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Pacto neoconstitucionalista na jurisprudência da União Europeia

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1.3 E VOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO FUNDAMENTAL À PRIVACIDADE NA LEGISLAÇÃO

1.3.2 Evolução do Direito Fundamental à Privacidade na União Europeia

1.3.2.1 Pacto neoconstitucionalista na jurisprudência da União Europeia

Antes mesmo da formação do atual bloco político-econômico europeu, os países da Europa já se organizavam internacionalmente.

Em 1949, foi instituído o Conselho da Europa, com o propósito de defender os direitos humanos e de proporcionar um desenvolvimento democrático e uma estabilidade político-social à Europa. Em 1950, o Conselho estabeleceu a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), que, por sua vez, instituiu, no âmbito europeu, um sistema de proteção internacional dos direitos humanos, com a criação de um Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Apesar de esse Tribunal Europeu dos Direitos Humanos possuir jurisdição tão somente no âmbito do Conselho da Europa, a partir do Tratado de Amsterdã (1997), que alterou o Tratado da União Europeia e o Tratado que instituiu a Comunidade Europeia, os 27 Estados- membros da União Europeia (que também são membros do Conselho da Europa)

116 Cf. Constituição Espanhola, de 1978. Artículo 1.1. Disponível em: <http://www.la-moncloa.es/NR/rdonlyres/ 79FF2885-8DFA-4348-8450-04610A9267F0/0/constitucion_ES.pdf>. Acesso em: 10/09/2009.

passaram a reconhecer a jurisdição dessa Corte Europeia de Direitos Humanos, paralelamente à do Tribunal de Justiça da União Europeia.

A influência do neoconstitucionalismo, nas decisões dos Tribunais da União Europeia e nas questões relacionadas à privacidade, pode ser percebida no caso K.U. v. Finlândia, julgado pelo Conselho Europeu, na Corte Europeia de Direitos Humanos117. O caso, ocorrido em 1999, é sobre a publicação de um anúncio de natureza sexual, com fotografias de K.U, com 12 anos de idade à época, em um site de relacionamento na Internet. A legislação finlandesa vigente impedia a polícia e os Tribunais de requererem ao provedor de Internet a identificação do responsável pelo anúncio (confidencialidade das comunicações). Em decisão unanime, a Corte Europeia de Direitos Humanos decidiu por receber o recurso e condenar o governo da Finlândia a pagar uma indenização à criança, por violação ao art. 8º da Convenção Europeia sobre os Direitos Humanos118. Mesmo considerando que não havia lei interna sobre violação de privacidade, a Corte entendeu que o governo finlandês foi omisso e, por isso, incapaz de proteger o direito à vida privada de uma criança, ao permitir que fossem infligidas verdadeiras ameaças ao seu desenvolvimento físico e mental, em razão de tais condutas praticadas contra ela119.

Assim, de acordo com a corrente neoconstitucionalista, a atual posição jurídico-constitucional dos direitos fundamentais é estabelecida com o intuito de garantir, aos seus titulares, proteção efetiva contra as diversas formas de ataques e violações aos seus direitos mínimos e básicos como cidadão. Compete, portanto, aos direitos fundamentais proteger a dignidade da pessoa humana, que é o valor máximo a ser garantido pelo ordenamento jurídico de um Estado de Direito.

117 Julgado em dezembro de 1998 pela Corte Europeia de Direitos Humanos (CORTE..., 1959).

118 Convenção Europeia de Diretos Humanos. Art 8º - (Direito ao Respeito pela Vida Privada e Familiar): 1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência. 2. Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros (CONVENÇÂO..., 1950).

119 À época, 1999, a lei finlandesa tratava o caso como de mera calúnia, e havia impedimento à violação do sigilo das comunicações, para se descobrir a identidade da pessoa que divulgou as fotos no site de relacionamento. Entretanto, a Corte entendeu que, mesmo não havendo norma específica na União Europeia sobre o caso, já era previsível a possibilidade de invasão de privacidade e de abusos sexuais de menores, por meio da Internet. O Estado devia garantia proteção das crianças e de outras pessoas vulneráveis de tais interferências em suas vidas privadas (CORTE..., 1959).

Com isso em mente, pode-se concluir da análise feita neste capítulo que

I. os direitos fundamentais nasceram com o processo de

constitucionalização dos direitos humanos, que se iniciou a partir das constituições criadas após a Segunda Guerra;

II. sob a ótica de um paradigma neoconstitucionalista, os direitos fundamentais são a base de todo o restante do ordenamento jurídico, pois refletem os aspectos axiológicos da Constituição do Estado;

III. os direitos fundamentais possuem características de normas jurídicas vinculantes, inalienáveis, indisponíveis, imprescritíveis e oponíveis erga

omnes;

IV. os direitos fundamentais são as normas constitucionais que materializam a proteção à dignidade humana, por constituírem o arcabouço jurídico mínimo para o desenvolvimento de uma vida digna;

V. a Constituição brasileira de 1988 faz parte do grupo de constituições responsáveis pela mudança de posição dogmática constitucional, a saber, positivista para a neoconstitucionalista;

VI. a Constituição brasileira de 1988 foi a primeira entre as Constituições nacionais, a prever o direito à privacidade;

VII. o direito à privacidade nos Estados Unidos limita-se a proteger o seu titular de violações praticadas pelo Estado, não produzindo efeitos nas relações privadas. Porém, tal direito foi praticamente suprimido após os atentados terroristas de 11 de setembro; e

VIII. a questão da privacidade tanto do cidadão quanto dos dados, na União Europeia, é tratada em altíssimo nível jurídico, legislativo e administrativo.

Portanto, após toda essa discussão, é cabível expressar que a análise que se passa a realizar das normas de direito fundamental, ao longo desta dissertação, será feita levando-se em conta toda essa alteração jurídico-constitucional desenvolvida sob o ideal neoconstitucionalista.

2 ASPECTOS JURÍDICO-DOGMÁTICO-CONSTITUCIONAIS DOS DIREITOS

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