1.5. Pintura cromossômica, hibridização genômica comparativa e a investigação de 1
cromossomos sexuais. 2
Procedimentos de citogenética molecular, tais como a hibridização genômica 3
comparativa (CGH – comparative genomic hybridization) e a pintura cromossômica total 4
(WCP - whole chromosome painting), têm permitido um avanço significativo no conhecimento 5
da composição e diferenciação molecular dos cromossomos. Em experimentos de CGH, o 6
DNA genômico total (DNAg) é usado como sonda para comparar genomas intra-específicos ou 7
interespecíficos, possibilitando uma visão ampla das diferenças moleculares entre os 8
cromossomos sexuais, quando o DNAg das fêmeas e dos machos são comparados entre si 9
(Traut et al. 1999; Symonová et al. 2015). Por sua vez, a microdissecção cromossômica 10
também tem sido utilizada com bastante êxito na citogenética evolutiva e comparativa, isolando 11
cromossomos inteiros ou parte dos mesmos para serem utilizados como sonda em experimentos 12
de hibridização total (WCP) ou parcial (PCP) do cromossomo. Dados relevantes de 13
procedimentos WCP e CGH têm sido obtidos na citogenética de diferentes grupos 14
taxonômicos, contribuindo significativamente para a compreensão do processo envolvido na 15
diferenciação dos cromossomos sexuais (Traut et al. 1999; Phillips et al. 2001; Fuková et al. 16
2007; Vítková et al. 2007; Henning et al. 2008; Ráb et al. 2008; O’Meally et al. 2010; Pazian et 17
al. 2013). 18
Entre várias espécies de diferentes táxons, portadoras de diferentes sistemas de 19
cromossomos sexuais, procedimentos de CGH permitiram a identificação de regiões com maior 20
diferenciação molecular entre o par sexual. Assim, os cromossomos X e Y do camundongo 21
Mus musculus e de Drosophila melanogaster, puderam ser mais bem caracterizados, bem como
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os cromossomos Z e W de três espécies de insetos, Bombyx mori, Ephestia kuehniella e 23
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Galleria mellonella. Além disso, um alto nível de diferenciação foi evidenciado entre os
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cromossomos Z e W nestas espécies, demonstrando a presença de sequencias de DNA W- 2
específicas (Traut et al. 1999). 3
Em serpentes, o emprego de CGH também possibilitou a visualização das regiões do 4
cromossomo W onde estão presentes as sequências específicas das fêmeas, permitindo 5
identificar as regiões cromossômicas mais diferenciadas e com menor taxa de recombinação 6
com o cromossomo Z (O’Meally et al. 2010). Microcromossomos heterocromáticos específicos 7
das fêmeas foram identificados em lagartos da espécie Pogona vitticeps, com a utilização de 8
diversos procedimentos citogenéticos, incluindo CGH, permitindo inferir que os mesmos 9
podem estar relacionados com a determinação do sexo (Ezaz et al. 2005), provavelmente 10
derivados da degradação e deleção de macrocromossomos (Olmo et al. 1987). Também entre 11
os peixes, grandes avanços têm sido alcançados no entendimento do processo de diferenciação 12
dos cromossomos sexuais com o uso da citogenética molecular, a exemplo de Danio rerio, 13
Xiphophorus maculatus e Poecilia reticulata. De fato, análises de CGH possibilitaram
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identificar estágios iniciais de diferenciação de cromossomos sexuais nestas espécies, bem 15
como localizar as regiões cromossômicas sexo-específicas (Traut & Winking, 2001). 16
Por sua vez, o uso da pintura cromossômica tem fornecido um grande volume de 17
informações a respeito da origem dos sistemas sexuais. Além de poder demonstrar origens 18
comuns ou independentes dos sistemas sexuais entre espécies proximamente relacionadas, essa 19
metodologia tem permitido verificar sequências compartilhadas entre grupos taxonômicos que 20
divergiram há milhões de anos. Entre as aves, por exemplo, Dromais novaehollandiae (emu) e 21
Gallus domesticus, pertencem a duas subclasses (Ratitas e Carinatas) que divergiram há
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aproximadamente 80 milhões de anos (Shetty et al. 1999). Sonda obtida do cromossomo Z de 23
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G. domesticus pintou quase toda a extensão do cromossomo Z e grande parte do cromossomo
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W de D. novaehollandiae, exceto a região centromérica deste cromossomo que se apresenta 2
mais fracamente hibridizada, possivelmente representando a localização dos genes 3
determinantes do sexo (Shetty et al. 1999). Além disso, este experimento indicou o grau de 4
conservação do sistema de cromossomos sexuais nas aves, mostrando que apesar das diferenças 5
em relação ao tamanho do cromossomo W, o cromossomo Z se mantém bastante conservado 6
entre as espécies (Shetty et al. 1999). 7
Assim como nas aves, o cromossomo Z nas serpentes é também altamente conservado. 8
Por outro lado, o cromossomo W é o elemento mais variável no genoma das serpentes, mesmo 9
em espécies intimamente relacionadas, sugerindo que este cromossomo passou por processos 10
de diferenciação de forma independente e repetidamente depois da especiação (Lahn & Page, 11
1999; O’Meally et al. 2010). Notavelmente, a pintura cromossômica na serpente Stegonotus 12
cucullatus, utilizando sonda do cromossomo W de G. domesticus, destacou notáveis sinais de
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hibridização no cromossomo W de S. cucullatus, evidenciando que apesar de 275 milhões de 14
anos de evolução independente, o cromossomo W de aves e serpentes ainda compartilham 15
sequências repetitivas (O’Meally et al. 2010). 16
Entre os invertebrados, a correspondência dos cromossomos sexuais entre espécies 17
distintas também tem sido comprovada através de pintura cromossômica (Fuková et al. 2007; 18
Vítiková et al. 2007). A sonda do cromossomo W da mariposa E. kuehniella evidenciou 19
homologia parcial com regiões do cromossomo W de outras espécies de mariposas, Cadra 20
cautella e Plodia interpunctella, mas quase nenhuma homologia com a espécie G. mellonella, a
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qual é filogeneticamente mais distante de E. kuehniella (Vítiková et al. 2007). Os resultados 22
deram suporte à hipótese de uma divergência molecular acelerada do cromossomo W em 23
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Lepidoptera e demonstraram que a redução de homologia deste cromossomo entre as espécies é 1
positivamente correlacionada com as distâncias filogenéticas entre elas (Vítiková et al. 2007). 2
Em contraste com a estabilidade na determinação do sexo de grupos como mamíferos e 3
aves, bem como com a origem comum dos sistemas sexuais nestes grupos, os peixes 4
apresentam diferenciações e origens independentes dos cromossomos sexuais. Em 5
Eigenmannia, experimentos de pintura cromossômica cruzada, utilizando sondas dos
6
cromossomos Y de Eigenmannia sp.2 e X de E. virescens, mostraram ausência de hibridização 7
nos cromossomos sexuais de ambas espécies, indicando a origem independente entre eles, 8
apesar de se tratarem de espécies do mesmo gênero (Henning et al. 2008). Em alguns outros 9
grupos de peixes este cenário pode ser ainda mais variável, como é o caso apresentado por 10
Hoplias malabaricus, que exibe diferentes cariomórfos e, entre eles, a ocorrência de sistemas
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sexuais simples e múltiplos. O cromossomo X do cariomórfo B (XX/XY) e X1 do cariomorfo D
12
(X1X1X2X2/X1X2Y) foram microdissectados e aplicados como sonda em pintura cromossômica
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cruzada, não sendo também evidenciado nenhum sinal de hibridização recíproca nos 14
cromossomos sexuais dos dois cariomorfos (Cioffi et al. 2011b). Por outro lado, o gênero 15
Characidium possui espécies com ou sem cromossomos sexuais diferenciados. Sonda do
16
cromossomo W de C. cf. fasciatum destacou expressivos sinais de hibridização tanto no 17
cromossomo W quanto no cromossomo Z de C. cf. gomesi e Characidium sp., as quais são 18
também espécies portadoras de cromossomos sexuais (Pazian et al. 2013). 19
O conjunto dos dados acima relatados exemplifica os avanços que vêm sendo obtidos 20
na citogenética de diferentes grupos animais, tanto em vertebrados como em invertebrados com 21
a utilização da pintura cromossômica e a hibridização genômica comparativa, notadamente no 22
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que se refere à investigação dos processos de diferenciação e evolução dos cromossomos 1
sexuais. 2
1.6. O gênero Triportheus e suas relações filogenéticas.