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3. Rupturas e continuidades do processo de desenvolvimento entre o

3.1 Os projetos da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos

3.1.1 Os projetos e os investimentos feitos em energia elétrica

Em base aos projetos levantados pela CMBEU, o segundo governo de Getúlio Vargas, buscou sanar principalmente os problemas relacionados à área de Infraestrutura no Brasil. Desta maneira, o setor de energia recebeu atenção especial do presidente, ao ponto de conseguir efetivar a criação de uma Companhia Nacional de Petróleo, a Petrobras.

Graças a este esforço político e lutando contra extensos debates, interesses estrangeiros, e mesmo muitos interesses nacionais contraditórios, o país deu um passo significativo no caminho da extração e refino de petróleo, permitindo assim a redução, no médio e no longo prazo, da dependência da importação deste combustível, uma vez que ele era apontado como o principal produto na pauta das importações brasileiras, favorecendo um melhor ambiente para a industrialização nacional.

Por mais que o desenvolvimento industrial brasileiro, que surgiu a partir de então e que se estendeu ao governo sucessor, tenha aumentado significativamente a demanda por este bem, o fato de agora existir a Petrobras possibilitou ao país uma base energética jamais vista.

Com relação à energia elétrica, ao divulgar em setembro de 1952 o texto “Organização dos serviços e diretrizes para o desenvolvimento da eletrificação do país”, Getúlio criticou severamente os dirigentes das concessionárias estrangeiras que alegavam baixa lucratividade do setor elétrico. Desta maneira, e com base nos trabalhos em andamento da CEMIG, em Minas Gerais e da Companhia Estadual de Energia Elétrica, no Rio Grande do Sul, o objetivo era desenvolver planos de âmbito regional, alinhado com os projetos já realizados da CMBEU.

Esta discussão pela forma de investimento e o próprio desenvolvimento do setor elétrico nacional, fez com que o Conselho Nacional de Economia propusesse a criação de uma Comissão Nacional de Energia Elétrica, que

seria encarregada da administração dos recursos do Fundo Federal de Eletrificação.

Este projeto visava o desenvolvimento regional do setor elétrico e foi aceito de bom grado por segmentos da indústria, como empresários e representantes das concessionárias privadas, e finalmente as propostas foram incorporadas à reforma legislativa do setor elétrico já no governo de Juscelino Kubitschek.

Neste contexto também nasceu o projeto de criação da Eletrobrás11. Entretanto, houve uma briga de interesses importante, muito parecida com a vivenciada durante a criação da Petrobras, tanto do lado das concessionárias estrangeiras como de parte dos empresários nacionais, que viam uma intervenção estatal forte com prejuízo para estas classes, bem como as próprias empresas estatais que já existiam temiam uma centralização política forte, o que poderia prejudicá-las. Desta maneira, durante o governo de Vargas não foi possível efetivar este projeto, e apenas anos mais tarde ele foi concretizado.

De qualquer maneira, a atuação de Getúlio Vargas no setor energético foi tamanha que, graças a ele, houve uma mudança significativa na característica do perfil da geração energética nacional, ou seja, o setor de geração de energia que era de predominância das empresas estrangeiras passou a ter o Estado como seu principal produtor, e estas empresas se moveram para a área de distribuição de energia. O Estado também passou a ser o principal financiador do processo de expansão da capacidade instalada.

Em paralelo aos trabalhos da CMBEU, o governo desenvolveu algumas iniciativas para equacionar a expansão do parque gerador brasileiro ao encaminhar projetos de leis destinados a: (I) instituir o Imposto Único Sobre Energia Elétrica (IUEE); (II) criar o Fundo Federal de Eletrificação (FFE);

11 O projeto de criação da Eletrobrás representou uma posição mais intervencionista já que até o

momento a posição do governo era vista como secundária e o setor privado teria a prioridade e iniciativa. Esta empresa seria encarregada da realização de estudos e projetos, da construção e da operação de usinas geradoras e de linhas de transmissão e da distribuição de energia elétrica, prevendo- se a possibilidade de suas associação com empresas estatais ou privadas. (CORRÊA, 2008).

(III) alterar a distribuição e aplicação das parcelas do imposto arrecadado que caberiam aos estados, municípios e Distrito Federal e; (IV) Instituir o Plano Nacional de Eletrificação. Em 31 de agosto de 1954, após a morte de Vargas, foi promulgada a lei de criação da FFE e IUEE, sendo o BNDE o administrador de ambos, e o Plano Nacional de Eletrificação não foi aprovado, mas suas propostas foram incorporadas posteriormente (ABARCA, et. al).

O gráfico de número três apresenta a distribuição dos recursos provenientes do BNDE durante o governo de Getúlio Vargas para os projetos da CMBEU. Desta forma fica evidente que o setor de energia foi o que mais se beneficiou, recebendo a maior parte dos recursos, muito embora, como foi destacado no início do tópico, seria o setor de transportes, e especialmente o ferroviário, que recebeu a maior parte da atenção da Comissão em número de projetos.

Fonte: XIII Exposição sobre o Programa de Reaparelhamento Econômico, BNDE, 1964. Elaboração própria in Tavares, M. C, MELO, H. P, CAPUTO, A. C, COSTA, G. M. M, ARAÚJO, V. L. 2010.

A quantidade de projetos na área de Infraestrutura, bem como a corroboração dos mesmos através dos investimentos efetivos tanto na área de transportes, mas principalmente na de energia destaca a efetiva carência de energia elétrica que o país possuía, sem esquecer do comprometimento do Estado em antecipar-se à demanda que existiria como consequência natural aos investimentos em outras áreas que também estavam sendo feitos, além do desenvolvimento urbano.

No governo de Juscelino Kubitschek não poderia ser diferente. Ao contrário de Vargas, que administrava os projetos através de diretrizes e princípios que eram apresentadas ao Congresso todos os anos, JK marcou em seu governo pelo Plano de Metas, já discutido neste trabalho.

Com as bases já lançadas por Vargas, o projeto de desenvolvimento do setor elétrico desenhado por JK traz sob o comando da empresa pública a criação da maior parte das companhias estaduais de energia elétrica12 além da geradora – a Central Elétrica de Furnas, controlada pelo governo federal e pelo estado de Minas Gerais (ABARCA, et. al).

O Plano de Metas teve em sua origem, entre outros estudos, os trabalhos realizados pela CMBEU. Assim, o conceito de pontos de estrangulamento que é apresentado quando da discussão do Plano nada mais é do que a continuação dos trabalhos iniciados nos estudos das Comissões anteriores e que tiveram efetivamente seus primeiros esforços no governo de Getúlio Vargas.

Dentre os investimentos previstos no Plano de Metas, o setor energético recebeu inicialmente 43,4% de todos os recursos. Neste sentido mostra a importância dada a esta área. Não foi por acaso que este foi considerado um ponto de estrangulamento por parte do governo JK, pois com o crescimento que o país vinha atingindo, era grande o desafio em manter o

12 Neste período foram criadas a Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG – 1952); a Usinas

Elétricas do Paranapanema AS (1953); a Espírito Santo Centrais Elétricas AS (ESCELSA – 1956); a Companhia Paranaense de Energia (COPEL – 1954); a Centrais Elétricas de Goiás (CELG – 1956); a Centrais Elétricas de Santa Catarina (CELESC – 1956); a Companhia Elétrica do Paraná (CEA- 1957); Furnas (1957); a Centrais Elétricas Matogrossenses (CEMAT – 1958); a Centrais Elétricas do Maranhão (CEMAR – 1958) e a Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia (COELBA – 1960). (ABARCA, et al).

fornecimento bem como prever a necessidade de geração frente à nova realidade nacional.

Efetivamente, o primeiro grupo de trabalho organizado no Conselho de Desenvolvimento foi o Grupo de Trabalho de Energia Elétrica (GTENE) do qual participavam ex-membros da CEMIG durante o governo estadual de Juscelino, bem como antigos participantes da CMBEU como o próprio Lucas Lopes.

O resultado dos trabalhos deste grupo gerou o que foi divulgado como a Revisão da Legislação de Energia Elétrica, que posteriormente resultou no projeto de lei Nº 1.898, cujo objetivo era atender a antigas reivindicações das concessionárias estrangeiras, de certa forma combatidas por Vargas, a saber, um sistema tarifário mais flexível ao que já existia, o qual apenas permitia reajustes conforme a inflação (CORREA, 2008).

Devido à forte pressão política por se tratar esta de uma medida defensora dos interesses do capital estrangeiro em detrimento das empresas nacionais, o projeto foi parcialmente aprovado, sendo apenas colocada em vigor o centro das exigências estrangeiras em 1964 já no período de ditadura militar.

Como desmembramento deste Grupo de Trabalho, foi criado o Grupo de Trabalho de Eletrificação (grupo de Trabalho Nº 4 – GTEL), cujo objetivo seria o de atualizar o Plano Nacional de Eletrificação, que fora encaminhado por Vargas ao Congresso Nacional em 1954 em conjunto com o projeto de criação da Eletrobrás.

Em base aos projetos gerados pela CMBEU, dos quais todos relacionados à energia visavam o aumento de capacidade bem como maior eficiência na distribuição, as metas apresentadas no plano de JK tinham por principal objetivo obter maior capacidade geradora de energia no país. Desta forma, o Governo Federal se tornou responsável por incrementar a potência instalada no país, já que este requeria somas de investimentos mais robustas, e desta forma as empresas estrangeiras se moveram para a

distribuição desta energia, pois o investimento em expansão e melhora de eficiência neste setor é menor.

3.1.2 Os projetos e os investimentos feitos em