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ORGANIZAÇÃO DA UNIDADE NACIONAL

No documento O ESTADO E A REVOLUÇÃO (páginas 56-60)

A EXPERIÊNCIA DA COMUNA DE PARIS (1871) ANÁLISE E MAR

4. ORGANIZAÇÃO DA UNIDADE NACIONAL

Num esboço de organizarão nacional que a Assembléia parisiense, toda entregue às necessidades da luta, não teve tempo de desenvolver, determinou-se que a Comuna deveria ser a forma política de todas as aldeias, mesmo as menores...

A "delegação nacional de Paris" seria eleita pelas Comunas.

As funções, pouco numerosas, mas muito importantes, que ainda restariam para um governo central, não seriam suprimidas, como se

disse erroneamente, mas, sim, preenchidas por agentes comunais e, por conseguinte, rigorosamente responsáveis.

A unidade da nação não devia ser destruída, mas, ao contrário, organizada, segundo a constituição comunal, e tomar-se uma realidade pela destruição do poder central, que pretendia ser a encarnação mesma dessa unidade, independente da nação - da qual é apenas uma

excrescência parasitária - e a ela superior. Ao mesmo tempo que se amputavam os órgãos puramente repressivos do velho poder

governamental, arrancavam-se a uma autoridade que usurpava a

preeminência e se colocava acima da sociedade as suas funções úteis, para as entregar aos agentes responsáveis da própria sociedade.

Até que ponto os oportunistas da social-democracia contemporânea não compreenderam ou, melhor dizendo, não quiseram compreender essa demonstração de Marx, não há prova melhor do que o livro do renegado Bernstein, Socialismo Teórico e Social-Democracia Prática, com que ele adquiriu uma celebridade do mesmo quilate que a de, Eróstrato. Precisamente a propósito dessa passagem de Marx, escreve Bernstein que ai se encontra "a exposição de um programa que, em suas tendências políticas, se assemelha de modo notável ao federalismo". E mais adiante: "Enfim, apesar de todas as outras dessemelhanças entre Marx e o "pequeno-burguês" Proudhon - Bernstein escreve " pequeno-burguês" entre aspas, por ironia - a maneira de ver de ambos, a esse respeito, é quase idêntica". Sem dúvida, continua Bernstein, a importância das municipalidades aumenta, mas "parece-me duvidoso que o primeiro objetivo da democracia seja a dissolução (Auflosung) dos Estados modernos e uma metamorfose (Umwandlung) tão completa de sua estrutura como a imaginam Marx e Proudhon: formação de uma assembléia nacional de delegados das assembléias estaduais ou municipais, que, por sua vez, se comporiam de delegados das comunas, de sorte que as representações nacionais, na sua forma atual, desapareciam por completo".

É simplesmente monstruoso! Assimilar idéias de Marx sobre o aniquilamento do poder do Estado “parasita" com o federalismo de

Proudhon! Mas, isso não se dá por inadvertência, pois nem mesmo ocorre à idéia do oportunista que Marx trata aqui, não do federalismo em oposição ao centralismo, mas sim da demolição da velha máquina de Estado burguesa existente em todos os países burgueses.

O oportunista não pode fazer idéia senão do que vê em torno de si, no seu meio burguês de estagnação "reformista", como sejam as "municipalidades"! Quanto à revolução do proletariado, ele já nem mesmo pensa nisso.

É ridículo. Mas, o mais curioso é que, nesse ponto, ninguém contraditou Bernstein. Muitos o refutaram, entre outros Plekhanov na Rússia e Kautsky na Europa ocidental, mas nem um nem outro notou essa deformação de Marx por Bernstein.

O oportunista anda tão esquecido de pensar revolucionariamente e de pensar na revolução, que vê "federalismo" em Marx, assim confundido com o fundador do anarquismo, Proudhon. E Kautsky, e Plekhanov, que pretendem ser marxistas ortodoxos e defender o marxismo revolucionário, calam-se! Eis uma das razões dessa extrema indigência de vistas, comum aos kautskistas e oportunistas, sobre a diferença entre o marxismo e o anarquismo. Mas voltaremos ao assunto.

Nos comentários já citados de Marx sobre a experiência da Comuna, não há nem sombra de federalismo. Marx está de acordo com Proudhon precisamente num ponto que o oportunista Bernstein não vê; Marx afasta-se de Proudhon justamente ali onde Bernstein os vê de acordo. Marx está de acordo com Proudhon no fato de ambos serem pela "demolição" da máquina contemporânea do Estado. Essa analogia entre o marxismo e o anarquismo - o de Proudhon e de Bakunine - nem os oportunistas nem os kautskistas a querem ver, pois que, nesse ponto, eles mesmos se desviaram do marxismo.

Marx afasta-se, ao mesmo tempo, de Proudhon e de Bakunine precisamente na questão do federalismo (não falando na ditadura do proletariado). O federalismo deriva, em principio, do ponto de vista pequeno-burguês do anarquismo. Marx é centralista, e, em todas as passagens dele citadas, não se pode encontrar a menor infidelidade ao centralismo. Só as pessoas imbuídas de uma "fé supersticiosa" no Estado é que podem tomar a destruição da máquina burguesa como destruição do centralismo.

Ora, se o proletariado e os camponeses mais pobres se apossam do poder político, organizando-se livremente em comum e coordenando a ação de todas as comunas para ferir o Capital, destruir a resistência dos capitalistas, restituir a toda a nação, à sociedade inteira, a propriedade privada das estradas de ferro, das fábricas, da terra, etc., não será isso centralismo? Não será isso o centralismo democrático mais lógico e, ainda melhor, um centralismo proletário?

Bernstein não concebe um centralismo voluntário, uma união voluntária das comunas em nação, uma fusão voluntária das comunas proletárias com o fito de destruir a dominação burguesa e a máquina de Estado burguesa. Bernstein, como bom filisteu, imagina o centralismo como qualquer coisa que, vinda de cima, só pode ser imposta e mantida pelo funcionalismo e o militarismo.

Como prevendo que poderiam deturpar a sua doutrina, Marx acentua que é cometer conscientemente uma fraude acusar a Comuna de ter querido destruir a unidade da nação e suprimir o poder central. Marx emprega intencionalmente esta expressão: "organizar a unidade da nação", para opor o centralismo proletário, consciente, democrático, ao centralismo burguês, militar, burocrático.

Mas, não há pior surdo do que o que não quer ouvir. Os oportunistas da social-democracia contemporânea não querem ouvir falar nem de destruir o poder do Estado nem de amputar o parasita.

No documento O ESTADO E A REVOLUÇÃO (páginas 56-60)