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Numa reflexão sobre a escola e a sua função, indaga-se sobre o papel da escola na sociedade. Para tal socorre-se de autores como Jacques Rancière e o auxílio do professor Jacotot na obra O Mestre Ignorante. Trazendo também autores que refletem o tema da escola e da sociedade escolar como Bourdieu.

Jacques Rancière indaga sobre a educação com a ajuda da personagem Jacotot, ambos afirmam que «a lógica da escola republicana da promoção da igualdade pela distribuição universal do saber faz-se sempre prisioneira do paradigma pedagógico que reconstitui indefinidamente a desigualdade que pretende suprimir» (Rancière, 2002, p. 12). Esta escola da promoção da igualdade leva a outro autor, e às suas terias da reprodutibilidade social, Bourdieu, onde a escola tinha por primeiro objetivo ser gratuita, universal e igualitária. Uma escola de igualdade de oportunidades, mas que falha, pois o que se mostra são as desigualdades. Evidenciando mecanismos de seleção social, os jovens provenientes de uma cultura mais elevada, de uma cultura de vanguarda, são mais valorizados na escola. Veja-se o que afirma Bourdieu acerca das desigualdades:

o liceu não faz parte do universo concreto das famílias populares, é necessária uma série continua de sucessos excecionais e concelhos do professor ou de algum membro da família para que se cogite de enviar para lá a criança. Ao contrário, é todo

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um capital de informações sobre os cursos, sobre a significação das grandes escolhas da quinta série, da sétima ou das classes terminais do ensino secundário, sobre o funcionamento do sistema universitário, sobre as carreiras futuras e sobre as orientações que normalmente conduzem a elas, sobre a significação dos resultados, as sanções e as recompensas, que as crianças das classes cultas investem em suas condutas escolares. (Bourdieu, 1988, p. 39-64).

A escola como um pilar para a construção de uma nova sociedade moderna, justa e democrática. «A escola pública e gratuita permitia o acesso à educação a todos os indivíduos, garantindo o princípio de igualdade e os que obtivessem mais sucesso seriam justamente recompensados com a continuação das suas carreiras escolares e alcançariam uma vida profissional com maior reconhecimento social» (Estêvão, 2013, p. 19).A escola era encarada como um espaço de igualdade de oportunidades, de meritocracia e justiça social, passa a ser encarada como um espaço de reprodução e legitimação das desigualdades sociais. A escola é hoje povoada de toda uma estrutura de mérito a que o estudante é exposto no seu percurso escolar, este fenómeno de meritocracia, que implica uma culpabilização individual e uma competitividade com os outros, não existe apenas na escola, é parte integrante da estruturação social e económica de um modelo político neoliberal.

Na perspetiva de Bourdieu a escola desempenha um papel ativo na reprodução das desigualdades sociais ao legitimar essas desigualdades ao convertê-las em diferenças académicas e cognitivas. Cada individuo é portador de uma bagagem da qual fazem parte o capital económico, o capital social e o capital cultural, que pode ser posto ao serviço do sucesso escolar(Estêvão, 2013, p. 20).

Se a escola é uma fábrica de reprodução social, de legitimação e acentuação de desigualdades, resta a questão: Para que serve a escola? Será que a escola serve para produzir cidadãos para operar lá fora, no mundo do trabalho? Parece que estamos perante uma escola do absurdo. Onde o pecado da escola é achar que devemos ser alguma coisa, num conhecimento já estruturado e pré-definido. David Rodrigues afirma que, ao longo do tempo fomos alargando o fosso entre a maneira como se aprende na sociedade e a maneira como se aprende na escola, ou seja, desvinculámos a escola da sociedade, quando a mesma deveria contribuir para a construção de uma sociedade, parece que a escola afastou-se da sociedade abrindo cada vez mais aquele fosso. David Rodrigues afirma ainda que

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hoje aprende-se de uma maneira na sociedade e de outra na escola.1 O que mostra, por um lado, que a escola ainda está muito relacionada com o transmitir conhecimentos e não formar para a reflexão, que estamos a educar de uma forma que já não se adequa à sociedade, ou seja a escola continua a organizar aquilo que entende por saberes sem abrir caminho para a reflexão sobre esses saberes. A escola, ainda, mostra um foco nos «conteúdo curricular ajustado à organização dos níveis escolares, dos horários das turmas escolares e aos modelos de desenvolvimento das crianças para o ensino secundário e primário» (Popkewitz, 2011, p. 92). Mostrando as disciplinas organizadas em caixas e fechadas em si mesmas onde «o olho pedagógico está tão naturalizado que as inscrições psicológicas são presumidamente detentoras de um lugar nas disciplinas escolares» (Popkewitz, 2011, p. 103). Confirmando que a educação continua concentrada nos conteúdos e não nos alunos. Assim é evidente o reinado da psicologia sobre a estruturação das disciplinas e do currículo pedagógico, quer seja nas artes, ou noutro qualquer saber ensinável na escola, todos os currículos destas áreas estão organizados da mesma forma, do simples para o complexo, numa lógica de evolução por ano. A própria organização funcional da escola também obedece à disciplina da psicologia, organizando as turmas, por idades, por disciplinas, por anos de escolaridade e por estratos sociais. Perante este cenário há que construir posições em relação à educação, desafiando a instituição e não sendo governado de um determinado modo, contudo temos de conhecer o que governa e como governa, para serem formulados pontos de vista.

1 Conforme apontamentos retirados do programa Prós e Contras exibido pela RTP a 25 de Maio

de 2020 sobre o tema A Revolução Digital na Educação, disponível no link

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O que fez a psicologia e a pedagogia à educação e ao ensino das