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2. A “ORIGEM” DAS COLÔNIAS E A “COLONIZAÇÃO” DAS

2.4 Os alvores da influência “italiana” no Brasil

Encontrar a “terra prometida” no mundo dos vivos foi ambição de muitos dos crentes na religião advinda da tradição cristã. O Éden deveria estar em algum lugar ermo desse achatado planeta, centro do universo criado por Deus, acreditava-se em meados do século 15. Decerto não foram poucos os que se aventuraram na tentativa de encontrar tal paraíso terrestre, dado por muitos como de uma vez por todas “descoberto” nas chamadas “Américas”. As fantasias dos habitantes do “velho mundo” foram regadas com notícias da chegada dos velejadores do além-mar, germinando sonhos acerca dessa “nova terra” onde estacionaram as naus dos representantes da nova ordem ultramarina emergente.

Muito embora a “ilha de Brasil” já fosse reconhecia desde a cartografia do século 14, em anotações de “italianos” como Toscanelli e Nicolò Zeno (CENNI, 2003, p. 38) por exemplo, é a partir do século 16 que a história marca temporalmente a gênese de seu “desbravamento”, concomitante ao engendramento do emergente sistema mundial

colonial/moderno (MIGNOLO, 2003). Muitos italianos participaram da “conquista da América”, impulsionados seja por interesses políticos, econômicos, religiosos ou mesmo culturais (como no mito da Cucagna). Mas a América adoçaria o café de poucos, à medida que amargava a água de muitos. Isso por que, para além dos interesses pseudo-divinos, o novo continente alimentava à toneladas a gana comercial de homens e mulheres, provocando uma verdadeira “corrida pelo ouro” (ainda que o metal não tenha caracterizado fonte exclusiva da promoção de riquezas) e avassalando os povos autóctones.

No caso específico do território que atualmente pertence à República Federativa do Brasil (anexado à Coroa Portuguesa por obra de Américo Vespúcio e Pedro álvares Cabral que, tento aqui atracado, reivindicou seus direitos sobre as 370 léguas garantidas à Portugal pelo Tratado de Tordesilhas), o povoamento não ocorreu nos mesmos moldes da “América inglesa” no Norte ou das hermanas espanholas no Sul. Diferentemente dos “semeadores” espanhóis, os “ladrilhadores” portugueses estavam interessados mais em colher os frutos da terra do que em cultivá-los (HOLLANDA, 1995). Assim, desde muito cedo a “Terra de Santa Cruz” foi inundada por toda sorte de aproveitadores que aqui se instalavam com diferentes propósitos. Desembarcaram de “degenerados” a príncipes, padres, aventureiros, artistas e cientistas, desde representantes oficiais da Metrópole até criminosos fugidos ou expatriados.

Fato é que a ocupação do território brasileiro foi composta por uma aquarela de interesses políticos, econômicos e sociais distintos entre si na exata proporção da diversidade de seus ocupantes. Entre eles sabemos da participação de indivíduos provenientes de regiões que hoje compõe os limites territoriais do país da Itália, mais tímida nos primeiros séculos e gradativamente maior de acordo com o avançar do calendário Ocidental. A bordo das caravelas de Martim Afonso vieram, ainda no século 16, os irmãos Adorno, genoveses a serviço de nobres aristocratas portugueses especialmente com o propósito de “[...] iniciar uma vasta cultura de cana-de-açúcar” (CENNI, 2003, P.45). Assim como há registro da presença de napolitanos no combate contra os invasores holandeses da costa do “Nordeste” brasileiro no século 17. Cenni (2003, p. 57) afirma que “[…] não poucos foram os soldados napolitanos que deram seu sangue numa ação em que portugueses, brasileiros e índios se tinham erguido contra um típico invasor. Eram esses os primeiros albores da nacionalidade”.

Dos idos do Império devemos lembrar-nos, entre outras coisas, de Dom Pedro II e suas “afinidades” com artistas e demais intelectuais italianos. Assim como de sua esposa napolitana Teresa Cristina, possuidora do título de “mãe dos brasileiros”. Não menos influentes foram Giuseppe Raddi, Giovanni Casaretto e Luigi Vicenzo de Simoni, todos botânicos de destaque ocupados da flora brasileira. Ou ainda João Botas que, quando de seu assassinato, em 1930, teria dito: – “morre um liberal, mas não morre a liberdade62”; houve também o naturalista e etnólogo Francesco Riccardo Zani, personalidade intelectual e política de relevo no país.

Temos, portanto, a presença do que veio a se convencionar “italianos” no Brasil desde sua “gênese Ocidental”, muito antes da maciça imigração iniciada nos anos setentas do século 19 e finalizada nos quarentas do 20. Cenni (2003) apresenta uma “história do Brasil” que se confunde com a história de diversos “italianos” no Brasil (napolitanos, piemonteses, venezianos e genoveses) sugerindo que uma (proto?) “nacionalidade brasileira” já havia despontado nas batalhas contra os invasores holandeses expulsos definitivamente das costas do Nordeste brasileiro no ano de 1661. Para Sérgio Buarque de Hollanda (2003, p. 61) “[...] pode-se dizer que o espírito da colonização portuguesa é um prolongamento […] da ação de seus predecessores e, por muito tempo, seus mestres: os navegadores italianos da Idade Média”. O autor afirma terem sido os(as) “descendentes” de “colonos europeus” que alargaram as fronteiras do território brasileiro, visando, além da caça e escravização dos indígenas para o trabalho rural, a procura de ouro e pedras preciosas.

Os “italianos” também influenciaram decisivamente no campo literário nacional, primeiro através das ordens religiosas, especialmente a Companhia de Jesus; depois, através de literatos italianos influentes. O prestígio alçado pelos autores italianos, para Hollanda (2002, p. 95), surgiu “[...] do fato de terem fornecido uma alternativa válida e também uma espécie de antídoto ao espanholismo”. Os portugueses procuravam alternativas para sua independência no campo literário, assim como a conquistaram no campo político a partir de 1640. Cenni (2003) toca no que chama de “luso-romano” e na influência da Roma clássica sobre as instituições sociais e jurídicas de Portugal. No Brasil, no ano de 1711, certo Giovanni Antonio Andreoni, reitor do Colégio da Bahia, publicou

62 Giovanni Battista Líbero Badarò, mais conhecido como “João Botas”, ficou famoso por suas ideias liberais e seu ativismo social (CENNI, 2003, p. 70).

a primeira obra sobre a economia brasileira, intitulada “Cultura e Opulência no Brasil” (TRENTO, 1988, p. 16).

A “grande imigração italiana” iniciada em fins do século 19, por sua vez, contribuiu para expandir as influências da península itálica no Brasil, tendo (re)construído “aqui” características tidas como típicas de “lá”, influenciando decisivamente não apenas na expansão da “cultura italiana”, mas igualmente sua impressão no mosaico cultural do que viria a ser “O povo brasileiro” segundo Darcy Ribeiro (1995).

Não é tarefa fácil mapear as influências dos ditos “italianos” (e “italianas”!) na composição da complexidade sociocultural da nação brasileira contemporânea. Sabemos que a “história” não é onisciente, apesar de haver vasta literatura sobre o assunto. Nesse capítulo procurei remontar a questões importantes acerca da imigração “italiana” para o Brasil, suas especificidades nas “colônias agrícolas” do Sul, os marcos de uma possível “italianidade”, o contexto migratório presente na dita “colonização” do território situado na região Oeste do Paraná, assim como a gênese “colonial” e a modernização do Município de Toledo. Com isso almejei indicar como a construção desse local (Toledo) e desse lugar social (“italianidade”) esteve associada à questões de “raça” e/ou de “origens” sociais/ culturais (e biológicas, devido à noção de “pureza de sangue”), engendrando a lógica da dominação intra-Sul (NOPES, 2012) em seu contexto, uma vez que sua dinâmica mais global insere-se no interior do imaginário da diferença colonial (MIGNOLO, 2003).

3. GERAÇÕES E FRONTERIAS GERACIONAIS ENTRE

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