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2. APRESENTAÇÃO DO COMPLEXO VER-O-RIO E O PERCURSO

3.1 PLANEJAMENTO E GESTÃO URBANA

3.1.1 Planejamento e Gestão Estratégica de Cidades

A gestão estratégica prevê a lógica de que a cidade tem que ser vendida como uma mercadoria de luxo a um grupo de elite de potenciais compradores, representados pelo capital internacional, visitantes e usuários que possam consumir ou solváveis, considerados investidores (SANCHEZ, 1997 apud SANTOS, 2002). Este tipo de planejamento não prevê o que acontece e como ficariam os usuários não solváveis. A cidade só é pensada em termos políticos de gestão e não mais como um território de exercício de democracia local. Assim, a cidade passa a ser descaracterizada enquanto um espaço de política e de lugar da construção da cidadania (polis), dando lugar a city marketing transfigurada em uma “cidade espetáculo” (SANCHEZ, 1997 apud SANTOS, 2002).

Sobre esta discussão, Trindade Junior (2002) afirma que a produção do espaço nas orlas sintetizam uma nova forma urbana, revelando novos conteúdos sociais. Amaral e Vilar (2005) corroboram com esse autor ao ressaltar que esse modelo de renovação urbana não se apresenta como singularidade local, sendo muito mais uma forma de urbanismo que tem se reproduzido para as orlas fluviais e marítimas em diversas partes do mundo, chamadas de waterfront (água/frente), objetivando reafirmar a relação existente entre a cidade e as águas.

Deve-se ressaltar, porém, que esse modelo de renovação urbana não se apresenta como singularidade local, sendo muito mais uma forma de urbanismo que tem se reproduzido para as orlas fluviais e marítimas em diversas partes do mundo (AMARAL; VILAR, 2005). Nesse sentido, Marcondes (apud Amaral; Vilar, 2005) mostra que tais intervenções buscam normalmente a revitalização de territórios degradados, com a incorporação de elementos naturais presentes no espaço waterfront, reafirmando a relação cidade-água. O autor exemplifica os projetos de Inner Harbor em Baltimore, Boston Waterfront em Boston, South Street Seaport em Nova York, Rom Rijnmond em Rotterdam, Puerto Madero em Buenos Aires e Docklands em Londres, afirmando que constituem exemplos emblemáticos, embora com diferentes abordagens e níveis de complexidade distintos (MARCONDES apud AMARAL; VILAR, 2005c).

Frey (1996) ao discutir a gestão técnico-pragmática ou gestão estratégica de cidades, tendo como referência empírica de análise a cidade de Curitiba, elenca algumas características desse modelo como o pragmatismo e a eficiência técnica, tidos como elementos centrais da gestão. Além desses, destaca ainda: a hierarquização administrativa nítida, o caráter participativo associado à legitimação de projetos já elaborados, a criação de uma identidade local, a negociação direta e amistosa com a iniciativa privada e a tendência ao decretismo e à criação de consensos.

Nesse modelo, associada à idéia de modernização da cidade, está a intenção de promovê-la através do marketing urbano e do urbanismo do espetáculo (SANCHEZ, 1997 apud AMARAL, 2005a; AMARAL; VILAR, 2005c), o que exige das práticas de gestão uma preocupação com a construção de uma determinada imagem (logomarca) para a cidade. O que na verdade se objetiva através desses projetos de renovação urbana, é construir uma nova marca, “um novo rosto”, para a cidade. Isso pode ser interpretado como sendo a produção de uma nova imagem/identidade para a cidade, imagem esta que serve como elemento de promoção e marketing urbano com a finalidade de atrair investimentos para atividade turística, que passa a ser mais um dos itens da dinamização ou diversificação da economia local (SANCHEZ, 1997 apud AMARAL, 2005a ; AMARAL; VILAR, 2005c).

Nesse sentido, a cidade deixa de ser produzida para quem nela habita para ser construída para os que vêm de fora, apenas para visitá-la ou consumí-la. Uma outra crítica refere-se ao processo de transformação da cidade concreta em cidade abstrata, da cidade como pluralidade de visões, em uma cidade do pensamento único, marcada pelo consenso, que é na verdade, uma expressão do obstáculo ao amadurecimento político e a conquista de cidadania no país (SANCHEZ, 1997 apud AMARAL, 2005a ; AMARAL; VILAR, 2005c ; ARANTES ; VAINER ; MARICATO, 2007).

Um outro autor que tem se destacado na crítica ao planejamento estratégico de cidades é Vainer (2007), enfatizando que esse modelo de gestão faz parte de uma nova forma de pensar o planejamento urbano, agora adjetivado de estratégico, em que a cidade passa a ser sinônimo de mercadoria, de empresa e de pátria. Nesse modelo de planejamento e gestão urbana a city está cada vez mais esmagando e substituindo a pólis: "de um lado, a city, impondo-se à cidade como espaço e objeto e sujeito de negócios; de outro lado, a polis, afirmando a

possibilidade de uma cidade como espaço do encontro e confronto entre os cidadãos" (VAINER, 2007, p.101).

Segundo Vainer (2007), no modelo denominado de planejamento estratégico de cidades, a cidade é vista de três maneiras: como mercadoria, como empresa e como pátria. No primeiro caso, ela é entendida como um objeto de luxo, em que seus insumos valorizados pelo capital são apropriados pelo marketing urbano, para serem vendidos a uma demanda solvente (investidores internacionais).

No segundo caso, a cidade é considerada uma empresa, portanto, deve ser gerida de maneira empresarial, ou seja, de acordo com a lógica da competitividade, da produtividade e do mercado. Trata-se de fazer com que a cidade deixe de ser objeto e se torne um sujeito, que seja capaz de aumentar seu poder de atração, para continuar investindo em sua capacidade de inovação e difusão.

No terceiro caso, cidade-pátria, o que ocorre é a construção do consenso, o fim do conflito de classe em benefício de uma causa maior, que é a cidade. Desse modo, o que se resgata é o sentimento patriótico, de participante e pertencente a uma cidade (identidade entre sujeito e espaço): “sem consenso não há qualquer possibilidade de estratégias vitoriosas. O plano estratégico supõe, exige, depende de que a cidade esteja unificada, toda, sem brechas, em torno do projeto” (VAINER, 2007, p. 91).