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Em nossa busca por compreender como os professores da rede municipal têm construído seu conceito de autonomia docente e, consequentemente, como tal construção tem influenciado no desenvolvimento do trabalho pedagógico, entendemos ser importante caracterizar os professores sujeitos de nossa pesquisa, o contexto em que realizam seu trabalho, assim como sua formação.

Assim, iniciaremos apresentando um pouco realidade da rede de ensino pesquisada e o perfil das escolas participantes do estudo.

6.1) Rede municipal de Juiz de Fora: um panorama.

A rede municipal de ensino de Juiz de Fora, é composta por 131 escolas (incluindo creches, educação infantil – 4 e 5 anos, Ensino Fundamental e EJA21) e atende a 47.122 alunos. Conta com 3561 professores22, dentre os quais 361 não possuem graduação23, ou seja, 10,1%; um significativo número possui pós-graduação, incluindo Mestrado e Doutorado. Tal nível de qualificação está diretamente ligado à chamada Lei do quadro do magistério - Lei n.º 7565 de 1989 - que garante acesso (que implica aumento salarial) aos professores a partir do seu nível de formação. Assim, um professor da rede municipal, anos iniciais, graduado24, ingressa com remuneração equivalente a R$1175,4425 para uma jornada de 20 horas (sendo 15 horas de regência e 5 horas para as atividades extraclasse)26; quando efetivo, tem direito a um acréscimo sobre o salário base, de 20% no caso de possuir especialização, 50% Mestrado e 100% para Doutorado. Essa mesma lei supracitada garantiu o direito à licença remunerada para aperfeiçoamento profissional.

Vale ainda ressaltar uma especificidade da rede municipal de Juiz de Fora: a organização da jornada semanal do magistério de 20 horas, distribuídas em 15 horas de regência e 5 horas de extraclasse, foi regulamentada pela Lei 9732/2000, portanto anterior à

21 EJA – Educação de Jovens e Adultos. 22

Dados obtidos através do Educacenso. Censo Escolar 2012, dados preliminares até 30/05/2012.

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Dados obtidos no Educacenso, Censo 2012, Relação de docentes sem formação superior. Aqui estão incluídos todos os docentes, até os que atuam nas creches (0 a 3 anos).

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O salário inicial para um professor dos anos iniciais que só possua o magistério Ensino Médio é de R$ 797,51 para uma jornada de 20 horas semanais, sendo 15 horas destinadas a regência e 5 horas para atividades extraclasse.

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Valores estabelecidos em maio de 2013. Fonte: Sindicato do Professores de Juiz de Fora (SINPRO/JF). Disponível em http://www.sinprojf.org.br/seusdireitospisossalariais.php

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Essa distribuição do tempo foi modificada a partir de agosto de 2014, como resultado do movimento de greve do primeiro semestre de 2013, passando a ser 13h e 20 minutos para a regência.

Lei do Piso Nacional (Lei 11.738/08) que reafirma o direito à parte da carga horária docente destinada a atividades extraclasse. Se essa Lei municipal de 2000 representou um avanço no sentido de garantir ao professor tempo para atividades que vão além da regência, criou um complicador, a partir do momento em que seu texto trazia a afirmação de que as atividades docentes extraclasse não deveriam ser obrigatoriamente exercidas na escola. Como a citada Lei não detalhou a quais atividades se referia, todas puderam ser incluídas. Isso trouxe muitas dificuldades para as equipes escolares na realização de reuniões coletivas nos tempos destinados às atividades extraclasse, já que muitos professores justificavam não ter que cumprir esse horário dentro da escola.

Para resolver esse impasse, a administração municipal, em 2006, criou, através da Lei 11.169/2006, a possibilidade da realização de reuniões pedagógicas remuneradas, através do acréscimo de 4%27 no salário dos professores que comparecessem às reuniões mensais, agendadas pela direção, destinadas a planejamento e discussões administrativas e pedagógicas, com duração de até 4 horas. O texto da Lei não prevê nenhuma punição para quem não comparece à reunião, apenas o abono aos presentes.

Além desses benefícios, os professores da rede municipal contam, ainda, com a chamada Ajuda de Custo para Valorização do Magistério Público (ACVM), aprovada pela Lei 10367 de 2002, que constitui o repasse de um valor anual28 aos professores, para utilização em compra de livros, equipamentos, materiais didáticos e participação em cursos que auxiliem em sua qualificação profissional.

A referida lei de 2002 criou, também, o chamado Fundo de Apoio à Pesquisa na Educação Básica – FAPEB, com a finalidade de dar suporte financeiro à execução de projetos e ao desenvolvimento de pesquisas realizadas pelos professores da rede municipal em suas escolas. É importante destacar que tais benefícios foram resultados de mobilização do magistério municipal, a custo de muitas paralisações e greves. Segundo dados do SINPRO, aproximadamente 60% dos profissionais da rede são sindicalizados.

Além disso, a Secretaria de Educação tem ainda o Centro de Formação de Professores (CFP), que oferece cursos organizados conforme a demanda da rede. Para isso, conta com a participação de profissionais da própria rede e de diferentes instituições, além de cursos que são realizados por meio de convênios com o Ministério da Educação ou a Secretaria Estadual de Educação, como é o caso do Pró-Letramento, o Gestar (Gestão da Aprendizagem Escolar) e o PNAIC (Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa).

Como afirmado anteriormente, dentre as 131 escolas da rede, a partir dos critérios nota no IDEB e nível de formação, selecionamos 4 (quatro) escolas. Em nosso primeiro contato com a direção das escolas, todas foram extremamente receptivas e autorizaram,

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A porcentagem aumentou e, atualmente, esta reunião é conhecida como reunião dos 10%.

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ainda durante o encontro, a realização da pesquisa, com exceção da diretora da Escola Primavera29, que disse ter que consultar aos professores, pois, segundo ela, ―naquela escola tudo é muito discutido‖ 30

. Alguns dias depois, a resposta também foi favorável.

Para facilitar a compreensão dos dados obtidos, apresentamos uma breve caracterização das escolas pesquisadas.

A Escola Verão31 está localizada em um bairro da zona norte de Juiz de Fora, uma região que tem crescido nos últimos anos, e atende a 315 alunos32, oferecendo Ensino Fundamental (anos iniciais) e EJA. Tem um total de 36 professores. Apesar da formação de seus docentes não se destacar em relação ao que se tem na rede como um todo, seus resultados no IDEB (5,4 em 2007 e 2009) estão acima dos resultados da rede (vide APÊNDICE B).

Na zona sul, estão localizadas as escolas Outono e Inverno. Ficam em bairros carentes, de baixo nível socioeconômico. A Escola Outono atende a 564 alunos, oferecendo educação infantil (4 e 5 anos) e Ensino Fundamental (1.º ao 9º ano). Com um total de 74 professores, o nível de formação não se destaca em relação à rede e seus resultados no IDEB (2,8 em 2007 e 3,7 em 2009) ficaram abaixo dos resultados da rede. Além disso, chamou-nos a atenção a discussão, nessa escola, sobre a possibilidade de trabalharem com apostilas elaboradas por um sistema de ensino. Esse fato que poderia ter implicações no conceito de autonomia, não se confirmou in loco.

Já a Escola Inverno, anteriormente atendia apenas aos alunos dos anos iniciais Ensino Fundamental, porém desde 2007, por determinação da Secretaria de Educação, passou a atender aos alunos dos anos finais, para dividir a demanda com outra escola vizinha. O atendimento a esse novo público trouxe alguns desafios para a escola, a começar pela própria estrutura física que não recebeu nenhum investimento por parte do poder público e parece não comportar adequadamente os adolescentes. Esse é um aspecto que mereceu atenção em nossos estudos, pois percebemos uma forte associação entre manutenção da estrutura física e direção das escolas, o que, muitas vezes deixa a Secretaria de Educação em ―segundo plano‖ e parece interferir na compreensão de autonomia.

Assim, atualmente, a Escola Inverno atende a 455 alunos (2.º ao 9º ano do Ensino Fundamental e EJA) e tem em seu quadro 67 professores que se destacam por sua formação, com um número significativo de docentes com Mestrado. Entretanto, em 2007,

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Importante destacar que a escolha dos nomes não esteve ligada a nenhuma ideia de valoração; a primeira escola que tivemos contato, recebeu o nome de Verão, estação que estávamos na época.

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Notas de campo em 01/03/2012.

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As demais seguiram a ordem das estações conforme o cronograma de acesso às escolas.

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Os dados sobre número de alunos e de professores de cada uma das escolas foram obtidos através do Educacenso. Censo Escolar 2012, dados preliminares até 30/05/2012.

seus resultados no IDEB (3,7 em 2007 e 4,4 em 2009) ficaram abaixo do alcançado pela rede.

Finalmente, a Escola Primavera localizada em uma região próxima do centro, é conhecida dentro da rede municipal como uma das suas melhores escolas. Sempre há comentários de que seus alunos são de classe média e que ―todos os professores‖ querem trabalhar lá. Tais considerações precisaram ser aprofundadas durante a pesquisa, pois indicam fatores que interferem no trabalho docente e na compreensão de autonomia. A escola atende a 935 alunos do Ensino Fundamental (1.º ao 9º ano e EJA - Anos finais), funcionando como um polo para a inclusão de alunos com deficiência visual. Seus 85 professores têm um bom nível de formação e seus resultados no IDEB (5,4 em 2007 e 6,9 em 2009) estiveram bem acima do resultado alcançado pela rede.

É interessante destacar que, além das variáveis: nível de formação e resultados no IDEB, cada uma das escolas, pelas suas características, acabou por nos fornecer outros elementos presentes nas reflexões sobre o trabalho docente e, consequentemente, sobre a compreensão do conceito de autonomia pelos professores. Esses elementos seriam: a) as relações entre Secretaria de Educação e as escolas; b) as condições socioeconômicas da comunidade escolar; e foram incluídos em nosso instrumento de coleta de opinião e nas entrevistas.

6.2) Caracterização dos sujeitos participantes da pesquisa.

Para nossos estudos, contamos com a participação de 91 professores que responderam ao instrumento de coleta de opinião, dos quais 89% eram do sexo feminino, o que reafirma a predominância de mulheres na atividade do magistério. Destes, nove professoras contribuíram participando da entrevista.

Em relação à faixa etária, podemos afirmar que apresentam características de um grupo mais maduro e experiente, já que 73,7% enquadram-se na faixa etária de 31 a 50 anos (APÊNDICE K) e 67,1% atuam no magistério há mais de uma década, como pode ser observado na tabela da página seguir.