• Nenhum resultado encontrado

Para além do déficit de atenção e da hiperatividade: TDAH entendido como um transtorno do desenvolvimento

F 90.0 314.01 Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Tipo Predominantemente Hiperativo-Impulsivo: se o critério A2 é satisfeito, mas o critério A1 não é

7. Para além do déficit de atenção e da hiperatividade: TDAH entendido como um transtorno do desenvolvimento

Para Barkley (1997), os sintomas de hiperatividade e de desatenção do TDAH não podem ser entendidos como os únicos fatores centrais e explicativos do transtorno. A visão atual do TDAH é, segundo Barkley, puramente descritiva, pouco teórica, muitas vezes desconsiderando as características cognitivas e comportamentais das crianças.

É preciso considerar, como já dito, que a hiperatividade e a impulsividade são, em certo nível, manifestações normais na primeira infância, e, além disso, são sintomas presentes também em outras patologias. Barkley (1981; apud BARKLEY, 2002), em pesquisa de observação com crianças com TDAH, constatou que a intensidade dos sintomas de hiperatividade era variável conforme a situação na qual a criança se encontrava: os sintomas eram mais intensos na presença dos pais (e, em relação a ambos, as crianças tendiam a ser mais submissas e menos hiperativas com seus pais do que com suas mães). No mesmo estudo, observou-se que em ambientes menos estruturados e restritivos, a diferenciação entre crianças com e sem o transtorno era mais difícil.

A questão da desatenção como sintoma central do TDAH é ainda mais controversa. Há dúvidas sobre quais dificuldades estão sendo agrupadas sobre o conceito de desatenção (dificuldade de filtrar ou focar informação, problemas de concentração e distratibilidade, atenção flutuante, mudança constante de atividade, etc). Diversas pesquisas demonstram que os níveis de desatenção tendem a variar conforme o contexto em que a criança está inserida e o nível de estruturação e estimulação da tarefa. Sabe-se que crianças com TDAH são mais facilmente atraídas por aspectos imediatamente reforçadores das tarefas, e buscam constantemente novos desafios e situações estimulantes, o que faz com que alguns estudiosos afirmem que essas crianças sejam “procuradoras de estímulos” (BARKLEY, 2002).

Além disso, os sintomas de desatenção no subtipo predominantemente desatento, e no subtipo combinado do TDAH, para alguns pesquisadores, são claramente diferentes (BARKLEY, 1997). O subtipo predominantemente desatento poderia ser caracterizado por uma desatenção passiva, letárgica, e uma hipoatividade, como se estivessem “no mundo da lua, sonhando acordados”. Já o subtipo combinado, juntamente com a hiperatividade, apresentaria uma dificuldade de sustentar a atenção por um período prolongado, distraindo-se facilmente por estímulos irrelevantes.

Portanto, para Barkley (1997), faz-se necessária a construção de um modelo teórico que explique de forma mais coerente os sintomas, integrando a hiperatividade e o déficit de atenção em um construto único, considerando também os achados cerebrais e neuropsicológicos.

Em artigo denominado Behavioral Inhibition, Sustained Attention, and Executive

Functions: Constructing a Unifying Theory of ADHD (1997), Russell Barkley, psicólogo

americano e importante estudioso do TDAH, elabora um modelo compreensivo e dinâmico para explicar o transtorno, que dentre outros aspectos, propõe: a ligação do fator desatenção e do fator hiperatividade com as funções executivas e metacognitivas; a tentativa de ligação dos achados neuropsicológicos com as funções cerebrais, principalmente as do córtex pré-frontal; e a consideração do conhecimento teórico trazido pela Neuropsicologia e pela Psicologia do Desenvolvimento, já que, neste modelo, o TDAH seria visto como uma ruptura do processo normal de desenvolvimento da criança.

A hipótese central defendida por Barkley, inicialmente neste artigo, e também em trabalhos posteriores (BARKLEY, 1998; 2002), é a de que o TDAH, ao menos em relação ao tipo predominantemente combinado, seria causado por uma falha no desenvolvimento da capacidade de inibir comportamentos e respostas. Esta capacidade de inibição permitiria frear também uma resposta inicialmente preponderante, ou parar uma resposta, atitude ou comportamento em curso, o que ocasionaria um atraso na decisão de responder, e conseqüentemente, abriria a possibilidade

do indivíduo refletir sobre outras alternativas de atitudes e respostas, e as conseqüências futuras das mesmas.

Crianças com TDAH são comumente descritas como impulsivas, não pensando antes de agir e facilmente perdendo o interesse pelas coisas. São também frequentemente guiadas pelos aspectos mais imediatos e recompensadores de uma situação. Rapport (1986, apud BARKLEY, 2002), em experimento com 32 crianças com e sem TDAH, propunha tarefas matemáticas a serem realizadas, prometendo a cada criança um brinquedo ao término da atividade. No entanto, antes de entregar o brinquedo, o pesquisador informava à criança que ela poderia optar por realizar mais problemas de matemática, e ao final destes, ganhar um brinquedo maior e muito mais valioso que o primeiro, porém teria que aguardar dois dias para recebê-lo. As crianças com TDAH tenderam mais freqüentemente a realizar a menor tarefa e ficar com o brinquedo menos valioso, enquanto que crianças não diagnosticadas apresentaram uma tendência a realizar o maior esforço e aguardar o brinquedo conquistado.

Esses e outros achados são constantemente explicados pelos modelos de reforçamento da Psicologia Comportamental. Neste caso, crianças com TDAH seriam mais propensas a analisar as contingências e recompensas mais imediatas, devido a uma incapacidade de inibir o comportamento mais imediato de resposta e analisar as demais possibilidades.

Como mencionado anteriormente, a Epistemologia Genética de Jean Piaget (1896-1980) constitui um modelo teórico importante e coerente para a compreensão do desenvolvimento das habilidades cognitivas e afetivas dos indivíduos. A capacidade de pensar antes de agir, de refletir sobre diversas possibilidades e antecipar, em pensamento, as conseqüências dos atos, promove um avanço intelectual para a criança, que pode assim rever seus conceitos morais, suas preferências e interesses. O pensamento operatório, por ser lógico, é reversível, estável e conserva-se num sistema coeso; isto permite que a criança possa avaliar objetivamente suas próprias atitudes.

Uma importante construção, concomitante à do pensamento operatório, foi o que Piaget denominou “força de vontade”. A força de vontade é uma regulação entre duas tendências do indivíduo: uma forte, mais imediata (por exemplo, ir para a praia tomar sorvete num dia de calor), e outra tendência inicialmente fraca, não tão imediatamente apreensível (por exemplo, estamos num dia útil, trabalhando num projeto importante que não podemos parar). A força de vontade seria então, esta capacidade regulatória, proporcionada pelo pensamento operatório que hierarquiza os interesses e vontades do sujeito numa escala de valorizações, fazendo com que a tendência inicialmente mais fraca (que, no entanto, se configura como mais importante na escala de valores do indivíduo), possa triunfar sobre a tendência aparentemente mais forte (Piaget, 1953/1954).

Portanto, dentro desta teoria, uma possível hipótese explicativa para os sintomas descritos em crianças com TDAH seria que o desenvolvimento das capacidades operatórias nessas crianças poderia estar atrasado, dificultando os processos reflexivos e de regulação dos interesses e vontades. A capacidade de inibir os comportamentos poderia ser entendida, dentro dessa concepção, como relacionada ao pensamento operatório. Antes disso, é necessário definir e apresentar o modelo proposto por Barkley, e sua fundamentação teórica.

Para Barkley, o desenvolvimento da capacidade de inibir comportamentos está diretamente relacionado com as funções executivas. O termo Funções Executivas, segundo o autor, refere-se a uma ação cognitiva, privada e autodirigida, que contribui para a autoregulação. As Funções Executivas surgem com o desenvolvimento de conexões neurais nos lobos pré- frontais, e permitem a aquisição de habilidades mais especificas de autocontrole, planejamento e autoregulação. Essas capacidades dependeriam também da experiência e socialização do indivíduo, e o quanto no decorrer da vida este foi estimulado a usá-las. As Funções Executivas não são determinadas diretamente pela capacidade de inibição comportamental, mas estão subjacentes a esta, sendo que ambas desenvolvem-se de forma mútua. Em tarefas de resolução de

problemas, e quando há um conflito de possíveis conseqüências das ações (conflito entre a conseqüência imediata e a conseqüência tardia), as Funções Executivas e o controle inibitório são essenciais para uma boa resolução destas situações. Portanto, tais tipos de tarefa poderão fornecer pesquisas importantes para a compreensão da conexão existente entre a falha da inibição comportamental e o TDAH (BARKLEY, 1997).

A proposta de Barkley constitui-se, portanto, num modelo teórico híbrido, que combina aspectos neuropsicológicos, psicológicos e cerebrais na compreensão das capacidades e habilidades cognitivas superiores anteriormente mencionadas. Esta tentativa de integração, de certa forma, já havia sido empreendida por outros autores, como Bronowski e Fuster, dos quais Barkley apreende algumas considerações (BARKLEY, 1997).

Para Bronowski (apud BARKLEY, 1997), a habilidade humana da linguagem é única dentre todas as espécies, pois além de meio de comunicação, possibilita a reflexão. Esta capacidade de refletir somente ocorre porque, nos seres humanos, existiria um atraso na resposta imediata, um intervalo entre a apreensão do estímulo externo e a decisão de responder. Em decorrência desta habilidade, surgiriam quatro importantes funções mentais: Prolongamento, Separação do Afeto, Internalização e Reconstituição.

A função de Prolongamento, segundo Barkley (1997), seria semelhante ao conceito de Memória de Trabalho da Neuropsicologia, e possibilitaria ao sujeito referir-se para frente e para trás no tempo, mantendo uma informação na mente na ausência de um sinal externo e utilizando essa informação internalizada para emitir e analisar respostas iminentes.

Para Bronowski, este intervalo no qual ocorreria um atraso na decisão de responder, possibilitaria ao indivíduo separar o conteúdo da resposta de sua valência emocional, inibir uma emoção mais instintiva e imediata que poderia atrapalhar a decisão a ser tomada.

Da mesma maneira, neste período em que analisa as condutas possíveis a serem tomadas, diversas áreas do cérebro são ativadas, proporcionando uma discussão interna antes da resposta

final. Seria esta Internalização do Discurso que confereria à linguagem humana um status único, o da metalinguagem, de poder dialogar consigo mesma. Além de meio de comunicação com o mundo, a linguagem também se constitui como importante instrumento para o desenvolvimento de habilidades mais complexas do ser humano.

A capacidade de Internalização do Discurso traria como conseqüência, de acordo com Bronowski, a habilidade de Reconstituição mental dos eventos, através da análise (processo de decomposição da seqüência dos eventos em partes que posteriormente podem ser combinadas como linguagem), e síntese (estrutura hierárquica da linguagem e do comportamento, que reorganiza as partes analisadas num todo).

Essas quatro funções mentais, (Prolongamento, Separação do Afeto, Internalização do Discurso e Reconstituição), seriam, para Bronowski, decorrentes da capacidade de retardar a resposta justamente porque estariam ancoradas nas estruturas cerebrais, podendo ser atribuídas ao córtex pré-frontal.

De acordo com a teoria das funções do lobo pré-frontal de Fuster (apud Barkley, 1997), a função global do córtex pré-frontal seria a formação de estruturas cada vez mais complexas que possibilitem ações dirigidas a um alvo determinado, e organizadas dentro de uma referência temporal. Essa organização dirigida a um objetivo e temporalmente situada seria possibilitada pelas funções retrospectiva e prospectiva.

A função retrospectiva permite analisar eventos atuais à luz das estratégias utilizadas anteriormente. Desta capacidade, surge a função prospectiva, que, através da antecipação mental dos eventos conduz a preparação de um comportamento dirigido a um objetivo especifico. Para Fuster, este encadeamento mental de eventos permite que o indivíduo adquira uma noção psicológica do tempo, e um déficit na construção dessas funções poderia gerar comportamentos impulsivos e hiperativos (BARKLEY, 1997). Da revisão teórica dos modelos de Bronowski e Fuster, Barkley (1997) encontra subsídios para a discussão a respeito da criação de um modelo

Inibição Comportamental Inibir a resposta mais preponderante

Parar uma resposta em curso Controle das Interferências

Memória de Trabalho Realizar eventos em mente Manipulando ou agindo nos

eventos Imitação de seqüências complexas de comportamento Funções Retrospectiva/Prospectiva “Jogo antecipatório” Noção temporal Organização “trans-temporal” do comportamento

Auto regulação do afeto/ motivação/ excitação Auto controle emocional

Objetividade/Adquirir perspectiva social

Auto regulação do impulso e motivação Regulação da excitação a serviço de ações dirigidas a

um alvo

Internalização do discurso Descrição e reflexão Comportamento guiado por

regras Generalização de regras e meta-regras Raciocínio moral Reconstituição Análise e síntese do comportamento Fluência Verbal/Comportamental Comportamento criativo dirigido a um objetivo Sintaxe do comportamento Controle motor-fluência-sintaxe Inibir respostas irrelevantes á tarefa Emitir respostas dirigidas a um alvo Execução de novas seqüências

motoras complexas Persistência dirigida a um alvo

“Sensibilidade ao feedback da resposta”

Re-engajamento em tarefas após perturbações

Controle do comportamento pela informação internamente

explicativo relacionando as funções executivas, o controle inibitório e as estruturas pré-frontais. O modelo teórico híbrido formulado por Barkley é sintetizado no esquema seguinte.

Extraído de Barkley, R.A. (1997) Behavioral Inhibition, Sustained Attention, and Executive Functions: Constructing a Unifying Theory of ADHD – livre tradução para o português feita por Camila Tarif Ferreira Folquitto

O esquema delineado por Barkley procura identificar as relações entre a Inibição Comportamental, as Funções Executivas e o Controle Motor e a influência dessas capacidades no comportamento e cognição humanas. O modelo híbrido propõe que a Inibição Comportamental permite o desempenho das habilidades executivas (Memória de Trabalho, Internalização do Discurso, Auto Regulação do Afeto/Motivação/Excitação, e Reconstituição). Essas quatro habilidades influenciam o sistema motor no que se refere à tomada de decisões e comportamentos dirigidos a um objetivo especifico, através de atributos reunidos sob a denominação de Controle Motor/ Fluência / Sintaxe. Um bom funcionamento do Controle Motor também dependeria diretamente da Inibição Comportamental.

As Funções Executivas, embora se originem no córtex motor, produzem efeitos em outras regiões cerebrais, relacionadas com as áreas sensoriais, lingüística, da memória e com as emoções de maneira geral, pois em quaisquer comportamentos intencionais, dirigidos a um objetivo especifico, as Funções Executivas estão presentes.

Boa parte das habilidades relacionadas no esquema é entendida a partir das teorias de Bronowski e Fuster; porém, algumas considerações de Barkley são divergentes daqueles autores. A separação do afeto, proposta por Bronowski, é substituída pelo conceito de auto- regulação do afeto/ motivação/ excitação, já que Barkley acredita que o afeto não pode ser totalmente separado da decisão de responder, ou mesmo da própria resposta. Assim como o afeto pode influenciar negativamente os comportamentos, a criança já no primeiro ano de idade conseguiria, em certa medida, regular sua afetividade no sentido de produzir estados positivos de motivação (BARKLEY, 1997). Para Piaget, afetividade e inteligência seriam aspectos indissociáveis da conduta, e em constante interação, apesar de suas naturezas diferentes: a energética das condutas proviria da afetividade, dos interesses e motivações, enquanto que caberia à inteligência a estruturação cognitiva das condutas (PIAGET, 1953/1954) No segundo estágio de desenvolvimento da afetividade,

paralelamente ao desenvolvimento cognitivo, por volta dos seis meses de idade, aparecem os primeiros afetos perceptivos, sentimentos basicamente ligados às percepções de prazer e dor, que se traduzem em reações de agrado / desagrado, ocorrendo também uma diferenciação das necessidades e dos interesses.

A habilidade de Internalização do Discurso, citada por Barkley, decorreria das trocas simbólicas com o meio, e, ao longo do desenvolvimento, com o controle que a linguagem passaria a exercer sobre os comportamentos motores. Possibilitando meios de reflexão, o discurso internalizado provê maneiras de sustentar o comportamento por longos intervalos de tempo sem que haja reforçadores a todo instante, através da aceitação e criação progressiva de regras que regulem as condutas.

Buscando estender o modelo proposto para uma compreensão dinâmica do TDAH, Barkley reúne um conjunto de evidências que apontam que sintomas característicos do transtorno podem ser relacionados a déficits nas funções e habilidades anteriormente discutidas. A questão do déficit na inibição comportamental parece ocorrer mais frequentemente em situações nas quais uma resposta impulsiva pode ocasionar um ganho imediato, uma recompensa tentadora.

Em tarefas de desempenho e baterias de testes neuropsicológicos, crianças com TDAH apresentam um padrão de dificuldades semelhantes a pacientes com lesões no lobo pré-frontal (BARKLEY, 1997). No Wisconsin Card Sorting Test (WCST), é necessário parar um padrão de resposta em curso para responder corretamente. Crianças com TDAH emitem um maior número de respostas perseverativas, em relação a crianças não diagnosticadas. Erros de comissão são freqüentes em testes de Cancelamento e de Desempenho Contínuo como o Contínuous Performance Test (CPT). A dificuldade em controlar as interferências internas e externas de uma tarefa costuma ser frequentemente demonstrada em crianças com TDAH através de pesquisas com o teste de Stroop, no qual é preciso inibir uma resposta impulsiva, mais preponderante inicialmente. Crianças com o

transtorno são mais influenciadas negativamente pelos distratores da tarefa que crianças controle (BARKLEY, 1997).

Como conseqüência de uma pobre inibição comportamental, déficits secundários ocorreriam nas funções da Memória de Trabalho em crianças com TDAH, que seriam mais influenciadas pelo contexto imediato em que estão inseridas, com dificuldade de formular planos, antecipar ou planejar comportamentos futuros. Segundo Barkley (1997), essas crianças apresentariam uma forma de “miopia temporal”, já que seus comportamentos seriam predominantemente determinados pelo tempo presente, do que por representações internas de experiências passadas ou de conseqüências futuras. Dessa maneira, a noção de futuro costuma pouco desenvolvida nessas crianças, devido a uma dificuldade de planejamento e antecipação das recompensas em longo prazo. Entretanto, existem poucos estudos sobre as noções temporais de crianças com TDAH, suas concepções verbais sobre o tempo, planos para o futuro, uso de referências de tempo no discurso, entre outros aspectos.

Déficits em habilidades relacionadas à Memória de Trabalho são observados no fator de Resistência à Distração do WISC-III, através dos subtestes de Dígitos, Códigos e Aritmética. Pesquisas realizadas com a Torre de Hanói encontram déficits em crianças com TDAH na habilidade para solução de problemas e planejamento. (BARKLEY, 1997).

A região do córtex pré-frontal é uma área importante não apenas para o planejamento de ações e inibição de comportamentos, atuando também no controle e regulação das emoções. Pesquisas clássicas sobre o TDAH já mencionavam que uma alta irritabilidade e sensibilidade emocional poderiam ocorrer em crianças hiperativas (STILL, 1902), e continuam sendo constantemente descritas em estudos mais atuais. Para Barkley (1997), haveria uma dificuldade na auto-regulação das emoções, motivações e excitações, o que ocasionaria uma maior reatividade emocional a eventos imediatos, e, em contrapartida, uma dificuldade de antecipar reações emocionais a eventos futuros, e de levar em consideração as emoções de outras pessoas em suas ações.

Entretanto, segundo o autor, essas afirmações devem ser compreendidas com cuidado, visto que existem poucos estudos sobre o assunto, e esta “alta reatividade emocional” pode ser apenas conseqüência de uma frustração por um desempenho ruim em tarefas e jogos, por exemplo.

Em relação à habilidade de Internalização do Discurso em crianças com TDAH, parece haver uma imaturidade no desenvolvimento desta capacidade, acarretando uma dificuldade em seguir regras, o que frequentemente ocasiona um comportamento anti-social. Além disso, o planejamento de estratégias torna-se prejudicado: pesquisas apontam que crianças com TDAH abandonam com facilidade a estratégia planejada nas tentativas subseqüentes (AUGUST, 1987

apud BARKLEY, 1997), bem como apresentam dificuldade de transferir regras e habilidades

aprendidas para novas tarefas (CONTE; REGEHR, 1991, apud Barkley, 1997).

Atualmente, não se pode concluir que crianças com TDAH tenham déficits nas habilidades de Reconstituição, como fluência verbal, análise e síntese do comportamento e criatividade (BARKLEY, 1997).

Diversas pesquisas apontam para a relação entre o TDAH e um déficit nas habilidades de coordenação e preparação para a ação motora (OOSTERLAND; SERGEANT, 1995, apud BARKLEY, 1997), principalmente na programação e execução rápida de esquemas motores complexos.

Ao ressaltar a existência de um déficit na capacidade de Inibição Comportamental, e, conseqüentemente, também das Funções Executivas, como sintomas primários do subtipo combinado de TDAH, Barkley desloca os sintomas de desatenção e hiperatividade para um plano secundário. A questão da desatenção poderia ser compreendida como uma falha em sustentar a atenção devido a uma dificuldade de inibir comportamentos e estímulos alheios à atividade do momento, bem como dificuldade em planejar e persistir em ações que envolvam objetivos definidos com resultados não imediatos. Já no subtipo predominantemente desatento, a

desatenção provavelmente seria explicada pela dificuldade em exercer uma atenção seletiva, não necessariamente relacionada a problemas de inibição de comportamento.

Os resultados de crianças com TDAH em baterias neuropsicológicas podem ser comparados a resultados de crianças mais novas não diagnosticadas. A dificuldade de inibição comportamental atrasaria o desenvolvimento de habilidades executivas, sendo que o transtorno poderia ser entendido como “um transtorno do desenvolvimento da capacidade de regular o comportamento com o olho voltado para o futuro” (BARKLEY, 2002, p. 40).

8. A utilização da teoria piagetiana na compreensão de Transtornos no