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5.2 O conceito de desenvolvimento sustentável

5.3.3 Os conhecimentos tradicionais como patrimônio imaterial segundo a

A UNESCO produziu em 2001, a Declaração Universal Sobre a Diversidade Cultural, em que foi definido que a cultura deve ser considerada como “o conjunto dos traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social e que abarca, além das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras de viver juntos, os sistemas de valores, as tradições e as crenças” (DECLARACIÓN, 2001).

O artigo 1º da Declaração entende que a diversidade cultural se manifesta de modo original e plural nas identidades das sociedades e dos grupos que formam a humanidade. A diversidade cultural é fonte de criatividade, de inovação e intercâmbios e, é tão fundamental para a espécie humana como a diversidade biológica é para os organismos vivos. Nesse sentido deve ser reconhecida e consolidada em benefício das gerações presentes e futuras, pois constitui em patrimônio comum da humanidade (DECLARACIÓN, 2001).

Assim, é necessário salvaguardar a criatividade humana, como expressa o artigo 7º, afirmando que a criação é originária das tradições culturais e se desenvolve em sua plenitude quando estão em contato com outras culturas. É por essa razão que o patrimônio, em todas as suas manifestações, deva ser preservado, realçado e transmitido às gerações futuras como testemunho do empirismo e dos anseios da humanidade, para que possa alimentar a criatividade em toda sua diversidade e inspirar um sólido debate entre as culturas (DECLARACIÓN, 2001).

Ficou explícita no anexo II das Orientações Principais de um Plano de Ação para a Aplicação da Declaração Universal da UNESCO sobre a Diversidade Cultural, a relação entre diversidade cultural e os conhecimentos tradicionais. No artigo 14º desse documento, foi apresentada a importância de se proteger e respeitar os sistemas de conhecimentos tradicionais, “especialmente os dos povos indígenas” e de se ratificar a contribuição dos conhecimentos tradicionais, “em particular no que diz respeito à proteção do meio ambiente e à gestão dos recursos naturais”, favorecendo assim, a integração entre os conhecimentos locais e a ciência moderna (DECLARACIÓN, 2001).

Neste documento, a defesa da proteção se faz presente na íntima relação com a proteção do meio ambiente, em especial no que se refere ao trato dos recursos naturais. Assim, a visão da UNESCO, sobre a proteção dos conhecimentos tradicionais se aproximava das disposições propostas pela CDB.

A reafirmação da referida análise, ocorreu em 2002 na Declaração de Istambul pela Terceira Mesa Redonda de Ministros de Cultura. Este documento definiu que o patrimônio cultural intangível “constitui um conjunto de práticas vivas e constantemente recriadas, conhecimentos e representações, que capacita os indivíduos e comunidades de todos os níveis a expressar sua concepção de mundo através de sistemas de valores e padrões de ética” (ISTAMBUL DECLARATION, 2002).

O patrimônio imaterial, de acordo com este documento, é definido como as expressões técnicas, conhecimentos, representações e usos – junto com os objetos, os instrumentos, artefatos, espaços culturais que lhes são inerentes – que os grupos, as comunidades e, em determinadas situações, os indivíduos reconhecem como parte intrínseca do seu patrimônio cultural (CONVENCIÓN, 2003).

De acordo com a Convenção, o patrimônio que se transfere de geração a geração é que é reconstruído freqüentemente pelos grupos e comunidades em função do seu meio, sua integração com a natureza e sua história, introduzindo-lhes um sentimento de continuidade e identidade e contribuindo desse modo para desenvolver o respeito da criatividade humana e da diversidade cultural (CONVENCIÓN, 2003).

Tal tipo patrimonial se manifesta:

• nas tradições e expressões orais, incluído o idioma como veículo do patrimônio cultural e material;

• nas artes de espetáculo;

• nos usos sociais, rituais e atos festivos;

• nos conhecimentos e usos relacionados com a natureza e no universo; • nas técnicas artesanais tradicionais (CONVENCIÓN, 2003).

Assim fica evidente que o patrimônio imaterial se expressa, dentre outras maneiras, nos usos e nos conhecimentos relacionados com a natureza. Manifestada a relação, se fez necessária a formulação de meios de resguardá-lo ciente das contradições existentes entre a OMPI e a CDB. Por esta razão, a Convenção tratou, no art. 11°, das partes adotarem meios que garantam em seu território, a proteção desse tipo de patrimônio. Pela salvaguarda, o parágrafo 3 do art. 2° definiu meios que visassem garantir a aplicabilidade do patrimônio cultural e material, compreendendo a valorização, identificação, investigação, proteção, promoção, transmissão, revitalização e documentação deste patrimônio em seus diversos aspectos (CONVENCIÓN, 2003).

Embora a forma de interpretação da UNESCO sobre os conhecimentos tradicionais tenha sido mais avançada que as versões anteriores permaneciam as barreiras para a proteção dos produtores desse tipo de conhecimento. Eles foram expostos, no art. 3°, que implementou a relação da Convenção com outros instrumentos internacionais: nenhuma disposição da referida Convenção deverá ser entendida de tal modo que afete os direitos e obrigações que tenham os Estados Partes em função de outros mecanismos internacionais referentes aos direitos de propriedade intelectual ou a utilização dos recursos biológicos e ecológicos dos que sejam partes (CONVENCIÓN, 2003).

A normatização referente à propriedade intelectual surge como uma das barreiras para a defesa dos conhecimentos tradicionais, reconhecidos como patrimônio imaterial.

Na tentativa de vencer esta barreira, na Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, contemplada pela UNESCO em 2005, em Paris, os países estabeleceram que a diversidade cultural é uma característica essencial da humanidade, definindo em si um patrimônio que deva ser preservado e valorado. Também foi defendida a agregação da cultura como elemento estratégico das políticas de desenvolvimento nacional e internacional e a

relevância dos conhecimentos tradicionais como fonte de riqueza material e imaterial, que são fundamentais à sustentabilidade (CONVENCIÓN, 2005).

O reconhecimento da relevância dos direitos de propriedade intelectual, para sustentar os que participam da criatividade cultural, estava presente no âmbito deste documento. Ficou evidente ainda que a criatividade cultural não deva ser considerada apenas no seu valor comercial. A diversidade cultural, para os convencionais, se revela não só nas várias maneiras pelas quais se expressam, transmitem e enriquecem o patrimônio cultural da humanidade mediante a diversidade de manifestações culturais, mas também através de diferentes modos de criação artística, produção, divulgação, distribuição e usufruto das manifestações culturais, sejam quais forem os meios e tecnologias utilizados (CONVENCIÓN, 2005).

Foi definido no art. 4° que a proteção significa “a adoção de medidas encaminhadas à preservação e salvaguarda e enriquecimento da diversidade das expressões culturais”. “Proteger”, ficou claro na Convenção, significa adotar “medidas regulamentares encaminhadas à proteção e promoção da diversidade das expressões culturais” (CONVENCIÓN, 2005).

Cada Parte, além de adotar as medidas acima, deve estabelecer as ocasiões especiais em que as manifestações culturais sofram risco de extinção, se estão ameaçadas, ou se requerem algum mecanismo urgente para a sua salvaguarda. A fim de ilustrar a força da Convenção foi estabelecido no art. 20° a sua relação com outros mecanismos internacionais. Uma relação “de reforço mútuo, complementar e de não subordinação”. Nesse sentido, ficou estabelecido que as partes não devem subordinar a Convenção aos demais tratados e que:

• fomentarão a potenciação mútua entre a presente convenção e os demais tratados dos quais são parte; e

• quando interpretem e apliquem os demais tratados de que são parte ou contraiam outras obrigações internacionais, levarão em conta as disposições pertinentes da presente convenção. Os preceitos desse artigo, diferente dos dispositivos da Convenção, para a Salvaguarda da Cultura Imaterial, determinam o ânimo de não sujeição da Convenção a outros tratados. Contudo, prevalece o item segundo de que nenhuma disposição da presente Convenção poderá interpretar-se como uma alteração dos direitos e obrigações das partes que sejam provenientes

Cabe ressaltar que, para entrar em vigor, a referida Convenção precisa ser confirmada por 30 Estados Membros, o que até o presente momento ainda não aconteceu.

5.3.4 O conhecimento tradicional como propriedade intelectual segundo a