• Nenhum resultado encontrado

Os Delitos Públicos da Carne mais severamente adjectivados e combatidos em todas as Constituições a partir de 1591, são os chamados Pecados "contra naturam": SODOMIA, MOLÍCIE E BESTIALIDADE.

1 - Da SODOMIA, dizem as Constituições do Porto118: "É tão péssimo e horrendo

o crime da sodomia, e tão encontrado com a ordem da natureza, e indigno de ser nomeado que se chama nefando, que é o mesmo que pecado em que se não pode falar quanto mais

116 Constituições Sinodais do Porto. Coimbra. 1690. pp. 536 e 537.

11 Constituições Sinodais do Arcebispado de Lisboa. Lisboa. 1656. p. 443.

cometer, provoca de tal modo a ira de Deus, que por causa dele vêm tempestades, terramotos, pestes e fomes e se abrasaram e subverteram cinco Cidades, duas delas somente por serem vizinhas das em que se cometia".

O mesmo texto, depois de referir duas Constituições do Papa Pio V sobre o modo como proceder contra os Clérigos culpados neste delito, recorda: "os Reis deste reino com todo o zelo impetraram da Sé Apostólica que para melhor ser castigado este nefando delito, se cometesse o castigo dele aos Inquisidores Apostólicos do Tribunal do Santo Oficio". Assim, recomendam as Constituições Sinodais de Elvas,119 "havendo alguma

pessoa tão infeliz carecida do lume da razão natural, tão esquecida de sua salvação (o que Deus não permita) que se cometa tão feio e torpe crime e for dele legitimamente convencido em nosso juízo pessoa leiga, homem ou mulher, será relaxado à justiça secular; e sendo Clérigo será perpetuamente deposto do Ofício e Benefício e degradado actualmente de suas Ordens e outrossim relaxado e entregue à justiça secular". Eram as penas de todas as Constituições.

Havia, portanto, perfeita sintonia entre as duas justiças sobre este delito. De qualquer maneira, à semelhança de outras Constituições , as de Lamego120, ao ordenar ao

Provisor, Vigário Geral e Visitadores que estejam atentos às "notícias" deste delito, aconselham que "com toda a circunspecção, diligência e segredo, se informem, perguntando algumas testemunhas exactamente". Por outro lado, as Constituições de Lisboa de 1656121, sem dúvida para incentivar as denúncias tentando defender os

denunciadores, ordenam "que as denunciações se tomem em segredo, sem nunca se descobrir a pessoa e nome do denunciador; e que, dando modo com que se prove o delito tanto quanto baste para o réu ser condenado, leve o interesse que da fazenda do réu se puder tirar, para ele ficar suficientemente satisfeito e premiado; e se o dito denunciador for cúmplice, se não procederá contra ele no nosso juízo, ainda que o delito se não prove contra os outros cúmplices, salvo se, quando vier denunciar, já estiver denunciado e suficientemente culpado, para se tratar do seu castigo".

Constituições Sinodais do Porto. Coimbra. 1690. pp. 519 e 520.

119 Constituições Sinodais de Elvas. Lisboa, 1635, p. 111 v. 120 Constituições Sinodais de Lamego, Lisboa, 1683, p. 421.

121 Constituições Sinodais do Arcebispado de Lisboa, Lisboa, 1656, p. 435.

Algumas Constituições, porém, como é o caso das de Elvas122 e as de Lisboa12",

dizem expressamente que só haverá entrega à justiça secular no caso de "acto nefando consumado": As de Lamego124 dizem que só assim se procederá no caso de "crime da

própria Sadomia, e não haverá lugar na imprópria"; neste caso, os delinquentes eram castigados mas com outras penas, arbitrárias, como merecer o acto que se cometeu.

2 - A BESTIALIDADE, de que algumas Constituições não falam, como as de Lisboa e as de Elvas (estas falam apenas de outro pecados "contra ou praeter naturam"125), é um crime ( "o qual se comete, quando homem ou mulher têm ajuntamento

carnal com qualquer animal bruto"126) " atrocíssimo e semelhante ao da Sodomia, contra a

natureza humana; e por ser tão horrendo, mandava Deus no Levítico que não só morresse o homem ou mulher que o tal crime cometesse, mas também o bruto animal com que fosse cometido; (...) e pelas leis do reino se manda, sejam, os que o cometerem, queimados e feitos em pó, para que não ficasse memória de tão detestável pecado".127

Tal como no caso da Sodomia, trata-se de um "delito de foro misto". Por isso, quer Clérigos, quer leigos, desde que o delito se provasse, deviam ser entregues à justiça secular, "com protestação de se não proceder a pena de sangue"128; se o crime não for tão

claramente provado que mereça pena ordinária, serão os delinquentes castigados com pena extraordinária de degredo e dinheiro, como merecer e pedir a qualidade da prova e circunstância da culpa".

3 - Ainda que o não considerem tão grave como a Sodomia e a Bestialidade, a MOLÍCIE é também apelidado pelas Constituições como "pecado gravíssimo", nele englobando a homossexualidade feminina - "Sodomia imprópria", mas também o pecado

122 Constituições Sinodais de Elvas. Lisboa. 1635. p. 111

123 Constituições Sinodais do Arcebispado de Lisboa. Lisboa, 1656. p. 435. 124 Constituições Sinodais de Lamego, Lisboa, 1683, p. 421.

125 Constituições Sinodais de Elvas, Lisboa, 1635, p. 111. 126 Constituições Sinodais de Lamego, Lisboa, 1683, p. 421. 127 Constituições Sinodais do Porto. Coimbra, 1690. p. 520. 128 Constituições Sinodais de Lamego. Lisboa. 1683. p. 422. 129 Constituições Sinodais de Lamego. Lisboa. 1683. p. 422.

de Molície cometida por homens entre si ("homem com pessoa do mesmo sexo. com actor e tocamentos torpes").

A Molície entre mulheres, desde que provada, implicava degredo de 10 anos para o Brasil, ou, nalguns Constituições, para as galés (Lisboa), "a qual pena se deve moderar segundo a qualidade da prova e mais circunstâncias"L'°.

Entre homens, esse delito era igualmente castigado com degredo, galés, prisão e penas pecuniárias; os Clérigos, além disso, eram depostos do Ofício e Benefício.

Algumas Constituições como as do Porto (p.522), impõem, sob pena de excomunhão maior, a obrigação de serem denunciadas todas as espécies deste pecado; os denunciantes devem ser ouvidos nas condições descritas para a Sodomia propriamente dita.

Constituições Sinodais do Porto, Coimbra 1690, p. 521.

O PECADO NAS CONSTITUIÇÕES

SINODAIS PORTUGUESAS

DA ÉPOCA MODERNA

Documentos relacionados