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CAPÍTULO IV

OUVINDO OS PROFESSORES: ENTREVISTAS

“Se as pessoas fossem críticas como eu, o Brasil seria diferente, não seria tão

atrasado como é. Sou muito politizada. Os meus colegas não tem a visão (crítica) que eu tenho” (P5, questão 29).

“Ter autocrítica (é importante). (Por isso) A importância da experiência com reflexão para melhorar a prática” (P8, questão 29).

“Data daí a opinião particular que tenho do canapé. Ele faz alinhar a intimidade e o decoro, e mostra a casa toda sem sair da sala. Dois homens sentados nele podem debater o destino de um império, e duas mulheres a graça de um vestido; mas um homem e uma mulher só por aberração das leis naturais dirão outra coisa que não seja de si mesmos. Foi o que fizemos, Capitu e eu” (Assis, 1971, p. 280).

Neste capítulo, sistematizaremos as entrevistas que fizemos com os dez professores de Geografia do EFM que foram observados em sala de aula. Embora nem sempre sentados em canapés, não temos dúvida que entramos nas suas/nossas vidas. E falar de si mesmos, inclui aí o ofício de professor de Geografia, pois todos eles o são em tempo integral. É entrar, sentados ou não em canapés, tanto na cozinha como na sala de serviço de todos nós. Ser professor implica, também atuar, como ator, num palco, diante de permanente platéia. Depende da sua/nossa atuação para ser reconhecido como ‘bom naquilo que faz’ ou como um ‘falastrão’. Atores. Palco. Platéia. Nossas vidas! Copa, sala de estar, cozinha, área de serviço. Nossas casas. Nossos espaços. Nosso ofício. Nossa Geografia de cada dia!

A ENTREVISTA

A seguir a entrevista feita com os dez professores pesquisados: 1. Qual a sensação de ser:

1.1 observado na sala? 1.2. entrevistado?

2. Por que aceitar ser observado e entrevistado? Há vantagem?

3. Cite algum fato marcante do contexto social/político/econômico/etc. que se destacou no período:

3.1. da sua infância pré-escolar: 3.2. do seu ensino fundamental: 3.3. do seu ensino médio:

4. Cite algum fato marcante do contexto social/político/econômico/etc. que se destacou no período da sua graduação:

5. Quando/ Por que decidiu ser professor(a)? 6. Por que ser professor(a) de Geografia?

7. O que disseram as pessoas próximas de você quando escolheu a profissão? 8. Após esses anos de profissão, qual o balanço (geral) que você faz dela? 9. Gosta de ser professor?

10. O que é ser professor?

11. Destaque três professores marcantes (EF e EM) que você teve. Por que eles marcaram? 12. Fale de dois professores significativos da graduação. Por que eles o marcaram?

13. Como foi sua graduação? Como ela preparou você para ser professor (a)? Foi eficiente essa preparação?

15. Quais as áreas que mais gostava na graduação? 16. Fale de algum evento significativo da sua graduação.

17. O que é fundamental para ser um bom professor? O que é preciso para ser um bom professor de Geografia? Você se considera um bom professor de Geografia? Como é a sua relação com os alunos? O que os alunos acham de ti como professor?

18. Como é feito o planejamento anual das aulas? É individual ou coletivo? O planejamento da Geografia segue a linha geral da escola? Como se dá a articulação dos professores de Geografia? Quantos são?

19. Como você organiza seu programa? Prepara a aula com que freqüência? 20. Fontes para preparar as aulas e a freqüência com que as usa?

21. Adota livro didático? Quais os que mais gosta? Quais as diferenças que você percebe de linhas teóricas nos LD?

22. Quais os assuntos mais importantes para ensinar? Por quê? São os que você mais gosta? Quais as categorias/conceitos fundamentais para ensinar Geografia?

23. Como você trabalha na prática estes conceitos/categorias com seus alunos?

24. O que é específico à Geografia, o que a caracteriza, a diferencia das outras disciplinas? 25. Você tem alguma linha teórica preferida dentro da Geografia? Qual? Por quê? Você tem alguma linha teórica preferida dentro da Educação/Pedagogia? Qual? Por quê?

26. O que você acha da Geografia Crítica (GC)? O que ela avançou com relação a Geografia Tradicional (GT)? O que diferencia as duas? O que elas têm em comum?

27. Por que ter a disciplina Geografia no currículo do Ensino Fundamental e Médio (EFM)? Qual a diferença entre a Geografia que você ensina e a Geografia que você aprendeu no curso superior?

28. Que características você acha importante nos seus alunos e o que você faz para alcançar/desenvolver tais qualidades neles?

29. Como você se sente ao final desta entrevista? Como foi o ritmo dela? Gostaria de fazer algum comentário ou alguma pergunta?

Questões respondidas, mas não tabuladas

Dado o excesso de informações já disponíveis, e, talvez por serem perguntas muito genéricas, as respostas às questões abaixo tenderam a ser muito homogêneas. Assim, delas não foram feitos quadros como as demais questões que, em breve, serão apresentados.

A) Quais os dois últimos eventos ligados à Geografia que você participou (nome, cidade, ano)? Estes eventos foram por convocação ou foi por sua escolha?

P1, P2, P3 e P5 (professores mais ‘antigos’): ficou claro que estão bem afastados dos eventos. Causa possível: desmotivação com a profissão. Sem falar que, até uns quinze, vinte anos atrás havia uma concepção de que o professor ‘formado’ estava ‘pronto’! Era relativamente raros os que procuravam ir além da graduação.

Os demais professores estão bem ativos no que diz respeito à participação em eventos. P8 e P10, inclusive, participam da AGB/Porto Alegre.

B) Cite dois livros sobre Geografia que você leu nos dois últimos anos e que não sejam LD. Repete-se o esquema anterior: profesores mais antigos têm dificuldade para dizer algum livro lido. Os mais novatos falam, com facilidade, de vários livros.

C) Cite três autores da Geografia que você gosta? Por que você os curte?

Milton Santos é quase uma unanimidade. Novamente há um padrão: professores mais antigos têm mais dificuldade para responder, e, quando o fazem, soa protocolar a resposta. Muitas vezes a impressão é que Milton Santos é citado na inversa proporção com que é lido!

D) Leu os PCN´s de Geografia? O que acha deles?

Quase todos leram, mas o tema foi pouco discutido nas escolas, e, sobretudo, pouco estudado e praticado. Informação isolada, tornou-se irrelevante.

E) Como você trabalha/percebe a questão da Geografia Física e a Geografia Humana? Como os seus colegas de Geografia vêem esta dicotomia?

Há uma tendência a resposta padrão: “não as vejo separadas”, “tento trabalhá-las integradas”, ou seja, busca-se um ‘meio termo’ cuja operacionalização em sala de aula não é simples. Além disso, como predomina nas escolas o trabalho pouco articulado entre os colegas (ver questão 18, p.251), tal questão não é, via de regra, discutida. Não se constitui um ‘problema’ para os professores. Cada um faz como lhe convém.

F) Quando e como você avalia suas aulas?

A maioria não faz isso de forma sistemática. Procuram ver no dia a dia, na reação dos alunos, a resposta deles às aulas. A questão “18” dá pistas: a maioria considera ter uma boa relação com os alunos e que eles são ‘amigos’ dos alunos. Na questão “28” veremos uma contradição interessante. Tal ‘amizade’ não garante que os alunos sejam, de fato, ouvidos, mesmo quando indagados pelos próprios professores.

A relação pessoal-afetiva dos professores com seus alunos, de fato, pareceu tranqüila. Vimos, entretanto, que tal ‘tranqüilidade’ encobre, muitas vezes, uma situação em que as partes não se ouvem ou não consideram o que o outro diz.

SISTEMATIZANDO AS ENTREVISTAS: METODOLOGIA EMPREGADA

Finalizadas as observações, marcávamos a entrevista. Esta era o encerramento do contato entre nós. A data da realização das mesmas está no quadro 2 (p.93).

Deixava as entrevistas para o final, a fim de não sobrecarregar os professores durante as observações. As entrevistas foram feitas nas casas dos professores (com uma exceção) num período que eles tivessem livres. Evitava-se assim a agitação dos ambientes de trabalho. Com isso, as entrevistas transcorreram num ambiente calmo e até descontraído.

As perguntas eram apresentadas por escrito, antes de iniciar a entrevista, para que eles soubessem do que falaríamos. No geral, eles não deram atenção para o roteiro escrito. O gravador, na opinião deles, não chegou a intimidar.

Depois das explicações iniciais, anotava-se alguns dados pessoais, e iniciava a entrevista.

Para facilitar a leitura das entrevistas colocamo-as em quadros. Para a surpresa as respostas, via de regra, eram curtas. Esperávamos o contrário, pois muitas perguntas são bastante amplas. As pausas para pensar, juntamente com as repetições (das perguntas e das próprias respostas) tornaram relativamente fácil a transcrição. O que se lê a seguir, portanto, não se trata de resumo ou seleção do que foi dito. Trata-se, na absoluta maioria dos casos, das respostas literais, completas! Não há, manipulação das respostas visando montar quadros favoráveis a esta ou aquela tese pré-concebida. A idéia era, de fato, ouvi-los, entender as suas lógicas. Conseguiu-se a manutenção de um ambiente de cooperação e harmonia. A curiosidade do entrevistador não era apenas intelectual, de um ‘pesquisador’. As perguntas feitas aos professores são as perguntas que me faço desde que sou professor de Geografia. A curiosidade foi a de analisar as experiências de vida, a formação, as expectativas profissionais

e as justificativas que viessem explicar as práticas adotadas e, nestas, a adoção, ou não, dos postulados da GC.

Claro, havia uma idéia fundamental: tentar ver a possibilidade de estabelecer pontes entre o feito (aulas que eu observamos) e o dito (as entrevistas), tensionando ambas. Tensionar não para dizer ‘A’ faz ‘bem’ a aula, ‘B’ faz ‘mal’ ou ‘pior’, mas para poder entender o quefazer dos colegas e, claro, o meu próprio. Entender não só como exercício de racionalidade. Entender para melhorar a nossa prática como formadores de futuros professores.

Se há divergências entre o que se leu no capítulo anterior e o que se ouve/fala nesse capítulo, isso não se trata, de ‘erro’ ou ‘manipulação’ de quem fala ou fez, mas sim de contradições que constituem a prática, a vida mesma de todos nós. Então, quando comentamos o que os colegas dizem e/ou fazem quero evitar – sabendo que muitas vezes fracassaremos – o julgamento do outro, pois é tão fácil quanto inócuo, moralista, condenável. Se opinamos, é porque estamos imersos, junto deles, identificando-nos como professores de Geografia que fomos e somos. A tarefa de opinar aqui desempenhada é tão necessária quanto espinhosa, pois as dicotomias razão-emoção; objetividade-subjetividade a todo momento me confrontarão com os limites muito tênues entre ciência - que se diz o mais possível isenta de emoções que embotoa(ria)m o discernimento - e a mera opinião. É inevitável: fazer ciência implica opinar, e as opiniões são repletas de preconceitos e paixões, o que pode, de fato, atrapalhar o entendimento do fenômeno da sala de aula da disciplina de Geografia. Este texto não é asséptico, neutro ou desapaixonado. Isso seria improvável, porque não somos neutros e muito menos desapaixonados pelo tema. Muitas vezes alegravamo-nos com o que víamos, e, mais vezes ainda, sofríamos (sic) com o que víamos, seja na sala de aula ou na escola. Razão e emoção sempre andaram brigando, feito marido e mulher, dentro de mim.

O desafio, portanto, é pôr no papel as minhas visões, seja de ensinar/aprender Geografia, sobretudo no EFM, seja de formação de professores de Geografia, para que se possa confrontá-las com outras visões/opiniões/ideologias sobre os mesmos temas! Para que tal aconteça, optei por ver e ouvir o que estes professores fazem na sua prática profissional cotidiana. Ainda que não intentasse fazer uma pesquisa dita participante, afinal meus professores estiveram num papel mais passivo (serem observados, serem entrevistados), o que atraiu mais (e angustiou, com certeza) foi vê-los, efetivamente nas suas salas de aula, no contato diário com turmas reais e não meras simulações do que pensávamos ser o ‘ideal’ de uma sala. Esta tese vai, claro, divagar pelo que ela considera ‘ideal’ num professor, numa escola e até em um tipo de aluno, mas a base, o início, o fim, o objetivo está em olhar, sempre, para o que acontece no cotidiano das escolas deste meu micro mundo que é Porto Alegre.

Os parênteses que aparecem junto às falas dos professores são inclusões e procuram precisar mais o contexto ou o sentido do que está sendo dito. O sinal de barra ( / ) indica, geralmente, mudança de assunto, seja pela ruptura de pensamento do respondente, seja pela mudança de pergunta.

Os agrupamentos que fizemos das questões buscaram diminuir o número de quadros. Obviamente, poderiam ter sido feitos outros agrupamentos ou outras fragmentações. O leitor perceberá que é possível um número muito grande de novas combinações entre as respostas dos professores. Assim como a ordem da leitura das respostas também podem variar conforme o interesse do leitor.

Um alerta: o texto faz a concordância de gênero hegemônica, isto é, apenas no masculino. O que é uma limitação. Por exemplo, ao lado da palavra ‘professor’ (P) o mais correto seria acrescentarmos a concordância no feminino, ‘professora’ (profa.), já que a profissão docente é, majoritariamente, feminina. O grupo, inclusive, é constituído de sete

mulheres, num total de dez professores. Para deixar o texto mais simples, minha opção preferencial é ficar com a concordância padrão. Sabemos que a linguagem é política, é poder, mas, pedimos licença ao leitor para subentender, onde se lê ‘professor’, a figura da professora. Onde se lê ‘aluno’, subentender a palavra aluna.

Os negritos são nossa escolha e pretendem induzir o leitor a refletir junto conosco sobre o que mais me chamou a atenção.

Por fim, o leitor perceberá que, ao longo de todo o capítulo, foram reunidos comentários e conclusões. O objetivo é evitar a sua concentração nas páginas finais deste trabalho.

Vejamos o que foi dito nas entrevistas:

Questões 1 e 2: Sensação de ser observado e entrevistado e razão para permiti-lo

1. Qual a sensação de ser: 1.1 observado na sala? 1.2. entrevistado?

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