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3. Capítulo 2: A insersão e a participação feminina na esfera civil e na esfera política

3.4. É possível pensar em perspectivas para o futuro?

3.4.3. Os governos da Frente Ampla e a política de equidade de gênero

Por fim, deve-se destacar o próprio “giro” à esquerda cujo país rumou a partir de 2005, essa mudança estrutural afetou a condição da mulher no Uruguai em diversos aspectos. Já foi mencionada a elevação de mulheres a cargos ministeriais

64 e a descentralização política, contudo, talvez seja na criação de organismos governamentais e nos avanços legislativos, que mais diretamente a eleição da FA tenha afetado a vida das mulheres.

No primeiro Governo da FA (2005 – 2010), observou-se gradativamente a ampliação dos espaços de governança descentralizada no Uruguai, com destaque para a realização de conferências e planos sobre temas que envolviam intensamente a sociedade civil e o governo. Nesse sentindo, foi criado o Ministério do Desenvolvimento Social (MIDES), um órgão de cobertura nacional, com o sentindo de promover a igualdade entre populações em desvantagem social.

Os debates sobre a temática de gênero também ganharam bastante notoriedade, sendo conveniente destacar a institucionalidade que a questão despontou com a implementação do Plano Nacional de Igualdade de Oportunidades e Direitos (PIODNA), instituído pela Lei nº 18.104. Este plano é fruto das discussões internas e um dos compromissos do Instituto Nacional das Mulheres (INAMU). A execução do PIODNA contou com a participação de membros do poder executivo, poder judicial, sociedade civil e pesquisadoras da UdelaR, tendo a duração de quatro anos (2007 – 2011). Seu principal objetivo era, de fato, promover a igualdade entre homens e mulheres:

[...] constituye un marco general que compromete al Estado a adoptar todas las medidas necesarias tendientes a asegurar el diseño, elaboración, ejecución y seguimiento de las políticas públicas de manera que integren la perspectiva de género (PLAN, 2007, p.13).

No tocante ao marco legal, no Art. 4 há três linhas de ações que se complementam, no item A garantem-se o respeito e a vigilância dos direitos humanos as mulheres (civis, sociais, políticos, econômicos e culturais). A seguir, no item B promovem-se estes direitos, constituindo garantias para tal e no item C se promovem trocas culturais com o objetivo de garantir a igualdade entre os homens e as mulheres. Ainda no Art. 8 menciona-se a criação de um Conselho Nacional Coordenador de Políticas Públicas de Igualdade de Gênero, presidido por um representante do Instituto Nacional das Mulheres.

Para esta análise destaca-se também a estratégia adotada pelo governo em aplicação o plano em todo o país, pois foram trabalhadas algumas variáveis já discutidas nesta dissertação, mas em relação aos municípios, o que demonstra uma

65 confluência de ideias e ações. O plano se deu em toda a extensão do território Uruguaio, foram desenvolvidas estratégias de descentralização para a realização de diversos programas, seminários e cursos. Depois, para que fosse executado, o programa contou com a participação cidadã tanto em sua formulação, quanto no momento de sua efetivação. Todas essas etapas têm por objetivo final a inclusão social, política e cultural das mulheres.

Mas não foi somente o compromisso formal com a igualdade feminina que se deve registrar. No segundo governo Frente Amplista (2010 – 2015) o Partido buscou uma reaproximação com os movimentos feministas – com os quais, definitivamente estava em dívida - com a tão esperada despenalização do aborto. A pauta manteve- se no plano de governo de José “Pepe” Mujica e Danilo Astori e, durante a campanha, o candidato a presidência já havia afirmado seu compromisso com a demanda. Para mais, a FA manteve a maioria na CRR e dessa vez a “ventana de oportunidad” voltou a se abrir, confluindo na aprovação da Lei N° 18.987 - Interrupción Voluntaria del Embarazo (JOHNSON; ROCHA; SCHENCK 2015).

Por fim, além da despenalização do aborto, as aprovações de outras duas leis, no segundo governo da FA, merecem destaque nessa sessão final: A Lei Nº 19.075 - Matrimônio Igualitário e a Descriminalização - e a Regulamentação do Consumo da Maconha, pela Lei N° 19.172 - Marihuana y sus Derivados. Estas, embora não sejam pautas ligadas necessariamente aos movimentos feministas, devem ser ressaltadas, pois recolocam o Uruguai, em uma posição de destaque na política progressista na América Latina, tal como aconteceu no século fim do séc. XIX e início do séc. XX.

É claro que estas duas modificações contaram especialmente com a pressão massiva de alguns coletivos e movimentos sociais sobre os partidos políticos e o Parlamento, para que os projetos se consolidassem em leis vigentes. Sem dúvida, as três demandas partiram das organizações da sociedade civil e se não fossem por suas mobilizações dificilmente estariam em discussão na agenda pública. Contudo, progrediram na esfera institucional em boa proporção pela ascensão da FA ao poder (MOREIRA; LAJTMAN, 2015).

66 Em 2014, a FA foi reeleita para um terceiro mandado, novamente Tabaré Vásquez foi eleito como o Presidente do país. Futuramente poderão ser feitas análises de como o governo se relacionou com os movimentos sociais, em especial com os Movimentos Feministas, já que a relação encontrava-se desgastada desde seu veto a despenalização do aborto em 2007. Também serão importantes as análises quanto a presença feminina na constituição da equipe diretiva e ministerial do governo. Porém, estas não são investigares para este momento.

Até aqui conhecemos as regras institucionais e o funcionamento do jogo político e partidário do Uruguai, bem como, qual é a participação das mulheres em todos os níveis polítocos e nas esferas de poder. Também nos aprofundamos no desenvolvimento e na atuação dos movimentos de mulheres e feministas durante a consolidação da democracia e na contemporaneidade. Todas as informações, analisadas até esse momento, colaboraram para explicar o desempenho feminino no terceiro nível de governo. Por fim, apresentamos um panorama geral sobre a situação da mulher na atualidade, momento em que o Uruguai resgata sua situação de vanguarda na América Latina, ao aprovar Leis progressistas.

Agora será o momento de focar diretamente nos atores sociais dessa história, isto é, as mulheres. Por isso, no terceiro capítulo apresentam-se as percepções, obtidas por meio das entrevistas de campo, de algumas Alcaldesas e Consejalas.

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4. Capítulo 3 - A edificação de um (novo) ator político? O perfil das mulheres