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Os direitos da personalidade do idoso à luz da Constituição Federal de

No documento Revista Brasileira de Direito Civil (páginas 50-53)

DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE DO IDOSO: O DILEMA DE LEAR

2. Os direitos da personalidade do idoso à luz da Constituição Federal de

Ao longo dos anos, a doutrina13 elucubrou acerca dos parâmetros que

poderiam ser adotados para se definir quem é o idoso, tendo em vista a necessidade que o Direito apresentava de delimitar juridicamente esse grupo social. Nesse contexto, destacaram-se diversos critérios para fazê-lo, dentre eles o psicobiológico, o qual se centra não na faixa etária da pessoa, e sim nas suas condições físicas e mentais, e o socioeconômico, cuja principal preocupação é a análise da situação financeira do indivíduo. Contudo, a nosso ver, nenhum critério é capaz de delinear melhor a silhueta da figura jurídica em tela que o etário, o qual, por causa de sua patente objetividade, garante segurança e previsibilidade ao tratamento legal dado aos idosos.

Tal orientação foi acertadamente acolhida tanto pela Organização Mundial

jurídico-legais e de políticas públicas, consideram-se idosas, nos termos do artigo 1º, da Lei no. 10.741/03 – conhecida como Estatuto do Idoso – todas as pessoas

com idade igual ou superior a 60 anos15; e a elas são garantidos, aos moldes do

CC/02 e da CF/88, todos os direitos da personalidade, não só os legalmente

previstos como também os inerentes à própria sistemática civil-constitucional16.

Em linhas gerais, os direitos da personalidade – também denominados

personalíssimos – são releituras dos direitos humanos. Enquanto estes apelam ao

çõ ú ― aspectos intelectual e moral da pessoa (englobam os direitos à honra, ao nome, à ã .)‖17. No entanto, vale

salientar que o termo aqui empregado para caracterizá-los – q ― ‖ – não deve ser compreendido sob uma lógica de absoluta adstrição, já que não há uma total correspondência entre as duas categorias de direitos em exame. A título exemplificativo, o direito à propriedade, que é direito humano, não compõe o rol de direitos personalíssimos, eis que apresenta um conteúdo eminentemente patrimonial18.

Como foi mencionado anteriormente, os direitos da personalidade não são típicos, isto é, transcendem, em qualidade e quantidade, o elenco estabelecido em

lei19. Do mesmo modo, também não pertencem exclusivamente à classe dos

direitos subjetivos, uma vez que podem incidir sobre as mais variadas situações jurídicas (e.g.: poder jurídico, direito potestativo, faculdade, ônus)20. Dito isso, não

há dúvida de que, dentro do universo do Direito brasileiro,só foi possível atribuir aos direitos personalíssimos tais peculiaridades graças à cláusula geral de tutela da personalidade, cujos contornos normativos ganharam forma através das letras dos artigos 1º, inciso III, 3º, inciso III e 5º, § 2º, todos da CF/88. Tal fato comprova que, com efeito, a seara civilista – à qual pertencem por excelência os direitos personalíssimos – está sujeita às benéficas irradiações da Carta Maior.

Sob uma perspectiva talvez menos específica – porém igualmente bastante relevante –, pode-se dizer que os direitos em questão também devem o não exaurimento de seu campo semântico ao texto legal a outra cláusula geral: aquela referente à tutela da pessoa humana. Esta constitui a concretização de um dos princípios mais caros à ordem jurídico-constitucional deste país, a dignidade humana21. Não é, pois, tarefa árdua distinguir o liame que existe entre o escopo

dos direitos da personalidade e a dignidade, já que ambos remetem à devida valorização da dimensão existencial da vida dos indivíduos.

Nesse sentido, pode-se afirmar que um dos resultados mais importantes do encontro entre os direitos da personalidade e o princípio da dignidade humana é o conceito de livre desenvolvimento da personalidade, tutelado pela Declaração

Universal dos Direitos do Homem de 194822. Ao contrário de outros países, como

Espanha, Portugal e Colômbia, no Brasil, o Constituinte optou por não positivar

essa essencial garantia23. Mesmo assim, o livre desenvolvimento da personalidade

é um princípio que, apesar de implícito, tem sua força e sua aplicabilidade asseguradas pela estrutura normativa da dignidade humana24, sobretudo se esta

for analisada sob o prisma da autonomia.

É imperioso ressaltar que a noção de autonomia à qual se fez referência acima não se limita a uma perspectiva meramente negativa. Em outras palavras, desde o advento do WelfareState, tornou-se impossível imaginar qualquer forma de liberdade que se realizasse apenas sob uma perspectiva absenteísta no que concerne à atuação estatal. A rigor, com vistas a uma integral e perfeita concretização de todos os direitos fundamentais, também se deve recorrer a um comportamento estatal proativo, voltado à proteção e à promoção desse grupo de direitos. Nesse sentido, afirma Ingo Sarlet:

―Com efeito, já se fez menção que todos os direitos fundamentais (inclusive os assim chamados direitos de defesa) (...) são, de certo modo, sempre direitos positivos, no sentido de que também os direitos de liberdade e os direitos de defesa em geral exigem, para sua tutela e promoção, um conjunto de medidas positivas por parte do poder público e que sempre abrangem a alocação significativa de recursos materiais e humanos para sua proteção e efetivação de uma maneira geral‖.25

Desse modo, pode-se afirmar que a autonomia, faceta constitutiva do princípio da dignidade humana e uma das bases para o livre desenvolvimento da personalidade, efetiva-se de duas maneiras. Por um lado, não é possível impor restrições injustificadas ao seu pleno exercício, bem como é imprescindível

salvaguardá-la de qualquer ação – oriunda do Estado ou de particulares26 – capaz

de comprometer sua higidez. Por outro, também é muito relevante que os entes públicos, em parceria com a própria sociedade, direcionem esforços no sentido de promover, no plano dos fatos, o conteúdo da garantia em tela. Para resumir essas duas ideias, os teóricos costumam se referir aos termos liberdade formal e liberdade material, respectivamente.

Dentro do mesmo contexto, devido à sua condição de direito fundamental, a igualdade também pode ser concebida tanto pelo viés formal quanto pelo viés material, conforme será explicitado a seguir.

3. Isonomia e autonomia no desenvolvimento da personalidade do

No documento Revista Brasileira de Direito Civil (páginas 50-53)