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Perguntas e respostas

No documento a Interpretacao Dos Contos de Fada (páginas 177-183)

Pergunta: Qual o modelo que um autor de literatura de contos de fada,

como Andersen, segue?

Dra. uon Franz: Bem, Andersen certamente é um grande poeta, porém,

na minha opinião, bastante neurótico. E eu não consigo ler suas histórias porque a neurose dele me perturba tanto que é como uma faca raspando no prato. Eu sou sensível às suas colocações mórbidas e sentimentais. Sua neurose principal não é um problema dele somente, mas de toda a Escandinávia: um terrível problema quanto a sexo, decorrente de uma proibição cristã, rígida e imposta, havendo subjacente um temperamento

pagão bastante selvagem. Esta é uma tensão encontrada em todos os países nórdicos e Andersen teve essa neurose coletiva de uma forma extensa e extrema. Ele nunca se casou e nunca foi capaz de tocar uma mulher. Ele morreu virgem, mas estava tão tomado de fantasias sexuais que quase enlouqueceu e no seu leito de morte praguejou e discursou obscenidades. Pode-se mesmo dizer que, na medida em que seu conflito não era só pessoal mas de toda uma coletividade do Norte, os seus contos de fada, então, tiveram o sucesso que se sabe. Sua neurose era um problema coletivo que ele sentiu com grande dor e de um modo muito mais profundo que a maioria das pessoas, pois era uma pessoa muito sensível. Seus contos de fada podem se tornar presentes na consciência coletiva numa determinada época e podem ser, então, recontados, por todo mundo; ou pode ser que nada disso ocorra, pois o seu conteúdo é muito específico.

Eu creio que um contador de histórias pode expressar um problema que é comum às pessoas e isso pode se tornar um conto de fada; mas se as histórias são muito impregnadas pela neurose pessoal do autor, elas não se tornarão populares: as pessoas sadias não as aceitariam.

Comentário: Com relação às discordâncias dos intelectuais que dizem

que a psicologia junguiana não é "científica", a ideia prevalecente é que a ciência precisa ser universal e, enquanto se considera o tom emocional e pessoal do indivíduo, o que se faz não é ciência, mas arte; desta forma, parece- me que a psicologia junguiana é uma ciência e uma arte.

Dra. von Franz: Sim, você tem razão. O que se tem a acrescentar a isso é

que uma emoção não é necessariamente não universal, se considerarmos a hipótese do arquétipo. Se eu tenho uma emoção pessoal que surgiu através de uma constelação arquetípica, então ela é, também, uma emoção universal. Dessa forma, os cientistas erram quando identificam sentimento e emoção como puramente subjetivos. Eu mesma posso ter uma forte emoção pessoal que é uma emoção arquetípica. Muitas pessoas podem ter essa emoção e, nesse sentido, ela é universal.

Pergunta: Em outras palavras, quando as pessoas apresentam um sonho

arquetípico, o analista experienciado será capaz de levantar materiais análogos?

Dra. von Franz: Sim. Algumas pessoas podem chegar a um estado de

engolfadas por um sonho terrível ou por um sincronismo de eventos: ela conta um drama pessoal inesquecível que pode afetar toda a análise, para melhor ou para pior. Mas o analista, conhecendo o material comparativo, pode notar algo de universal e ver, então, que aquilo não é algo puramente subjetivo. Há uma universalidade da emoção, uma universalidade de reações afetivas que devem ser levadas em consideração. Tem-se que aprender, aos poucos, a diferenciar entre o que se chama de sentimentos condicionados e pessoais e as reações afetivas gerais.

Digamos, por exemplo, que eu tenho um complexo maternal negativo e que reajo de maneira muito violenta diante de um tema mitológico sobre a mãe terrível. Todo mundo pode dizer, com razoável propriedade: "Oh! Sim, nós sabemos por quê! "Mas, apesar disso, o tema é também arquetípico, e mesmo as pessoas que não têm um complexo maternal negativo reagem de forma semelhante. Então, se eu me conheço através da análise, eu posso dizer: "Agora minha reação é neurótica e pessoal; eu passei por uma experiência pessoal que me marcou e que me fez neurótico, mas essa é também uma reação humana". Na verdade, então, somente quando um indivíduo passou por uma análise e tornou-se consciente (o quanto possível) das diferentes nuanças de suas reações é que ele é capaz de diferenciar os sentimentos e saber quando a emoção sentida é puramente pessoal e quando é universalmente válida. Embora o indivíduo possa estar mais fortemente afetado por sua história pessoal, a sua reação é humana e universal e assim deve ser considerada, e não somente como algo subjetivo. Alguns intelectuais chamam toda emoção e sentimento de subjetividade não-científica.

Pergunta: Se eu bem a compreendi, a senhora inclui Erich Fromm entre o

grupo de intelectuais? (Veja cap. 1, p.18.)

Dra. von Franz: Ele não pertence ao mesmo grupo de Graves e Eliade e

dos editores das revistas Antaios e Symbolon, mas algumas de suas interpretações seguem o mesmo caminho intelectual de identificar tudo com tudo, dessa forma caindo na mesma armadilha. Eu não o conheço, mas ele me parece ser um tipo intelectual intuitivo e ampliar seu material de maneira excessiva, como também faz Robert Graves. Toda a imagem arquetípica é o centro de uma rede de conexões. Intelectualmente, pode-se fazer conexões sem fim, mas com a ajuda da função-sentimento pode-se escolher aquilo que é pertinente e deixar de lado o que não estiver tão próximo. Quando se tem

2.000 ampliações, é necessário que se escolha, com a ajuda do sentimento, quais os temas que se sente mais próximos ou melhores, os que mais escla- recem o contexto do conto de fada. Isso não pode ser feito sem sentimento porque não há regras intelectuais para isso. De 2.000 lobos encontrados para ampliar um conto de fada, eu não lhes poderia dar uma regra intelectual que dissesse qual lobo deve ser considerado e qual deverá aparecer somente em nota de rodapé.

Comentário: Eu acho difícil reconciliar esse ponto de vista com o que eu

conheço de Erich Fromm e de seu interesse no amor na relação terapêutica.

Dra. von Franz: Bem, ocorre que as pessoas que enfatizam tanto a arte

de amar geralmente enfatizam algo que é auto-evidente para outras pessoas. Existe toda uma escola nos Estados Unidos e existem psiquiatras americanos como Sullivan e Rosen, por exemplo, que dão ênfase muito grande ao rapport, dizendo que não pode haver terapia sem amor. Isso, na verdade, é um movimento compensatório, pois, por um tempo, os terapeutas tentaram manter-se dentro dos seus aventais brancos, distantes dos seus pacientes. Nosso ponto de vista é que se você não é capaz de gostar de um paciente, você não lhe deveria conceder sequer uma hora. O Dr. Jung sempre dizia que se ele não conseguisse gostar de um paciente, ao menos em alguns aspectos (ainda que não gostasse de outros), ele nunca o aceitaria para análise. Se você não tiver amor, nada pode acontecer. Para nós isso é auto-evidente, e soa muito estranho quando as pessoas começam a repetir isso tantas vezes, escrevendo livros e livros sobre o assunto. A seguir, eles irão escrever livros sobre a necessidade do sono ou que comer é algo extremamente importante; ou mesmo, que se deve assoar o nariz (ainda que seja um terapeuta), e que uma análise pode ser toda comprometida se assim não se fizer e o nariz começar a escorrer; e ter essa coragem ética é existencialmente essencial!

Pergunta: A senhora sempre tem sonhos que a ajudam numa

interpretação?

Dra. von Franz: Somente se eu não compreendi suficientemente um

conto; então os sonhos emergem. Tome um conto de fada e tente, e você verá. Eu nunca vi ninguém que interpretasse um conto de fada com uma certa paixão sem que seu inconsciente reagisse. Por alguma razão, o inconsciente é bastante ávido em se tratando de interpretação de mitos; é que os mitos fazem cócegas no inconsciente.

Pergunta: Mas o sonho demoraria muito para aparecer?

Dra. von Franz: Não tanto, segundo minhas observações; mas eu não

posso propor uma regra absoluta. Pode-se dizer que usualmente ocorre uma perturbação emocional no inconsciente e, se você sair da trilha, terá reações curiosas advindas do inconsciente.

Pergunta: E essas são sempre confiáveis?

Dra. von Franz: Sim, eu sempre confio nelas. Eu não conheço nada

melhor. Desde que não haja nenhum critério absoluto de prova, o melhor que se pode fazer é dizer que a interpretação me é satisfatória, que me faz feliz e saudável, e se meu inconsciente não tem nada mais a dizer, então isso é tudo que posso fazer. Mas, naturalmente, esta não é nunca a última palavra.

ÍNDICE

Introdução à coleção "Amor e Psique" Primeira parte

Uma Introdução à psicologia dos contos de fada 1. Teorias dos contos de fada

2. Contos de fada, mitos e outras histórias arquetípicas 3. Um método de interpretação psicológica

4. A interpretação de um conto: "As três penas" 5. "As três penas" (Continuação)

6. "As três penas" (Conclusão) Segunda parte

7. Sombra, anima e animus nos contos de fada Terceira parte

8. Bibliografia adicional 9. Perguntas e respostas

Esta obra foi digitalizada e revisada pelo grupo Digital Source para proporcionar, de

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maneira totalmente gratuita, o benefício de sua leitura àqueles que não podem

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comprá-la ou àqueles que necessitam de meios eletrônicos para ler. Dessa forma, a

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venda deste e-book ou até mesmo a sua troca por qualquer contraprestação é

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totalmente condenável em qualquer circunstância. A generosidade e a humildade é a

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marca da distribuição, portanto distribua este livro livremente.

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Após sua leitura considere seriamente a possibilidade de adquirir o original, pois assim

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você estará incentivando o autor e a publicação de novas obras.

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Se quiser outros títulos nos procure:

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