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1 SENTIDOS ATRIBUÍDOS AOS ESTUDOS APÓS O ENSINO MÉDIO

1.3 Para os jovens

A temática das juventudes é complexa não somente pela dificuldade de enunciar uma definição concreta do termo como também do modelo de juventude na nossa sociedade.

Tentamos elencar aqui alguns conceitos para dialogar sobre esse tema, que se torna cada vez mais emblemático, principalmente se vinculado à educação escolar e suas implicações.

Há hoje no Brasil, uma diversidade de atores neste campo, com diferentes visões a respeito da juventude, diferentes modos pelos quais definem o público foco de sua ação e diferentes posições a respeito de como estes devem (ou não) se tornar assunto para políticas públicas; visões que também se vinculam a diferentes perspectivas políticas relativas às propostas e projetos para o país (ABRAMO, 2005, p.20).

Em primeira instância, recorri à Ferreira (2000) para encontrar uma tradução para os termos “jovens e juventudes”. O autor dá aos termos significados que implicam, na nossa compreensão, em uma condição de estado, ou seja, é jovem quem está na juventude e está na juventude quem tem juvenilidade ou mocidade. Desse modo, ambos os termos tomam uma amplitude de polemicidade, que o texto em questão busca compreender.

Alvarado (2009) afirma que o tema juventude resulta da dialética entre as ciências sociais, como a pedagogia, a sociologia, a psicologia e a antropologia, bem como da prescrição social. Para a autora, o sujeito jovem transcende uma mera classificação de idade ao englobar formas e estilo de vida, relações familiares, educação, trabalho, representação social e individual, trata-se de uma preparação para os compromissos da vida adulta.

Através de uma abordagem antropológica, Feixa (1999) nos possibilita transcorrer o percurso galgado para a compreensão da definição do que seria a juventude. Segundo o autor, os estudos sobre a temática data do começo do século XX, tendo como pioneiro o psicólogo estadunidense G. Stanley Hall, que na época caracterizou a adolescência como uma fase tempestuosa e de transição, sendo mais tarde, em 1925, refutado por Margareth Mead, que defendia a ideia de que essa fase correspondia a um desenvolvimento e uma maturação harmônica e gradual, teoria que nos anos 1983 seria posta em questão por Derek Freeman, que, investigando a vida de adolescentes em Samoa, percebeu uma situação que contrasta com a descrição dada por Mead, indicando a dependência familiar e a hierarquia social como pontos imperantes no estilo de vida das adolescentes, não o conflito nem a tensão.

A visão mais flexível e cambiante da definição que engloba as múltiplas facetas da juventude aparece como uma construção da cultura ancorada no tempo e no espaço. Assim, a organização e a transição da infância para a vida adulta são construídas pelas sociedades, cada uma das quais possui características, visões ideológicas e instituições políticas próprias, além de uma enorme diversidade de coisas e valores que modelarão e farão distinção em cada

grupo. Essa heterogeneidade se apresenta ainda internamente, como através do gênero, posto que os homens e mulheres atribuem significados distintos à vida adulta (FEIXA, 1999).

Feixa (1999) nos dá um parecer histórico retratando as realidades da juventude primitivas, quando para os meninos a puberdade implicava em força física e no culto ao corpo atlético, em maturidade fisiológica, reconhecimento social e capacidade de atuar. Por outro lado, para as meninas implicava em estar pronta para a reprodução.

A sociedade pós-industrial focaliza a juventude beneficiando-a com políticas de bem estar, destinando-lhe ainda um mercado de consumo por intermédio, por exemplo, da moda, das músicas e das tecnologias de comunicação. Margulis e Urresti (1996) afirmam que relacionar o termo juventude a um estado, etapa da vida e a uma condição social implica na complicação e na comercialização dos atributos relacionados ao termo. Os autores concebem a juventude como uma constituição condicionada pela cultura e associada à idade biológica.

Catani e Gilioli (2008) nos revelam que a consolidação das pesquisas acadêmicas sobre o tema juventude já tem quase um século, e que as especificidades históricas e as condições sociais pluralizam o termo. Dayrell (2003), por sua vez, destaca como o jovem é capaz de construir um modo de ser jovem exclusivo, resultante da sua vivência diária. A juventude, explica o autor, é condicionada e representada socialmente por cada grupo da sociedade. Nesse sentido, as mudanças psicológicas, fisiológicas e mesmo a caracterização universal da juventude varia de acordo com as condições sociais, culturais e de gênero nessa etapa. Dayrell (2003) defende a ideia de que a juventude é um momento onde o sujeito se constitui influenciado pelo seu meio social e pelas trocas que este mesmo meio vai proporcionar a cada jovem, pluralizando assim o caráter do termo juventude, articulando-o a noção de um sujeito social, que se constrói mediante suas experiências de vida, sentimentos, desejos e pensamentos que ele transforma em representações, aspirações e práticas.

Abramo (2005) afirma haver ao mesmo tempo uma explicação óbvia e mística no termo juventude. A autora alerta para os problemas da indeterminação do termo, mesmo o presente nos discursos políticos. Ela critica a defesa de uma concepção de juventude como um mero período da vida que transita entre a infância e a fase adulta. Assim, aponta um significado social moderno para a juventude, que consiste na aparição de certa ambiguidade, transição e tensão “de um tempo socialmente legitimado para a dedicação exclusiva à formação para o exercício futuro dessas dimensões de cidadania” (ABRAMO, 2005, p.41).

Ainda segundo Abramo, esse fato não deveria implicar na proibição das políticas públicas em permitir que esses mesmos jovens sejam inseridos na experimentação, iniciação, realização e participação de compromissos e encargos. Logo, vê a possibilidade de incluir a juventude no espaço público, pois acredita ter o jovem brasileiro potencial para exercer um trabalho.

Os jovens cada vez mais atraem os holofotes no tocante à moda, aos esportes, a música e a cultura, entre outros aspectos. Contudo, é necessário se despir de preconceitos para entender a ampla dimensão que a fase ou categoria abarca. Catani e Gilioli (2008) nos oferecem a possibilidade de compreender as múltiplas formas como as juventudes se expressam ao defender uma concepção de que os jovens são autores culturais. Nesse sentido, os estudiosos observam que é necessário falar em juventudes e em culturas juvenis, pois suas manifestações são diversas e porque os jovens produzem uma cultura autônoma que não é pura imitação do mundo nem das instituições tradicionais nas quais estão inseridos. Destacam ainda o fato de que os jovens sentem necessidade de serem autônomos em relação aos seus pais, porém esse comportamento, além de produzir discursos artificiais, confirma o conflito entre as gerações, construindo, por conseguinte, a imagem dos jovens ligada à delinquência.

Atualmente, as práticas esportivas são facilmente associadas ao ser jovem. O futebol conforme Catani e Gilioli (2008), além de mobilizar o mercado comercial e os meios de comunicação, é o principal meio de lazer dos jovens brasileiros, possibilitando a interação e socialização entre grupos. Dentro dessa conjuntura, os jovens constroem uma cultura específica resultante do seu comportamento e o que eles consomem.

Estudar os jovens ou as juventudes se torna tarefa árdua pela não existência de um modelo único caraterizador dessa etapa, e pela não definição exata de um termo que se altera, se reformula de teoria para teoria em cada época e em cada geração. Sposito (2009) se debruça num esforço teórico para construir um Estado da Arte dos estudos sobre juventudes na pós-graduação no Brasil. Numa identificação interdisciplinar, destaca os estudos nas áreas da Educação, Serviço Social e nas Ciências Sociais nos anos de 1999 a 2006. Esse balanço implica também numa possível demonstração teórica de onde paramos nas pesquisas e de onde devemos continuar. As temáticas encontradas e anunciadas por Sposito giram em torno do cotidiano escolar, relações sociais, processo ensino aprendizagem, expressões culturais, indisciplina e violência na escola, significados, sentidos e representações que os jovens atribuem à escola, relações com o saber e práticas educativas, entre outros.

Considerando que o jovem atual está inserido num processo educativo que engloba a educação escolar, compreendemos que as experiências vividas na escola vão desencadear uma série de questões que implicarão de forma direta e indireta no comportamento e na formação dos jovens. Reis (2012), ao relatar sua experiência escolar, afirma que essa vivencia não implica exclusivamente na aquisição de saberes, mas na produção da imagem. Segundo a autora, as experiências escolares constituem até mesmo a subjetividade dos sujeitos.

Abrantes (2003) destaca que a escola é capaz de produzir sentidos e transformação na vida dos jovens. Desse modo, faz parte do percurso da vida desses jovens, auxiliando na construção de seu projeto de identidade, resultante da participação cultural durante o percurso escolar. O autor evidencia que muitos jovens que se empenham arduamente nos trabalhos escolares veem a escola como um veículo para alcançar um bom emprego e uma vida mais tranquila; outros, como fator de realização pessoal. Abrantes (2003, p.113) menciona ainda que progressivamente os jovens se definem mais pelo lazer e pelo consumo, “manifestando uma disposição de “adesão distanciada” à escola”.

As políticas, estratégias e práticas das escolas e dos seus professores interferem, significativamente, na construção de ambientes estruturantes das identidades juvenis. Em muitos casos, contribuem para a produção de ambientes de exclusão e resistência, com consequências na polarização das identidades juvenis e na reprodução das desigualdades sociais. (ABRANTES, 2003, p.113).

Dessa maneira, surge uma incapacidade de elaborar uma caracterização concreta das juventudes atuais, mesmo que de pequeno porte. As amplitudes de implicações que afetam diretamente nossos jovens perpassam por aspectos transcendentes, que englobam as relações iniciais no seio familiar até as interferências das políticas que regem as instituições de ensino.

Em Abramo (2005), averiguamos que no Brasil da década de 1970 os movimentos estudantis trouxeram a questão da infância a da adolescência para as pautas da agenda pública, resultando na elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente. Porém, os programas limitavam a idade de no máximo 18 anos. Os jovens para além dessa idade ficavam de fora das ações e dos debates, fato que durou até meados dos anos 90, quando os jovens atraem os olhares do governo pela preocupação social em decorrência de problemas como drogas, doenças sexualmente transmissíveis, gravidez precoce, violência, criminalidade entre outros; nesse período, foram engrenadas várias ações desenvolvidas por ONGs.

A Frente Parlamentar desenvolve, a partir de 2003, um processo de audiências em todos os estados do país, com a participação de jovens, para o estabelecimento de um relatório indicando os elementos para a construção de um Plano Nacional de Políticas de Juventude, de um Estatuto da Juventude e o encaminhamento de uma proposição de criação de um órgão de gestão no governo federal, processo que teve como um dos pontos culminantes uma conferência nacional de juventude em 2004. (ABRAMO, 2005, p.28). Emergem concomitantemente com a criação dessas ações a consolidação da noção de adolescência pelo UNICEF e de juventude pelo Projeto Juventude.

[...] muito mais que uma etapa de transição, contemplando uma população que apresenta especificidades, das quais decorrem uma riqueza e potencial únicos[...] não pode ser compreendida como uma condição homogênea, uma vez que é atravessada por grandes diversidades e desigualdades, em seus aspectos naturais, culturais e sociais (ABRAMO, 2005, p.29).

Ainda de acordo com Abramo (2005), juventude passa a ser concebida como:

[...] fase marcada centralmente por processos de desenvolvimento, inserção social e definição de identidades, o que exige experimentação intensa em diversas esferas da vida. Os jovens são sujeitos com necessidades, potencialidades e demandas singulares em relação a outros segmentos etários. Requerem estruturas de suporte adequadas para desenvolver sua formação integral e também para processar suas buscas, para construir seus projetos e ampliar sua inserção na vida social. (ABRAMO, 2005, p.31). Em 2013 foi finalmente aprovado o Estatuto da Juventude, configurando-se em leis e determinações direcionada ao público entre 15 e 29 anos, reconhecido como jovem. Tomaremos essa definição para as analogias que iremos nos reportar no capítulo terceiro, quando iremos refletir sobre esse jovem em um contexto educacional marcado por problemas facilmente reconhecidos por nossa sociedade.

O Estatuto da Juventude (Lei 12.852/13) é um imenso legado para o Brasil. Ao dispor sobre os direitos dos jovens, sobre as diretrizes das políticas públicas de juventude e sobre o estabelecimento do Sistema Nacional de Juventude, o Estatuto torna a realização de políticas especialmente dirigidas às pessoas entre 15 e 29 anos uma obrigação do Estado, independente da vontade de governos.Com o Estatuto, o Estado brasileiro reconhece o papel estratégico da juventude no desenvolvimento do país e aponta os direitos que devem ser garantidos de acordo com a especificidade dessa população. São eles: direito à cidadania, à participação social e política e à representação juvenil; direito à educação; direito à profissionalização, ao trabalho e à renda; direito à diversidade e à igualdade; direito à saúde; direito à cultura; direito à comunicação eà liberdade de expressão; direito ao desporto e ao lazer; direito ao território e à mobilidade; direito à sustentabilidade e ao meio

ambiente; direito à segurança pública e o acesso à justiça. (MACEDO, 2013, p.7-8).

A problemática que envolve a educação da juventude e sua relação com a escola é discutida por Dayrell (2007). Para o autor, o cotidiano escolar tem se tornado morgado, e o que estimula ainda a presença dos jovens na escola é a aquisição do diploma. Dayrell faz sua análise considerando os jovens das escolas públicas. Observando-os sob uma ótica de condição juvenil, define juventude como:

Refere-se ao modo como uma sociedade constitui e atribui significado a esse momento do ciclo da vida, no contexto de uma dimensão histórico- geracional, mas também à sua situação, ou seja, o modo como tal condição é vivida a partir dos diversos recortes referidos às diferenças sociais (DAYRELL, 2007, p.1108).

O autor condiciona as características dos jovens mediante suas realidades sociais e trajetórias de vidas, estão aliadas às culturas não homogêneas, processadas por esses juvenis no interior de um ambiente onde houve agrupamento. De fato, a escola é um lugar dinâmico, propício para a socialização e agrupamento, onde algumas vezes esses grupos se caracterizam por estilos peculiares e outras vezes não. Dayrell (2007) chama essa dinâmica de movimento capaz de gerar situações de conflitos e violências, consideradas por muitos jovens como ritos de passagem para a vida adulta. Dayrell (ibidem) menciona que a sociedade está cada dia mais sofrendo a invasão da escola, mas que, em contrapartida, a escola vem perdendo o monopólio da cultura, em decorrência da forte concorrência com as culturas das massas.

Ao mesmo tempo, a escola, por si só, não consegue responder aos desafios da inserção social dos jovens, tendo poder limitado na superação das desigualdades sociais e nos processos de emancipação social. Parece que a instituição escolar torna-se parte dos problemas que ela se propôs a resolver (DAYRELL, 2007, p.1118).

Barrère e Sembel (2006) defendem uma cultura escolar positiva. Nesse sentido, fazem uso de termos como autonomia e transcendência da consciência individual. Na relação entre o jovem e a escola, perpassam, conforme Dayrell (2007), especificidades distintas. Assim, enquanto o jovem vem possuído de vivências socialmente construídas, a escola se revela como ambiente que articula diferentes dimensões e é ordenada por regras e normas que atuarão frente ao sujeito jovem, a fim de delimitar sua ação, de modo a atribuir sentidos a ela.

A escola, entanto não é uma instituição estática [...], nos últimos anos vem proliferando no Brasil a implantação de novas propostas políticos pedagógicas nos sistemas oficial de ensino [...]. Muitas destas propostas, na

busca de estabelecer um diálogo com os jovens, tendem a desenvolver ações em torno das mais diferentes expressões culturais, na perspectiva de valorizar a cultura juvenil dentro da escola. (DAYRELL, 2007, p.1123). É fatídico que por si só a escola não poderá resolver os problemas sociais, tampouco suprir as carências das juventudes da nossa sociedade. No mínimo, ela deveria se prestar a atender ou cumprir as metas e políticas que envolvem o seu regimento e, frente à observação dos resultados de sua ação, aprimorar sua função.

O tema das juventudes contempla e envolve uma multiplicidade de questões que a nós não seria cabível aqui responder. Tentamos apenas levantar uma breve compreensão da consolidação do termo e de algumas implicações da escola na vida desses jovens. Conhecer as juventudes é um grande desafio da nossa sociedade, bem como compreendê-las e assistir suas necessidade, conviver com as diferenças, potencializar as aptidões e redescobrir maneiras de melhor conduzi-las ou permitir que se auto conduzam, se desenvolvam e progridam, mesmo frente às dificuldades lançadas sobre este século.

É preciso, portanto, considerar que esta geração de jovens vive uma situação historicamente singular, comportando questões novas, que exigem reequacionamentos tanto nas definições conceituais como na formulação das ações e políticas a eles dirigidas. As mudanças do período histórico recente produzem, além da extensão temporal do período juvenil, que o transforma numa etapa do ciclo de vida longa a ponto de comportar fases internas distintas, mudanças de conteúdo da condição juvenil. (ABRAMO, 2005, p.34).

Esta pesquisa busca analisar argumentos de jovens do Ensino Médio. Portanto, fez-se necessário articular nosso estudo com essa última etapa da educação básica, que é do que trataremos a seguir.