• Nenhum resultado encontrado

5. NATUREZA DA DÍVIDA PÚBLICA BRASILEIRA ATUAL

5.1 PERFIL DA DÍVIDA PÚBLICA FEDERAL EM 2010

Os anos que procedem a crise financeira que se deflagrou ao final de 2008 demonstram um cenário incerto e dependente de políticas econômicas não muito tradicionais, como subsídios, isenções de taxas e anistias. Provém desses tipos de políticas econômicas a diminuição de arrecadação por parte do governo e conseqüente necessidade de aumento de gastos, acarretando em maiores obrigações de empréstimos por parte do Estado.

Desse modo, de acordo com projeções do Tesouro Nacional em seu Plano Anual de Financiamento 2010 (PAF), o referido ano deverá apresentar um aumento de cerca de 15% do montante da DPF brasileira em relação a 2009, como mostra o gráfico 15.

Por tratar-se de projeções, visto que a divulgação do PAF ocorre no início do ano a que este se refere, é necessário especificar bandas de valores a serem alcançados. No caso de 2010, o Tesouro Nacional estipulou que o ano se concluiria com uma DPF entre R$ 1,6 trilhão e R$ 1,73 trilhão. Cabe ressaltar que o ano de 2009 se encerrou com uma DPF de R$ 1,49 trilhão dentro da previsão de R$ 1,45 trilhão e R$ 1,6 trilhão estipulados pelo Tesouro Nacional.

Gráfico 15: Evolução DPF 2008 - 2010 – (R$ trilhões)

FONTE: Tesouro Nacional, 2010. Elaboração própria.

Dentre o total estimado de estoque da DPF, o montante de recursos em poder do público com vencimento projetado para 2010 equivale a R$ 372,3 bilhões, ou seja, cerca de 35% do total da DPF estará vincendo no ano de 2010, um valor relativamente grande quando se tem como uma das principais metas o alongamento do prazo de vencimento da dívida.

Dos R$ 372,3 bilhões a serem despendidos com pagamentos decorrentes do vencimento de títulos públicos em 2010, R$ 86,7 bilhões correspondem somente ao pagamento dos juros da dívida – fatia de 23% do total –, podendo-se deduzir que o Brasil ainda usufrui de grandes responsabilidades e encargos decorrentes do alto custo de sua dívida pública. É possível visualizar essa realidade na segunda figura do gráfico 16.

Na primeira figura do gráfico 16 também é possível notar, como era de se esperar, que o maior montante de pagamentos com títulos públicos vincendos decorre de encargos da Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFi), representando nada menos que 97% do total16, dos quais mais de 45% são referentes ao pagamento de títulos prefixados, seguidos dos títulos indexados à Selic, responsáveis por 37%. Como conseqüência da financeirização da dívida ocorrida principalmente graças ao Plano Real em 1994, a Dívida Pública Federal externa (DPFe) passou a representar uma fatia

16 Tratando-se do montante de R$ 359,7 bilhões gastos com pagamento de títulos públicos vincendo em

2010 relativos a DPMFi, R$ 79,7 bilhões são relativos ao pagamento dos juros (22%), sendo o pagamento do montante da dívida interna equivalente a R$ 280,0 bilhões.

mínima da dívida pública total, como já estudado, o que certamente faz despender menos encargos.

Gráfico 16: Dispêndios com títulos vincendos em 2010 – (R$ bilhões)

FONTE: Tesouro Nacional, 2010. Elaboração Própria.

O montante gasto com pagamento de juros em 2010 apresentou uma elevação em relação ao montante pago com juros em 2009 da ordem de 10%. O ano de 2008, porém, apresentou um dispêndio ainda maior, chegando a valores brutos de R$ 103,9 bilhões, como mostra o gráfico 17. O grande volume de recursos gastos com juros em 2008 pode ser atribuído à crise do subprime que abalou todo o mundo. A necessidade de reter capital estrangeiro no país e manter alto o nível de confiança dos investidores fez o governo aumentar o volume de títulos indexados à taxa Selic17, acarretando em aumentos proporcionais no custo da dívida.

Em 2009 o cenário foi outro. Com o intuito de manter alto o nível de liquidez na economia para evitar possíveis recessões econômicas, houve uma queda gradual na taxa de juros efetivas de mercado, alcançando seu menor índice no mês de novembro, qual foi 0,66% a.m. (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2010).

O início do ano de 2010 manteve relativas baixas taxas efetivas de juros, acusando ligeiros e variáveis aumentos a partir de maio deste ano. Esses aumentos tendem a diminuir o grau de liquidez na economia, visto que os efeitos da crise econômica mostram-se ultrapassados e a recuperação das economias avançadas e

17 Em agosto de 2008 o Tesouro Nacional precisou rever seu respectivo PAF e as metas elaboradas no

início do ano. Em decorrência da inesperada crise financeira, foram diminuídos o montante de títulos em estoque e as metas para emissão de títulos prefixados. Em contrapartida, o volume de títulos indexados à Selic apresentou notável elevação de seu limite. Para mais informações consultar o PAF 2008 – Revisão. Disponível em: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/hp/downloads/PAF_Proposta_Divulgacao270808.pdf.

emergentes mostra-se acelerada. Por essa razão, as projeções para o ano de 2010 aspiram a um aumento relativo dos gastos com pagamento de juros. Apesar de o volume de títulos indexados à taxa Selic apresentar ligeira queda quando comparado com os anos anteriores, ainda apresenta um grande peso no que tange às decisões e políticas monetárias do governo, visto que alterações na taxa básica de juros para atender necessidades econômicas representam impactos monetários de grandes proporções, resultando em alto grau de risco e grande volatilidade de custos.

Gráfico 17: Gasto total com pagamento de juros da dívida 2008 - 2010 (R$ bilhões)

FONTE: Tesouro Nacional, 2010. Elaboração própria.

Percebem-se os esforços por parte do governo para melhorar o perfil da dívida quando são analisadas as projeções das metas de composição da dívida para 2010. Diferentemente de 2009, que apresentou maior parte de seus títulos atrelados à Selic (33,4% do total), 2010 tem como meta a elevação dos títulos prefixados, além da elevação dos títulos atrelados à índices de preços, como pode ser comprovado no gráfico 18.

O gráfico 18 relaciona a composição de emissão de títulos realizada em 2009 com as metas mínimas e máximas para o ano de 2010. É notável uma preocupação por parte do governo em aumentar o montante de títulos prefixados e atrelados a índices de preço em detrimentos dos títulos atrelados à Selic e à variação cambial, visto que o perfil diferenciado de títulos representa maior equilíbrio quanto aos riscos e custos da dívida pública. Os papéis fixados a índices de preço representam uma boa saída para países que querem se livrar da armadilha de manter estoques de títulos indexados a taxas básicas de juros, mas que em contrapartida, não têm credibilidade suficiente para

manter alto o estoque de títulos prefixados ou com prazos de maturidade mais longos, como o Brasil. Já os títulos prefixados, que são mais negociados em países com alta credibilidade financeira, tornam benéficas políticas monetárias expansionistas, visto que aumentos na taxa básica de juros fazem diminuir o valor presente da riqueza de seus detentores.

Gráfico 18: Metas de composição da DPFi para 2010 - (%)

FONTE: Tesouro Nacional, 2010. Elaboração própria.

Segundo consta no PAF 2010 do Tesouro Nacional, tem-se dado preferência em reservar os títulos indexados à variação cambial ao financiamento da dívida externa, com metas baixas de variação no que tange a seu montante (dificilmente superior a 10% do total). O argumento a favor dessa política defende que, apesar de a dívida externa representar um custo médio menor para o país, seu risco é maior e

[...] uma pequena participação dessa dívida na estratégia de longo prazo não significa exposição excessiva a riscos, levando-se em consideração que as reservas internacionais fornecem proteção a esse tipo de dívida. Além disso, os bônus soberanos são importantes para o desenvolvimento da estrutura a termo das taxas de juros brasileira no mercado internacional. (TESOURO NACIONAL, 2010, p. 12).

Portanto, no que tange à composição dos títulos públicos, pode-se assegurar que a gestão da dívida caminha para uma visível melhora. O aumento substancial dos títulos atrelados a índices de preços permite maior projeção e menores incertezas no que concerne ao pagamento dos juros da dívida pública, visto que a variação de índices de preços está altamente correlacionada com a evolução do PIB, além de sinalizar pouca

volatilidade da dívida quando da necessidade de utilização de políticas monetárias. Os títulos prefixados, por sua vez, garantem maior previsibilidade em relação aos custos do financiamento da dívida pública.

Tratando-se do prazo médio de vencimentos dos títulos, não há notável evolução ou retrocesso para 2010, permanecendo estável quanto aos dois anos anteriores, na média de 3,5 anos. A projeção para 2010 é manter o prazo de vencimento no intervalo entre 3,4 e 3,7 anos. Importante ressaltar que, de acordo com o Tesouro Nacional, essas metas foram projetadas baseadas em cenários econômicos desfavoráveis para o Brasil, o que torna crível a possível realização de prazos maiores ao final do período.

É certo afirmar que manter o vencimento dos títulos a médio prazo não é o ideal para uma gestão ótima da dívida pública, porém pode ser considerado um nível bom quando subtende-se que a meta para 2010 é elevar o nível de títulos prefixados, que apresentam por sua natureza prazos médios de vencimento inferior aos demais títulos.

A situação muda quando se analisa o total de títulos vincendo em 12 meses, ou seja, a curto prazo. Apresentando em 2010, tendência de alta em relação aos dois anos anteriores, como demonstra o gráfico 19.

Gráfico 19: Títulos vincendo em 12 meses 2008 - 2010 (%)

FONTE: Tesouro Nacional, 2010. Elaboração própria.

A variação prevista para 2010 é que entre 24% e 28% dos títulos vençam em 12 meses, ou seja, em 2011. É notável a relativa diferença do montante de títulos que apresentaram vencimento a curto prazo em 2009, que segundo o Tesouro Nacional, apresentou valor abaixo da expectativa anteriormente projetada. Para 2009, os títulos vincendo em 12 meses representaram 23,6% do total, ante uma projeção de no mínimo 25% do Tesouro Nacional.

A explicação atribuída por especialistas é que, embora 2009 tenha apresentado uma evolução bastante benéfica no que tange à gestão de prazos da dívida, esse valor é considerado atípico e decorre de um cenário econômico previamente articulado pelo governo. Segundo o Tesouro Nacional, a esse fenômeno atribui-se o nome de “efeito calendário”, pois depende de acontecimentos sazonais previstos em épocas de abalos políticos e econômicos, como o ocorrido em 2009 com a previsão das eleições em 2010. Sendo um ano eleitoral, a estratégia do governo foi de concentrar menor quantidade de títulos com vencimento em 2010 para minimizar os possíveis impactos que uma mudança na direção da política do país poderia provocar, afetando desse modo a estrutura de refinanciamento da dívida.

Assim, fazendo-se um paralelo entre dados apresentados, deduz-se que do montante de títulos com vencimento em 2010 (R$ 372,3 bilhões), 23,6%, ou seja, R$ 87,86 bilhões são advindos de compromissos de curto prazo realizados em 2009. Tratando-se de um ano atípico, visto que o montante de títulos vincendo em 12 meses tende a ser maior que o realizado em 2009, pode-se considerar que o Brasil ainda tem muito a evoluir no que tange à aquisição de compromissos no curto prazo.

Os efeitos decorrentes da estratégia do governo em priorizar a emissão de títulos com vencimentos em anos diversos que não em 2010, fez aumentar o acumulado de títulos com vencimento em 2011. Aí a explicação para o aumento do agregado de títulos vincendo a curto prazo em 2010. Segundo o Tesouro Nacional (2010, p. 24), “dentro da busca pela suavização dos vencimentos, não se verifica concentração elevada em 2012, o que confirma a expectativa de que o percentual vincendo em 12 meses da DPF deverá retornar à sua trajetória de redução ao longo do ano de 2011”.

Desse modo, o governo vem trabalhando para prolongar o prazo de maturação dos títulos públicos, fazendo crível um cenário evolutivo a partir de 2010. É de extrema importância o fato de considerar que os dados relativos a 2010 referem-se somente a projeções, não sendo possível concluir se variações no cenário econômico irão realmente afetar para mais ou para menos os números previstos.

Ainda há de se considerar que o prazo de maturação dos títulos não depende apenas dos prazos de emissão, mas, sobretudo, do tipo e do montante de títulos que compõe a carteira de emissão. Participação maior de títulos públicos com rentabilidade prefixada no cronograma de emissões do Tesouro Nacional faz, por um lado, diminuir gradualmente os riscos da dívida para o setor público, mas por outros, faz também

diminuir o prazo médio de vencimento, visto que os títulos prefixados apresentam prazos de maturação menores que os demais títulos negociados.

Títulos públicos com prazos de vencimento mais longos, quais são os indexados a índices de preços, não apresentam evolução necessária em seu montante para compensar a diminuição ponderada do vencimento causado pelos títulos prefixados, visto que em 2010 a participação de títulos indexados a índices de preço tem previsão de apenas 24% a 28% do total, frente a um mínimo de 31% de prefixados.

O Tesouro Nacional também destaca que, além dos esforços para diminuição dos títulos com vencimento em 12 meses, há forte concentração para redução de títulos com maturação também no médio prazo, entre 1 e 3 anos, acarretando em uma drástica diminuição das perspectivas de riscos e custos do refinanciamento da dívida, caminhando para uma visível melhora de sua gestão.

Assim, analisando-se os dados apresentados é possível deduzir que a gestão da dívida tem apresentado notável melhoria no que tange a seu planejamento, poder de decisão e barganha por parte do governo. Os títulos indexados à taxa básica de juros que no limiar da trajetória da dívida pública foram os grandes responsáveis por sua expansão, já não apresentam nos dias atuais tanta estima. A gradativa troca de títulos mais onerosos para o Estado, como os indexados à Selic, por títulos prefixados, que garantem maior previsibilidade e menor custo para o setor público, tem demonstrado o desenvolvimento e a maturidade dos gestores no trato para com as contas públicas.

O gráfico 20 – desenvolvido pelo Tesouro Nacional – traduz a evolução do poder de barganha e do planejamento ao demonstrar que os títulos mais arriscados para o setor público têm regredido sua participação na certeira de emissões, transparecendo a fixação da confiança dos investidores nacionais e estrangeiros no futuro da política do Brasil.

Gráfico 20: Composição da DPF 2002 – 2010

FONTE: Tesouro Nacional. 2010. Dados secundários.

Apesar de ter apresentado visíveis evoluções nos últimos anos, a gestão ótima da dívida pública não está alcançada. Ainda há muito a ser planejado e realizado. Por essa razão, a próxima seção tem por finalidade apresentar opções de melhorias na administração e composição da dívida pública, buscando a otimização de seu gerenciamento.

Documentos relacionados