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5. Vulnerabilidades e perceção do risco online

5.3. Perceções parentais dos riscos online

Usualmente os pais têm uma visão positiva da utilização da Internet e encorajam os filhos a usufruírem das inúmeras vantagens que ela oferece, ao nível de novas aprendizagens, entretenimento, enriquecimento e crescimento pessoal. Essa visão e conduta encorajadora por vezes possui um caráter ambivalente, pois simultaneamente muitos pais estão conscientes dos potenciais riscos e perigos que podem advir do uso da Internet (Ceyhan, 2011; Livingstone & Bober, 2005) e mostram-se mais protetores na utilização da mesma pelos filhos.

Porém, apesar desta ideia de que muitos pais reconhecem a esfera negra do mundo online, também um número elevado subestima a frequência com que os filhos experienciam riscos ou experiências negativas. Por exemplo, Liau et al. (2008), num estudo realizado em Singapura, inquiriram adolescentes e os seus pais sobre a exposição dos primeiros a conteúdo inapropriado na Internet (conteúdo pornográfico, agressivo e violento). Os resultados revelaram uma discrepância entre os relatos das crenças dos pais e os relatos da exposição dos filhos. Os autores confirmaram que os pais subestimam os riscos que os filhos experienciam

39 online e, em contrapartida, sobrestimam a monitorização da segurança online que fazem em sua casa.

Semelhantemente, resultados do estudo UK Children Go Online mostraram que as crianças e adolescentes (9-19 anos) reportaram níveis mais elevados de experiências negativas online ou de risco (e.g. receber comentários indesejados de teor sexual; encontrar-se com alguém que conheceu online) em comparação ao que é percecionado pelos pais (Livingstone & Bober, 2005). O mesmo é verificado pelo Projeto EU Kids Online II (Livingstone et al., 2011), inquirindo jovens entre os 9 e os 16 anos e um dos seus pais, e por Symons et al. (2017), na Bélgica, inquirindo 357 famílias com filhos entre os 13 e os 18 anos.

Então, considerando os resultados desses estudos, a conclusão mais lógica a retirar é a possibilidade de os pais sobrestimarem o conhecimento que têm sobre as experiências online dos seus filhos (Symons et al., 2017). Adicionalmente, se os pais/educadores acreditam que os filhos estão em menor risco, ou são mais capazes de se protegerem em relação a outros jovens, podem não se preocupar tanto em utilizar estratégias que os protejam dos riscos/perigos da Internet (Byrne et al., 2014; Livingstone & Bober, 2005).

Aliada à perceção do risco online estão as preocupações dos pais sobre o uso que os filhos dão à Internet (também alvo de análise nesta investigação) e o impacto que essa utilização pode ter nos mesmos. Os dados obtidos no Eurobarómetro31 de 2008 são interessantes nesse sentido. O Eurobarómetro analisou a perceção dos pais sobre a utilização da Internet dos filhos conduzindo entrevistas telefónicas na Europa a uma amostra de aproximadamente 12,750 pais/educadores de menores entre os 6 e os 17 anos.

O relatório revelou que a nível nacional a maioria dos pais mostrou-se preocupada com diversas situações acontecerem com filhos, como por exemplo visualizarem imagens explícitas sexuais ou violentas na Internet, isolarem-se socialmente devido à utilização constante e diária da Internet, partilharem informação pessoal/privada e serem vitimados online (e.g. cyberbullying). Nessas preocupações foi destacada os filhos serem vítimas de

grooming online (89%) (Eurobarómetro, 2008).

Ponte e Simões (2009) propõem a hipótese de que a utilização (ou a não utilização) da Internet pelos pais possa explicar, em parte, as suas preocupações relativamente ao que os

31 Os objetivos passaram por analisar o uso da Internet dos jovens e dos pais; preocupações dos pais sobre os

riscos online; contextos em que os menores recorriam aos adultos para pedir ajuda; estratégias de proteção online utilizadas pelos pais para mediarem o uso da Internet dos menores; tipo de organizações às quais os adultos podem reportar alguma situação problemática ocorrida na Internet; perceções dos adultos sobre ações que poderiam contribuir para uma utilização mais segura da Internet e recursos preferenciais desses para obter informação sobre a utilização segura da Internet (Eurobarómetro, 2008).

40 seus filhos possam encontrar online. Vemos no Eurobarómetro (2008) que os pais “utilizadores ocasionais” ou “não utilizadores” temem mais todos os tipos de riscos anteriormente mencionados em relação aos pais que utilizam frequentemente a Internet. Portanto, de acordo com esses dados, quanto menor a utilização da Internet pelos pais, maior é a sua preocupação com os riscos online que os filhos podem encontrar.

Estas preocupações variam também de acordo com a idade dos filhos. Isto pode ser explicado pelo facto de a perceção do risco depender das representações parentais sobre o comportamento dos filhos em diferentes idades e também porque o controlo parental pode variar de acordo com a idade dos filhos (Ponte & Simões, 2009). O Eurobarómetro (2008) mostrou que, no geral, pais com níveis de escolaridade mais baixos, pais com filhos com idades compreendidas entre os 6 e os 14 anos e pais com filhas estão mais preocupados com a sua segurança online. Esta diferença na preocupação relativamente ao sexo é evidenciada em outros estudos. Sorbring (2014), por exemplo, concluiu no seu estudo que os pais temem mais que as filhas tenham contacto com “pessoas perigosas”, serem vítimas de bullying ou sentirem desconforto face à presença de conteúdo online inapropriado em relação aos filhos.

De referir que dois dos objetivos da presente investigação serão analisar especialmente as questões acima mencionadas relacionadas com a perceção parental dos riscos online (mais especificamente a perceção dos pais do risco de vitimação por grooming online) e também as preocupações dos pais com os riscos online que os filhos podem encontrar.

Em conclusão, podemos afirmar que a utilização dos novos meios de comunicação digital tem evoluído para uma privatização, permitindo que os jovens acedam a esses meios em qualquer local, longe da visibilidade dos pais (Livingstone, 2010), o que suscita nos últimos preocupações relativamente a situações ou experiências menos positivas com as quais os filhos possam deparar-se ou experienciar. Essas preocupações parecem variar de acordo com alguns fatores como a utilização da Internet e o nível de educação dos pais/educadores e a idade e género dos filhos/educandos. É também essencial que os adultos tenham conhecimento legítimo das atividades online dos filhos/educandos e experiências desses no mundo digital (Symons et al., 2017) para que assim consigam orientar e adequar medidas de prevenção/proteção à utilização da Internet dos jovens, sendo isso o que analisaremos de seguida.