• Nenhum resultado encontrado

O processo de construção de análise do PNQ/PlanTeQ-Paraíba não poderia alcançar uma melhor compreensão sobre a dimensão política que envolve o programa de qualificação profissional, enquanto uma política pública, se privilegiasse, apenas, os elementos técnicos e quantitativos. O acompanhamento e a análise do programa de qualificação na Paraíba requerem o reconhecimento de que o processo de construção de uma política pública sofre a influência do lugar, da conjuntura, dos valores, das ideias e das intencionalidades, estando passível de ser transformada a todo instante. Por isso, a análise qualitativa e crítica constitui a principal escolha metodológica, embora não tenham sido descartadas as contribuições de ordem quantitativa. Espera-se captar melhor as subjetividades que acompanharam a concepção, gestão e execução do programa de qualificação profissional, buscando o posicionamento dos sujeitos nos momentos de diálogo, disputas, seus julgamentos e posicionamentos a respeito das questões relacionadas ao trabalho, à qualificação profissional e à construção da política pública. A escolha por este método justifica-se por ele ser capaz “de incorporar a questão do SIGNIFICADO e da INTENCIONALIDADE como inerentes aos

quanto na sua transformação, como construções humanas significativas”5 (Minayo, 1996). Assim, espera-se compreender, com maior profundidade, o caráter social e político presente na construção do programa de qualificação profissional.

Neste trabalho, privilegiou-se a análise dialética e crítica, ressaltando-se a dimensão política dos fatos e a postura dos sujeitos, a partir de um olhar sociológico, apreendendo a política pública como um processo em construção, portanto, submetendo-a a sofrer interferências do espaço e dos sujeitos envolvidos. Buscou-se privilegiar a perspectiva do método dialético marxiano, que considera as pessoas e as coisas em um movimento incessante, podendo vir a definir outras formas e relações diferentes das anteriores, mas sem descaracterizar o fenômeno analisado. Assim, nenhuma relação social e nenhum movimento estão acabados, porque representam um processo dinâmico (Marx, 1989). Todo o tempo a política pública pode influenciar e ser influenciada pelos sujeitos que dela fazem parte e que justificam a sua formulação, podendo refletir intenções e ações diferentes e contraditórias àquelas traçadas quando do início de sua concepção, sem que isso lhe pareça estranho, mas natural ao movimento empreendido pela dialética (Minayo, 1996).

As avaliações já existentes por meio de relatórios elaborados pela UNITRABALHO, pelo Ministério do Trabalho, pesquisas acadêmicas e institucionais, serviram como ricos instrumentos complementares, considerando os relevantes esforços realizados por esses estudos para o monitoramento, a análise e a avaliação de políticas públicas (Oliveira, 2006b; Saul, Freitas e Pontual, 2007; Saul, Freitas, Koyama et al., 2007a e 2007b).

O principal referencial teórico utilizado nesta tese foi admitir o trabalho como fonte geradora de riqueza na sociedade capitalista e como elemento estruturante e fundamental da vida dos sujeitos. Esta compreensão tem como base a teoria do valor-trabalho de Marx (1989), que analisa as relações sociais da produção como expressão do movimento dialético, em que lhe são próprios a contradição, a negação e a recriação incessante das relações materiais e sociais, necessárias à acumulação de capital. Os sujeitos sociais presentes neste movimento são partícipes e responsáveis diretos pelas relações de poder estabelecidas na disputa de lugares e de riquezas. Portanto, o referencial, aqui seguido, é o da centralidade do trabalho na vida dos sujeitos (Antunes, 1999), influenciando não somente as condições materiais da sua existência, mas, servindo para desmontar relações sociais, mudar valores, ideias e posturas, na arquitetura de um movimento que pode significar a recriação das formas de controle do capital sobre o trabalho. O intenso processo de desinserções, em função da

modernização tecnológica e das novas relações de trabalho (Leite e Araújo, 2009; Druck, 1999; Antunes, 2006), exige a (re)qualificação profissional dos trabalhadores como requisito básico para se manter útil e poder garantir um lugar no sistema produtivo. Sendo assim, a força de trabalho tem sua condição de mercadoria cada vez mais reafirmada na necessidade do trabalhador torná-la valor de uso para o capital e tentar reduzir os riscos da exclusão frente às exigências do mercado de trabalho, alimentando ou comprometendo os possíveis ideais de participação dos sujeitos nos seus espaços de trabalho.

Orientando-se pela perspectiva da análise dialética, como já explicitada anteriormente, a política pública foi encarada como a expressão da dinâmica da relação entre o Estado e a sociedade, sujeita a ser cooptada pelos poderes dominantes e permeada por intencionalidades, contradições e avanços, uma vez que representa campo de disputas entre sujeitos com ideologias e histórias diferentes, como bem demonstraram as análises de Ianni (1996) e Nogueira (2005) a respeito do desenvolvimento do Estado no Brasil. A qualificação profissional, como matéria da política pública, é também permeada por intenções e poderes e, por isso, optou-se em analisá-la como uma relação social (Ramos, 2006; Castel, 1998) por estar consubstanciada em um processo de construção em que os sujeitos são ativos, manifestando seus conflitos, seus valores, seus anseios e carências, passível de reformulações frente aos interesses dominantes que estão sempre mudando de mãos, como resultado da luta entre governo, empresários e trabalhadores.

Compreendeu-se o conceito de qualificação como o processo necessário de formação dos trabalhadores para o desempenho de uma atividade no ambiente de trabalho e, mais do que isso, que possa lhes proporcionar o desenvolvimento de uma profissão, de valores e de consciência do seu lugar social. Contudo, as mudanças no modelo de acumulação terminaram por alterar o lugar do trabalho humano na sociedade, provocando transformações, também sobre as relações de trabalho, e fazendo com que a noção de qualificação profissional, enquanto formação para uma profissão e para uma vida com sentido social, fosse alterada para uma noção de formação mais próxima do trabalho flexível, da instrução e do caráter fugaz, ocupado pelo trabalho na sociedade contemporânea. A noção de competência foi abordada como sendo inerente ao conceito de qualificação profissional, porém, como expressão da sua ressignificação, para proclamar uma instrução profissional ou uma habilidade ainda mais específica, diante da conjuntura de flexibilização da produção e das relações de trabalho. Ao invés de formado no sentido de possuidor de uma profissão, capaz de reunir princípios político-pedagógicos, o sujeito está mais afeito a desenvolver habilidades, mais fáceis de serem adaptadas ao mundo do trabalho fragmentado e flexível. Nesta

discussão, buscou-se resgatar e atualizar o debate clássico, desenvolvido inicialmente pelos franceses Friedman e Naville, na construção do conceito de qualificação ao de competência, na década de 1960, trazendo, também, a contribuição de autores que se dedicaram a estudar o tema como o resultado de uma relação social, abrangendo os campos da educação, da sociologia e da política, além das relações técnicas da produção (Friedman, 1972; Castel, 1998; Castioni, 2002; Stroonbants, 1998; Dugué, 1998b; Manfredi, 1998).

Uma categoria que nos serviu de referência analítica foi a noção de participação que, compreendida em seu significado político, refere-se à capacidade dos sujeitos de poderem agir como conscientes do seu lugar social e conduzir suas vidas como protagonistas, opinando, decidindo, tornando-se visíveis e capazes de transformar a sociedade (Nogueira, 2005; Telles, 2001). Foi a partir desse entendimento que se acolheu a noção de participação dos sujeitos, indispensável para examinar a sua capacidade de intervenção no processo de concepção, gestão e execução do programa de qualificação profissional com o PlanTeQ-Paraíba. Buscou- se enxergar como os sujeitos (des)constroem suas referências políticas e como se colocam diante da exigência institucional de se fazerem presentes nos espaços de representação, como é o caso dos conselhos estadual e municipais de trabalho e emprego. Foi importante observar as posturas políticas desempenhadas e a capacidade de decisão frente aos poderes já estabelecidos; a possibilidade de romper estruturas e influenciar na construção e condução do programa de qualificação, como suportes fundamentais da categoria controle social, outra que foi incorporada para enriquecer as análises, não somente por cumprimento às determinações dos órgãos gestores, mas como reflexo de uma presença qualitativa e consciente da sua importância transformadora na sociedade.

A categoria cidadania foi outra que surgiu com fundamental importância para analisar as intenções presentes no PNQ/PlanTeQ quanto a formar um sujeito consciente do seu papel político, fazendo-se ativo, crítico e proponente na sociedade (Teixeira, 2001; Nogueira, 2005; Telles, 2001). Estudos têm revelado a invasão da mentalidade neoliberal sobre o comportamento dos sujeitos, estimulando o desenvolvimento de atitudes individualistas e instrumentalizadas dos trabalhadores, com comprometimento sobre as posturas mais coletivas e solidárias, vulgarizando o sentido de cidadania e de participação de forma a reduzi-las à noção de cidadão mínimo, expressão utilizada para demonstrar esse vazio nas atitudes dos sujeitos, incitando a buscar com mais aprofundamento os seus desdobramentos.

A inserção social foi também considerada uma importante categoria em nas análises, com a intenção de perceber como o programa de qualificação concebia a inclusão dos sujeitos

no mercado de trabalho e nos espaços de construção da política pública. Foi relevante investigar como o PlanTeQ-Paraíba vem se propondo a privilegiar uma inserção social que também contemple a formação cidadã, além da formação profissional. Assim, observar como esta inserção está sendo orientada e como os sujeitos estão se percebendo neste processo, constituiu um interesse significativo, uma vez que se espera da inserção dos sujeitos pelo trabalho a conquista de direitos, de lugares e a possibilidade de uma interferência mais qualitativa na sociedade.

Documentos relacionados