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Orientações da Comissão com vista à harmonização dos regimes nacionais

2 Os Grupos de IVA

2.3 A harmonização dos regimes nacionais

2.3.1 Orientações da Comissão com vista à harmonização dos regimes nacionais

No âmbito das suas competências35, e através de comunicações36 ou de

recomendações37, a Comissão Europeia tem vindo a reconhecer a importância de uma maior harmonização dos regimes de Grupos de IVA e identificado posições concretas adoptadas pelos legisladores nacionais que vão contra o espírito e o objectivo do artigo 11.º da Directiva IVA.

Neste âmbito, cumpre identificar, face aos diferentes regimes que vieram sendo consagrados pelos Estados-Membros, qual o entendimento da Comissão relativamente à interpretação da norma da Directiva IVA e qual o alcance da discricionariedade da norma, na medida em que não se desvirtue o seu espírito e objectivos.

35 Artigo 211.º do Tratado das Comunidades Europeias

36 Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu referente ao artigo 11.º da

Directiva IVA e à faculdade de criação de Grupos de IVA (COM (2009) 325 final Bruxelas, 2.7.2009)

[32]

a) Incidência subjectiva do regime dos Grupos de IVA

O artigo 11.º da Directiva IVA determina que “…cada Estado-Membro pode considerar

como um único sujeito passivo as pessoas estabelecidas…”. Neste contexto, a utilização

da expressão “pessoas” levou a divergências na Doutrina, originando a consagração de regimes nacionais divergentes no seu âmbito subjectivo de aplicação38.

Não obstante, o entendimento da Comissão, explanado na já referida comunicação ao Conselho e ao Parlamento Europeu, vai no sentido de que a expressão “pessoas” foi utilizada de forma a evitar-se a repetição, na mesma frase, da expressão “sujeitos

passivos”39. Neste sentido, o objectivo do legislador comunitário não foi o de incluir no âmbito de aplicação do regime dos Grupos de IVA aqueles que não estão sujeitos a imposto.

Contudo, na transposição da norma da Directiva para o direito interno, alguns Estados- Membros não limitaram a possibilidade de integrar um Grupo de IVA a sujeitos passivos de imposto. Um particular, que não tem direitos ou obrigações em sede de IVA, não deve converter-se em sujeito passivo pelo simples facto de integrar um Grupo, na medida em que a qualificação de sujeito passivo assenta no exercício de uma

actividade económica40. Neste sentido, a Comissão recomendou aos Estados-Membros

que não limitam a aplicação do regime dos Grupos de IVA a sujeitos passivos (como é o caso da Dinamarca41, Espanha42, Finlândia43, Holanda44, Irlanda45, República Checa46 e Reino Unido47), que alterassem as respectivas legislações de forma a respeitar a norma da Directiva.

38

Kenneth Vyncke – VAT Grouping in the European Union…” pág.255

39 Clotilde Palma, “A Comunicação da Comissão…”, pág. 250 40 N.º1 do artigo 9.º da Directiva 112/2006/CE

41 2008/2147 42 2008/2142 43 2008/2143 44 2998/4719 45 2008/2141 46 2008/2146 47 2008/2145

[33] b) Âmbito territorial

De acordo com o artigo 11.º da Directiva IVA, apenas podem integrar um Grupo de IVA os sujeitos passivos estabelecidos naquele Estado-Membro. De forma a esclarecer as divergências interpretativas, a Comissão veio clarificar que a expressão do texto comunitário abrange as empresas que tenham a sede da sua actividade económica no Estado-Membro que aplica o regime dos Grupos de IVA e também os estabelecimentos estáveis de empresas não estabelecidas48.

Desta interpretação resulta a impossibilidade de consagração de regimes de Grupos

cross-boarder. Embora se argumente que pode estar em causa uma violação do

princípio comunitário da liberdade de estabelecimento49, o critério de territorialidade em matéria de Grupos de IVA e a expressão “estabelecidos” constante do artigo 11.º da Directiva IVA encontram correspondência noutras normas daquela Directiva.

A possibilidade de integrar num Grupo de IVA um estabelecimento estável fisicamente presente noutro Estado-Membro levantaria questões relacionadas com a soberania fiscal

dos Estados-Membros50. Adicionalmente, poder-se-ia dar o caso de um estabelecimento

estável situado num outro Estado que admita igualmente os Grupos de IVA, pertencer a mais do que um Grupo.

Por outro lado, refira-se que se um estabelecimento estável aderir a um Grupo de IVA no Estado onde está fisicamente presente, as operações que realizar com a respectiva empresa-mãe passam a estar sujeitas a IVA. Embora a jurisprudência do caso FCE Bank considere que uma empresa-mãe e a sua subsidiária presente num outro Estado-Membro configuram um único sujeito passivo e, como tal, as operações entre si estão fora do âmbito de aplicação do imposto, a partir do momento em que a subsidiária aderir a um Grupo de IVA este entendimento não se deve manter, por possibilitar situações abusivas51.

48 Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu… pág. 6 e7 49 Kenneth Vyncke, “VAT Grouping in the European Union…”, pág.256 50

Clotilde Palma, “A Comunicação da Comissão…” – pág. 251

[34]

c) A qualidade de Sujeito Passivo do Grupo de IVA

O Grupo de IVA deve ter um número de identificação fiscal próprio, na medida em que configura um sujeito passivo de imposto com os mesmos direitos e obrigações que os demais sujeitos passivos52. Ao aderirem ao Grupo, os seus membros deixam de ter a qualidade de sujeitos passivos de imposto, na medida em que o Grupo assume essa qualidade, concentrando as obrigações e direitos dos seus membros.

As operações realizadas com terceiros, serão feitas em nome do grupo sendo que, nas facturas ou documentos equivalentes, deve constar a identificação do Grupo e respectivo número fiscal.

d) Simultaneidade dos vínculos

Em primeiro lugar, há que referir o facto de a Directiva permitir aos Estados-Membros definirem o conceito pessoas “vinculadas entre si nos planos financeiro, económico e

de organização”. Por outro lado, a definição geral de tais conceitos é consensual na

doutrina especializada53.

O vínculo financeiro, encontrar-se-á verificado quando uma empresa detém mais de 50% do capital social das restantes sociedades ou quando as controla, segundo as normas de Direito Comercial. Verificamos que Estados como a Alemanha e a Dinamarca fazem depender a aplicação do regime dos Grupos de IVA da existência de vínculos económicos de 100% de detenção do capital social ou dos direitos de voto. Tal medida, embora de carácter acentuadamente restritivo, não nos parece ir contra a norma comunitária, considerando que são exigências que pretendem evitar situações de fraude e não desvirtuam os objectivos de aplicação da norma.

O vínculo económico está relacionado com a actividade desenvolvida pelas empresas. Só poderão pertencer ao mesmo Grupo de IVA, as empresas que desenvolvam a mesma

52

Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu… pág. 9 e 10

[35]

actividade, actividades complementares, ou sucessivas, ou tenham o mesmo tipo de clientes54.

Finalmente, o vínculo organizacional verificar-se-á quando exista uma liderança comum às várias entidades que pretendem formar o Grupo de IVA.

Concluindo, importa realçar que a verificação dos vínculos acima descritos é cumulativa55 e, uma vez deixando de se verificar o preenchimento de qualquer um deles, a empresa relativamente à qual o vínculo deixou de existir, deve ser excluída do Grupo.

e) O Direito à dedução do Grupo

No cálculo do pro rata do Grupo, dever-se-á considerar que as operações intra-grupo não serão consideradas no denominador da fracção que pretende apurar a percentagem a ser utilizada neste método de dedução.

Embora a alínea b) do n.º 1 do artigo 174.º da Directiva IVA determine que o volume de negócios referente a operações não sujeitas a imposto deve constar do denominador da fracção, as operações intra-grupo não devem influenciar o cálculo do pró rata, por respeito ao princípio da neutralidade. Uma operação intra-grupo deve ser interpretada como um mero fluxo económico sem qualquer relevância em termos de IVA e, nesse sentido, não deve afectar, no sentido de diminuir, a percentagem de imposto a recuperar pelo Grupo.

Em face do exposto, para efeitos do Direito à dedução de um Grupo de IVA, apenas devem ser consideradas as operações realizadas entre o Grupo e terceiros56.

54 Alexandra Martins, Ob. Cit. 55

Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu… págs. 8 e 9

[36]

f) Desconsideração, para efeitos de IVA, das operações intra-grupo

Como se pôde observar na análise dos diferentes regimes de Grupos de IVA existentes nas legislações dos diversos Estados-Membros, Estados como Espanha, França, Itália e Roménia acolheram “modelos” de Grupos que não desconsideram, para efeitos de IVA, as operações realizadas entre membros do Grupo, continuando a tributar essas operações.

Como a Comissão veio reconhecer, a não sujeição a imposto das operações intra-grupo impõe-se como uma consequência do reconhecimento dos Grupos de IVA. A mera possibilidade de compensar saldos de imposto e de concentrar obrigações declarativas de uma pluralidade de empresas afigura-se como uma medida simplificação administrativa. Do surgimento da figura do Grupo de IVA e da sua qualificação como sujeito passivo de imposto decorrem relevante implicações no âmbito de aplicação subjectiva do IVA.

g) Limitação da aplicação do regime a determinados sectores de actividade

Conforme referido anteriormente, a Dinamarca, a Finlândia e a Suécia consagraram, nas respectivas legislações, o regime do Organschaft, mas limitaram a sua aplicação aos sectores financeiro e segurador. Não obstante, a Comissão já veio tomar posição, no sentido de considerar que a admissibilidade dos Grupos de IVA não deve restrita a determinados sectores de actividade5758.

A possibilidade de se limitar a aplicabilidade do regime a alguns sectores de actividade não resulta da letra do artigo 11.º da Directiva IVA e muito menos respeita o princípio da neutralidade. Uma limitação em função do sector de actividade cria vantagens injustificadas para os sectores de actividade que sejam abrangidos. A Comissão apenas admite a possibilidade de limitar a aplicação do regime quando se identifiquem operações concretas que possam ser consideradas abusivas.

57

Finlândia (2008/2143) e Suécia (2008/2144)

[37]

Os Estados acima mencionados apenas admitem Grupos de IVA no sector financeiro e segurador na medida em que são os sectores mais “prejudicados” pela inexistência de um regime de Grupos (devido ao seu direito à dedução ser limitado). Contudo, além de não serem os únicos sectores de actividade “isentos”, deve considerar-se que apenas estes sectores beneficiariam da redução de custos inerente à compensação de saldos e “simplificação” administrativa. Nesta medida, o princípio da neutralidade impõe que não sejam feitas restrições à aplicação dos regimes em função da actividade desenvolvida pelas empresas.

h) Consulta Prévia do Comité do IVA

No entender da Comissão, os Estados-Membros devem consultar o Comité do IVA, conforme previsto no artigo 11.º da Directiva IVA, com antecedência “suficiente” antes da publicação das leis nacionais referentes a Grupos de IVA, o que resulta de uma interpretação da letra da norma comunitária.

Contudo, é de referir que, embora a consulta seja obrigatória e o seu incumprimento consubstancie uma violação do direito comunitário59, este procedimento tem carácter meramente consultivo, sendo desprovido de quaisquer efeitos vinculativos para os Estados-Membros.

Neste sentido, a consulta traduz-se, na prática, numa informação dos Estados-Membros ao Comité do IVA sobre as medidas que decidiram introduzir em matéria de Grupos de IVA. Conforme referido aquando da análise do modelo de consolidação de pagamentos, a obrigatoriedade da consulta baseia-se na adopção de medidas que afectam o âmbito de aplicação do IVA nas diversas legislações nacionais pelo que essa obrigatoriedade não se verifica se as alterações forem referentes apenas a procedimentos de cobrança e pagamento do imposto.

59

Recomendação da Comissão ao Estado holandês (2008/4719) por este não ter comunicado previamente ao Comité do IVA as alterações legislativas em matéria de Grupos de IVA.

[38]

Enquanto não houver uma extensão dos poderes do Comité60, como defende parte da Doutrina, a sua consulta é um mero procedimento de rotina, sem quaisquer efeitos práticos para os Estados-Membros, que se limitam a comunicar as suas decisões.

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