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Participação como Adesão Antecipada 66

1. Patrimônio cultural 2 Participação social I Universidade Federal do Paraná II Pontes,

4.1 FORMAS DE PARTICIPAÇÃO NOS PROCESSOS DE TOMBAMENTO 57

4.1.3 Participação como Adesão Antecipada 66

Participação como Adesão Antecipada ocorre quando os responsáveis pelo processo de instrução de tombamento interpretam que preexiste grande aprovação da população em relação ao processo. São casos marcados pela atuação anterior de atores como universidades ou organizações da sociedade civil que se movimentam em prol do patrimônio cultural. Esse grau de envolvimento pode ter diferentes níveis, evidenciados nos processos de Jaguarão e Santa Tereza no Rio Grande do Sul. Nas reuniões esses casos são vistos pelos Conselheiros como processos amenos, pois existe um comprometimento prévio da população. Dessa forma, esses tombamentos seriam uma maneira de reconhecimento da mobilização realizada anteriormente pela comunidade relacionada ao local.

O tombamento do Núcleo Urbano de Santa Tereza foi a terceira proposição de tombamento de núcleos diretamente ligados ao processo de imigração ocorrido no Brasil no século XIX. O distrito de Santa Tereza de Bento Gonçalves foi criado em 1916, e o município só foi emancipado em 1992. Segundo o Diretor do DEPAM, Dalmo Vieira Filho, foi um processo cuja proposição derivou da vontade da cidade, havendo intenso engajamento local no processo, cujos estudos iniciaram-se mais de vinte anos antes (IPHAN, 2010b).

Segundo apresentação do Conselheiro Relator Luiz Phelipe Andrés, a Prefeitura Municipal localiza-se numa das edificações históricas restauradas da cidade, e o poder público está afinado com os propósitos de preservação e participa ³GHXPYHUGDGHLURFODPRUGDSRSXODomRSHORWRPEDPHQWR´2GRVVLrGHWRPEDPHQWR foi realizado por técnicos da superintendência do IPHAN e do DEPAM, e amparado em diversos estudos realizados em anos anteriores. Esses estudos complementares contaram com a contribuição de pessoas ligadas à Universidade Federal de Caxias do Sul e do Escritório Técnico do IPHAN em Antônio Prado. O primeiro volume contém o processo propriamente dito, iniciado em 2001 por pedido da Prefeitura Municipal de Santa Tereza. Em 2005 foram IHLWRVRV³(VWXGRVSDUDR7RPEDPHQWR do Conjunto Histórico, Arquitetônico e Paisagístico de Santa Tereza, Rio Grande do 6XO´Houve o desenvolvimento de outros relatórios e diagnósticos em conjunto com a EMATER-RS e ASCAR ± Associação Sulina de Crédito e Assistência Rural,

indicando a participação de outras entidades na construção do processo de tombamento. No ano 2000 foram aprovadas no Município uma série de leis referentes ao uso e ocupação do solo, incidindo sobre o patrimônio cultural edificado. Também estão anexados ao dossiê fichas técnicas de inventários realizadas pelo IPHAN em 1988, indicando interesse prévio da instituição pelo município. Segundo o Relator essa profusão de estudos justifica a expectativa da população em relação ao reconhecimento de seu patrimônio (IPHAN, 2010b).

FIGURA 06 ± NÚCLEO URBANO DE SANTA TEREZA

FONTE: PREFEITURA MUNICIPAL DE SANTA TEREZA (2020)

É citada a existência da APHAT-ST (Associação de Proteção ao Patrimônio Histórico e Turístico de Santa Tereza), criada em 2004. Essa Associação realizou campanhas para arrecadação de material para restauração de imóveis, e promoveu cursos relacionados à temática. Em 2008 foi aberto formalmente o processo de tombamento do Núcleo Urbano de Santa Tereza. Para tanto foi feita uma reordenação da documentação, adaptando-a às normas vigentes e elaborado o ³3DUHFHU 7pFQLFR VREUH 3URSRVWD GH 7RPEDPHQWR GD 3DLVDJHP 8UEDQD GH 6DQWD 7HUH]D´ 1HVVH SDUHFHU foi realizada uma proposta de adequação da poligonal de tombamento, e redesenho da poligonal de entorno. Portanto, no entendimento do Relator, a proposta das poligonais é resultante de estudos desenvolvidos ao longo de vários anos. O processo conta também com um livro de atas da Associação de Moradores de Santa Tereza que contém centenas de assinaturas em apoio ao tombamento. O Conselheiro Relator menciona que em sua viagem à cidade para elaboração do parecer observou o alto nível de consciência da população em relação ao acervo de seu patrimônio cultural. Cita um forte protagonismo das

instituições municipais, entidades não-governamentais e sociedade civil na reivindicação da conclusão do processo de tombamento. Na discussão entre os Conselheiros após a apresentação do parecer, a Conselheira Jurema Machado comentou a percepção de que nesse caso o tombamento parece inserido numa estratégia de desenvolvimento que a comunidade vislumbra, desejando visibilidade e presença turística. Uma opinião semelhante foi expressa pela Conselheira Cecília Londres, afirmando que existe grande conforto em relação a esse tombamento, pois ³DFLGDGHVHWRPERXVR]LQKDDQWHVGHVHUWRPEDGDSHOR IPHAN´ (IPHAN, 2010b).

Também localizado no Rio Grande do Sul, o município de Jaguarão está na fronteira com o Uruguai, na Região dos Pampas. O surgimento da cidade está ligado ao processo de ocupação espanhola e portuguesa no sul do continente e às estratégias militares utilizadas para garantia de posse desses territórios. Em 1832 a povoação do Espírito Santo do Cerrito de Jaguarão foi elevada à categoria de vila, e em 1855 a cidade, com o nome de Jaguarão. Nessa época a economia da região recebia impulso a partir da exploração do gado provindo das Missões, contribuindo para a consolidação do local. Desde a década de 1980 surgiram iniciativas de proteção do patrimônio cultural na cidade. Entre elas o pedido de tombamento estadual da Enfermaria Militar, uma das edificações mais destacadas no conjunto. É do mesmo período um movimento denominado Projeto Jaguar, onde foram promovidas vigílias em torno da Enfermaria Militar com o objetivo de chamar a atenção da comunidade para a valorização da edificação em ruínas e reverter o abandono. Além disso, no Projeto Jaguar foram mapeadas e identificadas edificações de interesse cultural na cidade (IPHAN, 2011).

FIGURA 07 ± ADESIVO E REGISTRO FOTOGRÁFICO DA III VIGÍLIA MUSICAL NA ENFERMARIA

Após essas primeiras iniciativas, surgiu o PRIJ (Programa de Revitalização Integrada de Jaguarão), elaborado a partir de 1991 através de um convênio entre a Prefeitura Municipal e a Universidade Federal de Pelotas. Desde então esses estudos sobre o acervo arquitetônico urbano da cidade passaram a guiar as iniciativas de preservação local. Além dos professores e acadêmicos da Universidade Federal de Pelotas, o desenvolvimento do Programa contou com a participação de representantes da comunidade jaguarense. Outros acordos entre a UFPel e Centro de Integração Empresa-Escola de Jaguarão resultaram em atividades como palestras, exposições e debates sobre a questão do patrimônio cultural, mobilizando a participação da comunidade. Além de apresentar um inventário sobre as edificações existentes, o PRIJ propôs instrumentos urbanísticos e critérios de intervenção nos bens de interesse cultural. Em 2007 foi sancionada a Lei Municipal n° 4.682/2007, chamada Lei de Preservação do Patrimônio Histórico, Arquitetônico e Turístico de Jaguarão, cujo texto está em conformidade com o PRIJ. Segundo o Conselheiro Relator fica evidente através destes relatos e de notícias anexadas aos autos do processo que existe considerável nível de consciência da população em relação ao patrimônio cultural. É igualmente evidente o protagonismo das instituições municipais, da sociedade civil e entidades não governamentais. Dessa forma, o trabalho do IPHAN com o tombamento foi complementar as iniciativas que já ocorriam em nível local há décadas (IPHAN, 2011).

A Participação como Adesão Antecipada evidencia que as questões relativas ao patrimônio cultural não dependem exclusivamente da instituição federal. Quando existem iniciativas concretas que partem do nível local, o IPHAN insere-se como mais um entre os demais atores, avalizando um entendimento e expectativas que partem da comunidade.