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II. T ERRORISMO E D IREITOS F UNDAMENTAIS

2. O respeito dos direitos e liberdades fundamentais na luta contra o terrorismo

2.2. Os direitos de natureza inderrogável

2.3.3. Os direitos dos requerentes de asilo e migrantes

À luz do enquadramento jurídico internacional em matéria de direitos humanos, os Estados têm a obrigação de oferecer proteção a todas as pessoas sujeitas a perseguição e de tratar todos os requerentes de asilo e refugiados humanamente e sem discriminação, sendo que ao nível da UE, o direito de asilo é garantido “no quadro da Convenção de Genebra de 28 de julho de 1951 e do Protocolo de 31 de janeiro de 1967, relativos ao Estatuto dos Refugiados, e nos

281 Olivier de Schutter, ob.cit., p.147.

282 Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a aplicação da sobre a

aplicação da Diretiva 2000/43/CE do Conselho, de 29 de junho de 2000, e da Diretiva 2000/78/CE, de 27 de novembro de 2000, Bruxelas, 17/01/2014, pp. 6-7.

81 termos do Tratado da União Europeia e do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia”283.

Como já tivemos oportunidade de constatar, um dos princípios do direito internacional com particular relevância no debate sobre a relação entre o terrorismo e os direitos humanos diz respeito ao princípio do non-refoulement.

Segundo este princípio, consagrado no artigo 33º, nº1 da Convenção de Genebra Relativa ao Estatuto dos Refugiados, “nenhum dos Estados contratantes expulsará ou repelirá um refugiado, seja de que maneira for, para as fronteiras dos territórios onde a sua vida ou a sua liberdade sejam ameaçadas em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas.”

Existe na UE um consenso geral sobre a necessidade de respeitar a proibição da repulsão, mas o desenvolvimento da legislação neste domínio tem gerado incertezas jurídicas, como foi assinalado na Conferência sobre Direitos Fundamentais organizada em 2014 pela Agência dos Direitos Fundamentais, em Roma284.

A ligação existente entre a migração e preocupações de segurança tem contribuído para o reforço de políticas de imigração e controle de fronteiras, assim como critérios mais restritivos para a concessão do estatuto de refugiado, em detrimento dos direitos dos requerentes de asilo. Com efeito, o aumento da pressão migratória sobre a Uniao Europeia conduziu a novas medidas, incluindo a construção de vedações em fronteiras terrestres, rejeições sumárias, aceleração de processos ou definição de perfis criminais em função apenas da nacionalidade285.

A perceção das migrações como uma ameaça, particularmente à segurança e liberdades nacionais, tem contribuído para a proliferação de perceções perigosamente enganosas, mas mesmo assim amplamente generalizadas, sobretudo no contexto atual: no meio de tantas pessoas que todos os dias chegam à Europa, muitos acreditam que elementos de organizações terroristas poderão infiltrar-se nestes grupos286.

283 Art. 18º da CDFUE.

284 Agência Europeia dos Direitos Fundamentais, Relatório sobre os Direitos Fundamentais 2016, p.

3.

285 Ibidem.

286 Teresa Tito de Morais, “Migrações: Liberdade vs. Segurança”, Boletim da Ordem dos Advogados Mensal, nº 133 /134, Dezembro / janeiro, 2016, p. 44.

82 Apesar de ser geralmente aceite que o Espaço Schengen constituiu uma das maiores realizações da União Europeia, o recente afluxo sem precedentes de refugiados e migrantes tem colocado a UE sob forte pressão287.A migração em larga escala para a UE criou vários desafios e divisões políticas notórias entre Estados- Membros. Os ataques terroristas em Paris e Bruxelas contribuíram para realçar a facilidade com que os terroristas entram no Espaço Schengen e aí se deslocam, o que levou alguns Estados a reintroduzir temporariamente os controlos nas fronteiras internas do Espaço Schengen.

É neste contexto que surge o perigo da adoção de políticas de imigração restritivas que podem ter efeitos negativos e contrários aos valores fundamentais da Democracia e do Estado de Direito, especialmente tendo em conta que o direito de asilo tem por base direitos fundamentais como o direito à vida, à liberdade e à segurança.

Os Estados devem abster-se das políticas e discursos que associam os requerentes de asilo e os migrantes ao terrorismo pois esta associação está a justificar maior vigilância, a reintrodução de controlo nas fronteiras, detenções, deportações e políticas migratórias mais restritivas, contribuindo para uma tendência crescente anti-imigrante na sociedade europeia, que tem estimulado discursos populistas e nacionalismos xenófobos288.

Combater os terroristas é um objetivo legítimo e necessário, mas não se pode olvidar que a eficácia dos controlos nas fronteiras é limitada pelo facto de muitos terroristas serem "homegrown" ou serem cidadãos que se radicalizaram no exterior, o que coloca um limite na eficácia do controlo de migração como forma de prevenir o terrorismo289.

Ainda que todos os Estados tenham o direito de garantir a segurança e o bem- estar dos seus cidadãos e definir as suas políticas migratórias, este direito legítimo não pode ser concretizado em detrimento de assegurar proteção a quem necessita,

287 Em resposta à tragédia humana que abalou o Mediterrâneo, a Comissão Europeia adotou, em maio

de 2015, a Agenda Europeia da Migração, com o objetivo de reforçar a política comum de asilo e propor ações a empreender nos próximos anos com vista a assegurar uma melhor gestão dos fluxos migratórios em todos os seus aspetos. A agenda estabelece novas medidas no sentido de uma reforma do sistema europeu comum de asilo, que foram apresentadas em dois pacotes de propostas legislativas em maio e julho de 2016, disponíveis em: http://www.europarl.europa.eu

288 Teresa Tito de Morais, “Migrações: Liberdade vs. Segurança”, ob.cit., p. 44.

289 Alex P. Schmid, “Links between Terrorism and Migration: An Exploration”, ICCT Research Paper,

83 o que significa que o acesso a um procedimento de asilo justo e expedito e políticas de integração que contribuam para a coesão e harmonia social são fundamentais para a criação de um espaço de proteção e de solidariedade na Europa290.

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