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3. TRANSPARÊNCIA PÚBLICA

3.3 TRANSPARÊNCIA PÚBLICA DIGITAL: DE QUE FORMA AS

3.3.2. Pesquisas empíricas sobre a transparência pública digital no Brasil

No caso brasileiro, as pesquisas em transparência pública digital têm se concentrado mais em investigar websites.

Almada (2016) realiza um estudo comparativo entre Brasil, Estados Unidos e Reino Unido e, para isso, define duas dimensões de análise: eficácia digital e transparência digital. Para a primeira dimensão, a autora considera três categorias:

acessibilidade, hiperlinks e habilitação do cidadão para a compreensão da informação. E para a transparência digital, a autora examina as informações financeiro-orçamentárias, as informações administrativas e os instrumentos de acompanhamento e interação. Para o caso brasileiro, são considerados dois websites: o portal do Poder Executivo Federal (www.brasil.gov.br) e o Portal da Transparência (www.transparencia.gov.br). Segundo a autora, os três países apresentam nível avançado de transparência e não há diferenças significativas entre eles. No Brasil, a “informação é mais dissipada, dispersa. É comum a mesma informação estar disponível de diferentes maneiras, em diferentes páginas ou links, o que pode denotar [...] falta de planejamento e organização” (p. 190). Mas, apesar disso, as informações são completas, detalhadas e inteligíveis.

Amorim (2012) faz um estudo comparativo dos portais do Poder Executivo de todas as capitais brasileiras e verifica se fatores sociais, políticos e econômicos interferem

no nível de transparência desses websites. A partir da elaboração de um índice que divide o nível de transparência em cinco classificações (inexistente, fraca, moderada, significativa e avançada), a autora conclui que todas as capitais aderiram “a projetos de governo eletrônico e de democracia digital, tendo base comum o emprego dos chamados portais da transparência” (p. 191). Mais da metade das capitais apresentam transparência moderada (Boa Vista, São Luís, Macapá, Teresina, João Pessoa, Palmas, Manaus, Maceió, Campo Grande, Goiânia, Belém, Natal, Fortaleza, Aracaju, Porto Velho, Rio Branco e Salvador) e as demais apresentam transparência significativa (Florianópolis, Cuiabá, Recife, Brasília, Vitória, São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Rio de Janeiro e Porto Alegre).

No que tange às características socioeconômicas, Amorim (2012) demonstra que o índice de desenvolvimento humano e o número de habitantes são variáveis associadas positivamente ao grau de transparência dos portais municipais. O analfabetismo, por sua vez, é uma variável que apresenta relação inversamente proporcional, ou seja, “à medida que o percentual de analfabetismo da cidade pesquisada diminui, aumenta o índice de transparência digital do portal” (p. 194). O partido político do prefeito, entretanto, mostra-se pouco preditivo para a transparência digital.

Com o intuito de verificar em que medida a internet está sendo utilizada para operacionalizar as funções da accountability, Angeli (2017) compara os websites de 30 controladorias públicas da América Latina. A presença dessas agências no Facebook, no Twitter e no YouTube é uma das categorias de análise propostas pela autora. Além de concluir que a CGU apresenta maior desempenho entre as agências estudadas, Angeli (2017) afirma que, no que tange às redes sociais, o Twitter é a plataforma mais popular entre as controladorias da América Latina e que as agências que não estão presentes no Twitter também não possuem contas no Facebook e no YouTube.

As três pesquisas acima se destacam na literatura brasileira sobre transparência digital, uma vez que são duas teses e uma dissertação que se debruçam de forma muito minuciosa sobre os websites estudados. Além disso, apresentam propostas metodológicas que certamente são pertinentes a trabalhos futuros.

Outra pesquisa de grande relevância, e com foco no estado do Paraná, é a de Rodrigues (2016), que cria um índice de governança digital para avaliar os 399 municípios paranaenses. Entre as dimensões de análise consideradas pela autora, estão a Lei de Transparência e a Lei de Acesso à Informação. Os resultados demonstram que a primeira é efetivada pela maior parte dos municípios. Entretanto, “a LAI não é cumprida

em 223 municípios do Paraná, deste total, 101 deveriam manter um espaço para pedidos de acesso à informação online, uma vez que possuem mais de 10 mil habitantes” (p. 138).

Outros trabalhos analisam a transparência pública em websites brasileiros. Silva, et al. (2011) estudam o portal do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e constatam que o site fornece muitas informações, mas poucos mecanismos de interação.

Hoch, Rigui e Silva (2012), por sua vez, analisam a transparência ativa em portais dos Tribunais Regionais Federais. Segundo os autores, até a conclusão da pesquisa, nenhum TRF cumpria na íntegra com os deveres informacionais postulados pelo oitavo artigo da LAI, que se refere à transparência ativa (BRASIL, 2011). A conclusão de Hoch, Rigui e Silva (2012) reafirma o judiciário como o menos transparente dos três poderes38. No que tange aos avanços da transparência brasileira através da Lei de Acesso à Informação, Filgueiras (2016) apresenta uma visão mais cética. O autor observa que a não obrigatoriedade de divulgação de informações em um portal específico para esse fim resulta em “repositórios de informações largamente dispersas, de difícil entendimento (p.

105). E que a sociedade civil permanece sujeita a visões de elites políticas e sociais, uma vez que muitas das solicitações à LAI são feitas por indivíduos ligados a empresas.

Apesar dos avanços no que tange à transparência ativa – privilegiada na política de transparência do Estado brasileiro – e na possibilidade hoje existente de transparência passiva, não houve ganhos de participação da sociedade civil em função da manutenção de uma trajetória de controle das elites políticas no processo de democratização do Estado. (FILGUEIRAS, 2016, p. 108).

Sabe-se que (como já mencionado acima), pelo menos no caso do Portal da Transparência e do portal do Poder Executivo Federal, as informações são realmente dispersas, mas também são claras e compreensíveis (ALMADA, 2016). Em relação aos pedidos de acesso à informação, julga-se que um dos grandes desafios é chamar os cidadãos ao engajamento. E, considerando as capacidades democratizantes das redes sociais já abordadas acima, pressupõe-se que os problemas apontados por Filgueiras (2016) podem ser abreviados a partir de sua utilização.

Entretanto, ainda são poucos os trabalhos empíricos que investigam experiências brasileiras de transparência pública em redes sociais digitais.

38 Ver em: https://congressoemfoco.uol.com.br/especial/noticias/judiciario-e-o-poder-menos-transparente-aponta-levantamento/. Acesso em 21 nov. 2018.

Farranha, et al. (2014) estudam os perfis do Ministério do Desenvolvimento Agrário, da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial e da Secretaria Especial de Mulheres no Facebook e no Twitter, em 2013. O objetivo principal do texto é verificar em que medida esses perfis proporcionam a efetivação do princípio da publicidade, disposto no artigo 37 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Os autores afirmam que os perfis do ministério e das duas secretarias muito informam, mas pouco interagem com os usuários. Além disso, essas páginas divulgam ações governamentais de forma muito semelhante a de agências de notícias, “a impressão que se tem é que são mais “noticias”/

comunicação do que publicidade de atos administrativos” (FARRANHA, et al., p. 4).

O Facebook da CGU é objeto de pesquisa de dois trabalhos. Sodré (2014) analisa a imagem institucional da organização através das postagens de janeiro a abril de 2014.

Para a autora, nesse período, o perfil da CGU tratou mais da Lei de Acesso à Informação e da Lei Anticorrupção, além de estimular o controle social. Farranha (2015), por sua vez, monitorou o Facebook da CGU em maio de 2015, demonstrando que, em geral, as postagens são educativas e interativas.

Esses dois trabalhos também aplicam entrevistas semiestruturadas junto a integrantes da CGU. Farranha (2015) entrevista a assessoria de comunicação e a equipe técnica da instituição. Entre os pontos destacados pelos entrevistados estão: 1) a atuação da CGU nas redes sociais busca utilizar uma linguagem horizontal (e não hierárquica); 2) apesar da limitada estrutura diante da grande demanda de questionamentos, há um esforço para que as dúvidas mais frequentes dos usuários sejam respondidas; 3) a CGU busca chamar o usuário à participação; e 4) a ampliação da transparência enfrenta uma barreira interna, uma vez que “muitos funcionários veem a transparência como um processo muito trabalhoso e não necessário” (p. 760).

Sodré (2014) entrevista dois integrantes da CGU (um assessor de imprensa e um analista de comunicação). Em um dos momentos mais relevantes das entrevistas (disponibilizadas pela autora nos apêndices do trabalho), o analista de comunicação discorre sobre as peculiaridades de cada rede social. Para o entrevistado, as estratégias de comunicação são diferentes no Facebook e no Twitter porque essas duas plataformas compreendem públicos distintos.

Sem dúvida, as entrevistas com os integrantes da CGU correspondem à contribuição de destaque de tais trabalhos. Não obstante, no que tange à análise das publicações, o n da pesquisa de Farranha (2015) é limitado (com apenas 48 postagens) e Sodré pouco explora os resultados, uma vez que utiliza muitas estratégias metodológicas

em seu trabalho (entrevistas semiestruturadas, Análise de Conteúdo e questionários online de 17 seguidores da fanpage da CGU).

Os trabalhos aqui explorados demonstram que ainda existem obstáculos a serem enfrentados (como a abertura do Poder Judiciário, por exemplo), mas que as experiências brasileiras apresentam bons resultados no que tange à transparência pública (inclusive quando comparadas a outros países).

Visto que a maior parte das pesquisas brasileiras se debruçam sobre análises de websites, faz-se necessário ampliar os estudos sobre transparência pública em redes sociais digitais. Este capítulo demonstrou que tais plataformas midiáticas podem contribuir para a transparência pública devido aos seus aspectos democratizantes. Resta saber se as instituições públicas e os governos brasileiros estão, de fato, utilizando as redes sociais de forma a ampliar esse valor democrático.

Este capítulo teve como propósito conceituar transparência pública, mostrar que não há plenitude democrática sem abertura governamental, apresentar os avanços da transparência no Brasil e no mundo e entender os efeitos que a utilização das redes sociais podem trazer à transparência pública.

A seguir, são explicadas as questões metodológicas do trabalho. Trata-se do objeto de pesquisa, do recorte temporal, das hipóteses e das estratégias de coleta e análise dos dados.