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2 CENÁRIO: ESCOLHAS METODOLÓGICAS E O ADVENTO DO CORPUS

2.2 Características físicas e estruturais da escola: reconhecimento do advento do

2.2.5 Os alunos

Por meio de questionários, contendo perguntas fechadas e abertas, pudemos registrar aspectos relativos à diversidade cultural dos alunos da 3a fase do 1o segmento, sujeitos da pesquisa, do tipo: local de moradia, gênero humano, faixa etária, religião, trabalho e história de escolarização. Constatamos, por meio das respostas, que 100% dos alunos da turma pesquisada são provenientes do próprio bairro onde a escola está situada. Os demais aspectos levantados, sem maiores pretensões de análises quantitativas, podem ser visualizados através dos quadros abaixo.

Em relação a gênero humano, havia, do total de 18 discentes na turma, um equilíbrio em relação à presença de homens e mulheres, conforme mostra o gráfico abaixo:

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Gráfico 1 – Quanto à diversidade de gênero

Fonte: Autora, 2012.

Isso pode apontar para o fato de que tanto homens como mulheres já buscam um retorno à escola. Além disso, não se pode ignorar o fato de a Chã da Jaqueira, conforme referido anteriormente, ser um bairro cujos moradores mostram-se bastante atuantes e participativos, inclusive nas atividades culturais.

Em relação à faixa etária, a média de idade variava entre 15 e 74. A predominância era de alunos jovens, tal como vem se desenhando as salas de EJA nos últimos tempos.

Gráfico 2 – Faixa etária

Fonte: Autora, 2012.

Essa concentração de jovens, conforme mostra o quadro, reforça o estigma da modalidade EJA. Segundo Haddad e Di Pierro (2000), os jovens que chegam às salas de EJA são considerados como alunos-problema. Ou seja, alunos que não foram bem sucedidos no ensino dito regular e, por isso, tentam superar as dificuldades em modalidades às quais

atribuem o caráter de aceleração e/ou recuperação. Alunos, portanto, que carregam a pecha de serem problemáticos.

No que se refere à religião, 45% dos alunos afirmam ser católicos e 9% protestantes. A maioria, no total de 46%, não declara a opção religiosa. Embora haja diferentes opções religiosas, isso não chega a se constituir um problema de convivência entre eles na sala de aula. De acordo com a história do bairro da Chã da Jaqueira, os moradores costumam, inclusive, realizar cultos ecumênicos.

Gráfico 3 – Religião

Fonte: Autora, 2012.

A religião é, portanto, um elemento de identificação cultural. É provável que a predominância da religião católica entre os alunos seja por conta da origem do próprio bairro, cujo santo padroeiro é São João Batista, um santo ligado à Igreja Católica.

No que diz respeito ao trabalho, 70% trabalham e 30% não trabalham. Os que trabalham são trabalhadores informais35 que exercem as ocupações de: pintor, marceneiro, ajudante em madeireira, diarista, porteiro e serviços gerais, recebendo salários que variam de 1 a 2 salários mínimos36.

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O trabalho informal é o tipo de trabalho desvinculado a qualquer empresa, ou seja, é o trabalho indireto onde não há vínculo empregatício por meio de documentação legalizada.

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Gráfico 4 – Trabalho

Fonte: Autora, 2012.

Vale perguntar o que poderia estar determinando um índice expressivo de alunos, no caso 70%, pertencentes ao mundo do trabalho informal? Vale lembrar que a turma pesquisada é composta predominantemente por jovens, tal como ilustra a tabela da faixa etária. No percentual de 70%, portanto, também estão incluídos os jovens.

Em se tratando especificamente de emprego, podemos dizer que eles se encontram na idade considerada produtiva para o mercado de trabalho. Nesse caso, o que justificaria eles estarem fora do trabalho formal? Possivelmente, eles enfrentam “a realidade do trabalho precário, em suas distintas formas, que reserva para o jovem o forte vínculo entre trabalho e incerteza” (CARRANO, 2005, p. 15). Geralmente, realizam todo tipo de atividade laboral como forma de se manter financeiramente, bem como manter a família. O trabalho informal, certamente, é uma consequência da falta de escolarização adequada para atuar no mercado de trabalho formal. Isso também nos leva a pensar que a escola pública, embora por principio seja o “lugar de todos”, ainda não é o espaço legítimo dos trabalhadores. Se isso já fosse uma conquista, eles não estariam nessa relação desigual entre escolarização-trabalho- escolarização.

Como diz Rummert (2005), apesar de mudanças ocorridas no sistema educacional brasileiro, sua essência dual é ainda a responsável pela distribuição desigual de acesso ao conhecimento e o distanciamento da classe trabalhadora da escola. Entretanto, é importante salientar que tal distanciamento não foi construído no interior da escola (embora muitas vezes ela retroalimente essa assimetria), mas no âmbito das relações sociais e políticas que marcam a história do modo de produção capitalista.

No item história de escolarização anterior, há um percentual de 36% que alega falta de interesse. Curiosamente, nesse percentual prevalece, mais uma vez, o grupo jovem. Um total de 32% dos alunos informa sobre a necessidade de trabalhar para colaborar com o

sustento da família. E um menor percentual, 9%, revela ter desistido da escola em virtude da mudança de cidade.

Gráfico 5 – Escolarização anterior

Fonte: Autora, 2012.

Nesse Gráfico chama mais atenção um índice relativamente alto de alunos que alegaram o fator “preguiça” como motivação para a não permanência na escola, quando criança e/ou adolescente. Mas o que pode ser considerado “preguiça” se levarmos em conta que esses sujeitos insistem em voltar para a escola? Como adjetivar a atitude de saída da escola como “preguiça” se a vida não parece nada fácil, especialmente para essa parcela da população que enfrenta em seu cotidiano as diferentes formas de exclusão? Na verdade, esses sujeitos têm uma história frustrante que marcou de forma singular sua relação com a escola. Diante de tantos enfrentamentos, não é possível, simplesmente, caracterizá-los como preguiçosos. Como diz Arroyo (2005, p. 25),

Os jovens e adultos populares não são acidentados ocasionais que, gratuitamente, abandonaram a escola. Esses jovens e adultos repetem histórias longas de negação de direitos. Histórias que são coletivas. As mesmas vivenciadas por seus pais e avós; por sua raça, gênero, etnia e classe social.

Mas é curioso perceber que eles absorvem os discursos que circulam na sociedade e não se reconhecem, assim, como sujeitos de luta, haja vista também o alto percentual no item “falta de interesse” para justificar sua não permanência na escola. Enfim, esses alunos assumem toda a culpa que nem sequer lhes cabe de fato. É possível recorrermos às palavras de Freire (2002) quando ele diz que o ato de atribuir um não saber aos sujeitos não

escolarizados favorece a reprodução de uma “ordem injusta” que naturaliza a negação dos sujeitos e descredencia os saberes legitimamente produzidos por eles, inculcando-lhes a sensação de “ser menos”.

Na próxima seção, analisaremos as práticas observadas e as intervenções que foram realizadas na turma do primeiro segmento de EJA. Após analisar algumas sessões regidas pela professora da turma, também colocaremos sob análise as sessões por nós assumidas enfrentando, na trama dos modos de ensinar, o drama de se ver diante do espelho.

3 MODOS DE ENSINAR: A TRAMA E O DRAMA DE (SE) EXPOR NUMA SALA