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LISTA DE TABELAS

2.2 Perspectivas de Autores Relevantes

Este tópico estrutura-se na produção de quatro autores entendidos como basilares para a tese, Jane Jacobs (1916-2006), Jan Gehl (1936), Cristopher Alexander (1936) e Nikos Salingaros (1952). Em abordagens que ora se aproximam, ora se afastam, os quatro expõem de que maneira uma adequada leitura do espaço construído pode ser reputada como a matriz para o sucesso ou insucesso de propostas de intervenção na cidade, a afetar diretamente as dinâmicas de deslocamentos.

2.2.1 Jacobs

A jornalista norte-americana Jane Jacobs, ainda no início da década de 60, decidiu publicar o registro de suas sensações acerca das cidades dos EUA no clássico Death and life in big american cities. O incômodo que sentia baseava-se na necessidade de arquitetos, urbanista e planejadores urbanos terem mais ciência a respeito de que componentes tornavam uma cidade mais viva, o que requeria a compreensão das articulações inerentes ao espaço urbano. Jacobs (2001) formulou quatro condições que acreditava serem essenciais para que houvesse diversidade ‘exuberante’ nas ruas em espaços públicos urbanos, o que favorecia seu uso, portanto gerando fluxos e segurança.

1. Necessidade de usos principais combinados – diversidade de usos

A autora acreditava que “o total absoluto de pessoas que utilizam as ruas e a maneira como elas se distribuem ao longo do dia são coisas distintas”. Pode haver grande movimento em determinado espaço, em apenas um momento do dia, por exemplo, o que implicaria ociosidade em algumas horas. Um centro comercial que apenas funciona no horário comercial promove um conjunto de espaços completamente vazios à noite, ou com a presença de usos escusos. Não é esta distribuição temporal de atividades que se deseja para uma cidade.

19 Portanto, para Jacobs (2001), “as misturas dos usos principais devem ser eficientes para gerar a diversidade” ao longo de períodos de tempos mais extensos. O aspecto evitaria a impressão de áreas mortas, que se tornam onerosas economicamente e socialmente, a contar os tipos de atividades que ali podem se desenvolver. Além disso, a autora acrescenta que essa diversidade deve dizer respeito às mesmas ruas, ou seja, devem existir caminhos que atraiam todo o tipo de gente, não se setorizando ou formando guetos. É o contato com a diferença que torna inclusive a cidade rica e propícia à experiência urbana mais completa. Além disso, para a vivacidade dos espaços urbanos, a autora acredita que deve haver diversidade comercial, desde grandes redes de lojas até a ‘mercearia da esquina’, pois deste modo, a atração de pessoas se dará por meio de seus distintos interesses, e, portanto, “distintas pessoas – em termos de idade, classe social, nível de escolaridade, etc.”

2. Necessidade de quadras curtas – maior conectividade entre os espaços

No que diz respeito às relações entre macroparcelas, microparcelas e sistema de vias, Jacobs (2001) observa as desvantagens existentes no predomínio de quadras longas, uma vez que esta composição acentua o isolamento da vizinhança, e tornando os caminhos mais longos.

A autora acredita que, por essência, as quadras longas tornam inativas as vantagens potenciais que as cidades propiciam de gerar movimento em intensidade e diversidade.

Por natureza, as quadras longas neutralizam as vantagens potenciais que as cidades propiciam à incubação, à experimentação e a numerosos empreendimentos pequenos ou específicos, na medida em que estes precisam de cruzamentos muito maiores de pedestres para atrair fregueses ou clientes. As quadras longas também frustram a tese de que, se se espera que as misturas de usos urbanos sejam mais do que uma abstração nas plantas, elas devem provocar a presença de pessoas diferentes, com propósitos diferentes, em horários distintos, mas usando as mesmas ruas. (Jacobs, 2001, pp. 202).

Grosso modo, na escolha de um local para iniciar um negócio, mesmo que pequeno, o comerciante vai escolher aquele que seja o mais visível possível, em que essa visibilidade é produto do conjunto de trajetos existentes naquele entorno imediato. Numa perspectiva em planta, o aspecto pode ser traduzido por maior possibilidade de caminhos que observem/alcancem o local – nas palavras de Hillier (1984), potencialidade de movimento –, ou seja, maior conectividade visual voltada ao pedestre.

20 A Figura 2.1 demonstra o quanto o tamanho de um quarteirão pode afetar as possibilidades de caminhos a serem utilizados para gerar mais movimento de e para um determinado espaço. Quarteirões menores tornam a malha mais articulada, o que fornece maior número de percursos para os deslocamentos, sejam de pedestres ou veículos.

Figura 2.1 – Possibilidades de caminhos (menores distâncias) em quadras longas (A) e em quadras curtas (B) da origem ao destino (comércio)

Fonte: Adaptado de Jacobs (2001).

Portanto, como afirma a autora, uma maior quantidade de vias e a existência de “quadras curtas são valiosas por proporcionar uma rede de usos combinados e complexos entre os usuários do bairro”, o que fomenta a vivacidade do espaço, tornando-o mais seguro e convidativo.

Jacobs (2001) complementa que a relação entre a atração de distintas pessoas com a geração da diversidade é recíproca, ao afirmar que:

Como as combinações de usos principais, as ruas frequentes efetivamente ajudam a gerar diversidade só pela maneira como atuam. O modo como funcionam (atraindo para si misturas de usuários) e os resultados que elas proporcionam (o crescimento da diversidade) estão intimamente relacionados (Jacobs, 2001, pp. 206).

Em uma perspectiva crítica, Jacobs questiona o papel do urbanismo moderno, ao aparentemente desaprender com a cidade tradicional, talvez na ânsia de produzir algo novo, ainda que equivocado. Ela critica a repetição do erro com a implantação de cidades com base modernista e deixando de lado as cidades pré-modernistas, ao dizer que: “a pseudociência do urbanismo beira a neurose em sua determinação de reproduzir o fracasso empírico e ignorar o sucesso empírico”.

21 Sobre a idade dos edifícios, Jane Jacobs declara que talvez seja impossível existirem ruas vivas sem a presença de prédios antigos:

Ao falar de prédios antigos, refiro-me não aos edifícios que sejam peças de museu, nem aos prédios antigos que passaram por reformas excelentes e dispendiosas – embora esses sejam ótimos ingredientes –, mas a uma boa porção de prédios antigos simples, comuns, de baixo valor, incluindo alguns prédios antigos deteriorados (Jacobs, 2001, pp. 207).

Poucos acreditam que os edifícios antigos são saudáveis, mas Jacobs pondera:

O único mal dos prédios antigos num distrito ou numa rua é aquele que inevitavelmente não resulta senão da idade – um mal que existe em tudo o que é antigo e se deteriora. Mas uma área urbana em tal situação não fracassa por ser velha. Ao contrário. A área é velha por ter fracassado (Jacobs, 2001, pp. 208-209).

Portanto, não seria a idade de um ou alguns edifícios que provocaria o fracasso de um espaço, mas sim o seu insucesso a causa do abandono e velhice da área. Há bons exemplos de áreas antigas e vivas (portanto, de sucesso), como alguns bairros de Lisboa (Portugal) – Alfama, Graça, Chiado, etc. –, o bairro da Ribeira no Porto (Portugal), Cidade de Goiás em Goiás (Brasil), cidade de Ouro Preto em Minas Gerais (Brasil). Exemplares do contrário também são notáveis, como: centro antigo de São Paulo (Brasil), bairro da Cidade Velha situado no centro antigo da cidade de Belém (Brasil), dentre outros.

4. Necessidade de concentração – densidade urbana significativa

Jacobs (2001) menciona que já em 1785 Samuel Johnson relacionava a concentração de pessoas às especialidades que elas conseguem manter:

Os homens, quando muito dispersos, se arranjam, mas se arranjam mal, sem várias coisas (…). É a concentração que propicia o conforto material (Johnson, 1785 apud Jacobs, 2001, pp.221).

A autora complementa a assertiva com a seguinte observação:

Essa relação entre concentração – ou alta densidade – e conforto material e outros tipos de diversidade é geralmente reconhecida quando se refere aos contros urbanos. Todos sabem que uma quantidade imensa de pessoas concentra-se nos centros das cidades e que, se não houvesse tal concentração, não haveria centro urbano que se prezasse – certamente não com a diversidade típica dos centros (Jacobs, 2001, pp. 222).

22 Ou seja, a concentração de pessoas gera as centralidades urbanas e, por conseguinte, as diversidades delas inerentes. O atributo parece associar-se à Lei do Movimento Natural estabelecida por Hillier et al. (1993) e mencionada no subitem 2.3.4, quando assegura a maneira pela qual as propriedades configuracionais podem ser reputadas como responsáveis pela emergência de uma hierarquia urbana, a produzir, inclusive, as centralidades.

A questão que surge, entretanto, é o aspecto residencial. As áreas centrais, a despeito da diversidade, tendem a ter um reduzido número de uso residencial. Por outro lado, áreas residenciais dificilmente apresentam usos diversificados, o que compromete a dinâmica citada no item anterior. Para a relação entre concentração populacional e diversidade de usos,

quase não é levada em conta quando se refere aos bairros cujo uso principal é o residencial. Apesar disso, as moradias formam a grande parte da maioria dos distritos urbanos (Jacobs, 2001, pp. 222).

A questão da densidade habitacional é complexa e, portanto, difícil de se estabelecer critérios tão precisos para serem aplicados. Deve-se ter em conta as características e peculiaridades de cada espaço de modo a se adequar às suas funcionalidades. Sobre o tema, Jacobs (2001) faz uma observação a partir de seu próprio questionamento:

Quais densidades habitacionais urbanas seriam adequadas? A resposta é parecida com a que Lincoln deu à pergunta: “Qual deve ser o comprimento das pernas de um homem?” Suficiente para alcançar o chão, respondeu Lincoln. (Jacobs, 2001, pp. 230).

Para a autora, os extremos da densidade habitacional – ou muito altas ou muito baixas – “impedem a diversidade urbana, em vez de a promover”. E justifica o porquê do impedimento da diversidade urbana quando esta situa-se num pico alto:

em algum momento, para acomodar tantas moradias no solo, recorre- se à padronização. Isso é fatal, pois uma grande diversidade de idades e tipos de construção tem relação direta e explícita com a diversidade de panoramas (Jacobs, 2001, pp.235).

O padrão, que reforça características de homogeneidade e, portanto, compromete a variação de forma e tipos.

Em síntese, na perspectiva de Jane Jacobs, o que parece crucial para uma melhor dinâmica e vida urbana é o fator “diversidade”. A autora destaca como critérios prioritários: diversidade de usos e tipos edilícios (em oposição à padronização),

23 presença de quadras curtas (o que significa uma relação mais alimentada de vias articulando as quadras), existência de edifícios de variadas idades, densidade construída e populacional (os pólos máximo e mínimo são prejudiciais). A mistura de pessoas, usos e edifícios (dada a interdependência entre estas três instâncias), asseguraria um espaço mais rico, alimentado e, portanto seguro. Seriam áreas mais convidativas aos deslocamentos, especialmente para aqueles realizados a pé, no âmbito da caminhabilidade, em que a interação indivíduo/meio é mais franca, pois não há o invólucro do carro a criar uma separação.

2.2.2 Gehl

Jan Gehl, é arquiteto e urbanista, natural da Dinamarca, sócio fundador da empresa Gehl Architects e professor emérito de Desenho Urbano na School of Architecture in Copenhagen. Escreveu, ainda na década de 80, os livros Life between Buildings e Cities for People, nos quais descreve suas ideias para melhorar os espaços públicos urbanos, com base numa expressiva experiência empírica.

Gehl (2010) caminha na mesma direção de Jacobs. Entretanto, a contar sua formação, acrescenta um conjunto de pormenores que permitem uma classificação mais minuciosa de aspectos relevantes ao desempenho de um espaço público urbano.

O autor acredita que as atividades dividem-se em três tipos: (a) necessárias, (b) opcionais e (c) sociais (Figuras 2.2, 2.3 e 2.4). A relação entre tais tipos de atividade e a qualidade do ambiente físico externo (Figura 2.5) ocorre de três maneiras: (a) para que as atividades necessárias sejam realizadas, a qualidade do ambiente externo é irrelevante; (b) para que aconteçam as atividades opcionais, a qualidade do ambiente externo é determinante, e, por fim, (c) para as atividades sociais, a qualidade do ambiente físico interfere no seu acontecimento, no entanto, numa escala inferior às opcionais (a depender do que motive as atividades sociais, as condições são desprezadas).

24 Figura 2.2 – Movimento de entrada e saída na estação de metrô Abbesses – Paris

(França) – julho de 2008 (Atividade Necessária)

Crédito: Ana Barros.

Figura 2.3 – Idosos a passarem o tempo em conversas e a contemplarem a paisagem – Canteiro central da Alameda Afonso Henriques – Lisboa (Portugal) – janeiro de 2014

(Atividade Opcional)

25 Figura 2.4 – Comemoração da Independência do Brasil – Brasília (Brasil) – dia 07 de

setembro de 2012 (Atividade Social)

Crédito: Ana Barros.

Figura 2.5 – Representação gráfica da relação entre a qualidade dos ambientes externos e as atividades ao ar livre

26 Em relação às primeiras (necessárias), estão relacionadas com as atividades de deslocamento casa-trabalho, casa-estudo, etc., ou seja, aquelas imprescindíveis; quanto às opcionais, associam-se às atividades essencialmente de lazer e de ócio, como a leitura de um livro, brincadeiras com colegas, conversa com amigos, encontros ao ar livre, etc., ou seja, atividades que podem ser realizadas em qualquer altura; e, por fim, em relação às sociais, correspondem a eventos que tenham hora e data marcada, como exemplo, tem-se os eventos culturais em geral, ou seja, aquelas que não podem ser realizados em outras alturas, mas que não dependem exclusivamente de nós.

Além da categorização das atividades, Gehl (2010), assim como Jacobs (2001), também pontua algumas condições basilares para tornar as cidades vivas, ou seja, com uso frequente dos seus espaços públicos:

1. Estrutura urbana compacta; 2. Densidade populacional razoável;

3. Distâncias razoáveis a serem percorridas a pé ou de bicicleta; 4. Espaço urbano de qualidade;

5. Diversidade de funções.

Verifica-se que pelo menos três destas são compartilhadas por Jacobs e as outras duas acabam por complementar as primeiras.

O autor acrescenta ainda a precaução que deve existir com o tratamento do térreo dos edifícios (rés-do-chão) – chamados de espaços de transição, por estabelecer a ligação entre o privado com o público – para a promoção de uma cidade ao nível dos olhos, o que favoreceria simultaneamente a interação e a segurança. Portanto, ao se estudarem espaços para pedestres, nos quais os olhos são o sentido mais utilizado na percepção do espaço (além dos pés, é claro), o nível da rua deve merecer especial atenção.

Neste caso, atenção deve existe com a alimentação da rua, o que se vincula à redução do caráter “cego” de alguns trechos de via, em que praticamente inexistem portas ou janelas. Gehl (2010), com base nisso, adotou classificação de 5 níveis no que se refere à percepção do trecho da rua:

1. Ativo – 15 a 20 portas a cada 100m

Espaços estruturados dessa maneira tendem a ter ampla variedade de funções; nenhuma unidade cega e poucas unidades passivas; muitos detalhes no relevo da

27 fachada; predominância de articulação vertical da fachada; bons detalhes e material.

2. Convidativo – 10 a 14 portas a cada 100m

Unidades relativamente pequenas; alguma variação de funções, poucas unidades cegas e passivas; relevo na fachada; muitos detalhes.

3. Misto – 6 a 9 portas a cada 100m

Unidades grandes e pequenas; modesta variação de funções; algumas unidades passivas e cegas; relevo modesto na fachada; poucos detalhes.

4. Monótono – 2 a 5 portas a cada 100m

Grandes unidades, poucas portas; variação de funções quase inexistente; muitas unidades cegas e desinteressantes; poucos (ou nenhum) detalhes.

5. Inativo – 0 a 1 portas a cada 100m

Grandes unidades, poucas (ou sem) portas; nenhuma variação visível de função; unidades passivas ou cegas; fachadas uniformes, nenhum detalhe, nada para se ver.

As características destes níveis estão diretamente relacionados com a morfologia dos espaços, portanto, um bom indicador de vivacidade dos espaços públicos urbanos, a incluir aquelas que acolhem os deslocamentos.

Gehl (2010) acredita que para uma cidade ter um bom desempenho, deve ser pensada principalmente na escala local (micro – escala do olho) e não somente na global (macro – escala da planta baixa). Em síntese, o autor destaca as seguintes características como prioritárias para uma maior dinâmica nas cidades: a) compactação da estrutura urbana, b) densidade populacional razoável (presença de moradias, inclusive nas áreas centrais), c) relação funcional que promova a existência de distâncias razoáveis a serem percorridas a pé ou de bicicleta, o que acentua as trocas interpessoais, d) presença de diversidade de funções, e e) atenção com o nível do chão dos edifícios, de modo a promover espaços bem alimentados e não cegos.

28 Em relação aos tipos de atividades discutidos pelo autor, cabe refoçar que esta tese centra-se no grupo das necessárias, a considerar que embora as condições de tempo e espaço não sejam fundamentais, as variações de tais condições acabam por condicionar a opção pelos trajetos escolhidos pelos indivíduos. As pessoas não desistem de percorrê- los, mas podem optar por uma via ou outra, a depender de certas características da forma urbana.

2.2.3 Alexander

Christopher Alexander, matemático, arquiteto e urbanista austríaco, é professor emérito da Universidade da Califórnia, em Berkeley. Seus estudos estão principalmente vinculados a utilização de padrões geométricos e matemáticos para o Urbanismo e Arquitetura, nos quais faz críticas substanciais à arquitetura moderna.

Alexander (2006), no texto A city is not a tree, publicado originalmente em 1988, qualifica as cidades em naturais – aquelas que surgem de maneira “espontânea”, sem projeto prévio – e artificiais – aquelas surgidas a partir de desenho idealizado, normalmente por planejadores urbanos. O autor acredita que às últimas lhes faltam, nas suas próprias palavras, “algum ingrediente especial” para alcançarem o êxito das primeiras.

No que diz respeito à malha viária, que sintetiza a noção das macro e microparcelas relacionada à rede de caminhos, o autor define estrutura ‘em semi-trama’ ou ‘semi- reticulada’ como sendo aquelas que contém unidades sobrepostas e estruturas 'em árvore' como sendo aquelas que:

sempre que, no interior desta estrutura, nenhuma peça, de qualquer de suas 'unidades', esteja conectada às outras 'unidades', senão através do miolo daquela unidade, considerada como um todo (Alexander, 2005, pp. ).

Alexander assegura que há diferenças basilares entre estas duas estruturas. Na primeira há expressivo número de interseções e, portanto, são muito mais complexas; na última não há interseções significativas, o que a torna uma estrutura simplificada, com poucos elementos. O autor realiza um cálculo para demonstrar a distinção:

uma estrutura 'em árvore' composta de 20 elementos, pode conter, no máximo, 19 subconjuntos derivados, enquanto uma estrutura 'em semi-trama', baseada nos mesmos 20 elementos, pode conter mais de 1.000.000 de subconjuntos diferentes (Alexander, 2006, pp. 5).

29 Alexander acredita que é esta falta de complexidade estrutural – existente nas estruturas em árvore – “que está distorcendo nossa concepção do que seja uma cidade” (Figura 2.6). Para ele, “ as 'unidades' que conformam uma 'cidade artificial' são sempre organizadas em forma de 'árvore', ou seja, em que suas relações com as outras unidades são restritas:

Somente numa concepção artificial de cidade – isto é, numa concepção 'em árvore' –, as sobreposições e interseções – naturais, adequadas e necessárias – são destruídas (Alexander, 2006, pp.17). Em relação aos problemas mais expressivo, Alexander (2006) aponta como incômodos mais evidentes destes modelos espaciais (a) a separação dos fluxos e (b) a segregação dos usos – lazer, casa-trabalho, etc., o que se articula ao aspecto de diversidade necessária para uma maior vitalidade urbana, como argumentado por Jane Jacobs e Jan Gehl.

Sobre o primeiro, o autor acredita que as separações de fluxos são negativas para a vida nos aglomerados urbanos uma vez que ao segmentar o espaço em setores o torna rarefeito em termos de movimento. São rompidas as interações entre os diferentes, a considerar os modos de deslocamento, como ocorre em propostas emblemáticas do movimento moderno, a incluir as concepções do arquiteto Le Corbusier (Figura 2.7):

Observemos a separação entre pedestres e veículos automotores, um conceito tipicamente 'em árvore', proposto por Le Corbusier, Louis Kahn e muitos outros projetistas. Num nível muito tosco de raciocínio, esta é uma ideia que pode parecer 'obviamente' boa. No entanto, o serviço de táxis urbanos, por exemplo, só funciona se pedestres e veículos não estiverem rigidamente separados. Os táxis circulantes na cidade necessitam de um fluxo rápido de tráfego para que possam cobrir grandes áreas e ter certeza de que encontrarão passageiros. Já os pedestres, demandam, em primeiro lugar, que seja possível chamar um táxi de qualquer ponto do território frequentado pelas pessoas a pé e, segundo, que possam dele desembarcar em qualquer lugar que faça parte deste mesmo universo, e para o qual estejam se deslocando. Neste sentido, o 'sistema' no interior do qual os táxis circulam necessita se sobrepor, tanto ao sistema de tráfego rápido – onde circulam os veículos –, quanto ao sistema de circulação de pedestres. Em Manhattan, pedestres e veículos compartilham certas partes da cidade, e é assim que esta imprescindível interseção fica assegurada (Alexander, 2006, pp.17).

30 Figura 2.6 – Exemplares de estruturas em árvore: (a) Columbia, Maryland (canto superior esquerdo); (b) Plano de Londres (canto superior direito); (c) Chandigarh (canto

inferior esquerdo); e (d) Plano Piloto de Brasília (canto inferior direito)

Fonte: Alexander (2006).

Figura 2.7 – Separação dos fluxos de pedestres e dos carros

31 Em relação ao segundo, mais especificamente quanto à segregação das áreas de lazer (os chamados parquinhos ou playgrounds), Alexander (2006) tem uma postura bastante crítica (inclusive compartilhada por Jacobs, 2000 e por Gehl, 2010) ao afirmar que os estudiosos que pensam a cidade parecem estar viciados em enclausurar as áreas de lazer infantis e, portanto, a repetir o que vem sendo feito (e sem êxito) nos espaços urbanos. É enfático ao afirmar que:

Isto [segregação das atividades de lazer] se cristalizou, em nossas cidades reais, na figura dos playgrounds. O playground, asfaltado e cercado, nada mais é que uma espécie de confirmação ou validação figurada da existência do 'brincar' enquanto conceito individualizado em nossas mentes. Mas o playground não tem nada a ver com o