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4. APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS

4.2 AÇÕES DESENCADEADAS COM A REFLEXÃO CRÍTICA

4.2.5 Pedir demissão

Foram relatados pelos participantes diversos sentimentos e sensações vividas durante o processo de reflexão crítica que mostram a pressão emocional exercida sobre o profissional e que desestabilizam a sua segurança no emprego. No relato da Diretora 3 (D3) e da Gerente 4 (G4) identifica-se o sacrifício da empregabilidade em favor da autopreservação, materializado na efetivação ou intenção de um pedido de demissão:

A gente enxerga coisas ao longo de uma vida, de uma carreira, que você vai tolerando, convivendo, deixar passar muita coisa no início, não é? Mas que depois você olha e diz, eu preciso disso ainda? Isso não muda! Essa dinâmica ainda é a

mesma! A vida corporativa não muda, entra ano e sai ano é a mesma coisa! [...] A minha opção foi me preservar e ficar em paz com o que eu tinha de maior valor que era o meu grupo. [...] Saí da organização. (D3 – Pedido de demissão)

Eu tenho um pouco de dificuldade quando alguém diz: “- Pouco me importa se vai enfiar o diretor na cadeia. Faça!” Eu não consigo prosseguir. [...] Não dá para fazer isso é antiético, é demais em busca de dinheiro! Existem outros valores na vida! Pensei: eu não quero tomar parte disso! [...] Quando a operação foi aprovada, eu já estava decidida a passar no RH e pedir as contas. Não levei muito tempo pensando, a situação era gritante! (G4 – Pedido de demissão)

Quando o superior imediato de D3 passou a exigir um estilo de gestão muito mais político do que existia na organização até então (politicagem), impondo o que deveria ser feito, agindo sem respeito para com os outros (áreas e pessoas), e especialmente prejudicando outras áreas da organização, a Diretora 3 não concordou e deixou a organização, após refletir criticamente. Conta que a pressão que sofreu chegou a um ponto de saturação que prejudicou sua saúde, e neste clímax, se afastou das atividades do dia a dia para pensar (SANDBERG; DALL'ALBA, 2006) impondo um limite a uma gestão a qualquer preço.

Essa pressão e tortura chegaram numa saturação, que ao chegarem as minhas férias, num estágio muito crítico dessa situação, porque era muito desrespeito com os profissionais, como se eles não valessem nada, porque a gente sabe que em grandes corporações a gente é como uma peça de xadrez, mas tudo tem um limite. Aí eu saí de férias para pensar e repensar essa situação, porque eu tinha certeza absoluta que aquilo que eu vivia não me fazia bem, eu estava doente. [...] Saí de férias e repensei: não é isso que eu quero pra minha vida. Saí da organização. (D3 – Pedido de demissão)

Relata também que a efetivação da decisão que ela tomou de pedir demissão como consequência de sua reflexão crítica tem diferença no estágio de carreira de cada indivíduo, em função da maturidade profissional e pessoal, conforme sua fala a seguir:

Eu pensei o que eu quero para minha vida. Isso vai muito do amadurecimento do espírito pessoal e profissional, e do estágio de carreira. Se fosse no início talvez a resposta aos estímulos externos [da empresa em que trabalha] fossem diferentes. Sempre fui política, eu sempre atuei nisso de uma forma que nunca me incomodou, eu soube lidar com isso. Mas chegou num momento limite. (D3 – Pedido de demissão)

A Gerente 4 (G4) descreve em seu relato a situação de uma operação bancária de estruturação financeira, que colocou sua ética em jogo. A reflexão crítica de G4 ocorreu quando a pressão de seguir as ordens da chefia superior se tornou discrepante em relação ao que ela acreditava que era correto fazer: operações dentro da lei. Ação desencadeada a partir da reflexão crítica revelada é a intenção de G4 de pedir demissão. Porém relata que antes de efetivar esse propósito, o cliente que seria atendido pela estruturação financeira desistiu da operação, trazendo um grande alívio a ela, pois manteve a sua empregabilidade. Este fato, o sentimento de alívio de G4 para manutenção da sua empregabilidade ratifica a visão da Diretora 3 de que a ação de saída voluntária de uma organização é influenciada pela maturidade pessoal e pelo estágio de carreira (estabilidade financeira) de cada indivíduo.

Agora veja como são as coisas. Três horas após o término do comitê, antes de eu ir ao RH, o cliente ligou para o banco declinando da operação. Lembra que eu falei que as condições eram gritantes? Puxa, meu! Fiquei completamente feliz! Por não ter ferrado ninguém e por ter mantido o meu emprego! (G4 – Pedido de demissão)

Como consequência da não efetivação do pedido de demissão, G4, permaneceu na organização se desviando de casos antiéticos. Percebe-se assim que, apesar de ter criticamente imposto limites a uma gestão a qualquer preço, não aceitando novamente participar daquela situação, não enfrentou o dilema existente na organização, até a sua saída efetiva da empresa. Não se identifica na ação desencadeada uma transformação pessoal de pressupostos ao ponto de dar uma forma mais adequada a futuras ações e práticas (MEZIROW, 1990; BROOKFIELD, 1995).

Esse ponto de vista foi compartilhado pelos meus gestores diretos na ocasião, mas teve pouco efeito sobre o pensamento da diretoria ou organização, tanto que levaram o assunto no comitê. Eu mudei a empresa? Não. Quando vinham essas propostas estranhas novamente eu dizia para o meu gestor: “- Passa para outro analisar.” Isso eu fiz até eu sair daquela organização. Consegui desviar desses casos. [...] Ninguém trabalha por hobby. Eu sei que precisamos do dinheiro para sobreviver, mas, honestamente, eu não faria parte desse tipo de coisa: se o banco mandar, vamos em frente? Não! A partir do momento que o seu trabalho não te deixa dormir porque te afeta pessoalmente, na índole, no conceito de certo e errado, eu não fico com dúvida, eu não faço o que é errado. Não adianta continuar. Eu não quero isso para minha vida! (G4 – Pedido de demissão)

Na próxima seção serão discutidos relatos sobre profissionais que enfrentaram a política organizacional nesta pesquisa recebendo as consequências dessa ação desencadeada pela reflexão critica na organização.