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2 A INDUSTRIALIZAÇÃO, A DESINDUSTRIALIZAÇÃO EM

2.4 A desindustrialização de Paracambi, seus reflexos e as

2.5.1 Patrimônio industrial

Patrimônio industrial deve ser compreendido como um tema amplo que abrange não só os edifícios, as estruturas arquitetônicas e a produção de máquinas, mas, também, todas as transformações ocorridas decorrentes do processo de industrialização. Desta forma, e segundo a Carta de Nyzhny Tagil (2003), deverão ser considerados, igualmente, os meios de transporte e de comunicação, por meio do qual chegavam e escoavam as matérias-primas e produtos, como portos e ferrovias, as moradias, as associações e sindicatos, e as mais variadas alterações na forma de vida da população no período industrial24 e que trouxeram modificações substanciais

na paisagem e no espaço social.

Um marco para o patrimônio industrial foi, em 1973, a realização do Primeiro

24 Estas são as considerações da Carta de Nyzhny Tagil sobre patrimônio industrial. O texto desta

Carta foi aprovado pelos delegados reunidos na Assembleia Geral do TICCIH (Comissão

Internacional para a Conservação do Patrimônio Industrial, que é a organização mundial consagrada ao patrimônio industrial), de caráter trienal, que se realizou em Nizhny Tagil (Rússia) em 17 de Julho de 2003, o qual foi posteriormente apresentado ao International Council of Monuments and Sites (ICOMOS), para ratificação e eventual aprovação definitiva pela UNESCO. Disponível em:

Congresso Internacional para Conservação de Monumentos Industriais, First International Congress on the Conservation of Industrial Monument (FICCIM)25, na região histórica de Ironbridge, no The Ironbridge Gorge Museum Trust26. Entre os resultados alcançados com o evento, pode-se relacionar a criação, em 1978, na Inglaterra, do Comitê Internacional para a Conservação do Patrimônio industrial, International Committee for the Conservation of the Industrial Heritage (TICCIH)27. Uma organização internacional para a arqueologia industrial e o patrimônio industrial, cujo objetivo é estudar, proteger, conservar e explicar os vestígios da industrialização. Este Comitê exerce, desde o ano 2000, a função de conselheiro especial para o tema junto ao Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS)28, sendo este um organismo que, com outras entidades, assessora a UNESCO na organização da Lista do Patrimônio Mundial.

No Brasil, segundo Meneguello,

[...] a “faísca” foi dada pelo historiador Paulo Fontes29, autor de uma tese sobre a indústria Nitro-Química, e que procurou organizar um grupo composto por acadêmicos e também por cidadãos, que se reuniram por cerca de um ano na Escola de Sociologia e Política em São Paulo. (MENEGUELLO, 2004, p. 127).

A partir da criação deste grupo para discussão da preservação dos vestígios materiais do processo de industrialização no Brasil, algumas ações começaram a surgir, entre elas, a formação, em 2004, do Comitê Brasileiro de Preservação do Patrimônio industrial30, o TICCIH Brasil, que tem por objetivo pesquisar, investigar, mapear, catalogar, inventariar, divulgar, proteger e conservar os bens materiais e imateriais do patrimônio industrial brasileiro, atuando em consonância com o Comitê internacional.

Essas iniciativas são criadas com vistas a promover o estudo, valorização e preservação da sobrevivência física do passado industrial e tecnológico. Auxiliando, desta maneira, a compreensão do patrimônio industrial como um patrimônio cuja conservação não se realiza para contemplação, como uma obra de arte, mas para

25 FIRST INTERNATIONAL CONGRESS ON THE CONSERVATION OF INDUSTRIAL

MONUMENTS (FICCIM). Disponível em: <http://ticcih.org/activities/congresses/#gb>. Acesso em: 13 out. 2015.

26 Disponível em: <http://www.ironbridge.org.uk/about-us/ironbridge-gorge-museum-trust/> Acesso

em: 13 out. 2015.

27 Disponível em: <http://ticcih.org/>. Acesso em: 13 out. 2015.

28 Disponível em: <http://www.icomos.org/fr/>. Acesso em: 13 out. 2015.

29 Paulo Fontes é historiador. Docente e pesquisador do CPDOC/FGV desde 2008.

que, por meio dele, se compreenda uma parte da história social e econômica que marcaram uma época.

As preocupações relacionadas aos destinos dos bens culturais e imateriais e aos problemas urbanos no mundo moderno não iniciam com o surgimento dessas instituições. Elas começam a surgir na primeira metade do século XX, quando setores da sociedade começam um movimento que resulta em ações no sentido de preservar e conservar os bens culturais materiais e imateriais das cidades e dos indivíduos.

Dentre estas iniciativas, está a elaboração, pelo Conselho Nacional de Arquitetura Moderna, ocorrido em Atenas no ano de 1933, da Carta de Atenas. Este documento evidencia importantes pontos quanto ao tema da urbanização. Entre eles, a determinação sobre a conciliação dos interesses públicos e particulares quanto aos monumentos históricos. Segundo a Carta de Atenas, “o interesse privado será subordinado ao interesse público”. Nesta perspectiva, não deveria haver transformações de prédios históricos em estabelecimentos comerciais. Contudo, o que ocorre é contrário a esta orientação, pois o que se percebe é que vários edifícios com valor histórico são transformados em shopping centers e outros empreendimentos de interesse comercial.

Em 1967, a Carta de Veneza, que foi elaborada no II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos de Monumentos Históricos (ICOMOS), realizado na cidade de Veneza, Itália, demonstra claras preocupações com as definições, finalidades e com os princípios de conservação e preservação dos monumentos históricos.

Em 1980, a Carta de Burra, na Itália, segue a linha do documento anterior, contudo, apresenta mais detalhamento quanto às definições, finalidades e princípios. Alguns itens são de importância substancial como:

a) Inciso 2 do Art. 1º - são consideradas as “questões sociais de gerações passadas, presentes e futuras” de um bem cultural;

b) Inciso 9 do Art. 1 - define-se as condições para adaptação destes bens;

c) Art. 7º - enfatiza as condições para estas adaptações, restringindo intervenções e “modificações irreversíveis”;

com detalhamento dos aspectos das intervenções, que só poderão ser realizadas como única forma de preservar o item;

e) Art. 23º - que este trabalho deve ser realizado por profissionais que perpetuem os aspectos essenciais do item, como exatidão;

f) Art. 28 – os documentos gerados a partir de qualquer intervenção no item devem ser arquivados em órgão público e com acesso público.

Em 2003, delegados da Comissão Internacional para a Conservação do Património Industrial (TICCIH) aprovaram a Carta de Nyzhny Tagil, na Rússia. Este documento foi elaborado com a finalidade de nortear os setores da sociedade no tratamento adequado dos elementos do patrimônio industrial. Aborda considerações sobre as definições e os valores; a importância da identificação, do inventário e da investigação; ações que devem ser adotadas para proteção legal dos sítios industriais; orientações quanto à manutenção e conservação; a necessidade de políticas de educação (do fundamental ao universitário) e formação profissional sobre o Patrimônio industrial.

Entre as diversas razões que justificam a necessidade de conservação e preservação de sítios industriais estão: o direito à memória, à construção de identidade, à história dos indivíduos e das cidades, à história do trabalho, a preservação de acervos etc.

As práticas de degradação e esquecimento dos locais de trabalho e dos trabalhadores, do recente período industrial brasileiro, constituem uma negação aos valores do patrimônio industrial. Segundo a Carta de Nyzhny Tagil,

O patrimônio industrial representa o testemunho de atividades que tiveram e que ainda têm profundas consequências históricas. As razões que justificam a proteção do patrimônio industrial decorrem essencialmente do valor universal daquela característica, e não da singularidade de quaisquer sítios excepcionais. (CARTA DE NYZHNY TAGIL, 2003, p. 4).

Logo, percebe-se que, desde o ano de 2003, algumas iniciativas visando à conservação e à preservação do patrimônio industrial, com o intuito de identificar, registrar, preservar e conservar os sítios, estão na pauta de discussão.

Para Pimenta (2012, p. 127), o patrimônio industrial trata de mudanças sociais que não se limitam somente aos espaços de trabalho. Para o autor, este patrimônio, além dos locais referentes aos sítios fabris, que são “as vilas operárias, os muros,

açudes, capelas, igrejas, clubes, galpões, ferrovias e todas as estruturas que marcaram a forma de vida daquele período na cidade” deve incluir a memória dos trabalhadores, as tradições, os hábitos, o maquinário, os objetos.

A conservação, restauração e preservação destes sítios são objeto de estudo do patrimônio industrial. Muitos têm sido os esforços para resgatar e preservar a memória desta recente forma de vida. São historiadores, arquitetos, sociólogos, antropólogos, engenheiros, restauradores empenhados em desenvolver a disciplina do patrimônio industrial no Brasil e no mundo. O trabalho multidisciplinar destes profissionais tem produzindo teses e dissertações, vídeos, artigos, livros, documentários, muitos utilizando a prática da história oral, a análise de documentos, e exposições fotográficas revelando várias formas de trabalho e ofícios que praticamente não existem mais.

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