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3 PLANEJAMENTO

3.1 PLANEJAMENTO URBANO

3.1.1 Planejamento do Uso do Solo

Para Chapin (1977), o Planejamento do Uso do Solo é definido como o conjunto de diretrizes que conferem consistência e racionalizam as decisões públicas e privadas sobre o uso e desenvolvimento do solo urbano, guiam as decisões sobre seu uso e auxiliam o processo de planejamento. Enquanto que ouso do solo urbano pode ser descrito como o meio de distribuição espacial das funções da cidade, divididas em zonas, onde se destacam as residenciais, industriais, comerciais, de serviços, de lazer e institucionais.

Para Ceneviva (2007), a organização do uso do solo reflete as atividades desenvolvidas na cidade, as quais devem ser suportadas pelos padrões de ocupação previstos para os lotes em que se instalam. Assim, os tipos de atividades são classificados segundo a sua similaridade e seu potencial de geração de conflitos (por ruídos, vibrações, geração de tráfego, padrões de funcionamento, quantidade de pessoas, processos produtivos, etc.) e são associados aos padrões de ocupação dos lotes pela edificação (recuos de frente, fundo e laterais, altura máxima, taxas de ocupação do lote, coeficiente de aproveitamento, etc.). De um modo geral a legislação urbanística impõe restrições ou incentivos a sua utilização, para que não afetem as condições de entrada e de saída dos lotes, bem como, toda a sua vizinhança.

No entanto, a forma pela qual continuam a ser produzidos os espaços privados acaba por afetar o transporte urbano. O adensamento e a verticalização das edificações, por exemplo, têm um efeito drástico, pois implicam em uma intensificação da circulação de bens e pessoas que, se não planejado, pode acarretar congestionamentos e falta de lugar para estacionamentos, dentre outros. A situação oposta, de esvaziamento de atividade em certa área, por sua vez, gera ociosidade nos serviços de transportes. Ambas as situações afetam o mercado imobiliário e seus preços, alterando o processo de desenvolvimento urbano local. A renda da população é outro fator que exerce forte influência nos padrões de uso e ocupação do solo, expressando as formas pelas quais os setores dominantes exercem seu controle sobre os demais segmentos sociais, impondo-lhes seus valores e conceitos. Ceneviva (2007) defende que no plano urbano, esse controle se expressa através de:

a) ocupação extensiva do território - crescimento permanente do território ocupado, sem considerações quanto ao impacto no tempo de deslocamento e nos custos das redes de transporte e demais serviços;

b) uso especializado do território/zoneamento - separação das funções urbanas definindo os padrões e as finalidades dos deslocamentos;

c) acessibilidade prioritária para o automóvel - decorrências conhecidas - congestionamentos, destruição de áreas para uso de estacionamento, degradação ambiental.

Neste sentido, a política de desenvolvimento urbano, nas últimas décadas, demonstrou privilegiar o mercado imobiliário ao introduzir modificações nos Planos Diretores de Ordenamento Territoriais (PDOTs) que resultaram na verticalização das cidades, licenciando a construção de espigões que aumentaram a densidade demográfica. A alteração da morfologia urbana provocou a degradação da infraestrutura viária, prejudicando as funções de mobilidade e acessibilidade, além da deterioração do meio ambiente, da diminuição da qualidade de vida das populações, da segregação sócio espacial e do espraiamento da cidade, todos conseqüência do crescimento desordenado das cidades que ignoram a idéia de um planejamento urbano. (Gonçalves, Portugal e Nassi, 2005).

Pescatori e Browns (2008) também compartilham dessa idéia e vão além ao apresentar os problemas do ponto de vista da qualidade de vida, da sustentabilidade ambiental, da equidade na apropriação da cidade e dos custos sociais e econômicos de funcionamento das cidades. Um primeiro problema é a exagerada setorização dos usos, produzida por um zoneamento estanque que reforça a segregação, principalmente da população de baixa renda, e obriga a realização de deslocamentos desnecessariamente extensos, demorados e dispendiosos, em função da separação total das áreas residenciais (geradoras de demanda) das áreas de comércio, serviços e indústrias (que atraem demanda). Esta configuração cria uma grande dependência do transporte motorizado, com maiores custos sociais e externalidades negativas. Densidades desequilibradas de ocupação do território também podem ter efeitos perversos na mobilidade. A infraestrutura de transporte público e de circulação (motorizada ou não), como também a dos demais serviços urbanos, é cara e requer significativos investimentos para sua provisão. Tais investimentos são mais bem aproveitados quando realizados em eixos de concentração de demanda, onde beneficiam um maior número de pessoas. Pelo mesmo raciocínio, a gestão das políticas urbanas deve estimular o adensamento das atividades em regiões de fácil acesso e já dotadas de infraestrutura de serviços, pois manter uma densidade

populacional muito baixa significa construir uma cidade pouco racional e com altos custos de implantação e manutenção dessa infraestrutura.

Assim Pescatori e Browns (2008) afirmam que quanto menor a densidade, maior a expansão horizontal da cidade e, conseqüentemente, maiores as distâncias a serem percorridas nas viagens cotidianas. Ao contrário, densidades muito altas, sem possibilidade de provisão de infraestrutura, equipamentos públicos e serviços em quantidade e qualidade suficiente levam à deterioração da qualidade de vida. O equilíbrio entre a capacidade de oferta da infraestrutura de mobilidade urbana instalada e a densidade de ocupação de cada região da cidade deve ser um dos elementos predominantes na determinação dos mecanismos de controle das edificações, especialmente dos índices de aproveitamento e das taxas de ocupação, ao lado de outras referências, tais como: preservação do patrimônio histórico, sustentabilidade ambiental, desenvolvimento econômico e outras.

Pescatori e Browns(2008) também asseveram que o padrão usual da urbanização brasileira não tem contribuído de forma positiva para a estruturação da mobilidade. Comandadas pelo mercado imobiliário, as cidades cresceram horizontalmente, segundo um modelo de contínua expansão periférica.

Este tipo de urbanização atende a dois segmentos econômicos distintos da população que migram para as regiões mais afastadas dos centros urbanos: os grupos de baixa renda que para as periferias na busca de lotes mais baratos; e, a população de renda mais elevada na busca de terrenos mais amplos e de menor densidade populacional. No primeiro caso, demandam a extensão dos serviços de transporte coletivo; no segundo geram um elevado número de viagens do transporte individual.

Os problemas advindos da urbanização somados à falta de planejamento adequado acarretaram, também, na crescente utilização do transporte individual motorizado, nos congestionamentos, nos inúmeros problemas de trânsito e no contínuo processo de decadência e ineficiência do transporte público urbano.

Estudos demonstram que as políticas de uso do solo somente contribuem para a sustentabilidade do sistema de transportes caso sejam adotadas medidas para tornar o uso do automóvel menos atrativo, pois a oferta de um transporte coletivo eficiente, por si só, não é suficiente. É certo que isso só será possível em cidades estruturadas de forma a não depender de veículos motorizados, com uso do solo misto que permita a realização de diversas atividades sem necessidade de grandes deslocamentos. (Greiving e Wegener, 2001).

Para Somekh (2008), institucionalmente os poderes públicos, mais especificamente as Administrações Municipais, dispõem de diversos instrumentos de ordenamento do território, por intermédio do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT),que lhe permitem atuar sobre essas dinâmicas, se não controlando-as, pelo menos procurando orientá-las. Eles podem ser classificados em três grandes grupos, cada um incidindo de modo distinto sobre a estrutura urbana e a funcionalidade da cidade.

O primeiro deles, não necessariamente em ordem de importância, é o zoneamento, que determina os tipos de uso do solo urbano aceitáveis para cada região da cidade (uso residencial, comercial, misto, industrial, institucional e áreas especiais).

Em um segundo grupo, as regras para parcelamento do solo estabelecem os padrões para a estrutura fundiária da cidade e que, junto com o plano regulador de uso e ocupação do solo, irá definir as densidades desejadas para cada setor urbano da cidade e seus tipos edilícios. A legislação municipal pode estabelecer critérios para loteamentos, desmembramentos ou fracionamentos, desde que sejam obedecidos os padrões estabelecidos na legislação federal. Por fim, os instrumentos que fixam limites para a ocupação física dos lotes privados, determinando a tipologia das edificações (altura, volume, taxas de ocupação dos lotes, índices de aproveitamento, recuos, etc.); estas normas se tornam condicionantes da paisagem urbana e determinam o potencial construtivo de um lote, permitindo a previsão do volume de viagens a ser gerado em cada área da cidade.

A estas normas, aplicáveis principalmente para a produção privada, somam-se a ação direta do poder público, implantando os equipamentos públicos e a infraestrutura para a mobilidade urbana, que permitem a conexão entre as diversas partes da cidade.

Segundo Somekh (2008), todos estes mecanismos, quando aplicados sobre o espaço urbano público ou privado,orientam a produção e o crescimento das cidades, disciplinam a distribuição das atividades econômicas e sociais no território e limitam ou estimulam o crescimento horizontal ou vertical da cidade, o seu adensamento, e como resultado de tudo isto, determinam os padrões presente e futuro da mobilidade urbana.

Diante do exposto, pode-se afirmar que a política de planejamento de uso do solo é essencial para se controlar a distribuição dos pólos geradores e de atração de viagens. Somente para citar um exemplo, em Haia (Holanda), a administração pública mudou grande parte dos seus departamentos para prédios próximos de estações de trem e outros terminais. Isso causou uma

profunda alteração na matriz de utilização dos modais de transportes da cidade, com o uso dos automóveis caindo cerca de seis vezes. (Somekh, 2008)