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OS ARRANJOS JURÍDICO-INSTITUCIONAIS

No documento mateushenriquesilvapereira (páginas 36-39)

Após este caminho percorrido entre vários pensamentos sobre Direito, Estado políticas públicas e a relação entre eles, almeja-se criar um percurso capaz de beber da fonte de cada possibilidade e crítica trabalhada ao longo do capítulo. De início, deixa-se claro o desejo de transpor o direito estritamente jurídico-formal, e contribuir para o seu viés de arranjo institucional (COUTINHO, 2013), procurando cumprir um papel na compreensão da tomada de decisões de atores sociais, a função do Estado e do Direito, a própria capacidade das políticas públicas, suas limitações diante do poderio político e econômico e a criação de novos arranjos institucionais capazes de superar as dificuldades dos atuais.

Tal perspectiva dentro do Direito é nova, tendo início o seu desenvolvimento a partir do crescimento das políticas públicas no Brasil. Compreender o Direito para além de seu aspecto formal é mister para a evolução das políticas públicas e seu aprimoramento. Destarte, expõe-se essa matriz do jurídico perante a sua relação com as políticas públicas:

Entender o direito como parte estruturante da dimensão institucional de políticas públicas é supor que normas jurídicas estruturam seu funcionamento, regulam seus procedimentos e também se encarregam de viabilizar a articulação, coordenação e intersetorialidade entre atores (organizações e pessoas) direta e indiretamente ligados a tais políticas. Dito de outra forma: atributos do desenho institucional de políticas públicas de alguma maneira dependem da consistência do arcabouço jurídico das estruturas: seu grau de centralização ou descentralização, definição de mandatos de ação e os possíveis feixes de relações públicas e público- privadas, bem como sua integração com outros programas ou entre entes federativos encarregados de diferentes programas, por exemplo. Nesse sentido, o direito pode ser visto como uma espécie de mapa de divisão de responsabilidades e tarefas nas políticas públicas, isto é, o acabouço jurídico, em termos simplificados, define com maior ou menor precisão “quem faz o que” em um plano de ação governamental. (COUTINHO; MARQUES; MORETTI; PACHECO; ROZO, 2014, p.62).

Do ponto de vista da relação entre Direito e políticas públicas, a contribuição de Diogo Coutinho é importante na medida em que entende a norma jurídica em sua relação dinâmica e interdependente com as ações governamentais.

Ao dimensionar aspectos relevantes concernentes as instituições participantes das políticas públicas, o Direito ganha novos contornos e novas formas de atuação perante atores sociais não levados em conta numa análise meramente jurídica- formal. Tanto em relações de intersetorialidade entre um mesmo órgão, quanto nas relações entre entes distintos. Com isso o Direito como arranjo institucional fornece novos instrumentos para a concretização de políticas públicas, superando, portanto, a mera visão de legalidade e juridicidade que são ampliadas quando se fala na relação entre Direito e políticas públicas.

Todavia, uma concepção crítica de Direito, tal como propõe Roberto Lyra Filho, contribui com uma lente na qual a relação entre a norma jurídica e política pública será pautada à luz do conflito dialético entre Direito e Antidireito, ou seja, dentro dessas normas poderá visualizar-se de maneira mais clara suas limitações e possibilidades, afirmando quais elementos das políticas públicas realmente estão garantindo um direito, e qual deles está obstaculizando o mesmo, atuando como um Antidireito.

Acrescente-se a essa perspectiva de arranjos jurídico-institucionais a perspectiva dialética anteriormente referido das afirmações de Roberto Lyra Filho. Essa junção faz-se pertinente em razão de buscar compreender nos arranjos, avanços e conservações, buscando aferir o Direito e o Antidreito dos aspectos jurídicos das políticas públicas. Acredita-se na insuficiência das inovações dos arranjos jurídico-institucionais para a promoção de políticas públicas baseadas na justiça social sem a perspectiva crítica dos mesmos. Da mesma forma que a materialização de garantias jurídicas em normas mostra-se insuficiente baseadas no direito positivo, a determinação de arranjos jurídico-institucionais sem a perspectiva crítica da dialética, poderá ensejar em problemas similares, numa estagnação de garantias fundamentais implementadas via políticas públicas.

Essa visão dinâmica do Direito acrescentada à perspectiva dos arranjos jurídico-institucionais, permite elucidar e melhorar arranjos até então efetivos, como mecanismos de tomada de decisões e de participação popular, planejamentos, instrumentos burocráticos, novos mapeamentos estratégicos e demais atividades inerentes às instituições envolvidas com políticas públicas.

Outra visão que coaduna com a complexidade desta pesquisa, é a abordagem histórico-social. Para isso, utiliza-se da perspectiva institucionalista, na ideia de path dependence, na qual entende-se que as decisões tomadas no passado têm forte influência sobre as possibilidades do presente (GALA, 2003). Também na linha econômica do institucionalismo, pressupõe que o ambiente econômico envolve disputas, antagonismos, conflitos e incertezas (CONCEIÇÃO, 2002). Por conseguinte, transpondo tal entendimento do institucionalismo para as políticas públicas, compreende-se as mesmas como processos de mudanças graduais no itinerário humano (SILVA PEREIRA, 2017b).

Essas constatações de trajetória histórico-social e de um ambiente envolvendo interesses contraditórios propiciam a abertura para o panorama jurídico- institucional, indicando novas possibilidades para a garantia de direitos ligados à alimentação e à SAN. Aqui, salienta-se a perspectiva dialética das relações jurídicas das políticas públicas, possibilitando a crítica a arranjos institucionais até então importantes para o DHAA e a SAN, incentivadores da democracia participativa, como se verá no capítulo a seguir.

Isso é relevante para a superação de mecanismos que se mostraram insuficientes nas lutas por uma alimentação adequada e a consolidação da segurança alimentar e nutricional em detrimento da insegurança alimentar. E também para conservar aquilo que deu certo, não tratando a análise jurídica das políticas públicas estanque, vinculada somente a processos burocráticos. Dessa forma, dimensiona-se o caráter dinâmico do Direito em busca de avanços em garantias essenciais para as pessoas.

Nesse diapasão, as inovações em matéria de arranjos jurídico- institucionais devem sempre ser pensados na procura da desburocratização das relações sociais que permeiam as políticas públicas. A contínua transformação do processo histórico humano não permite fórmulas jurídicas que congelam ou atrasam a sua evolução. O Direito dinâmico, móvel, não acabado, não vinculado somente a normatividade estatal, deve conduzir as novas possibilidades de arranjos que poderão ensejar novos espaços e novas formas de políticas públicas.

3 ALIMENTAÇÃO, O DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA E A

No documento mateushenriquesilvapereira (páginas 36-39)