• Nenhum resultado encontrado

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.1 Patrimônio e Paisagem Cultural

Na sua luta diária pela existência, os seres humanos produzem não só sua história, mas também a cultura, a estrutura sócio-política, o espaço em que habitam. A necessidade de se aprimorar resulta nos avanços tecnológicos, provocam sérias alterações na natureza marcando os espaços.

As relações sociais se fundem à materialização dos espaços, e a arquitetura resultante dessas relações registra o momento do processo de desenvolvimento, dando origem às paisagens. A produção do espaço está diretamente relacionada a cada época, porém guardam estreita relação e coexistem no espaço presente. As cidades, o espaço urbano, o rural e as paisagens são o resultado da criação ininterrupta e articulada entre o novo e o velho num constante renovar.

A preocupação do homem em preservar os vestígios do passado é recente, uma invenção relativamente moderna, mas foi o ponto inicial da preservação dos monumentos, que se direcionou posteriormente para uma visão mais ampla, como paisagem cultural (SABATÉ, 2007, p.53).

44

3.1.1 Patrimônio

Patrimônio é o que herdamos do passado e transmitimos às gerações futuras. Porém esse conceito é muito generalizado, uma vez que algumas manifestações humanas se esgotam em sua funcionalidade, material e imaterial, e significado. Outras se mantêm, além de seu tempo, alimentando e sendo alimentadas pela criatividade de novas gerações, num processo de colaboração mútua.

Não é considerado patrimônio somente o legado que herdamos, mas o legado selecionado por um grupo consciente e significativo da população. Trata-se de um conceito relativo, onde a mudança do grupo atuante, dos personagens, mudaria diretamente o olhar da seleção do objeto a preservar, matizado pelos intelectos agentes e por sua época.

As primeiras medidas de proteção de determinados edifícios em função de sua antiguidade segue preferências estilísticas. Esta visão se consolida, assim como o acesso público às riquezas patrimoniais, que criam museus de exposição, que muitas vezes desvinculam a peça preservada da relação com o território (SABATÉ, 2007, p.54).

O resultado da identificação da identidade cultural de um grupo é o diferencial deste em relação aos demais e seu patrimônio cultural. O passado e o presente nos trazem uma identidade coletiva, que nos identifica como grupo e nos diferencia.

O patrimônio nos traz consciência da continuidade humana através dos tempos. “Começa assim a tomar consciência de seu valor como herança de uma sociedade e de novas instituições, instrumentos e conceitos, como as paisagens culturais” (SABATÉ, 2004, p.2).

45

3.1.2 Paisagem Cultural

Paisagem cultural é um âmbito geográfico associado a um evento, a uma atividade ou a um personagem históricos, que contém valores estéticos e culturais. É o vestígio do trabalho sobre o território, algo assim como um memorial do trabalhador desconhecido. É o registro do homem sobre o território, como um texto que se pode escrever e interpretar, entendendo o território como uma construção humana (SABATÉ, 2004, p.5).

Paisagem cultural representa os trabalhos combinados da natureza e do homem. Eles são ilustração da evolução da sociedade humana no tempo, sob a influência das limitações e/ou oportunidades físicas presenteadas por seu ambiente natural, de sucessivas forças sociais, econômicas e culturais tanto externas quanto internas. Eles devem ser escolhidos com base em seu sobressalente valor universal e de sua representatividade em relação a uma região geo- cultural, essencial e distinto de outras regiões.

Paisagem cultural é um espaço comunicativo, que acumula e transmite informações, levando ao desenvolvimento territorial. Permitindo inserir o aprendiz na perspectiva histórica e de identidade do grupo social a que pertence, transmitindo-lhe conteúdos éticos e de cidadania.

A natureza e a cultura, memória, paisagens culturais, frequentemente adquirem uma significação crescente no uso e ordenação do território pós-industrial, usados como valorização fazem parte de um conceito novo de patrimônio. Um potencial de renovação de métodos e instrumentos de intervenções traz às paisagens culturais crescente importância no desenvolvimento econômico regional.

O patrimônio interpreta o lugar da memória, o território reforça sua identidade, no que surge o conceito de paisagem cultural (SABATÉ, 2007, p.54).

46

3.1.3 Surgimento dos conceitos

Ao final do século 19 surgem os primeiros ensaios do conceito que associa paisagem e vestígios do homem. Friedrick Ratzel, Otto Schlütter, Vidal de la Blaché, Emile Durkheim são alguns nomes que trazem à tona uma inter-relação harmoniosa e uniforme de elementos físicos, uma incidência mútua entre natureza e humanidade, relação entre formas culturais de vida e território (SABATÉ, 2007, p.54-55).

No princípio do século 20 Carl Sauer faz uma revisão da idéia de landschaft, uma transformação da paisagem natural em cultural, habitat em hábito. Ele estuda a paisagem vernacular e seu deslocamento junto á migração cultural, e cria um conceito de paisagem cultural, que seria o “resultado de um grupo social sobre uma paisagem natural”, o registro do homem sobre o território, que é uma construção humana (Sauer, apud SABATÉ, 2007, p.55).

Em 1972 surgem alguns movimentos e medidas resultantes destes estudos, a UNESCO celebra a convenção para a proteção do patrimônio natural e cultural, e o National Park Service impulsiona o Parque Cultural do Carvão.

Em 1992 se oficializam conceitos de Paisagem Cultural, tanto pela Unesco quanto pelo National Park Service. A Unesco distingue três categorias de paisagem cultural: Clearly Definined Landscape, Organically Evolved Landscape e Associative Cultural Landscape. Já para o National Park Service, a paisagem cultural pode abranger quatro tipos: Historic Site, Historic Designed Landscape, Historic Vernacular Landscape, Ethnographic Landscape (SABATÉ, 2007, p.56).

Para reforçar a necessidade de estratégia de desenvolvimento territorial surge um novo conceito, dentro de paisagem cultural, o Parque Patrimonial, que tem foco na reativação, preservação do patrimônio, promoção da educação e atividade recreativa, e desenvolvimento econômico.

47

A consolidação de Parques Patrimoniais se faz através de um inventário dos recursos, hierarquização e interpretação em função de uma determinada história, construção de uma estrutura suporte, que tem uma linha condutora: industriais, mineiros, paisagem bélica, parques arqueológicos ou ecomuseus, caminhos históricos (SABATÉ, 2007, p.57).

Também se desenvolve uma nova investigação sobre o desenho de espaços públicos vinculados a acontecimentos culturais, os Event Places (SABATÉ, 2007, p.73). São eventos bem sucedidos, arraigados na cultura local e com características próprias, com estreita ligação entre a comunidade e o lugar.

3.1.4 Paisagem antropocêntrica

Os principais recursos das paisagens culturais são os residentes, eles são a memória viva do passado, possuem a lembrança dos processos, do imaterial, são agentes destes processos, são o recurso cultural básico.

O surgir da base vem da consciência da importância do homem no processo, pois a cultura é a relação dos homens entre si, e deles com o território. Valorizar as fontes primárias remanescentes, como os jornais, é ter consciência do valor do homem no processo de transformação do território.

Mesmo já se definindo a paisagem cultural, o parque patrimonial, o homem continua sendo o agente a impulsionar a gestão destes lugares. A constituição de um grupo de pessoas multidisciplinar valida a proposta e a mantém ativa.

A gestão inteligente dos recursos patrimoniais é fundamental para o desenvolvimento econômico, porque atrai turistas e investimentos, gera atividades e postos de trabalho e reforça a auto-estima da comunidade (SABATÉ, 2007, p.63-64).

48

Os moradores devem ser incentivados a colaborar, e a troca é feita oferecendo lazer, preservação, trabalho e educação, pois só o olhar educado é capaz de perceber a importância dos recursos patrimoniais para o local.

Estes espaços contam uma história, e o homem é o centro deste enredo, que deve ser coerente e ter um fio condutor, pautando uma viagem baseada em documentos rigorosos, imagens, áreas, centros de interpretação, conexão temporal e contextual (SABATÉ, 2007, p.65).