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Fazer memória dessa instituição, para mim, significa recordar minha própria história e a de minha família. Quando meus pais, meus irmãos e eu – éramos ao todo onze pessoas – migramos para Natal, prove- nientes do interior do estado, no ano de 1976, viemos porque meu irmão mais velho, então com 16 anos, havia sido admitido, no ano anterior, como aluno da antiga Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte.

À época, em nossa terra natal, Santana do Matos, uma pequena cidade encravada entre serras do sertão potiguar, só havia oferta de educação até o primeiro grau, equivalente hoje ao ensino fundamental. Meu pai, proprietário de um pequeno comércio, ponderando a decisão de manter meu irmão estudando sozinho na capital e não vislumbrando perspectivas de estudo nem de emprego para os filhos no interior, vendeu o que tinha e resolveu mudar-se com toda a família para a cidade grande.

De comerciante, passou a comerciário. Como todos os filhos eram menores e apenas ele trabalhava para o sustento da família, tivemos de enfrentar muitas privações e dificuldades, inclusive para nos manter estudando. Abaixo de Deus, nossa esperança estava na antiga ETFRN, na educação aí ofertada, que poderia nos garantir mobilidade social e o acesso a uma vida com mais dignidade. Assim que meu irmão mais velho concluiu o curso técnico de geologia, empregou-se em uma mine- radora na região Norte do país e logo começou a ajudar no pagamento das despesas de casa.

Em 1982, aos 12 anos, de posse da carteirinha do Sindicato dos Empregados no Comércio do RN, consegui me inscrever no Pró-Técnico, o curso preparatório para ingressar na ETFRN, destinado aos filhos dos trabalhadores sindicalizados, que era então ministrado com aulas presen- ciais no turno da noite. Não fosse esse curso preparatório, dificilmente teria condições de passar no rigoroso e concorrido exame de seleção para cursar o técnico de edificações nos quatro anos seguintes.

Antes de mim, mais um irmão e uma irmã também tiveram a oportunidade de ingressar na ETFRN. Graças à educação de qualidade que nos foi ofertada, com uma forte capacitação técnica, mas também uma sólida base de conhecimentos gerais, todos conseguimos boas co- locações no mundo do trabalho. Meu irmão mais velho foi aprovado em primeiro lugar em um concurso da Caixa Econômica Federal no interior da Paraíba; minha irmã, tendo mudado para São Paulo, lá passou em um concurso público e foi chamada para trabalhar no Bando do Estado de São Paulo (Banespa); e meu outro irmão, também através de concurso, ingressou na Petrobras como técnico de segurança.

Na ETFRN, tivemos uma atenção especial do serviço social, com di- reito a auxílio-transporte, merenda, consultas médicas, visitas periódicas ao dentista, acesso a palestras e participação no programa de bolsa de trabalho, que, além do auxílio financeiro, dava oportunidade de iniciar uma prática profissional. Meu irmão, que era bolsista, prestava serviços no Abrigo de Idosos Juvino Barreto e, com o dinheiro recebido, complementava a renda familiar, comprando gêneros alimentícios de primeira necessidade. Recordo- me, um pouco emocionada, de que ele, quando teve de ficar imobilizado por três meses, por ter fraturado a perna em um acidente, recebeu da escola o apoio de que necessitava para não abandonar os estudos. Lembro-me ainda de que, certa vez, de tão surrada, a farda de minha irmã rasgou, e lhe foi concedido um uniforme novinho. No atendimento de todas essas demandas, as assistentes sociais atuavam sempre com muita discrição.

Foi um período inesquecível em minha vida! Apesar de muito tí- mida e reservada, pude fazer grandes amizades, tendo, inclusive, conhe- cido aí o rapaz que viria a ser meu esposo. Esse tempo na escola, como era carinhosamente chamada por nós, também foi de importantes desco- bertas, como a de minha vocação ao magistério. Em relação a este último aspecto, devo ressaltar a contribuição que essa instituição deu ao burilar minhas aptidões em leitura, redação, gramática e literatura, durante as aulas de português ministradas por professores dos mais qualificados: João Palhano, Maria do Carmo, Amíris, Nalva, Lélia, Haidée... Verdadei- ros mestres no trato com a palavra, cada um, com suas características

Nadir Arruda Skeete

e modo peculiar de ensinar, selou em mim o desejo de trabalhar com as palavras e de ensinar outros a fazer o mesmo. Isso de tal forma que, já em 1986, paralelamente ao estágio que realizava na área de construção civil, fiz vestibular e passei a cursar a Licenciatura em Letras na Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Ao concluir, nesse mesmo ano, o curso técnico, saí da instituição, mas ela não saiu de mim... Tinha uma grande vontade de a ela regressar, como se, talvez inconscientemente, quisesse retribuir todo o bem que me proporcionara. Com essa ideia em mente, dei continuidade aos meus estudos superiores. Fazia faculdade à noite, com muito sacrifício, pois trabalhava o dia inteiro, em obras ou no escritório. Assim que terminei a graduação, em 1991, submeti-me à seleção para o Mestrado em Letras na Universidade Federal da Paraíba e fui aprovada. Ainda nesse ano, surgiu a oportunidade de retornar à ETFRN, mediante Concurso de Pro- vas e Títulos para Professor, cargo para o qual concorri com cerca de 80 candidatos e, uma vez aprovada, tomei posse em 8 de outubro de 1992.

De lá para cá, tenho atuado como professora de língua portuguesa nos diversos cursos técnicos e tecnológicos oferecidos pela instituição. Ultimamente, venho também desenvolvendo atividades de assessoria no gabinete da Reitoria, sendo responsável pela revisão dos documentos ofi- ciais e colaboração em alguns projetos institucionais, além de secretariar os colegiados superiores da instituição. Decidi publicar esse depoimento para que mais pessoas possam se convencer da importância da educação e da garantia desse direito através de políticas públicas de inclusão social como essa desenvolvida pelo IFRN.

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