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4. ANÁLISE DAS ENTREVISTAS E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS

4.2. Percepção dos Entrevistados sobre aspectos facilitadores e bloqueadores

A principal característica de um indivíduo que demonstra Inteligência Cultural é sua capacidade de interagir com diferentes culturas e contextos culturais (Thomas et al., 2015). Nesta dimensão, uma questão foi unanimemente avaliada como de alta importância para diminuir ou aumentar barreiras culturais, facilitando ou dificultando o processo de transferência de conhecimento tácito. De acordo com a Tabela 7, 100% dos entrevistados foram capazes de identificar que os

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expatriados que chegam ao Brasil sem dominar o português tem muito mais dificuldades de adaptação se comparados aqueles que, previamente ou durante a expatriação, buscam aumentar seu conhecimento do idioma local. O entrevistado E8 diz em trecho de sua entrevista “A questão do idioma facilita muito. Obviamente, aquele expatriado que corre e busca aprender o português se insere mais rápido, uma vez que ele se comunica melhor, as pessoas veem e recebem de maneira melhor um indivíduo que está demonstrando um esforço em aprender a língua local e isto é uma das coisas que tendem a criar mais barreiras para expatriados que já estão há muito tempo e não aprenderam o português.”

Tabela 7 - Aspectos Facilitadores ou Bloqueadores

Variável Código da percepção dos Entrevistados

% de vezes que foi citado em todas as entrevistas Aspectos Facilitadores e

Bloqueadores

Barreira linguística 100%

Diferenças culturais podem impedir transferência do conhecimento

88%

Segurança no Rio de Janeiro como aspecto negativo

50%

Interação pessoal aumenta desempenho 50%

Da mesma forma, também 100% dos entrevistados percebem que, admitindo que dadas as características, cultura organizacional e origem da empresa de onde são provenientes os entrevistados, a fluência na língua inglesa pela equipe local é uma condição sine qua non para garantir uma alta possibilidade de transferência de conhecimento entre estes e os expatriados. Com efeito, o entrevistado E5 ressalta “Quando temos expatriado no time, acaba que todas as reuniões de equipe têm que ser em inglês e muitas vezes as discussões não rendem tanto como poderiam. O pessoal fica mais inibido e os temas são tratados de forma mais superficial, porque ninguém quer se comprometer a falar alguma coisa errada em outra língua na frente dos colegas e do chefe. Outra coisa que percebo é que, com esta história de só termos reunião em inglês, as pessoas discutem menos, porque não sabem bem como expressar sentimentos.”

Uma parte significativa dos entrevistados, 50%, identificou que a interação social, que neste contexto pode ser entendida como participação em eventos diversos que não estejam relacionados diretamente ao trabalho, mas nos quais haja presença de membros da equipe, como por exemplo, um jantar ou happy hour, é um potencial facilitador para o processo de transferência de conhecimento tácito. De acordo com a entrevistada E1 “Quando os expatriados estão aqui, organizamos sempre almoços ou jantarzinhos só para falar sobre tudo. E, aí é onde

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acho que as trocas mais interessantes acontecem.” Esta percepção está relacionada com um aspecto surpreendente que foi identificado por 50% dos entrevistados. Em sua visão, a transferência de conhecimento, admitindo que esta seja favorecida pela interação social, será bloqueada ou prejudicada por conta da sensação de insegurança que assola a cidade do Rio de Janeiro, uma vez que, para evitar se colocar em situações de risco, os expatriados tendem a não participar de eventos sociais. O entrevistado E8 ressalta “temos a questão da insegurança. O expatriado no Brasil se assusta um pouco quando chega ao Brasil. Quando ele recebe o briefing de segurança ele fica assustado de como ele vai se adaptar.” Um pouco mais enfática, a entrevistada E1 diz “Quem é que vai tirar um Iphone top de linha do bolso para traduzir uma placa no centro da cidade do Rio de Janeiro? Quase certeza que vai ser roubado se fizer isto. Então, voltamos ao fato de que a insegurança é uma barreira, eu acho. Vivo insegura de sair, e eu sou brasileira. Imagina um holandês, americano. Olha, já tive até indiano no meu time que tinha medo de sair de casa.”

A grande maioria dos entrevistados (88%) relatou diversas formas de divergências culturais que foram consideradas por eles como barreiras para o processo de transferência do conhecimento tácito. A relatar a forma mais direta de comunicação de certas culturas, notadamente as germânicas como ressaltou o entrevistado E3 “... os holandeses são super diretos. Então, quando há holandeses aqui no time e eles traduzem diretamente da língua holandesa, que eu falo um bocado holandês, eu sei, eles não dizem: por favor, eu quero fazer assim, assim. Porque em holandês, a língua é muito direta. E, às vezes há o choque das pessoas a dizerem: por que ela está a dizer dessa maneira?...” ele continua “... Outros, os americanos são muito driven querem suceder31 a custo de tudo. Mas, eles esquecem que eles foram ensinados da escola, do ensino secundário até a universidade, depois vem cá, aqui, para o Brasil ou até para Portugal, e em parte da Europa, onde as pessoas são mais descansadas, mais tranquilas.”. O quesito pontualidade para início e término das reuniões foi apontado por dois entrevistados como sendo uma divergência cultural que também causa problemas, como descreveu E4: “essa coisa do horário é sempre um problema. Risos. Tem expatriado que brinca que brasileiro tem fuso horário muito diferente. Eles reclamam muito que as reuniões aqui nunca começam ou terminam no horário planejado. Eles acham um absurdo as pessoas entrarem atrasadas nas reuniões. Por causa disso, há um tempo atrás, implementamos um sistema que a pessoa que

31 Nota do autor: Suceder: Acontecer, produzir-se ou realizar-se. Dicionário Aulete da Língua Portuguesa.

Disponível em: http://www.aulete.com.br. Acesso em 28 de setembro de 2019

Aparentemente, em interpretação livre do autor, o entrevistado quis dizer que os americanos querem determinar com que as ações sejam tomadas rapidamente, na mesma velocidade que estão acostumados em seu país.

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chegasse atrasada pagava R$1,00 por minuto de atraso. Era uma forma de fazer as pessoas se sentirem mais responsáveis. Risos. Mas, não deu muito certo. Risos”

4.3. Percepção dos Entrevistados sobre a Capacidade de Adaptação e Adaptabilidade