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Percepção sobre o conceito de Vigilância Socioassistencial

1 RETROSPECTO DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO PERÍODO DE

3.3 Conhecendo o perfil das equipes técnicas

3.3.2 Percepção sobre o conceito de Vigilância Socioassistencial

Em complemento ao debate conceitual a que aludimos no capítulo anterior e a partir de alguns elementos que constituem o perfil das equipes técnicas que atuam na área, como visto há pouco, consideramos que apreender o significado da vigilância socioassistencial na ótica dos entrevistados nos possibilita, de certa forma, desvendar tanto o direcionamento destas práticas profissionais quanto o esforço contínuo dos profissionais em ressignificar cotidianamente o conceito de vigilância socioassistencial. Uma particularidade não pode ser desconsiderada: a de que a estas equipes vêm cabendo a atribuição de construir a vigilância nos municípios. Além disso, é necessário tornar claro para os demais atores da arena institucional o seu significado concreto. Entretanto, percebe-se que ainda não se alcançou o consenso sobre este ponto.

“Eu acho que o que falta é que o MDS criou a vigilância, criou vários instrumentais, criou os índices, mas falta dizerem de fato o que é a vigilância. As orientações técnicas são muito amplas. Quando cheguei aqui tive que aprender fazendo porque ninguém me disse o que realmente era a vigilância. Eles precisam detalhar o que de fato é a vigilância. Faltam protocolos e diretrizes mais aprofundadas em termos nacionais. A sensação que eu tenho que estamos inventando diariamente a vigilância e descobrimos fazendo” (Entrevistado “Diagnóstico”).

Podemos perceber que no bojo desta narrativa estão impressas não somente as dificuldades de entendimento do significado da vigilância socioassistencial. A crítica realizada tem como pano de fundo a necessidade de ampliação do debate para além dos instrumentais. Talvez muitas das lacunas, imprecisões e desafios presentes na implementação da vigilância socioassistencial ocorram porque o debate em âmbito nacional priorizou, inicialmente, uma abordagem mais tecnicista. Nesse sentido, a organização da área foi dotada de uma perspectiva de pensá-la mais sob o ponto de vista dos produtos possíveis de serem gerados. A expressão “aprender fazendo”, também utilizada pelo conjunto dos entrevistados, ainda que revele o cotidiano das equipes, é um ponto que merece destaque, haja vista o “[...] descompasso ainda existente entre a

importância que a vigilância socioassistencial assume na política e as condições reais e operacionais para sua efetivação” (BRASIL, 2013, p. 40). A rigor, é preciso pensá-la numa perspectiva ampliada, conectada à realidade de cada município.

Entendo [a vigilância socioassistencial] como produção de conhecimento, de saber, problematização, reflexão sobre a prática, sobre a oferta. A forma como a política está sendo construída, um olhar crítico para esta política e um conhecimento, uma aproximação com o território, com as pessoas, com a vida de cada pessoa, de suas vulnerabilidades, que elas enfrentam. Vejo muito como um olhar pra dentro e um olhar pra fora. Um olhar pra dentro da política, como ela está sendo executada, quais os entraves, e quais avanços. E um olhar pra fora: olhar para o território, para o município como um todo (Entrevistado “Território”).

As colocações dos entrevistados indicam, via de regra, uma concepção de vigilância abrangente, que reúne aspectos ligados ao aperfeiçoamento das práticas de gestão pública. Os relatos partem da perspectiva de complementaridade dessa área com as demais funções da política, ao mesmo tempo em que demonstram as dificuldades de afiançá-la desta forma. Parte dos entrevistados verbalizou que considera que o conceito de vigilância socioassistencial não está fechado, mas em construção. As formulações registradas, configuram um sincronismo em torno de algumas noções-chaves dispostas nas principais regulamentações: produção de conhecimento; sistematização, análise e disseminação de informações; relação entre demanda e oferta; monitoramento e avaliação.

Entendo que há dois tipos de ações de vigilância socioassistencial. Um técnico da ponta, por exemplo, que faz o mapeamento das principais situações de riscos e vulnerabilidades que incidem sobre os adolescentes do serviço de medida socioeducativa está fazendo vigilância socioassistencial. O nível daqui da gestão é aquele que tem a responsabilidade de nortear um caminho a ser tomado. Então, um dos papéis da vigilância é fazer o levantamento e o cruzamento dos dados de todos os serviços que a gente tem para idoso e da demanda do próprio território. É um exemplo hipotético de como eu entendo ações de VS (Entrevistado “Território”, grifo nosso).

Não somos apenas nós que estamos aqui lotados na vigilância, exercendo nossas funções que somos responsáveis pela vigilância. O meu entendimento é de que a vigilância deve ser horizontal. Ela é responsabilidade dos gestores e dos técnicos. Caso os profissionais dos CRAS e CREAS não tenham este entendimento não conseguiremos avançar. A vigilância requer o olhar atento sobre o território e sobre as demandas ali colocadas. Requer trocas constantes. Não adianta estruturar uma equipe, ter um lugar na estrutura da Secretaria se não estamos dispostos a termos este contato direto com as equipes das unidades. Esta é uma preocupação que temos, mas devido à dimensão territorial no município, nem sempre damos conta. É muito trabalho para poucos profissionais! (Entrevistado “Território”).

Sob esse ângulo, os entrevistados sustentam que a ações de vigilância estão vinculadas a duas dimensões: a da gestão e a do território, mas direcionadas para o mesmo sentido. E somente se materializa enquanto função à medida que é capaz de interligar a gestão e a oferta de serviços da política de assistência social. Entretanto, este aspecto deve ser compreendido também como uma direção política, merecendo destaque o fato de que nem sempre são colocados os subsídios para que a atuação da vigilância ocorra de forma interligada com as unidades do SUAS, e isso por uma série de fatores. Nesse sentido, os relatos fundamentam-se numa leitura crítica da realidade, apontando para os limites diários da gestão municipal.