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O passo a passo do périplo: entre a metodologia original e a metodologia produzida

3. Procedimentos Metodológicos

3.5. O passo a passo do périplo: entre a metodologia original e a metodologia produzida

“O convite para ser outro. O dar a ver, o dar a pensar e o dar a sentir o que somos e o que não somos; ou como inventamos o outro; ou como nos inventamos a nós mesmos”. (Carlos Skliar, 2004, p.7)

O uso da metodologia proposta por Clot (2006) em toda sua complexidade para este trabalho implicaria em assumir um referencial teórico sobre o trabalho e sua ergonomia, o que não foi o objetivo do estudo aqui apresentado. O propósito de analisar o trabalho do intérprete educacional em sua atuação então se pautou nas estratégias propostas por Clot, utilizando-se da filmagem em situação de trabalho e de uma sessão em que o intérprete assistiu à sua própria atuação em companhia do pesquisador e fez comentários e reflexões, mas as categorias de análise e os aspectos discutidos por Clot não foram considerados nesta oportunidade.

Assim, foram feitas adaptações também nas estratégias da autoconfrontação, e para este estudo somente alguns aspectos da metodologia original foram contemplados. O motivo das adaptações se deu por conta de circunstâncias que serão devidamente explicitadas a seguir, mas a idéia original: filmar o intérprete educacional, em atividade, para posteriormente ser visto por ele,

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junto com o pesquisador, como uma autoconfrontação simples, foi mantido e teve por objetivo, proporcionar situações de diálogo e interação, por meio da visualização do profissional em atividade e conversas durante as quais pudessem ser levantadas e discutidas, as opiniões e apreciações dos intérpretes envolvidos na pesquisa sobre o trabalho desempenhado por eles junto a alunos surdos do ensino médio.

Os motivos pelos quais se fez necessária a adaptação da metodologia foram:

 O fator tempo: precisou-se limitar um prazo para a realização das filmagens, por conta do calendário escolar e a necessidade de obter dados para essa pesquisa.

 O aguardar da autorização da presidência da instituição escolhida36, para essa intervenção. Quando saiu o aval para a realização da mesma, ficou se sabendo que o recesso escolar estava próximo e isso implicaria num intervalo que poderia levar ao arrefecimento do grupo, assim como em relação às duas escolas contatadas pertencentes à instituição, por isso a aceleração na materialização do trabalho indo-se o máximo de vezes possível aos espaços eleitos, a fim de configurar uma regularidade e também, objetivando contemplar um quantitativo razoável e significativo de disciplinas, das diferentes áreas que se pudesse observar.

 O aguardar à aceitação dos convites realizados aos intérpretes de LIBRAS (que foram em número de quatro, para esse empreendimento), alguns, colegas de profissão, que já atuam como intérpretes educacionais a um bom tempo, para serem sujeitos da pesquisa. Os que participaram da pesquisa aceitaram imediatamente, achando inclusive muito bom fazerem parte de um processo em que pudessem contribuir e serem voz, mas houve intérpretes convidados, que no entender geral, ficaram um pouco reticentes em se expor nessa formatação de pesquisa.

 A escolha das escolas que pudessem servir de cenário para a proposta de trabalho, conciliando os cursos a serem observados (Informática e Patologia Clínica) com os intérpretes que se disponibilizaram e, que trabalham nessas escolas,

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As unidades escolares onde se realizou essa pesquisa fazem parte das escolas técnicas estaduais ligadas à FAETEC – Fundação de Apoio à Escola Técnica, criada em 10 de junho de 1997, que vem a ser uma instituição vinculada à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia (SECT), que além de reunir as escolas técnicas, oferece também educação profissional gratuita por meio de centros de educação tecnológica e profissionalizante. Informações site http://www.faetec.rj.gov.br.

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confiando que trariam elementos instigantes à pesquisa, em função dos termos e vocabulários que circulam nessas disciplinas.

Em paralelo a essa ações, busquei conversar com os membros da direção, docentes e os alunos (ouvintes e surdos), que estariam envolvidos direta/indiretamente nessa trama. Sujeitos de ordem e natureza exterior, que a meu ver devem/riam ser levados em consideração.

O pesquisador, e somente ele, poderia identificar a dinâmica mais profícua, que resguardasse a integridade da maneira de ser dos sujeitos pesquisados. [...] Se ele souber se situar dentro do contexto estudado, se não recortar a fala dos entrevistados por critérios arbitrários e exteriores e, sobretudo, se não quiser corrigir os depoimentos, saberá distinguir em que momento os sujeitos estudados podem se expressar livremente (OLIVEIRA, 2001, p. 21).

Primeiramente os intérpretes foram filmados atuando durante as atividades- aula37 (no período de 19 de junho a 14 de julho de 2009), depois se fez uma edição dessas filmagens. Estes vídeos editados foram assistidos pelos intérpretes juntamente com o pesquisador e enquanto os intérpretes se observavam, na filmagem editada, iam se narrando e apontando situações ocorridas durante as aulas, referindo-se àquilo que achavam relevantes, dialogando com o pesquisador.

Esse segundo momento foi realizado em um estúdio, sendo filmado e a ação teve a participação do pesquisador intervindo nos momentos em que julgava necessário, com perguntas sobre o que estava sendo observado naquele momento como também, evocando as situações ocorridas enquanto o intérprete fora filmado em ação, em sala de aula, como uma proposta de orientaçãobem natural (sabendo- se de antemão que esse é um processo muito particular e não tão fácil, pois além de filmados, as suas falas seriam submetidas a futuras análises do pesquisador), no apontar os momentos que eles achassem interessante intervirem, dentro do que cada um compreendesse como sendo importante comentar.

À época da edição das fitas, durante a seleção das imagens para apreciação e levantamento das discussões relativas às ações desempenhadas pelo intérprete,

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Para formalizar a participação na pesquisa, os intérpretes envolvidos assinaram os termos de consentimento para filmagem (ANEXO 2), assim como foi providenciado um pedido formal à instituição, para autorização na realização das filmagens, nas unidades escolares escolhidas.

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em seu trabalho (primeira fase da pesquisa), fez-se necessário lançar mão de insights do próprio pesquisador, enquanto profissional da interpretação. Instante tenso, pois entre o discurso do sujeito a ser analisado e conhecido e o discurso do próprio pesquisador que pretende analisar e conhecer, uma vasta gama de significados conflituais e mesmo paradoxais vai emergir (AMORIM, 2007, p.12).

Como as aulas foram inteiramente filmadas, as gravações iniciais ficaram longas e permeadas por situações que se repetiam, ou por outras alheias ao fazer do intérprete, como por exemplo, o aluno ler ou anotar coisas. Considerando que seria impraticável assistir e manter a atenção dos intérpretes às gravações tão alongadas, foram elaborados critérios para selecionar as imagens, com base nas experiências da pesquisadora como intérprete de LIBRAS, em que o foco da pesquisa se situaria no discutir sobre o fazer do intérprete (no “se ver”), e não em promover a distração, incidindo na localização das cenas que poderiam contribuir para suscitar discussões acerca do propósito do “se ver e se narrar” no trabalho como intérprete educacional de LIBRAS no ensino médio.

Os recortes buscaram as situações em que as expressões em LIBRAS utilizadas entre o intérprete educacional e o aluno surdo, pudessem despertar algum comentário relevante por parte do profissional, assim como, na forma como ele lida com a língua portuguesa (conceitos, informações, conteúdo) ao traduzir/interpretar para LIBRAS (recursos envolvendo configuração de mão, o alfabeto, os sinais, classificadores, etc.); as posturas e posições recorridas pelos intérpretes enquanto trabalham, levando em consideração o espaço físico, as situações-problema, com as demais pessoas do entorno também, como nos momentos de avaliação (trabalho em grupo ou individual). Estes critérios tanto foram utilizados para os recortes das filmagens realizadas nas aulas comuns, como nas aulas práticas, realizadas em laboratórios.

Ao analisar o material filmado, e decidir pelas imagens a serem editadas, foram realizadas anotações das cenas e falas envolvendo o intérprete, e todas as ocorrências em sala de aula, durante o exercício de suas funções. As reações, movimentos, atitudes, forma e situações que aconteceram, serviram para a elaboração de uma espécie de roteiro, apoio na condução dos diálogos no segundo

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momento, no encaminhamento da autoconfrontação do sujeito da pesquisa com ele mesmo.

O material editado foi apresentado para cada um dos intérpretes, que se viram atuando. A partir dos diálogos e das reflexões emergentes foi possível configura as análise em quatro eixos temáticos de análise, que serão apresentados no capítulo 4.