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A PESQUISA “TRANSEXUALIDADE E SAÚDE: CONDIÇÕES DE ACESSO E CUIDADO INTEGRAL”

2.1 Metodologia

Após o estudo teórico conceitual sobre a apropriação médica da transexualidade e construção do modelo assistencial calcado na idéia de adequação do sexo ao gênero, com o objetivo de demarcar o campo em questão para reflexão sobre a patologização da transexualidade e seus efeitos, foi realizada uma análise dos dados coletados na pesquisa “Transexualidade e saúde: condições de acesso e cuidado integral” (CNPq / MS-SCTIE-DECIT) realizada no Instituto de Medicina Social / UERJ. A pesquisa, que teve como objetivo geral aprofundar o conhecimento sobre o acesso e o processo de cuidado integral à saúde de transexuais na rede pública de saúde brasileira, possibilitou uma investigação detalhada sobre a assistência a transexuais no país, as características da demanda, as dificuldades de acesso ao cuidado integral, os dilemas éticos e jurídicos enfrentados nesse processo. A pesquisa supracitada foi coordenada pela professora Márcia Arán, orientadora do presente estudo.

Para a construção de um conhecimento empírico que contemplasse os objetivos da pesquisa, inicialmente foi realizada uma seleção dos serviços a serem analisados, a partir de um banco de dados elaborado após o levantamento preliminar de todos os Hospitais Públicos que prestam assistência a pacientes transexuais no país29. Com referência nas informações sobre o funcionamento de

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Esse levantamento foi realizado a partir de um pequeno inquérito respondido pelos profissionais responsáveis pelos serviços assistenciais que fornecia informações sobre o funcionamento do mesmo. Os Serviços

pesquisados foram os seguintes: (1) Programa de Transtorno de Identidade de Gênero (PROTIG) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre – UFRGS; (2) Unidade de Urologia Reconstrutora Genital do Hospital Universitário Pedro Ernesto – UERJ; (3) Ambulatório de Transexualidade - Projeto Sexualidade (PROSEX) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP; (4) Projeto Transexualismo do Hospital das Clínicas de Goiânia; (5) Programa de Atendimento a Transexuais e Cirurgia de Transgenitalização do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho UFRJ; (6) Ambulatório de Endocrinologia Especial (Transtorno de Identidade de Gênero) do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione (IEDE); (7) Serviço e Disciplina de Ginecologia - Hospital das Clínicas da UFPE; (8) Hospital das Clínicas da UFMG; (9)

Transexualidade - Serviço de Urologia da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto da Faculdade de Medicina e Hospital de Base; (10) Atendimento Ambulatorial a Transexuais do Hospital Universitário de Brasília; (11) Departamento de Psicologia do Instituto Paulista de Sexualidade. Desses serviços, apenas oito se

dispuseram a responder a um questionário detalhado. Um dos serviços contatados foi excluído da segunda etapa da pesquisa exploratória por se tratar de um programa assistencial particular. Para mais detalhes ver

cada instituição, incluindo o espectro do cuidado ofertado (especialidades envolvidas, número e tipo de consultas já realizadas, número e tipo de cirurgias), capacidade de cobertura e financiamento das atividades ofertadas, estes serviços foram listados a partir de sua relevância no campo assistencial e escolhidos para a segunda etapa da pesquisa. Esta consistiu na observação livre do funcionamento dos serviços e a realização de entrevistas em profundidade com usuários e profissionais dos mesmos. Os serviços selecionados na pesquisa citada foram os seguintes:

1. Programa de Transtorno de Identidade de Gênero (PROTIG) do Hospital das Clínicas de Porto Alegre – Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

2. Unidade de Urologia Reconstrutora genital do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

3. Ambulatório de Transexualidade – Projeto Sexualidade (PROSEX) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP)

4. Projeto Transexualismo do Hospital das Clínicas de Goiânia – Universidade Federal de Goiás

5. Programa de Atendimento a Transexuais e Cirurgia de Transgenitalização do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho – Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

6. Ambulatório de Endocrinologia Especial (Transtorno de Identidade de Gênero) do Instituto de Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione (IEDE)

7. Serviço e Disciplina de Ginecologia – Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

No decorrer deste levantamento preliminar dos serviços, parte integrante da pesquisa, foi instituído o Processo Transexualizador no SUS, a partir da Portaria

relatório Final da pesquisa “Transexualidade e Saúde: condições de acesso e cuidado integral” (Arán e Murta, 2009)

1707/GM de 2008 do Ministério da Saúde, que credenciou como Centros de Referência30 quatro dos serviços selecionados. Assim, optou-se por utilizar apenas os dados levantados sobre os quatro primeiros serviços listados; de um universo composto por onze programas assistenciais, entre ambulatórios e serviços que realizam cirurgias de redesignação sexual em transexuais, foram analisadas as informações dessas quatro instituições que recebem recursos repassados pela Alta Complexidade31

do Ministério da Saúde.

No que se refere à observação livre dos serviços32

, vale destacar que as mesmas aconteceram a partir de visitas pré-agendadas entre o segundo semestre de 2008 e ao longo do ano de 2009. O recorte empírico foi o funcionamento formal do programas (processo de recepção, fluxo de atendimento, marcação de consultas, porta de entrada dos usuários, características sócio-demográficas dos mesmos e capacidade de cobertura), os profissionais que nele atuam (médicos de diferentes especialidades, psicólogos, assistentes sociais e funcionários do hospital) e os pacientes que foram e são assistidos pelo programa.

Tais observações somadas com entrevistas em profundidade realizadas com os profissionais ao longo das visitas aos serviços, permitiram a coleta de dados para a descrição e análise dos mesmos, contemplando os dispositivos de cuidado institucionalizados, as referências utilizadas em suas experiências assistenciais e os efeitos da patologização da transexualidade sobre as condições acesso a saúde.

Em relação às entrevistas com pessoas que se identificam como transexuais, para definir a amostra a preocupação foi com o aprofundamento e abrangência da compreensão do objeto de estudo, não sendo utilizado o critério numérico, mas sim a noção de que a amostra ideal é aquela que é representativa do universo pesquisado (Minayo,2008, p. 102). Desta maneira, foram realizadas entrevistas com usuários de serviços assistenciais, militantes do movimento LGBTT e do Coletivo de Transexuais e pessoas sem qualquer vínculo com qualquer programa de atendimento ou movimento social. Com o objetivo de identificar a diversidade da construção de gênero, práticas sexuais, sofrimento psíquico, atuação profissional atual e passadas considerando-se as dificuldades encontradas para o exercício da

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Portaria 457/2008 da Secretaria de Assistência de Saúde de 2008.

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Conjunto de procedimentos que, no contexto do SUS, envolve alta tecnologia e alto custo, objetivando propiciar à população acesso a serviços qualificados, integrando-os aos demais níveis de atenção à saúde (atenção básica e de média complexidade) (Brasil, 2007, p.18).

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A coleta de dados da pesquisa de campo foi realizada pelas pesquisadoras Marcia Arán, Daniela Murta e Maria de Fátima Lima Santos.

profissão escolhida, demanda pelo processo transexualizador, buscas anteriores de cuidado e principais obstáculos encontrados, foram utilizados roteiros semi-estruturados que abordavam diferentes questões e, no caso de usuários de serviços, incluíam também questões relacionadas a assistência recebida no serviço atual, tempo e grau de vínculo formado com o serviço, assistência jurídica recebida para adequação da identidade civil, e grau de satisfação com a assistência recebida na atualidade e no passado. Esse universo é composto por um total de 26 pessoas.

Vale destacar que optou-se por realizar essa modalidade de entrevista por entender que dessa forma é possível apreender a visão dos atores sociais, tal como previstos nos objetivos da pesquisa sem restringir a coleta dos dados às referências do pesquisador (Minayo, 2008, p. 99).

As entrevistas foram gravadas e transcritas tendo como referência as normas de pesquisa da Resoluçao 196/ 96 da CONEP no que se refere à garantia de sigilo e ao consentimento livre e esclarecido dos participantes. Com o objetivo de preservar a identidade dos pesquisados, os profissionais – 4 coordenadores de serviço (médicos), 2 enfermeiros, 1 fonoaudiólogo, 3 psicólogos, 2 psiquiatras e - foram elencados por sua especialidade e foram adotados pseudônimos para as pessoas transexuais. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UERJ.

Seguem os quadros dos participantes:

Quadro 1. Pessoas transexuais

NOME PROFISSÃO LOCAL DA

ENTREVISTA

SITUAÇÃO