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PERFIL DOS USUÁRIOS DO CRÉDITO

No documento 2. IMPERFEIÇÕES DO MERCADO DE CRÉDITO (páginas 26-34)

Nesta seção iremos analisar os principais determinantes para o acesso ao mercado bancário de crédito. O objetivo aqui é identificar fatores que de fato influenciam a probabilidade de um indivíduo tomar empréstimo em banco, considerado aqui o mercado formal de crédito, ou outras formas alternativas, denominadas de informais. Desejamos, portanto, estimar os efeitos de algumas características na probabilidade de um indivíduo pegar empréstimo em banco. Para tanto, utilizamos um modelo de regressão probit, típico modelo de escolha binária, onde a variável dependente assume valor 0 ou 1 em função do indivíduo apresentar uma determinada característica ou não. No nosso caso, a variável dependente assumiu valor 1 se a principal fonte de recursos para obter empréstimo, crédito ou financiamento no período de 01/08/97 a 31/10/97 foi bancos públicos ou privados e 0 para outras fontes de recursos que não este. No fundo o que queremos é encontrar as variáveis que estão relacionadas com a probabilidade da fonte de recursos ter sido o meio bancário.

Fonte de Recursos Freqüência Percentual Acumulado

0 43835 98.04 98.04

1 876 1.96 100.00

Total 44711 100.00

Observando os dados da pesquisa observamos na Tabela 1 que apenas 1,96% da amostra utilizou o meio bancário como principal fonte de recurso. A partir daqui tentaremos identificar os fatores que estão por trás dessa escolha.

De acordo com a literatura econômica dois dos principais problemas ligados às imperfeições no mercado de crédito são o risco moral e seleção adversa. As variáveis independentes do nosso modelo são, portanto, fortemente relacionadas com algumas hipóteses básicas dos principais estudos teóricos sobre mercado de crédito.

A primeira delas está relacionada ao colateral. Para tanto a pesquisa perguntou o valor total dos equipamentos e instalações da unidade econômica. De acordo com a nossa hipótese,

Tabela 1

quanto maior o colateral maior deverá ser a probabilidade da fonte de recursos utilizada ter sido o crédito bancário, já que o colateral diminui os riscos do banco em emprestar uma vez que funcionam como uma garantia ao calote.

A segunda variável independente que usamos foi a receita. Aqui o argumento é parecido com o do caso acima. Espera-se que quanto maior a receita do negócio maior a probabilidade do indivíduo não dar calote, e, portanto, maior a probabilidade do banco estar disposto a emprestar. Para estas duas primeiras variáveis, que são contínuas, aplicamos o seu logaritmo para que a interpretação se desse não no nível, mas na variação percentual. Uma outra vantagem de utilizarmos a forma logarítmica é reduzir a dispersão dos dados diminuindo a sensibilidade dos resultados a outliers.

Introduzimos também variáveis dummies, como a existência de licença municipal ou estadual que permitisse o funcionamento legal da atividade, a assistência técnica, jurídica ou financeira proveniente de algum órgão da administração pública federal, estadual ou municipal ou de instituições especializadas; e também o controle das contas do negócio. Estas três variáveis têm, de alguma forma, alguma relação com o risco que o banco enfrenta ao se deparar com um pedido de empréstimo. O fato, por exemplo, de ter recebido alguma assistência para a realização do negócio pode ser um fator indicativo de que aquele negócio tem mais chances de alcançar sucesso e, portanto, a probabilidade de o tomador não pagar o empréstimo por falta de condições diminui. Assim, podemos esperar que este seja um fator que aumente a probabilidade do indivíduo conseguir tomar empréstimo bancário.

Ainda adicionamos outras duas variáveis que no nosso entender seriam também uma indicação para o banco diferenciar o grupo de baixo risco. Assim, as variáveis dummies para o tipo de clientela e funcionamento durante o ano são esperadas com valores positivos. No segundo caso, por exemplo, o valor “1” ocorre quando o empreendimento funciona normalmente ininterruptamente durante o ano todo e “0” caso o contrário. Essa variável investiga se a atividade desenvolvida é estável ou se caracteriza-se por ser uma atividade sazonal, funcionando sempre nos mesmos meses e deixando de funcionar em outros e, ainda identifica atividades de caráter eventual. O fato de haver uma interrupção da atividade durante o ano pode ser interpretado pelo banco como um indicador de que o negócio é instável e, portanto, seria arriscado realizar o empréstimo.

Abaixo apresentamos os resultados mostrando possíveis explicações dentro da teoria econômica para tentar entendê-los.

Como pode ser visto na tabela XX dos resultados das regressões, os coeficientes relativos ao log do valor de máquinas e equipamentos e log da receita corresponderam ao sinal esperado e foram bastante significativos (ambos a 1%). O aumento de 1% no valor dos equipamentos e instalações aumenta em 10,4% a probabilidade da principal fonte de recursos ser o crédito bancário, enquanto que o aumento de 1% na receita eleva em 16,1% esta probabilidade. Uma decorrência deste resultado é que firmas maiores, com maiores receitas, têm maior probabilidade de tomar empréstimo em bancos. Conforme vimos na introdução à teoria, a principal implicação da obrigatoriedade do colateral é eliminar do mercado formal de crédito os indivíduos que ou não possuem colateral ou o possuem em valor insuficiente. A idéia é que não possuindo este “seguro”, não têm como garantir ao banco que não darão calote.

Para a variável de licença municipal o resultado também foi o esperado. Se a unidade econômica possui licença6 municipal ou estadual para funcionar, então a probabilidade da sua fonte de recursos ser um banco aumenta em 8,5%. O resultado é significante a 5%. Conforme já dito, a regularização do funcionamento de uma atividade pode ser inclusive uma obrigação legal exigida pelo banco para realizar o empréstimo. A posse dessa licença daria maiores garantias e poder de punição ao banco em caso de ações judiciais contra o devedor.

Não tem licença Tem licença Total

Outros 33903 9932 43835

Banco 612 264 876

Total 34515 10196 44711

6 Inclui-se neste quesito, alvarás, licença de localização, etc. e registro como autônomo.

Fonte de Crédito e Licença Municipal/Estadual

Tabela 2

Pela tabela 2, vemos que a proporção de usuários de crédito bancário dentro do grupo que possui licença municipal (2,7%) é superior à proporção dentre o grupo que não possui licença do governo para funcionar (1,8%), Enquanto na amostra inteira atinge apenas 1,96%.

O efeito de ter havido uma assistência técnica jurídica ou financeira é também bastante expressivo e significante. A probabilidade da fonte de recursos ser o crédito bancário aumenta em 56,2% (significante a 1%), em caso do informante ter recebido alguma das três assistências.

A capacitação de certo é entendida pelo banco como uma característica importante do bom pagador. O fato de ter recebido essa capacitação em forma de assistência na visão do banco diminui os riscos do negócio falir e, portanto, reduz a possibilidade de um calote involuntário.

Tipo de Assistência Freqüência Percentual Acumulado

Financeira 390 32.39 32.39

Não recebeu assistência Recebeu assistência Total

Outros 42086 1056 43142

Banco 741 135 876

Total 42827 1191 44018

O resultado para variável que responde se a empresa tem constituição jurídica pode seguir, de certa forma, a mesma interpretação para a licença junto ao município ou estado, e

Tipo de assistência recebida

Fonte de Crédito e assistência

Tabela 3

Tabela 4

diz respeito ao grau de regularização da empresa. Se esta possui constituição jurídica, então a probabilidade de ter recorrido o empréstimo bancário aumenta em 20,3%. Este resultado também é significativo a 1%. Outra possível explicação aqui é que para ter cadastro de pessoa jurídica exige-se uma série de documentos e informações pessoais e do negócio. Quando o banco observa que a empresa tem constituição jurídica, então ela automaticamente observa essa série de informações que, de outra maneira estariam ocultas sem nenhum custo informacional a mais.

Observamos pelas tabelas 5 que a proporção de empresas que utilizam empréstimo bancário como principal fonte de recursos dentre as empresas que têm constituição jurídica é muito superior àquelas que não têm constituição jurídica. Apenas 1% das empresas que não possuem constituição jurídica acessam o mercado bancário, enquanto que esse valor é de 8%

para as que têm alguma constituição jurídica.7

A variável que responde à forma como ocorre o controle das contas do negócio não correspondeu ao resultado esperado. O valor “1” da dummy se referia à resposta em que o entrevistado afirmou não haver qualquer controle das contas do negócio, enquanto o valor “0”

incluía o registro sozinho, o registro com contador e outras forma de registro. O efeito encontrado de uma redução de 0,8% na probabilidade de acessar o crédito bancário, embora tenha aparecido com o sinal esperado é quase insignificante e não significativo. Aqui não há

7 Foram consideradas firmas com constituição jurídica: firmas individuais, sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples, sociedade em comandita por ações, sociedade de capital e indústria, sociedade civil, sociedade por cotas de responsabilidade limitada, cooperativa, e sociedade anônima.

Tabela 5

Fonte de Crédito e Constituição Jurídica

uma única resposta para esse resultado e seria precipitado apontar uma ou outra razão para este resultado. A única certeza é que controlar ou não as contas do negócio não influi na probabilidade de acesso ao mercado bancário de crédito.

Por último, como variável relevante incluímos uma dummy para filiação à sindicato ou órgão de classe da atividade. Temos aqui uma situação bastante interessante, uma vez que foi perguntado na pesquisa o principal motivo para que o dono do negócio tenha se filiado a sindicato, associação ou cooperativa.

Freqüência Percentual Acumulado

Pela tabela 6 acima, vemos que o terceiro motivo (o segundo “espontâneo”) que leva o indivíduo a se filiar a um sindicato ou órgão de classe é facilitar o acesso ao crédito.

Principal razão para filiação a sindicato e órgão de classe

Tabela 6

Como foi dito, a pergunta é interessante porque nos permite comparar o desejo ou a expectativa que a pessoa tem ao tomar tal atitude e o que de fato acontece caso esta opção pela filiação tenha sido feita.

O resultado da regressão, significante a 1% nos mostra que a filiação a estes órgãos aumenta em 12,8% a probabilidade de o indivíduo tomar empréstimo em banco. De fato, o que temos é que pertencer a um sindicato ou associação de classe tem um impacto positivo na facilidade de acesso ao crédito, indo ao encontro das principais razões apontadas pelos proprietários para entrar nesse tipo de organização.

Não Filiado Filiado Total

Outros 37804 5176 42980 Banco 589 285 874

Total 38393 5461 43854

Pela tabela 7 observamos que a proporção de crédito bancário entre os filiados (5,5%) é bem superior à proporção entre os não filiados a nenhum sindicato (1,6%). Este resultado pode estar ligado a questões informacionais, mitigação de riscos, e até aumento de poder de barganha do sindicato junto ao banco. Pode ser que o órgão de classe consiga fechar com algum banco uma linha de crédito especial, com taxas de juros mais baixas baseado no cadastro e informações que este órgão repasse para o banco. Como este, podemos imaginar ainda algumas outras razões e mecanismos de incentivo que impliquem nesse resultado.

Para todas estas variáveis que são relevantes no contexto deste trabalho inserimos variáveis de controle para evitar que possíveis efeitos fossem captados erroneamente, viesados com efeitos dessas outras variáveis. Para tanto, controlamos a regressão para a escolaridade do proprietário, a freqüência de funcionamento da firma, o tipo de clientela, a forma de venda, o número de pessoas ocupadas, a posição na ocupação (se era empregador ou conta própria),

Fonte de Crédito e Filiação a Sindicato ou Órgão de Classe

Tabela 7

para a existência de um ou mais proprietários e para a realização de investimento ou aquisição no período de um ano imediatamente antes.

Pode-se notar olhando a tabela com o resultado das regressões que muitas dessas variáveis são significativas e tem um impacto fortíssimo, como é o caso das variáveis referentes à escolaridade do proprietário. Entretanto, como não estamos testando nenhuma hipótese em relação a elas, não daremos muita importância. Dessa forma conseguimos isolar as hipóteses que estávamos interessados em verificar e conseguimos, através de um experimento empírico, confirmar as premissas básicas introduzidas no segundo capítulo do nosso trabalho.

No documento 2. IMPERFEIÇÕES DO MERCADO DE CRÉDITO (páginas 26-34)

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