamente especializados para viverem como parasitas humanos (Gonçalves, 2003).
Os helmintos são divididos em três grandes grupos: Platelmintos -vermes planos
Nematelmintos ou nemátodos- vermes cilíndricos Asquelmintos –vermes cilíndricos de corpo alongado
No campo da engenharia ambiental, somente os dois primeiros grupos são importantes (Jimenez, 2005)
Os ovos de helmintos constituem a forma de disseminação dos helmintos no meio ambiente. Para se tornarem infectivos, dependem do desenvolvimento da larva, que ocorre sob condições de umidade e temperatura adequadas (Jimenez, 2005).
Os quais, apresentam uma cobertura muito resistente, composta de três camadas básicas, ainda pouco conhecidas. Estas camadas, secretadas pelo próprio ovo, são: uma membrana interna lipoidal, uma intermediária quitinosa, e outra externa de natureza proteica. Em conjunto, essas camadas conferem uma grande resistência a condições ambientais adversas (Jimenez, 2005).
A sobrevivência dos parasitos intestinais pode ser afetada por variáveis, como: Físicas: temperatura e intensidade de radiação solar;
Químicas: amônia, sais e ácidos;