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A estrutura policial brasileira apresenta historicamente profunda complexidade organizativa e funcional. Atravessou importantes momentos históricos desde de sua fundação até os dias atuais, como o período de exceção ao Estado de Direito vivido antes da Segunda Guerra, a era Vargas, o Regime Militar e, finalmente, a retomada dos cânones democráticos com a promulgação da Constituição Federal de 1988.

O sistema policial brasileiro se filia diretamente ao sistema francês, consagrando a divisão das funções policiais em Policia Administrativa e Polícia Judiciária e estabelecendo princípios de centralização e hierarquia.88

A Polícia de Segurança Administrativa age preventivamente, mantendo a ordem pública e prevenindo a prática de delitos. Já a Polícia de Segurança Judiciária age repressivamente, funcionando após a prática do delito, na investigação e elaboração do inquérito. Embora se chame de “polícia judiciária”, a atividade exercida por ela também é de caráter administrativo.89

Convém lembrar que a Polícia de Segurança Administrativa não é a mesma Polícia Administrativa, pois esta é considerada lato sensu, dedicada aos serviços de utilidade pública e sanitários.90

CHOUKR esclarece que a essência da organização e o funcionamento das estruturas policias foram muito pouco alterados com a superação formal do regime militar. Isto porque a Constituição de 1988 manteve em seu texto todas as estruturas policiais já existentes, incluindo, apenas, estruturas policiais municipais.91

Veja-se o artigo 144 da Constituição Federal de 1988:

88 ROCHA, Luiz Carlos. Organização Policial Brasileira. São Paulo: Editora Saraiva, 1991. p. 07. 89 ROCHA, Luiz Carlos. Organização Policial Brasileira. op. cit., p. 08.

90 ROCHA, Luiz Carlos. Organização Policial Brasileira. op. cit., p. 07.

91 CHOUKR, Fauzi Hassan, AMBOS Kai (coordenadores). Polícia e Estado de Direito na América Latina. op. cit. p. 03.

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.92

Conforme o exposto, percebe-se que a Constituição prevê uma série de polícias, cuja cada uma dessas organizações policiais conta com suas respectivas leis orgânicas e são administradas, também, por atos emanados das Secretarias de Segurança Pública (polícias estaduais) e do Ministério da Justiça, por meio do Departamento de Polícia Federal, no caso da Polícia Federal.

A Polícia Militar do Rio Grande do Sul, objeto do presente estudo, é regulamentada pela Lei n.º 10.991 de 18 de agosto de 1997.

Portanto, é possível perceber que os organogramas foram mantidos em sua essência desde o último regime militar. Não apenas os organogramas foram mantidos, como também os policiais que participaram de todo o contexto histórico e cultural anterior, permaneceram em seus postos, principalmente em razão da Lei da Anistia (n.º 6.683 de 28 de agosto de 1979).93

Isto significa que já estava em vigor uma nova Constituição Federal, a qual restaurava o regime democrático no país, com uma polícia quase inalterada, com similar organização e os mesmos comandantes do regime militar.

A organização da polícia acompanha a forma de Estado determinada pela Constituição Federal de 1988. Esta prevê um Estado federado, ou seja, dividido entre os âmbitos da União (federal), dos estados e dos municípios. Em razão disto, evidentemente haverá uma divisão de atribuições das polícias entre os níveis acima mencionados.

92 Constituição Federativa do Brasil de 1988. Disponível no site www.stf.gov.br. Acessado em 15/06/2006.

Dessa forma, com relação a forma de Estado (federado), a polícia está dividida entre Polícia Federal (União), Polícias Estaduais (dos estados) e Guardas Municipais (dos municípios).

A divisão mais pertinente ao presente estudo refere-se a divisão quanto a estrutura organizativa da polícia, a qual a divide em polícia civil e militar. A polícia militar é considerada ainda como uma força auxiliar das Forças Armadas, com uma hierarquização simétrica a do Exército.

Outra divisão existente da polícia diz respeito ao tipo de atividade policial. Há a chamada polícia investigativa ou judiciária, cuja atribuição cabe normalmente à polícia civil e a polícia ostensiva, de atribuição da polícia militar.

A polícia militar também pode investigar, assumindo, assim, a atribuição da polícia civil. Esta exceção a regra está definida no artigo 9.º do Código Penal Militar, o qual determina que os crimes militares definidos no próprio artigo, deverão ser investigados pela própria instituição militar, por meio do inquérito policial militar.

No entanto, quando os crimes forem dolosos contra a vida e as lesões corporais dolosas forem praticadas por militares contra civis, ainda que em atividade de polícia, o julgamento ocorre na Justiça Comum, embora a investigação também seja realizada por meio do inquérito policial militar.94

O crime de abuso de autoridade praticado por policial militar, ainda que em serviço, também deverá ser processado e julgado na justiça comum.95

A polícia militar é responsável pelo policiamento ostensivo no âmbito dos Estados e/ou, quando da União, de acordo com a área específica de tutela (polícia rodoviária federal e ferroviária federal).

Essa estrutura está atrelada ao Poder executivo. No âmbito federal, o chefe da instituição, denominado “Superintendente da Polícia Federal”,

94 Sobre o tema ver Lei n.º 9.299/96. 95 Conforme Súmula 172 do STJ.

está subordinado ao Ministro da Justiça que, por sua vez, liga-se ao Presidente da República. É um cargo de confiança, ou seja, pode-se demitir ad nutum o Superintendente que não goza de qualquer tipo de período fixo de administração. Não há qualquer controle externo a esta nomeação.96

O mesmo ocorre com a Polícia Civil e Militar. Estas estão subordinadas à Secretaria de Segurança Pública, cujo titular, o Secretário de Segurança Pública é diretamente nomeado pelo Governador do Estado. O chefe da Polícia Civil, Delegado Geral de Polícia, é nomeado pelo poder executivo, assim, como o Comandante Geral da Polícia Militar, órgão máximo da estrutura militar no âmbito estadual. Ambos podem ser demitidos de acordo com a conveniência daquele que lhes nomeou, sem qualquer controle na sua forma de nomeação.97

A organização das carreiras policiais se dá da seguinte forma: Além da separação entre as atividades de policiamento ostensivo e de polícia judiciária entre as polícias estaduais militares e civis, há formas diferenciadas de ingresso em cada uma das instituições. Na Brigada Militar, polícia militar do Rio Grande do Sul, são recrutados soldados e capitães, com requisitos diferentes para o ingresso, treinamento e carreiras totalmente separados, de forma semelhante à que acontece no Exército. Nas polícias civis, da mesma forma, recrutam-se separadamente delegados e agentes (o termo genérico de “agente” corresponde a cargos diferentes, como investigador, detetive, inspetor e escrivão, segundo o Estado da Federação considerado). Assim, não há nenhuma experiência inicial comum em termos de função desempenhada, mas somente a experiência de ocupar a função policial em termos amplos.98

96 CHOUKR, Fauzi Hassan. Polícia e Estado de Direito na América Latina, op. cit., p. 07. 97 CHOUKR, Fauzi Hassan. Polícia e Estado de Direito na América Latina, op. cit., p. 11-12. 98 HAGEN, Acácia Maria Maduro. O trabalho policial: estudo da polícia civil do Estado do Rio Grande do Sul, op. cit., p. 39.