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CAPÍTULO 4 A FORMAÇÃO DO COMPLEXO LOGÍSTICO E INDUSTRIAL DO

4.2. OS PROCESSOS DE DESAPROPRIAÇÕES E OS CONFLITOS COM OS

Para a implantação do CLIPA, a desapropriação de duas áreas foi realizada. A primeira delas se referiu à área da Fazenda Saco D’antas, onde várias famílias residiam ou mantinham plantações/criações desde 1999. De acordo com um estudo realizado pela Associação de Geógrafos do Brasil (AGB) (2011) em 2008 as famílias que residiam nessa fazenda foram transferidas para a Fazenda Pontinhas, para a implantação do terminal offshore do CLIPA. Ainda de acordo com a AGB, as pessoas que só plantavam ou criavam gado na área não receberam nenhum tipo de apoio financeiro por parte do governo do Rio de Janeiro. A segunda área desapropriada era composta por um total de 7.036 hectares localizados no V Distrito de São João da Barra e que pertenciam ou eram ocupadas por cerca de 580 famílias (Ecologus/agrar, 2011).

Um assentamento de 1000 hectares, denominado Vila da Terra, foi criado para receber as famílias desapropriadas que aceitassem as propostas feitas pelo governo do Rio de Janeiro para saírem espontaneamente de suas propriedades. O assentamento foi planejado para receber cerca de 90 famílias com lotes de 2 a 10 hectares, casas de até 4 quartos com áreas construídas variando de 68m² a 109m². Para os reassentados que antes residiam em casas maiores de 190m², as novas casa seriam construídas do tamanho original (ALVARENGA, 2013).

As desapropriações destinadas ao DISJB, foram alvo de muitos conflitos com os proprietários rurais e agricultores que habitavam há várias gerações o V Distrito de São João da Barra. De acordo com Pedlowski (2013) o processo de desapropriação se assemelhou a operações paramilitares, pois as remoções das famílias das propriedades foram realizadas com apoio de policiais militares e seguranças privados, como forma de inibir movimentos de resistência por parte dos desapropriados. Essa forma truculenta de conduzir as desapropriações gerou um ambiente de inconformismo em relação ao processo de desapropriação já que os moradores as associaram a repressão e injustiça (ALVARENGA, 2013).

Outro ponto de conflito com os proprietários foi o valor proposto pela Companhia de Desenvolvimento Industrial do Rio de Janeiro (CODIN) para pagar pelas desapropriações. Em audiência pública, muitos questionamentos foram

realizados a respeito da metodologia para o cálculo desses valores, que considerou a área a ser desapropriada como rural. No entanto, desde 2008, a área do V Distrito já havia sido designada como área industrial, pela Lei Municipal 115/2008, aprovada em 31 de dezembro (PEDLOWSKI, 2013).

Na audiência pública do DISJB, realizada no dia primeiro de setembro de 2011, diversos moradores se manifestaram contra a realização das desapropriações, mostrando a insatisfação com a forma como o processo vinha sendo realizado. O relato abaixo ilustra essa situação:

“Vocês só sabem falar dos benefícios do porto, etc,. Mas não se importam com a vida das pessoas que vocês querem retirar de suas casas. Vocês acham que dando casas mobiliadas e terra e ajuda no plantio está resolvido? Não é bem assim, não. Casa mobiliada não dá comida a ninguém. Vocês, além de tirar o povo de nossas casas, ainda querem que façamos o que vocês acham melhor, que é plantar. E quem não quer plantar vai ser obrigado a fazer isso mesmo, não é? Aí pergunto: e se não der certo? Vivemos da pesca. Como faremos para pescar, para nos garantirmos? Será que um salário dá pra pagar luz, água, comprar comida, remédio, roupa e ainda comprar o combustível para fazer o que sabemos? Sei que não somos obrigados a ir para Palacete, mas não temos outra saída, pois vocês não querem pagar. Logo, temos que esperar o dinheiro da justiça. E se formos obrigados a sair antes, para onde vamos? Não somos bichos, por isso acho que vocês deveriam ir de casa em casa para saber como vivemos. Eu estou sabendo que as casas de Palacete não têm escrituras, e quero deixar bem claro que só vamos sair de nossas casas com a indenização e a documentação em mãos. Somos da roça e não sabemos muita coisa. Mas sei o bastante para saber dos meus direitos.” (relato escrito de um participante da audiência pública do DISJB, 2011) Todo esse contexto conflituoso acabou por desencadear movimentos de resistências no V Distrito, onde agricultores liderados pela Associação de Produtores Rurais e Imóveis (ASPRIM), realizaram ações políticas e protestos, fazendo com que o caso ganhasse visibilidade política. O caso foi tema de uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) e isso desencadeou a formação de uma comissão especial para acompanhar o processo de desapropriação de terras de modo a apurar a veracidade das irregularidades denunciadas13.

Na contramão do movimento coletivo liderado pela ASPRIM, o governo do Estado do Rio de Janeiro, editou o Decreto 42.422/2010, que delegou a competência pelas desapropriações diretamente à CODIN permitindo a realização

13 Jornal do Brasil - Alerj cria comissão para investigar irregularidades no Porto do Açu

http://www.jb.com.br/informe-jb/noticias/2011/09/16/alerj-cria-comissao-para-investigar- irregularidades-no-porto-do-acu/

de acordos amigáveis com os proprietários. De acordo com Quintsl (2014), a possibilidade de a CODIN poder negociar caso a caso despolitizou o processo de negociação, pois favoreceu tratativas individuais em detrimento da elaboração de soluções coletivas.

Assim, a implantação do DISJB resultou num conflito em que o Estado abdicou de seu papel de mediador, para atuar em favor da viabilização do empreendimento por meio das desapropriações. Nesse sentido, o conflito pode ser visto como um conflito ambiental territorial, onde dois grupos disputam a mesma região espacial e, o Estado se manifesta por meio da facilitação da aquisição desse espaço em favor dos controladores do CLIPA, seguindo um molde que já havia sido identificado por Zhouri e Laschefski (2010).

4.3. OS PROCESSOS DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL, AVALIAÇÕES DE