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como origem e destino de questões:

Um dos pressupostos que sustentam este estudo sobre a produção de Dan Graham baseia-se na forte continuidade de questões que a trajetória do artista apresenta. Ao mesmo tempo em que garantem coerência e unidade para uma produção bastante diversi icada, o reaparecimento ou a reincidência de determinadas questões são também os fatores que acabam delineando um campo próprio de investigação, em que o artista constitui e aprofunda as suas próprias problemáticas. Ainda que este campo reúna conteúdos aparentemente díspares como uma constelação formada pela crítica aos espaços e às práticas da arte, pelos produtos e discursos da cultura de massa, pelo punk rock, pelos dispositivos de comunicação, por teorias provenientes da psicanálise e da arquitetura e urbanismo, entre tantos outros temas sua análise mais detida acaba identi icando certos eixos constantes de questões e que, por sua vez, permitem interpretar as matrizes de seu pensamento, seu olhar, o contexto histórico em que está inserido e quais as suas contribuições– tanto para o campo da arte, quanto para os demais campos com que estabelece seus vínculos.

Os capítulos anteriores expuseram como Dan Graham se dedicou à tarefa de explicitar as convenções do espaço expositivo, sublinhando o funcionamento de aparatos, discursos, mecanismos e sistemas que dão forma ao circuito institucional da arte. Na mesma linha, também as convenções do olhar, dos modos de percepção

e processos de subjetivação foram expostas ao escrutínio do próprio público, dentro e fora do cubo branco , dispersas no cotidiano da cidade contemporânea. Em suas pesquisas realizada através de sua produção prática e escrita , Graham investiga formas para desestabilizar determinados códigos do objeto de arte, bem como dos produtos e fenômenos característicos da produção de massa e da indústria cultural – que ativam relações de alienação com seu público, colocado na categoria de

espectadores ou meros consumidores. Dentre elas, a pesquisa sobre como também o espaço construído dispõe seus próprios códigos e convenções dentro deste mesmo contexto econômico, político e cultural torna-se para nós, tanto para o artista, um fator de grande relevância.

O interesse crescente pela construção de, ou pela intervenção em dispositivos espaciais, discutido no capítulo anterior através de instalações como Public Space/ Two Audiences , Video Piece for a Shop Window , Video Piece for Two Glass Buildings e Alterations to a Suburban House , demonstram como sua ideia de que o marco arquitetônico do interior de galerias e museus estaria pautando a experiência subjetiva de seu público converte-se a partir destes anos no principal enfoque de sua produção. Não seria incorreto dizer que as experiências que antecederam estes trabalhos desde o amadurecimento da crítica às instituições de arte, às investigações sobre o modos e processos de criação de subjetividade do público levaram ao desenvolvimento de formas so isticadas de investigação das pressões sociais, dos códigos e valores que incidem sobre as formas e as práticas do próprio espaço. O que explica a ocorrência de todo um conjunto de textos, artigos e ensaios dedicados a questões especi icamente arquitetônicas e urbanísticas.

É fato que o interesse sobre o espaço não implica necessariamente em um interesse sobre o campo disciplinar da arquitetura e do urbanismo. Assim como Robert Smithson reconheceu a semelhança entre a estrutura espacial dos museus e dos asilos e jaulas – [eles] apresentam enfermarias e celas – em outras palavras, salas neutras chamadas galerias –¹, Dan Graham poderia ter deslocado seus questionamentos sobre o espaço expositivo para tantos outros marcos arquitetônicos existentes na cidade, sem que fosse preciso analisa-los a partir do prisma do discurso da arquitetura: ela é uma entre tantas outras práticas e discursos sobre o espaço. No entanto, a tarefa de identi icar os autores e os conceitos que interessam o artista em sua produção textual, bem como os debates em que se insere, apontam para duas questões centrais em seu envolvimento com este campo. Além do próprio fato de discutirem o espaço e sua construção, a arquitetura e o urbanismo estão sendo pressionados pelas transformações sociais, culturais e econômicas da mesma maneira como o artista observou em relação à arte e à cultura. Se as transformações da lógica produtiva rede iniram o estatuto da arte, por exemplo desestabilizando a autonomia que se creia ter sobre a produção estética, sobre os limites entre a alta cultura e cultura de massa , podemos supor que elas

. SM)T(SON, R. Cultural Confinement in: ALBERRO; ST)MSON. ed. Conceptual Art: A Critical Anthology, The M)T Press, , p. . Tradução nossa t.n. .

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a arquitetura e a cidade como origem e destino de questões

também provocaram tensões sobre o estatuto arquitetônico e urbanístico. Desta forma, entre um ponto de onde se pode discutir o espaço e a urgência de repensar seus próprios limites e de inições, Graham encontrou um campo fértil para avançar os próprios questionamentos com que vinha se deparando.

A análise desta problemática pode ser inicialmente explorada a partir de dois importantes textos para a trajetória do artista, tendo sido escritos paralelamente ao desenvolvimento de suas primeiras propostas em relação à arquitetura e à cidade:

Art in relation to Architecture. Architecture in relation to Art, publicado na revista Artforum, em , e Not Post-Modernism: History against Historicism, European archetypal in relation to American Commercial Vernacular, and the City as opposed to individual building, escrito em . As questões reunidas nestes dois textos servem como ponto de partida para identi icar seu posicionamento frente a um processo de questionamento das práticas e do pensamento arquitetônico que ocorria no mesmo período em que foram escritos. Em um segundo momento, a constatação de um alinhamento teórico com uma das principais críticas à ideologia da arquitetura moderna – subjacente ao primeiro texto e mais explícito no segundo – ajudará a compreender como o artista busca redimensionar as formas de inserção tanto em relação à produção de arte quanto do espaço arquitetônico e também urbano . Estas perspectivas irão balizar a leitura de sua produção mais recente, iniciada já na década de , quando o artista passa a construir dispositivos arquitetônicos diretamente sobre os espaços urbanos.

AS CONVENÇÕES DO