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2. Revisão bibliográfica 7

2.4. Pegada Hídrica 15

A crescente utilização de água doce está a originar grande preocupação em diversas partes do mundo, uma vez que é um bem escasso, vital e essencial para o desenvolvimento e crescimento das populações e dos países.

As atividades humanas consomem e poluem uma grande quantidade de água. A maior parte da utilização desta destina-se à produção agrícola, consumo de volumes significativos de água e poluição pelos sectores industriais e domésticos (Programme, 2009). A poluição e o consumo da água podem estar associados a atividades como a irrigação, higiene pessoal, limpeza e refrigeração. O total de consumo e poluição da água é geralmente considerado como a soma de diversas distribuições de água e atividades poluentes independentes. No entanto tem-se prestado pouca atenção ao facto de que, no final, o total de água consumida e o volume de poluição está relacionado com o que e quanto certas comunidades consomem e à estrutura da economia global que fornece os diversos bens de consumo e serviços (Hoekstra et al, 2011).

A ideia de se contabilizar o uso da água ao longo das cadeias produtivas ganhou maior importância após a introdução do conceito de “pegada hídrica” por Hoekstra, em 2002 (Hoekstra A. Y., 2008 b).

A pegada hídrica é um indicador do uso da água que analisa a sua utilização de forma direta e indireta, tanto do consumidor quanto do produtor (Hoekstra & Chapagain, 2008). Ou seja, a pegada hídrica de um individuo, comunidade ou empresa é definida como o volume de água doce total que é utilizado para produzir os bens e serviços consumidos pelo individuo, comunidade ou produzidos pelas empresas, tanto em território nacional como no estrangeiro, no caso de bens importados (Hoekstra et al, 2011).

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As pegadas hídricas podem ser divididas em três componentes (Tabela 1):

 Pegada hídrica azul: refere-se ao consumo de água doce superficial ou subterrânea ao longo da sua cadeia produtiva. O termo consumo refere-se à perda de água superficial ou subterrânea disponível numa bacia hidrográfica quando a água evapora, é incorporada num produto, não retorna à mesma bacia hidrográfica embora escoe para outra bacia ou oceano, ou não retorne no mesmo período, por exemplo, quando é retirada no período de seca e só retorne no período de chuvas (GRACE Communications Foundation).

 Pegada hídrica verde: refere-se ao volume de água da chuva consumida, que não escoa, e é utilizada no processo de produção. É particularmente relevante para os produtos agrícolas e florestais correspondendo ao total de água da chuva que sofre evapotranspiração mais a água incorporada nos produtos agrícolas e florestais colhidos (GRACE Communications Foundation).

 Pegada hídrica cinza: refere-se à poluição e é definida como o volume de água doce necessário para assimilar a carga de poluentes a partir de concentrações em condições naturais e de padrões de qualidade da água existentes (GRACE Communications Foundation).

Tabela 1 - Representação esquemática dos componentes de uma pegada hídrica (Hoekstra et al, 2011)

Uso direto Uso indireto Captação da água Pegada hídrica Verde Pegada hídrica verde

Consumo Vazão de retorno

da água captada Pegada hídrica Azul Pegada hídrica azul

Pegada hídrica Cinza Pegada hídrica cinza Poluição

Portanto, a pegada hídrica oferece uma perspetiva mais adequada e mais ampla sobre a forma como o consumidor ou produtor se relaciona com o uso dos sistemas de água doce. É uma medida volumétrica de consumo e poluição, não é uma medida da severidade do impacto ambiental local do consumo e poluição da água. O impacto ambiental local de uma determinada quantidade de consumo e poluição da água depende da vulnerabilidade do sistema hídrico local, do número de consumidores

- 17 - e poluidores que fazem uso do mesmo sistema. A contabilização da pegada hídrica fornece informações temporais e espaciais específicas acerca de como a água deve ser utilizada nas diversas atividades humanas (Hoekstra et al, 2011).

A avaliação da pegada hídrica refere-se a um amplo campo de atividades que visam:

 Definir de objetivos.

 Quantificar e localizar a pegada hídrica de um processo, produto, produtor, consumidor ou quantificar no espaço e no tempo a pegada hídrica numa determinada área geográfica.

 Avaliar a sustentabilidade ambiental, social e económica de cada pegada hídrica.  Formular estratégias de resposta.

Em termos gerais, é importante avaliar a pegada hídrica e analisar o modo como as atividades e os produtos se podem relacionar com as questões de escassez e poluição da água para que estes se possam tornar o mais sustentáveis possíveis sob o ponto de vista hídrico (Hoekstra et al, 2011).

2.4.1. Pegada Hídrica de Portugal

Portugal possui uma das maiores pegadas hídricas por habitante, ocupando a sexta posição numa lista de 140 países analisados. A elevada pegada hídrica de Portugal deve-se à reduzida eficiência do sector agrícola nacional, à dependência dos bens agrícolas, que se importa, principalmente de Espanha, e às diferenças geográficas internas, com problemas de escassez de água a sul.

Estima-se que em Portugal o emprego da água seja de aproximadamente 52 𝑚3/pessoa/ano e a

capitação diária regional varia entre cerca de 130 litros (nos Açores) e mais de 290 litros (no Algarve). Se a estes valores for acrescentado o consumo de cada individuo, toda a água utilizada nos bens consumidos, desde a agricultura à energia, conclui-se que cada cidadão português é responsável pelo uso de 2,264 𝑚3/ano. Mais de 80 % desse valor corresponde à água consumida pelos bens agrícolas

e cerca de 54% destes corresponde à importação de bens para consumo, ou seja, a maior parte da pegada hídrica de Portugal é externa.

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Entre os seis países que possuem as pegadas hídricas mais relevantes, cinco encontram-se na região mediterrânea, nomeadamente: Grécia, Itália, Espanha, Chipre e Portugal.

Portugal possui recursos hídricos relativamente abundantes no contexto da região mediterrânica, ficando somente atrás da Grécia, e apresenta uma taxa de escassez de água de 33%.

Para se melhorar a eficácia da utilização da água deve-se conhecer as características do consumo direto (quem, onde e como se consome mais água) e também do consumo indireto (quem, onde e como se produzem os bens importados e em quais deles na produção se usa água) (PÚBLICO, 2010).

Assim, para alterar este cenário é fundamental apostar na educação, sensibilização dos consumidores para que optem por escolhas pessoais mais sustentáveis e desenvolver ferramentas adequadas de certificação da gestão de água (WWF, 2010).