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5.1 OS ATIVISTAS

5.1.3 Panteras Rosa

Para sabermos sobre a trajetória bem como saber das práticas do coletivo Panteras Rosa, entrevistamos aquele que conduz o grupo, Sérgio Vitorino. Ele nos diz que o mais adequado seria chamar de “Panteras Rosa- Frente de combate a lesbogaytransfobia.

É um coletivo que existe desde 2004, considerado recente, já que a maioria dos outros grupos portugueses de defesa dos direitos LGBTs é oriundo ainda dos anos 1990. Vitorino também considera o grupo recente por não ter as marcas de partícipes do 25 de Abril, data magna de Portugal, em que há a queda da ditadura e a instauração da democracia. Os Panteras, na realidade, são frutos de ondas recentes de manifestações.

Conta, dentre seus participantes, com ativistas que já militaram noutros grupos, mas que procuram estar estreitamente conectados com as demandas, bandeiras e símbolos das novíssimas lutas sociais, lutas estas que não estavam contempladas na Teoria dos Novos Movimentos Sociais, por exemplo. Estes militantes podem ser tanto ativistas fundadores do movimento LGBT português, assim como a especialidade do grupo que são as causas e a juventude deste novo milênio.

Seus objetivos estão intimamente entrelaçados com a luta contra os mais variados tipos de opressão. Realizam intervenção junto aos profissionais do sexo, aos imigrantes, e também, sempre que possível, estão lado a lado com manifestantes que apresentem como adversários qualquer motivo opressivo. Isto vale para as feministas, bem como para os operários de fábricas.

Panteras Rosa não é um grupo ideologicamente anarquista, mas possui uma estrutura mais ou menos anárquica, segundo seu próprio fundador. Para ele, mais do que juntar manifestantes que lutam por causas LGBTs, os ativistas do grupo têm uma consciência coletiva muito mais ampla.

Ideologicamente apresentam-se como “nada”, porém, reconhecem-se como radicais de esquerda. Conhecer as práticas e o trabalho do coletivo que, novamente segundo Vitorino, é admirado e odiado é um exercício bastante interessante.

Foi uma ação dos Panteras aquela que é considerada a primeira manifestação anti-homofóbica do país. Ocorreu na cidade de Viseu, no ano de 2005. Viseu é considerada uma espécie de bastião do conservadorismo em Portugal14e, para além disso, naquele ano havia uma série de denúncias que acusavam a existência de uma organização armada que atacava gays na cidade.

Houve denúncia formal à Justiça e nada foi feito. Vitorino chegou a ir pessoalmente cerca de cinco vezes à Viseu a fim de conferir de perto as denúncias que eram feitas. Contudo, nada disso surtia efeito.

Como os Panteras Rosa são um coletivo com múltiplas ligações, conforme veremos na entrevista, convidaram uma jornalista para investigar a questão e, como resultado, apresentou-se à Justiça uma listagem com cerca de 40 nomes de homens ligados às práticas violentas contra os gays e que o faziam com simples intuito de “divertirem-se”. Muitos destes, das classes mais abastadas do Distrito de Viseu.

Também os Panteras estiveram envolvidos nas investigações da morte da travesti brasileira Gisberta, que ocorreu na cidade de Porto, no ano seguinte ao caso de Viseu, em 2006.

Uma das múltiplas atividades do grupo no ano de 2010, quando da entrevista, era lutar pela aprovação da Lei de Identidade de Gênero15. Tanto que nos dias seguintes à entrevista haveria uma atividade na Assembleia da República onde os Panteras estariam presentes. A título de informação, no ano de 2011 a lei foi aprovada e já está vigindo em

14

Em conversas informais com amigos portugueses, diziam-me que uma alcunha pela qual Viseu conhecida é “Cavaquistão”, em referência ao presidente da república, Aníbal Cavaco Silva, de centro-direita e classificado por muitos como um claro representante do conservadorismo português.

15 A Lei trata sobre a possibilidade de transexuais passarem a ser reconhecidas (os) pelos nomes que passem a adotar, por exemplo.

Portugal.

O orçamento com o qual Panteras Rosa trabalha gira em torno de 250€ anuais, tratando-se de doações espontâneas, já que não há cobrança alguma de cotas aos ativistas. Da parte do Estado não recebem nada. Aliás, como veremos adiante, as relações com o Estado Português são bastante sofríveis.

Contam com várias parcerias, dentre elas o movimento feminista, movimentos anti-racistas, associações de imigrantes, especialmente de africanos, mas eventualmente também com a Casa do Brasil, organizações ambientalistas, associações culturais, grupos de teatro, com alguns bares, muito embora haja grande resistência à solidariedade neste meio, segundo o entrevistado.

Trabalhos de prevenção ao HIV/AIDS foram mais desenvolvidos no passado que à época da entrevista.

Panteras Rosa, por mais que apresente-se aberto às novas reivindicações, aponta uma visão bastante crítica quanto à possibilidade de juntar forças a partidos políticos. As queixas não são apenas contra os chamados partidos de direita, mas aos de esquerda também. Aos comunistas ainda resta uma postura conservadora, especialmente no concernente à prostituição.

O coletivo Panteras realiza um trabalho muito próximo às pessoas envolvidas com prostituição. Há uma grande esperança no potencial que este movimento, ainda incipiente, possa apresentar no futuro. Não apenas por atrair as atenções para a baixa qualidade de vida a qual os trabalhadores do sexo estão expostos, mas também pelas lutas que visam reconhecer este trabalho como uma profissão, com direitos trabalhistas e demais vantagens. Para além disso tudo, há também a grande possibilidade de desconstrução de vários pilares sob os quais a contemporaneidade está assente. Figuras como a família tradicional, a monogamia e mesmo as relações com o próprio corpo e com a sexualidade estão em jogo e a entrada da prostituição como um forte elemento no tabuleiro movimentalista pode causar alguma modificação substancial no modo pelo qual os movimentos sociais são percebidos.

Se há a crítica aos partidos políticos, há também ao sistema político, que, por ser representativo, verdadeiramente não expressa o desejo de cada cidadão. Cada um, ou, a cada um caberia a decisão sobre a própria vida. Não é à toa que há uma identificação forte entre os Panteras Rosa e o anarquismo.

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