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PERFIL DE USUÁRIOS DO UM CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO EM HIV/AIDS DO INTERIOR DA BAHIA.

Plano de estudo apresentado para o Mestrado Profissional em Gestão de Sistemas de Saúde da Universidade Federal da Bahia / Instituto de Saúde Coletiva.

Orientadora: Drª Profª Inês Dourado.

Vitória da Conquista 2009

Introdução

A epidemia do HIV/AIDS se tornou nas duas últimas décadas uma das maiores pandemias da humanidade, em decorrência principalmente da sua magnitude e impacto na morbi- mortalidade (LOBO, 2003). Estimativas globais demonstram que em 2008 o número de pessoas com HIV chegou a 33,4 milhões (UNAIDS, 2009). Embora seja uma doença prevenível e tratável (VITÓRIA, 2007), diariamente 7.394 mil pessoas se infectaram e 5.559 mil morrerão por AIDS no mundo em 2008 (UNAIDS, 2009).

O Brasil, responde por mais de um terço das pessoas vivendo com HIV/aids na América Latina (GERMANO, 2007), com acumulado de 506.499 casos de aids desde o inicio da epidemia até junho de 2008 e com cerca de 30 mil casos novos por ano (BRASILl, 2008) . Além da magnitude, é importante considerar a existência de varias epidemias ocorrendo em paralelo, acometendo segmentos diversos da sociedade brasileira com padrões de disseminação e velocidades variadas (JONATHAN et al. apud PARKER, 2002). Em conseqüência, não existe uma única forma de enfrentá-la em escala global e até mesmo entre regiões próximas (OMS, 2007).

Com a universalidade da cobertura dos serviços de saúde no SUS e diante da complexidade do HIV/AIDS, a oferta sorológica para o diagnóstico precoce é considerada uma das mais importantes estratégias no seu enfrentamento. Por este motivo, o Departamento de DST, AIDS e Hepatites Virais (D-DST/AIDS e HV), desde o final da década de 80, optou por implantar uma rede de Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA). Em 1999 foi implantado um CTA de grande porte (1.000 testes/mês) no interior da Bahia, que atende não somente a população deste município como da região circunvizinha.

Estudo feito por Granjeiro et al., (2007) com 383 CTA em todo o Brasil, demonstrou que esse serviço desempenha um importante papel na promoção do acesso ao diagnóstico da infecção pelo HIV e das ações de prevenção. Porém, ressalva que o seu potencial para promover a eqüidade tem sido limitado pelo não atendimento sistemático as populações mais vulneráveis, uma vez que 92% dos CTA analisados não atendem a esse grupo de forma prioritária. Realidade presente em estudo feito em 14 CTA de Santa Catarina que demonstrou que em relação ao recorte populacional, fazem parte da população geral quase à totalidade das mulheres e maioria dos homens (SCHNEIDER et al., 2008). Ao avaliar mudanças no âmbito da testagem anti-HIV no Brasil entre 1998 e 2005, estudo demonstra que houve uma expansão desigual na testagem, atingindo principalmente mulheres em idade reprodutiva (FRANÇA JÚNIO & CALAZANS & ZUCCHI et al., 2005), populações consideradas de menor vulnerabilidade.

No início dos anos 2000, o CTA passa a ser visto também, como local estratégico para produzir conhecimentos sobre tendências da epidemia. Em 2001, iniciou-se a implantação de um Sistema de Informação no CTA (SI-CTA) que entre os principais objetivos estão: facilitar e organizar o processo de trabalho, produzir indicadores para avaliação do serviço e perfil de demanda, compor o sistema de vigilância epidemiológica do HIV e propiciar a realização de investigações científicas (BRASIL, 2002). No entanto, o uso deste banco para o reconhecimento da população atendida, assim como a caracterização do portador de HIV/AIDS testados é incipiente. No CTA em estudo, embora o SI-CTA tenha sido implantado em 2003, o seu banco nunca havia sido analisado.

É interesse da pesquisadora caracterizar o perfil epidemiológico dos usuários do CTA segundo variáveis programáticas, sócio-demográficas, comportamentais e de status da sorologia para o HIV/aids, disponíveis na base de dados de 2004 a 2007, Investigar o nível de escolaridade

e gênero, entre os usuários testados e positivos para HIV no CTA em estudo, buscando verificar uma possível pauperização e feminização da Aids de 2004 a 2007, e descrever o CTA segundo características estruturais, operacionais e organizacionais. Os achados permitirão um melhor planejamento das ações de promoção da saúde e prevenção das DST/HIV/AIDS com foco nos grupos de maior vulnerabilidade no município e na região.

Revisão de Literatura

Vigilância epidemiológica do HIV/Aids no Brasil

Um sistema de Vigilância Epidemiológica precisa responder à complexidade dos agravos que busca conhecer, desenvolvendo novos modelos, que não sejam baseados exclusivamente na notificação de casos que representam apenas eventos ocorridos anos antes. No Brasil constam na lista de agravos e doenças de notificação compulsória do Ministério da Saúde (MS), os casos de Aids e de HIV em gestante e em crianças menores de 14 anos. Estes casos são notificados, investigados e lançados no Sistema de Notificação Compulsória (SINAN) que se constitui no mais importante banco de dados para a vigilância epidemiológica da Aids no país. No entanto, vale ressaltar que o perfil epidemiológico apresentado pelos casos deste sistema, reflete um padrão de transmissão do vírus de 5 a 10 anos atrás (SANTOS et al., 2002).

Outra questão a ser considerada é o atraso na notificação e a subnotificação, muito freqüente em nosso meio (BASTOS & BARCELOS, 1995). O D-DST/Aids e HV comparou os dados do SINAN relacionados aos casos de AIDS, a partir do cruzamento das bases de dados do

Sistema de Informação de Exames Laboratoriais (SISCEL) e do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM). A análise demonstrou a ausência no SINAN, de 73.609 casos de 1980 a junho de 2008, o que aponta para um número elevado de subnotificação com importantes variações em cada região do país. Do total de casos não notificados 28% ocorreram na região norte, 20% no nordeste, 17% centro-oeste, 15% sul, e 12% na região sudeste. (BRASIL, 2008).

Portanto, apesar do reconhecimento da importância do SINAN, a mensuração do comportamento de risco para dar o sinal de alerta quanto à disseminação do HIV acontece tardiamente, tornando-se difícil explicar as modificações na magnitude da infecção pelo HIV na atualidade (SANTOS et al., 2002). Outro problema freqüentemente encontrado é o preenchimento inadequado dos campos contidos nas fichas de investigação assim como a falta de variáveis sócio-econômicas, com exceção do grau de escolaridade, sendo inclusive proposto por alguns pesquisadores a sua revisão (PARKER & CAMARGO, 2000).

Uma possibilidade para melhorar a Vigilância Epidemiológica do HIV/AIDS, discutida por vários autores, é integrar a base de dados dos diferentes sistemas de informação existentes. Utilizando o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e do SINAN é possível caracterizar o grupo de portadores para saber onde a epidemia esteve; através do SISCEL (Sistema de Informação de Exames Laboratoriais) e do SICLOM (Sistema de Controle Logístico de Medicamentos), há uma compreensão dos portadores de AIDS na atualidade e a Vigilância do HIV caracteriza os rumos da epidemia (BRASIL, 2007). Esta última análise é de extrema necessidade para que os gestores programem estratégias de enfrentamento focadas no grupo que demonstra maior “vulnerabilidade” ao vírus HIV em cada região.

Perfil epidemiológico do HIV/AIDS no mundo

Segundo relatório da UNAIDS sobre a situação da epidemia da Aids em 2008 as novas infecções pelo HIV reduziram 17% nos últimos oito anos. Mesmo com esta redução, a prevalência global da infecção permanece no mesmo nível. Fato justificado pelo aumento no número absoluto de casos em decorrência da soma das novas infecções com o maior tempo de sobrevida das antigas, além do crescimento da população mundial. O número de pessoas vivendo com HIV chegaram a estimados 33,4 milhões (UNAIDS, 2009).

Após duas décadas de luta contra a AIDS, esta pandemia segue se constituindo em um dos desafios mais importantes para a saúde pública mundial. Globalmente, existem dois padrões principais de disseminação: um caracterizado por uma epidemia generalizada entre as populações da África Sub-Saahariana, com prevalência do HIV em indivíduos de 15 a 49 anos de 5%, os quais em oitos países esta taxa ultrapassa 15%; o outro padrão caracteriza o resto do mundo onde a epidemia concentra-se principalmente entre as populações de maior risco, quais sejam os HSH, UDI, trabalhadores do sexo e seus parceiros sexuais (UNAIDS, 2009).

O impacto dessa epidemia já foi comparado com o impacto social, econômico e político do fenômeno da Peste Negra na Europa no séc. XIV como o que está acontecendo na África nos séculos XX e XXI. Ao analisar, por exemplo, o impacto na expectativa de vida, em muitos dos países deste continente, houve de 20 a 30 anos de redução num período relativamente curto de 5 anos. Outra realidade é a redução drástica em alguns países na disponibilidade de mão-de-obra para a principal atividade econômica (agricultura), apontando para uma perda significativa da força de trabalho em diversas nações africanas (VITÓRIA, 2007). Esta situação empobrece ainda mais a população, tornando-os cada vez mais vulneráveis a esta e outras epidemias.

É marcante o crescimento do número de novas infecções entre jovens. Pessoas entre 15 e 24 anos respondem por 40% das novas infecções em 2008. A Rússia, situada numa região com um dos mais altos índices de expansão da epidemia, 80% das pessoas que vivem com HIV têm menos de 30 anos. Dos diagnósticos positivos no mundo, 37,2 milhões são adultos, 17,7 milhões representam mulheres (maior número até hoje reportado) e 2,3 milhões referem-se a crianças com menos de 15 anos (UNAIDS, 2007).

As mortes por AIDS somam 2,9 milhões: 2,6 milhões são adultos e 380 mil, crianças (ONUSIDA, 2007). Outro dado alarmante que surge em decorrência desta pandemia é a tendência crescente em diversos países da orfandade, com previsão de 20 milhões de órfãos por causa da Aids nos próximos 3 ou 4 anos (VITÓRIA, 2007).

Além do continente africano, existem outras regiões a exemplo da América Latina, onde há países com situação preocupante. Na região do Caribe, existem cerca de 250 mil pessoas vivendo com HIV/AIDS e com 27 mil infecções novas em 2006. Na América Latina existem 1,6 milhões de pessoas com o vírus, cerca de 100 mil casos novos e 58 mil mortes em 2007, sendo que o uso de drogas injetáveis e sexo entre homens sem preservativo são as causas mais importantes de novas infecções (ONUSIDA, 2007). Sexo sem proteção entre homens também é um fator importante nas epidemias da Bolívia, Chile, Equador e Peru na América do Sul, bem como em vários países na América Central, incluindo El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua e Panamá. Mais recentemente, o sexo desprotegido entre heterossexuais tem se tornado a principal via de transmissão do HIV na Argentina (Lopes, 2007 apud ONUSIDA, 2007). Nos EUA a epidemia predomina no sexo masculino, com 74% dos casos. Em relação aos casos novos, 53% ocorreram em HSH, 32% em heterossexual e 18% em UDI. Nesse país, a participação da raça negra na epidemia é significativa: enquanto a população americana é constituída por 13% de negros, eles são responsáveis por 48% dos novos casos de HIV/AIDS.

Perfil epidemiológico do HIV/AIDS no Brasil

Do total de casos registrados no país de 1980 a junho de 2008, 60% se concentram na região Sudeste, 19% na região Sul, 12% no Nordeste, 6% no Centro-oeste e 4% no Norte (BRASIL, 2008). Embora a epidemia tenha se espalhado por todo território nacional (FONSECA et al., 2000) onde pelo menos 85% dos municípios apresentam no mínimo um caso notificado da doença, as maiores taxas de incidência ainda estão na região Sul (BRASIL, 2007). Além disso, é importante considerar diferenças regionais importantes na dinâmica de transmissão do HIV/Aids. Parker e Camargo (2000) afirmam:

[...] o Brasil, país de dimensões continentais com importantes disparidades sociais, econômicas e demográficas em sua população. É de esperar, portanto, que tais disparidades - e os vários Brasis que elas delimitam - reflitam-se também na forma como o HIV se propaga em nossa população. Dito de outra forma, estas diferentes características conformariam populações diferentes, ainda que em mesmo território, com variações quanto à probabilidade de que seus componentes viessem a infectar-se pelo HIV, configurando, portanto, diferentes vulnerabilidades à infecção pelo HIV e, por conseguinte, à AIDS.( p.55) Em 2007, foram identificados no banco de dados relacionado (SINAN, SICLON, SICEL e SIM) 35.965 casos novos de Aids, o que representa uma taxa de incidência de 19,5/100.000 hab. Considerando apenas o SINAN, existe uma diferença de 6,7/100.000 hab. entre os dois bancos. A taxa de incidência em cada região do país demonstra diferenças significativas, o Sul do país registrou 27,6/100.000 hab., seguido do Sudeste com 19,1/100.000 hab. e Centro-oeste 15,1/100.000 hab., a região Norte ficou com 15,2/100.000 hab. e a região Nordeste que embora tenha a menor taxa de incidência neste ano 10,8/100.000 hab., mantém com uma curva crescente de novos casos de AIDS assim como a região Norte.

O estado da Bahia, com 9,2/100.000 hab., ocupa o 8º lugar em casos novos registrado no Nordeste, Pernambuco está em 1º com 15,9/100.000 hab. seguido de Sergipe com 11,2/100.000 hab. e o Rio Grande do Norte com 9,0/100.000 hab. (BRASIL, 2007). Estes dados reafirmam que o processo de transmissão da epidemia é caracterizado por intensidade e velocidade bastante desigual nas diferentes regiões do país.

O Relatório da UNAIDS de 2006 indica que as pessoas que vivem na pobreza e com baixo índice de educação formal são as mais vulneráveis ao HIV no Brasil, além disso, destaca o número crescente de mulheres infectadas no país. Fonseca et al., (2000), ao avaliar a evolução temporal dos casos de Aids com base na variável nível de escolaridade, concluiu que no Brasil, a epidemia se iniciou nos estratos sociais de maior escolaridade, com progressiva disseminação para os estratos sociais de menor escolaridade. Ainda sobre isso, este mesmo autor afirma:

[...] é notório que a epidemia de AIDS vem atingindo paulatinamente populações em desvantagem sócio-econômica. Em um país marcado pelas diferenças sociais, o risco crescente de pessoas pertencentes aos segmentos populacionais menos favorecidos ante o HIV/AIDS certamente lança novos desafios à sociedade e aos profissionais engajados no controle da doença [...].(p.12)

Esta autora, em estudo mais recente sobre a distribuição social da AIDS no país, confirmou a progressiva mudança no gradiente social da epidemia, com maior velocidade de disseminação nas populações de menor status sócio-econômico. Evidenciou ainda o aumento das taxas de incidência da AIDS entre indivíduos desempregados e entre trabalhadores cuja categoria de atividade foi definida como “manual” a exemplo de trabalhadores rurais, do comércio ambulante etc. Estes dados revelam que a epidemia vem afetando progressivamente indivíduos em posição desvantajosa em relação ao mercado de trabalho, que normalmente são trabalhadores com um nível educacional mais baixo e com rendimentos menores. Em estudo feito sobre

escolaridade e a infecção pelo HIV em um CTA na Bahia, Jesus (2006) também confirmam que o nível de escolaridade mais baixo encontra-se associado à infecção pelo HIV entre os usuários pesquisados.

No Brasil, esse processo de pauperização da epidemia aconteceu de forma paralela com a feminização, ou seja, o aumento do número de casos em grupos populacionais mais pobres acompanha a expansão de casos em mulheres. Este aspecto é relevante considerando principalmente a intensa diversidade e desigualdade presente no país (TOMAZELLI et al., 2001).

De 1980 até junho de 2008 foram identificados 333.485 casos de Aids no sexo masculino (65,8%) e 172.995 no sexo feminino (BRASIL, 2008). Mantendo assim a tendência de diminuição sistemática da razão de sexo, passando de 125 homens para 1 mulher em 1984 e 1,5 homens para 1 mulher em 2006. Este mesmo boletim demonstra que na faixa etária de 13 a 19 anos, há uma clara inversão na razão dos sexos a partir de 1998 com redução entre os casos masculinos de 13 a 34 anos, e um ligeiro crescimento entre os casos femininos.

A progressão da epidemia para o sexo feminino, inicialmente foi justificada por estudiosos como Castilho & Chequer(1997) como uma conseqüência do aumento do número de casos em mulheres na categoria UDI. A CN-DST/AIDS em 1999 publicou que dentre o total de casos de AIDS diagnosticados em mulheres, 36% foram decorrentes do uso de drogas injetáveis usadas por elas ou por seus companheiros. No entanto, Parker & Camargo (2000) ao analisarem os anos de 1998/1999, identificaram que 63,7% dos casos notificados de AIDS em mulheres, foram entre aquelas que referiram ter se contaminado através da relação sexual e apenas 8,8%, por meio do uso de drogas injetáveis. Para Tomazelli et al. (2001) as divergências na interpretação são muitas vezes decorrentes da complexidade da epidemia e dos comportamentos envolvidos na sua transmissão, que gera muitas vezes uma superposição de categorias de

exposição. Em 2005, 94,5% dos casos registrados de HIV/Aids em mulheres foram classificados na categoria de transmissão sexual e apenas 3,8% como UDI, reafirmando os achados de Parker & Camargo (2000) e Szwarcwald et al. (2001) que atribuem esta mudança no perfil epidemiológico ao processo de heterossexualização.

Um dos fatores que contribui para a maior vulnerabilidade da mulher ao HIV é o fator biológico (BASTOS & SZWARCWALD, 2000). Primeiro porque a superfície da mucosa vaginal exposta ao sêmen é extensa e o sêmen tem maior concentração de HIV do que do líquido vaginal; segundo porque as DST’s são mais freqüentes, de formas assintomáticas na mulher, causando micro lesões imperceptíveis, que fragilizam a barreira de proteção ao HIV. Esta situação se agrava nas mulheres mais jovens, nas quais a imaturidade do aparelho genital determina fragilidade adicional frente a esta infecção (COLL et al., 1999 apud BASTOS & SZWARCWALD, 2000).

Os dados epidemiológicos já demonstram há algum tempo, um maior número de casos de HIV entre mulheres jovens e adolescentes do que entre homens na mesma idade (BRASIL, 2007). No entanto, não é possível atribuir esse acontecimento tão somente às questões biológicas, mas principalmente ao fato das jovens assumirem um comportamento sexual de maior risco (TOMAZELLI et al., 2001). Bastos & Barcelos, 1995 & Szwarcwald (2000) afirmam que as “regras” de pareamento entre os gêneros de óbvia determinação sócio-econômica e cultural fazem com que mulheres mais jovens mantenham freqüentemente relações sexuais com homens mais velhos, que apresentam nível de infecção pelo HIV mais alto, ampliando desta forma o risco de se infectarem.

Para Takahashi et al., (1998), diante da epidemia da AIDS, ser mulher implica em especificidades que representa situação de especial susceptibilidade em relação ao homem. Não

apenas por uma questão anatômica, mas também por questões de gênero que permeiam o ser e o viver das mulheres na nossa realidade social que interferem inclusive na sua forma de vivenciar o processo saúde-doença, implicando em susceptibilidade especial frente a esta epidemia (GUIMARÃES, 1998 apud TAKAHASHI et al., 1998).

Para Bastos & Barcelos, 1995 e Szwarcwald (2000) mais importante que a vulnerabilidade biológica e epidemiológica está a desigualdade de gênero:

[...] mas a questão central aqui é que os dois gêneros, a despeito de inúmeras iniciativas, são tratados desigualmente em termos políticos, culturais e sócio-econômicos. Estes eixos de desigualdade apresentam simultaneamente dimensão macro e micro social, ou seja, a observância ou não dos direitos, as relações desiguais de poder e o acesso diferenciado a bens materiais e simbólicos [...].(p.9)

Em pesquisa sobre a distribuição social da AIDS no Brasil, Fonseca et al. (2003) encontrou entre as mulheres um incremento anual em quase todas as categorias ocupacionais de 1987 a 1998. Esta mesma pesquisadora, em 2001 ao estudar o avanço da AIDS relacionando a escolaridade, evidenciou que entre as mulheres, a epidemia iniciou e cresceu entre aquelas com menor escolaridade.

Se por um lado, as questões anatômicas e de gênero contribuem para uma maior vulnerabilidade da mulher ao HIV, por outro, a forma com que os serviços de saúde se posicionaram frente a esta epidemia também favoreceu o aumento desta vulnerabilidade. O Programa Nacional de HIV/Aids, durante muito tempo voltou o “olhar” para os homens. Embora, as mudanças no perfil da epidemia, indicando um incremento dos casos em mulheres, se fizeram notar desde 1986, somente em 1990 setores responsáveis reconheceram esta nova dinâmica. Outro evento que confirma a ausência de campanhas e ações de diagnóstico e tratamento voltados para as mulheres é o fato de a soropositividade ser detectada, na maioria das vezes apenas quando

grávidas, quando ocorre morte ou adoecimento dos filhos / companheiros e ou quando elas adoecem já com quadro de imunodepressão (TOMAZELLI et al., 2001).

O aumento de casos em mulheres traz como conseqüência, um maior número de casos em crianças pela Transmissão Vertical (SANTOS et al., 2002), apontado por alguns autores como uma das conseqüências mais perniciosas da disseminação do HIV entre as mulheres. No Brasil, de 1980 a junho de 2008 houve 11.796 casos de Transmissão Vertical. Em 2006, com 561 casos a taxa foi de 3,1/100.000 hab., sendo os maiores índices registrados na região sul 5,7, seguidos de 3,3 na região sudeste, 2,9 na Norte, 2,3 na Centro-oeste e o menor índice no Nordeste com 2,0.

Verificam-se, em ambos os sexos, um aumento proporcional nos casos de Aids na

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