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Uma semana do término do prazo da inscrição, minha mãe faleceu, vítima de um atropelamento cruel, já que se encontrava no canteiro de uma das principais avenidas de Belém, a Pedro Álvares Cabral. A tragédia me levou a desistir de fazer o exame, momentaneamente. Até porque a prova seria no dia 20 de novembro, dezesseis dias após o acidente, quando ela completaria 65 anos. Achava que não teria condições psicológicas para realizá-la.

Incentivado pela família, pela namorada, Claudia Pinheiro, e porque ingressar no mestrado era também um sonho de minha mãe, fiz a inscrição no último dia. E nos últimos minutos antes de encerrar o prazo. O relato torna-se necessário para dizer que minha intenção de pesquisa foi produzida em um clima de extrema turbulência emocional. Turbulência agravada com a perda do meu pai, quarenta dias após o ocorrido com minha mãe. Vitimou-o um acidente vascular cerebral, enquanto dormia. O fato me levou a pensar outra vez na desistência. Mas consegui superar a ideia, realizar o exame e enfrentar a entrevista. Assim, ingressei no NPADC e deixei a função de supervisor pedagógico no Colégio ―Alfa‖. No entanto, continuei ministrando aulas de Geografia até maio de 2007. Em fevereiro de 2008, recebi uma bolsa de estudo da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e pude me dedicar de forma exclusiva ao Programa de Pós-Graduação até setembro de 2008, quando acabou o prazo de vigência da bolsa.

Porque deixara de ser arrimo, podia viver com uma renda menor. No entanto, precisava renovar minhas forças para não desistir dos meus objetivos acadêmicos e profissionais, já que a minha vida não podia mais ser direcionada para retribuir aos meus pais todos os esforços que fizeram para que eu vencesse, pelos estudos, em Belém. Fazer o que não conseguiram fazer. Não por falta de interesse, mas porque

a localidade de Arapixi, onde morávamos, não tinha escola para que eles pudessem avançar além da 5ª série do Ensino Primário.

Nos primeiros meses, no mestrado, os períodos sem aulas eram terríveis. Entrava em depressão. Sofria silenciosamente. Pensava que não teria forças para continuar. Para me animar, dizia: ―Não posso deixar de concluir esse sonho, que não era só meu‖. Além disso, a linha de pesquisa do projeto – os processos de ensino e de aprendizagem na educação em Ciências e Matemáticas – foi escolhida em vista das minhas vivências com o ensino, como professor e como pedagogo. Mais uma automotivação para levar adiante o curso e a vida e, posteriormente, perseguir outro sonho: o doutorado.

Minha proposta de pesquisa foi amadurecendo nesse clima, inscrita no contexto das questões socioambientais que, nas últimas décadas, têm despertado preocupações e interesse crescente. Os primeiros anos do século XXI têm testemunhado o viés problemático que reveste a relação entre a sociedade e o meio ambiente. Nesse aspecto, a questão ambiental define o conjunto de contradições resultantes das interações internas ao sistema social e, desse, com o ambiente.

Situações marcadas pelo conflito, colapso e destrutividade são temas que tenho levado para debate em sala de aula. Meus alunos discutem o fato de estarmos vivendo em um planeta marcado pelo esgotamento e destruição que se expressam: nos limites materiais do crescimento econômico desenfreado; no crescimento urbano e demográfico; na tendência de esgotamento dos recursos naturais e energéticos não renováveis; no crescimento das desigualdades socioeconômicas internas e globais, que alimentam e tornam crônicos os processos de exclusão social; no avanço do desemprego estrutural; na perda da biodiversidade e na contaminação crescente dos ecossistemas terrestres, entre outros. É o avanço da globalização econômica produzindo mais desigualdades sociais e problemas socioambientais. Tudo, realidades que comprometem a vida humana no Planeta.

A globalização, segundo Leff (2008), surge como a mudança histórica mais relevante do ordenamento global na transição para o novo milênio. Esse processo tende a pulverizar as fronteiras nacionais, homogeneizando a Terra por estender a racionalidade do mercado a todos os lugares. Na fase da globalização ecologizada, as novas estratégias do poder capitalista não se reduzem à exploração direta dos recursos, mas investem em uma releitura do mundo, das diferentes ordens de valor

e de racionalidade, à maneira abstrata de um sistema generalizado de relações mercantis. Face ao processo de globalização econômica, esse autor anuncia:

Os movimentos da cidadania estão legitimando novos valores e direitos humanos que estão detonando o surgimento de projetos sociais inéditos na história. A cidadania emerge configurando novos atores sociais fora dos campos de atração das burocracias estatais e dos círculos empresariais, que reclamam a autodeterminação de suas condições de existência e a autogestão de seus modos de vida (LEFF, 2008, p. 125).

Tudo isso demanda que a educação seja dotada de novas estruturas, novos agentes, novas formas de gestão e, principalmente, que facilite e favoreça a participação da comunidade como condição imprescindível para uma inovação educativa sustentada. Como elucida Imbernón (2000, p. 90), ―isso necessita que de novo se repense a escola e seu papel na educação dos cidadãos. Devemos usar a imaginação na busca de alternativas‖.

Com essa visão e aqueles temas, procurava encantar meus alunos da mesma forma como fui encantado pela professora Antonia, da Escola ―Placídia Cardoso‖, e pela professora Georgina, do Colégio ―Beta‖. Tratava de realidades que afetam a qualidade da vida humana, em particular, e ameaçam a continuidade da vida global do planeta, entre outros fatores. Assim fazia, como explica Silva (2005, p. 61), em função da

ausência da consideração da dimensão ambiental no processo de desenvolvimento, ou melhor, de sua consideração apenas nos limites estritos do cálculo econômico, o que demonstra uma visão de natureza como recurso inesgotável. Essa não consideração das necessidades de conservação ambiental traz para o desenvolvimento a consequente ausência da percepção de seus limites, o que gera a crise ambiental também vista em níveis mundiais.

De fato, a questão ambiental revela o retrato de uma crise multidimensional que aponta para o esgotamento de um determinado modelo de sociedade que produz, desproporcionalmente, mais problemas que soluções. Segundo Santos (1997, p. 296):

De todos os problemas enfrentados pelo sistema mundial, a

degradação ambiental é talvez o mais intrinsecamente transnacional

e, portanto, aquele que, consoante o modo como for enfrentado, tanto pode redundar num conflito global entre o Norte e o Sul, como

pode ser a plataforma para um exercício de solidariedade transnacional e intergeracional. O futuro está, por assim dizer, aberto a ambas as possibilidades, embora só seja nosso na medida em que a segunda prevalecer sobre a primeira.

Ao expressar a relevância do tema em minha intenção de pesquisa, reconheço que a escola não pode se alijar dessa discussão que envolve a Região Amazônica e as questões relacionadas ao meio ambiente, em geral. Tanto que minha proposta de investigação apontava para os seguintes pontos: a visão de ensino e aprendizagem que norteia a prática dos professores de Ciências do Ensino Fundamental de 5ª a 8ª série; os entendimentos de Meio Ambiente e Educação Ambiental por parte dos professores de Ciências em conexão com os objetivos, conteúdo e procedimentos de ensino; a relação da disciplina Ciências com as outras disciplinas no desenvolvimento da Educação Ambiental e o entendimento e as representações dos alunos da 8ª série do Ensino Fundamental quanto aos seus ambientes de vida. Entretanto, como discuto na próxima seção, a proposta inicial de investigação foi modificada durante as aulas do mestrado, até mesmo para atender ao critério de recorte epistemológico, ajustado ao tempo do curso e às possibilidades de minha formação.

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