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2 PERSPECTIVAS TEÓRICAS: ANÁLISE CRÍTICA DO DISCURSO,

2.3 Eixos teóricos: mudanças sociais, relações de poder, (trans)formação das identidades e

2.3.2 As relações de poder e as noções de controle

2.3.3.1 Papéis sociais

Goffman (1985), em sua obra, A representação do eu na vida cotidiana, considerada por muitos estudiosos da Sociologia como imprescindível para a compreensão das relações sociais, discute como o indivíduo assume determinados papéis e como ele é representado socialmente. Conforme anunciamos em nossa introdução, um dos objetivos desta pesquisa é

70 verificar como papéis sociais atribuídos às mulheres são discutidos na fanpage Claudia

online. Para cumprir, então, esse objetivo, discutiremos alguns conceitos que julgamos

pertinente, dentre eles, o conceito de representação, interação social e papel social, além de relacioná-los com os conceitos de identidade outrora apresentados.

O termo “representação” é usado por Goffman (1985) para referir-se a toda atividade de um indivíduo, que, quando “se apresenta diante dos outros, seu desempenho tenderá a incorporar e exemplificar os valores oficialmente reconhecidos pela sociedade e até realmente mais do que o comportamento do indivíduo como um todo” (GOFFMAN, 1985, p. 41). Por esse motivo, verificaremos, no capítulo de análises, como os papéis de mãe, esposa e dona de casa demandam, das mulheres, determinadas características, como, por exemplo, uma mãe

zelosa ou uma dona de casa habilidosa, ao entender que esses valores perduram desde a

formação das sociedades tradicionais, por serem arraigados culturalmente e reconhecidos no seio da sociedade como naturais às mulheres.

Dessa forma, ao exercer um papel, como os mencionados, a noção de desempenho, nomeada por Goffman (1985) como fachada, é essencial. Para o autor, sempre que um indivíduo assume um papel, assume, por conseguinte, uma determinada fachada. Isso implica afirmar que, ao representar um papel social, este representa uma identidade social a ele associada, constituída e (trans)formada através das relações sociais (ZANATTA, 2011).

No que se refere às interações, Strauss (1999) afirma que estas não se dão apenas entre duas pessoas, pelo contrário, é necessário considerar outros indivíduos que auxiliarão no processo de representação, na formação de grupos e na transformação das identidades. Esses indivíduos têm como missão complementar o processo de representação, dentre os quais, destacam-se os parentes, os amigos e os professores. Alguns desses envolvidos nesse processo, consoante o autor, poderão ter morrido ou ter feito parte do passado, mas ainda assim, serão imprescindíveis na representação dos grupos que esse indivíduo pertence. Nessa instância, Zanatta (2011), parafraseando Strauss (1999), explica que, analisar o processo de interação implica em reconhecer o quão importante é a formação dos grupos e das organizações sociais, visto que, as interações nesses grupos permitem a execução dos papéis pelos indivíduos.

Nesse viés, salientamos que a formação de grupos sociais decorre da existência de pontos em comum entre seus membros, cujos fatores predominantes são sexo, etnia, idade, profissão, classe social e grau de instrução. Nos estudos feministas, alguns grupos são formados a partir da condição social que as mulheres se encontram, como, o grupo das mães

71 solteiras, das mulheres que estão amamentando, das mulheres que trabalham fora, estuda e cuida do lar e dos filhos, das mulheres divorciadas e muitas outras formações, que, por sua vez, colaboram para a intensificação das interações sociais, por se identificarem com a temática em discussão na fanpage, como também com os relatos de experiências registrados nos comentários, incentivando, dessa forma, uma troca, uma interação.

Diante desse contexto, salientamos que, para Goffman (1985), os conceitos de representação e interação são similares, isto é, apresentam uma relação de sinonímia. Logo, podemos conceituá-los como “toda a atividade de um indivíduo que se passa num período caracterizado por sua presença contínua diante de um grupo particular de observadores e, que exerça sobre estes algum tipo de influência” (GOFFMAN, 1985, p. 29).

Uma vez compreendida a noção de representação/interação, discutiremos agora o conceito de papel social, que é entendido por Goffman (1985) como a promulgação de deveres e direitos relacionados a uma situação social e que, para uma pessoa exercer um determinado papel social, deve-se levar em consideração o contexto em que se encontra. Nesse sentido, é possível afirmar que a identidade é contextual, por depender da situação e dos indivíduos que estão envolvidos. Enfatizamos, então, a relação existente entre a execução de um papel e a influência desta para a formação das identidades em jogo.

Em linhas gerais, o comportamento dos indivíduos, o papel que desempenha ou vai desempenhar, determina a adoção de determinados comportamentos, implicando assim, na formação da identidade social. Assim, quando estamos em ambientes públicos, tendemos a nos preocuparmos com nossas ações, interações/representações, por termos a noção dos modelos comportamentais vigentes e por compreendermos que algumas expectativas são geradas nesse processo. Essas expectativas, chamadas também de impressões, estão sujeitas a rupturas, permitindo a (trans)formação das identidades, seja a individual, seja a coletiva. Dessa forma, “a identidade, tanto a atribuída quanto a adquirida pelo sentimento de pertencimento, é assimilada no processo de interação. Cada pessoa é identificada por outra no interior das esferas de que participa. Os papéis, como resultado da rotulagem, representam as instituições” (ZANATTA, 2011, p. 50).

Diante desse aparato teórico sobre identidades e papéis sociais, ratificamos que esta tese recorre aos preceitos do Interacionismo Simbólico e da Sociologia para enfatizar a liquidez, a fluidez, a fragmentação e a (trans)formação das identidades. Embora os autores usados aqui não pertençam às mesmas correntes, eles partilham do pensamento de que o indivíduo não é unificado, acabado; sua identidade não é estática; pelo contrário, ele recebe

72 influências do meio que vive, dos grupos sociais e organizações dos quais participa, além de, em meio aos conflitos, questionar o seu papel no mundo.

Por fim, verificaremos que as postagens escolhidas para compor o corpus desta pesquisa demarcam a forma como as mulheres são representadas no seio da sociedade e como alguns papéis são vistos e discutidos pelas leitoras/internautas da fanpage Claudia online, gerando a ideia de satisfação ou insatisfação, ou até mesmo, conformidade, a depender do contexto. A interação estabelecida através dos comentários confirma o processo de concordância ou não ao que está sendo discutido, permitindo-nos analisar as metamorfoses nas identidades, além da tentativa de depreendermos porque o acúmulo de funções é cada vez mais constante, visto que, para assumir um dado papel, rotulado como pós-moderno, a mulher precise, provavelmente, cumprir um papel tradicional.