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4 PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO E TRIBUTÁRIO

4.3 Planejamento fiscal

É muito comum ouvir-se por aí que a constituição de uma holding, notadamente a familiar, traz benefícios fiscais. Porém, a afirmativa não é necessariamente verdadeira, já que existem hipóteses de aumento de carga tributária pela implementação da holding empresarial:

O resultado fiscal pode ser vantajoso ou não, conforme o caso e, principalmente, conforme a engenharia que seja proposta para a estrutura societária. Portanto, não é correto ver a constituição de uma holding familiar como a solução para todos os problemas e, principalmente, uma garantia de recolhimento a menor de tributos. Não é assim. É indispensável a avaliação por um especialista que, para cada situação, faça uma avaliação dos cenários fiscais para definir, em cada caso, qual é a situação mais vantajosa, sendo possível que, no fim das contas, a constituição de uma holding se mostre desaconselhável por ser mais trabalhosa e onerosa. Isso pode decorrer, inclusive, da incidência de tributos que a pessoa natural não está submetida, como a Cofins e o PIS (MAMEDE, G.; MAMEDE, E. C., 2019, p. 104).

Ou seja, como referido, existem hipóteses em que se demonstra desvantajoso a instituição de uma holding familiar, a depender do caso concreto, que deverá ser analisado com cuidado pelo operador do direito que realizar a operação. Existem, por certo, situações em que não se haverá necessariamente uma economia tributária propriamente dita, mas uma maior celeridade no processamento quando houver um planejamento cuidadoso, o que sem dúvidas gerará economia para a empresa como um todo.

Como complementam Mamede, G. e Mamede, E. C. (2019, p. 104), o cenário ideal é aquele em que a constituição de uma holding familiar contemple um planejamento tributário que contemple a totalidade do patrimônio familiar, ou parte dele, principalmente as sociedades controladas que passem a ser controladas pela sociedade de participação.

Um exemplo típico é o popular planejamento tributário realizado através da integralização de imóveis como capital social de uma empresa. Operação que possui imunidade de incidência de Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, conforme previsão do artigo 156, parágrafo segundo da Constituição Federal (BRASIL, 1988),

salvo para empresas do ramo imobiliário.

Por certo que muitos empresários beneficiaram-se dessa imunidade para realizar operações fraudulentas e vendas cruzadas, eis que mesmo que a integralização se desse em valor parcial do imóvel, muitos municípios deixaram de cobrar o imposto da totalidade do negócio, tendo em vista a imunidade Constitucional. Tal operação também serviu às blindagens patrimoniais, que conforme já visto, trata- se de ilegalidade com a finalidade de prejudicar credores na persecução da recuperação de seu crédito.

Porém, recentemente o Supremo Tribunal Federal decidiu por limitar essa imunidade de incidência do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis na integralização de capital social de pessoas jurídicas prevista no artigo 156, parágrafo segundo da Constituição Federal (BRASIL, 1988), dando provimento à tese do fisco de que a imunidade somente se estende ao valor do imóvel que efetivamente foi integralizada, incidindo o imposto sobre o excedente, conforme Recurso Extraordinário de nº 796.376/SC:

EMENTA. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS - ITBI. IMUNIDADE PREVISTA NO ART. 156, § 2º, I DA CONSTITUIÇÃO. APLICABILIDADE ATÉ O LIMITE DO CAPITAL SOCIAL A SER INTEGRALIZADO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO IMPROVIDO. 1. A Constituição de 1988 imunizou a integralização do capital por meio de bens imóveis, não incidindo o ITBI sobre o valor do bem dado em pagamento do capital subscrito pelo sócio ou acionista da pessoa jurídica (art. 156, § 2º,). 2. A norma não imuniza qualquer incorporação de bens ou direitos ao patrimônio da pessoa jurídica, mas exclusivamente o pagamento, em bens ou direitos, que o sócio faz para integralização do capital social subscrito. Portanto, sobre a diferença do valor dos bens imóveis que superar o capital subscrito a ser integralizado, incidirá a tributação pelo ITBI. 3. Recurso Extraordinário a que se nega provimento. Tema 796, fixada a seguinte tese de repercussão geral: “A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social

a ser integralizado" (BRASIL, 2020,

https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur429670/false).

Assim, qualquer planejamento tributário deve observar rigorosamente as constantes mudanças legislativas e de jurisprudência, para não correr o risco de incorrer em fraude ou sonegação fiscal, o que além de desserviço ao direito, pode levar uma família à ruína.

De qualquer forma, não se pode pensar que a holding serviria diante de tal imunidade para permitir a transferência de bens entre pessoas sem pagar imposto. Na anteriormente citada operação através da doação, deverá então optar entra a

realização em vida, ou em decorrência da morte, já que conforme Mamede, G. e Mamede, E. C. (2019, p. 104), “não há distinção nos encargos tributários entre a doação em vida e a transferência dos mesmos bens em função da morte, haja ou não testamento. Esse valor é de 4% sobre o valor dos bens transferidos.”

Porém, realizar todos estes atos em vida pode fornecer à família uma maior tranquilidade para com o futuro, já que não se discutirá esses bens no âmbito do inventário, que frequentemente mesmo sendo consensual, possui tramitação demorada e pode travar as operações das empresas familiares.

Não se pretende esmiuçar aqui de forma hipotética planejamentos tributários que adentrem nas ciências contábeis, limitando o estudo sobre algumas das possibilidades oferecidas ao empresário familiar para melhor posicionar a estrutura societária e dos seus bens pensando na continuidade dos negócios familiares:

A constituição de uma holding familiar se encarta numa compreensão maior dos desafios relativos ao patrimônio e às atividades negociais, observando os respectivos impactos fiscais e examinando-lhes a adequação e, mais do que isso, as oportunidades existentes no sistema legal vigente. Essas oportunidades não são poucas. Em verdade, em muitos casos (e não em todos) a legislação fiscal oferece balizas que podem definir cenários mais ou menos onerosos, definidos a partir da conformação adotada pelo contribuinte. Essas oportunidades justificam que a opção pela constituição de uma holding familiar se faça acompanhar de um planejamento tributário que, de resto, pode justificar mesmo a adoção de uma estrutura societária mais complexa, multissocietária. Isso quando a criação da sociedade de participação (ou sociedade patrimonial) não tiver por mérito a adequação da família e seu patrimônio à linha adotada no planejamento tributário da(s) sociedade(s) ou grupo de sociedades controlados ou nas quais tenha participação societária relevante (MAMEDE, G.; MAMEDE, E. C., 2019, p. 104).

Os autores defendem seu posicionamento de que o planejamento tributário dependerá do caso concreto, não havendo fórmula mágica o axioma, sendo que em determinados casos a instituição de uma holding familiar pode apresentar economia de tributos, e em outros pode representar acréscimo.

Outros exemplos podem ser citados em que há, a princípio, economia tributária, como a tributação da renda advinda da locação de bens pela holding inserida no regime tributário de lucro presumido que possui no objeto social a locação de bens quando em comparação com a tributação da pessoa física.

De qualquer forma, a implementação de determinada estratégia tributária no âmbito da empresa exigirá dos sócios empenho e diligência, já que em determinados casos essa implementação deverá se dar por verdadeira reestruturação das práticas

negociais e da própria personalidade da empresa. Serão necessários treinamentos, alinhamentos, reeducação e assim por diante.

Em um contexto empresarial essa tarefa pode se tornar ainda mais árdua quando se tratar dos exemplos já citados em que os herdeiros não possuem a aptidão e o interesse para dar continuidade ao negócio e empenhar o esforço para adotar tais medidas, razão pela qual se recomenda a admissão de um administrador profissional, como já exposto.

Porém, existirá também o bônus oferecido pela centralização do poder de comando oferecido pela holding familiar controladora, isto é, na sua condição de liderança, poderá inserir nas controladas determinada política e visão, para que as controladas estejam alinhadas ao pensamento da controladora, o que pode trazer benefícios à empresa familiar e ao patrimônio da família.

Ao fim, cabe destacar um ponto: proposições fiscais constroem-se a partir de uma tecnologia jurídica refinada, mas altamente mutável. Como dito, há uma avalanche de normas, entre leis, decretos, regulamentos, instruções fazendárias etc. Isso implica estudo e aprimoramento constante, tanto dos especialistas, quanto das organizações. A solução proposta para um exercício pode simplesmente não servir o(s) exercício(s) fiscal(is) seguinte(s). De qualquer sorte, o estudo sobre a viabilidade e a oportunidade de constituição de uma holding familiar pode – e deve – ser posto em âmbitos maiores, considerando suas múltiplas possibilidades e reflexos. Dependendo do tipo de planejamento societário que se tenha elegido como o melhor para o patrimônio familiar e/ou para a(s) sociedade(s) ou grupo de sociedades, pode-se mesmo chegar a situações nas quais os sócios da holding familiar podem perceber seus haveres livres da incidência de tributos, uma vez que o ônus fiscais foram já suportados pela própria sociedade, sendo calculados não apenas em função do montante dos rendimentos, mas considerando outros fatores, como o tipo de atividade exercida (MAMEDE, G.; MAMEDE, E. C., 2019, p. 107).

Assim, os autores reiteram seu posicionamento acerca da necessidade da avaliação constante do caso concreto, inclusive de ano para ano, considerando a mutabilidade da legislação brasileira, principalmente em decorrência dos diversos reflexos que essa decisão pode geral, inclusive em relação à terceiros e ao Poder Público.

E ainda, essa realidade deve ser apresentada ao empresário, que deve esperar este tipo de mudança, não estando jamais acomodado ou sequer jogar ao operador do direito a responsabilidade sobre determinada estratégia que outrora funcionava e agora já não é eficaz.

eis que uma operação mal feita ou ilegal pode ensejar na quebra da empresa familiar, indo exatamente na contramão do que se busca pela atividade do direito empresarial e do direito em si, que não deve servir como instrumento para a persecução de vantagens ilegais ou operações fraudulentas.

Tendo assim se estudado aspectos importantes da holding empresarial familiar, onde sua implementação pode oferecer ao empresário benefícios de ordem fiscal e de planejamento sucessório, a depender do caso concreto, sendo necessário assim entender o funcionamento e extinção deste singular tipo jurídico, para que seja possível conhecer suas melhores aplicabilidades.

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