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PARTE 3: RESULTADOS E DISCUSSÕES

8. CONTEXTUALIZAÇÃO E SIMULAÇÃO DA RESOLUÇÃO DO CONFLITO VIA MANGUE

8.1 Simulando a Resolução do Conflito – Parte 1:Análise

8.1.4 Os Dilemas dos Atores

Pode-se reconhecer que os atores enfrentam diferentes dilemas a seguir apresentados. O empreendedor vive o dilema do alcoólatra (drunk) já que propor e executar obras viárias de tamanha grandiosidade e impactos, tanto positivos quanto negativos, priorizando-a em detrimento a outras demandas sociais faz parte de uma cultura do setor público. As chamadas “obras faraônicas” que buscam chamar a atenção da opinião pública, justificando que algo foi realizado com o dinheiro público.

Cumprir exigências ambientais, evitar o corte de vegetação protegida, pensar formas de reurbanização confortáveis para a população, eram exigências que representavam desafios de mudança de uma cultura de realização de obras públicas e de custos adicionais para a proteção do meio ambiente.

No dilema do empreendedor, aparece como ator, na posição de regulador, o técnico da secretaria municipal de Planejamento Participativo, Obras e Desenvolvimento Urbano e Ambiental que, nas obras que interferirão sobre o ecossistema manguezal terá o papel principal de autorizar adaptações de projeto, avaliar a correspondência entre o projetado e o realizado, atestar a execução da obra e liberar as faturas. No dilema do alcoólatra, fazendo vistas grossas para o cumprimento de exigências ambientais, assumiria o papel do amigo que fornece a bebida.

O ambientalista substitui a agência de regulação ambiental e assume o papel da esposa que ameaça embargar a obra, caso não haja o cumprimento de exigências legais. Esse dilema é representado na tabela 6, abaixo.

Tabela 6 – O Dilema do Alcoólatra aplicado ao Conflito Via Mangue

Empreendedor P 3 F 1 4 t d 2 Cumprir exigências reduzindo custos. Ambientalista 1 2 4 3 Fiscalizar cumprimento de exigências Embargar a obra Regulador 4 1 3 2

Fazer vista grossa para a redução de custos.

P é a posição do empreendedor e do regulador. F é a posição do técnico da secretaria municipal. Futuro de ameaça = t.

Futuro de desistência = d (representa a tentação de reduzir custos, apoiado pelo fiscal, desistir de P).

Algarismos indicam ordem de preferência: 1 é o mais preferido, 4 é o menos. Carta Jogada Carta Não Jogada

Fonte: Elaboração própria baseado em Howard (1999 apud BREDARIOL, 2001)

Os ambientalistas vivem o dilema do covarde (chicken). Neste dilema os ambientalistas sabem que embargar e paralisar a obra significa grave desgaste político, mas se não usam esse recurso, o meio ambiente não será protegido. Escolhem a alternativa mais ‘radical’ porque já não acreditam em qualquer mudança de posição por parte do empreendedor e assim, vão para o desastre ou para o enfrentamento. A tabela 7 ilustra esse dilema.

A posição 2,4 evidencia que para o ambientalista a emoção poderia conduzi-lo a inviabilizar as obras. Dessa forma, o embargo da obra possibilitaria a proposição de novas medidas de proteção ambiental.

Olhando por esse ângulo, o Empreendedor se apegaria à posição 3, 3, pois é aquela que, de todos os modos, asseguraria a realização da obra, mesmo que implique

aumento de custos ou redução de lucros. Permanecendo no dilema do alcoólatra, o empreendedor corre riscos de ganhar mais e, ao mesmo tempo, de perder o contrato.

Tabela 7 – O Dilema do Covarde aplicado ao Conflito Via Mangue

E A Não Embarga Embarga

Cumpre exigências 3,3 2,4

Reduz custos 4,2 1,1

A (posição do ambientalista/posição de linha) E (empreendedor/posição de coluna)

Primeira linha e primeira coluna = posição de melhores resultados para ambos os atores

Primeira linha e Segunda coluna = melhor posição para o ambientalista Segunda linha e Primeira coluna = posição preferida pelo empreendedor

Segunda linha e Segunda coluna = ameaça para ambos os atores, mas nenhum é covarde.

Fonte: Elaboração própria com base em Howard (1999 apud BREDARIOL, 2001)

A agência reguladora vive o dilema do pacifista. Embora possa optar por assistir à agressão ou de sair de cena, como o pacifista, há o papel de polícia que lhe é atribuído pela legislação. Assim, a agência foi acionada para licenciar o projeto. Mesmo assim não se pronunciou nem buscou o Relatório de Impacto Ambiental. A agência ficou quieta, assistindo à atuação do Ministério Público. Uma dificuldade para a aplicação do dilema do pacifista é o enquadramento dos outros atores, pois ambos poderiam ser reconhecidos como agressores ou vítimas já que se trata de um conflito (Tabela 8).

Tabela 8 – O Dilema do Pacifista aplicado ao Conflito Via Mangue

E A R f

Empreendedor 1 3 2

Ataca o meio ambiente 1 → 0 0 1

Ambientalista 3 1 2

Embarga 0 1 ←0 1

Regulador 2 3 1

Sai de cena 1 → 0 → 1 1

E (agressor); A (vítima); R (pacifista)

(1) uma posição tomada; (0) posição não tomada Números de 1 a 3 indicam as preferências dos atores

As setas indicam a tendência a se movimentar em direção a outra posição.

Fonte: elaboração própria baseada em Howard (1998 apud BREDARIOL, 2001).

O empreendedor posiciona-se inicialmente de acordo com o que é apresentado na coluna 1, linha 2, sentindo a ausência do regulador, ataca a vítima, ou seja, busca

fazer a obra ao menor custo. O ambientalista posiciona-se de acordo com o que é apresentado na coluna 2, linha 4, em que tende a ocupar a posição do regulador, pois este ausentou-se do conflito. Agindo sob pressão, o regulador tende a passar da posição de ausência apresentada na coluna 1, linha 6, para as posições do ambientalista da coluna 2, linha 6, ou de regulador (na coluna 3, linha 6). O interesse da análise, a cada momento do conflito, é distinguir as possíveis mudanças de posição dos personagens.

É ressaltado por Bredariol (2001) que há uma boa dose de arbitrariedade e mesmo de graça, mas não de falta de seriedade, quando se ensaia o enquadramento das posições dos atores em dilemas como esses. Aqui, a preocupação é investigar novas maneiras para compreensão de um conflito. Os dilemas expressam talvez, aspectos mais emocionais do que de racionalidade dos atores, mas segundo Howard (1998 apud BREDARIOL, 2001) “a hipótese dos jogos leves é que os preparativos para confrontos, envolvendo os dilemas da Teoria dos Jogos, causam emoções, positivas e negativas. Essas emoções conduzem ao debate racional, ao comportamento irracional (significando a formação de intenções contrárias às próprias preferências do ator), ao engodo, ao descrédito, às mudanças de pontos de vista, e também às mudanças de posição dos atores”.

De fato, ressalta Bredariol (2001) mais uma vez, não se está fazendo, stricto sensu, uma análise segundo os dilemas da teoria dos jogos, mas apenas ilustrando os possíveis movimentos ou mudanças de posição dos atores ao mesmo tempo em que se vislumbram possibilidades de apoiar a análise de um conflito com base numa teoria matemática, não dos Jogos, mas do Drama. Usando a análise de confronto, pode-se reconhecer que o conflito Via Mangue não teve um caráter cíclico, conforme é apresentado na Figura 19, abaixo.

Figura 19 – Análise de Confrontos

As fases de colocação do problema, construção de uma estrutura comum de referência, clímax, resolução, conflito e implementação de compromissos foram se repetindo. A recomendação de, na etapa de colocação do problema, criar um ambiente fechado de informações, jamais se cumpriu, pois surgem novas informações ou denúncias em todo momento. Bredariol (2001) observa que o acesso a informações é uma das principais fontes de poder dos atores em conflito e, toda vez que um dos atores tem acesso a uma informação nova, o conflito tende a voltar ao início.

Não foi possível estabelecer uma estrutura comum de referência, instalando-se um conflito de valores já que os atores permaneceram apegados às suas posições iniciais. Para um grupo de atores o que interessava era a realização das obras e para o outro, a proteção do meio ambiente. As resoluções não representaram um acordo global.

Finalmente, a fase de clímax foi se repetindo, a cada vez que se identificava uma nova situação ou impacto ou ainda, o não cumprimento de compromissos anteriormente assumidos.

8.2 Simulando a Resolução do Conflito - Parte 2: Aplicação da