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Planos de Recursos Hídricos que considerem as águas subterrâneas em posição de

3 O SISTEMA AQUÍFERO GUARANI: REFLEXÕES SOBRE UM MODELO DE

3.2 R EFLEXÕES ACERCA DE DIRETRIZES PARA UM GERENCIAMENTO DO S ISTEMA A QUÍFERO

3.2.2 Planos de Recursos Hídricos que considerem as águas subterrâneas em posição de

Dentre os instrumentos de gestão previstos na PNRH, estão os Planos de Recursos Hídricos, os quais, conforme a previsão legal, “são planos diretores que visam a fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional e o gerenciamento dos recursos hídricos” (art. 6º). Nos termos da norma geral fixada pela União, caracterizam-se como “planos de longo prazo, com horizonte de planejamento compatível com o período de implantação de seus programas e projetos” (art. 7º).

Os Planos de Recursos Hídricos são documentos programáticos para o setor hídrico, tratando-se não apenas de um diagnóstico das informações que repercutem na tomada de decisão na bacia hidrográfica como unidade básica de planejamento, mas também procuram “definir a repartição da gota d´água disponível entre os diferentes usuários, considerando-se sempre o uso cada vez mais eficiente.”289

Pode-se dizer, ainda, que correspondem a planos diretores que visam a fundamentar e a orientar a implementação da política hídrica e o gerenciamento de tais recursos, devendo ser elaborados por bacia hidrográfica, por Estado e para o País.

289 REBOUÇAS, Aldo da Cunha. Proteção dos recursos hídricos. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 32, p. 33-67, out./dez. 2003, p. 58.

A bacia hidrográfica, importante que se diga, é a unidade territorial de gestão e implementação das políticas públicas voltadas à questão hídrica, sendo que, muitas vezes, não corresponde à região em que incide um sistema aquífero. Trata-se de um novo e importante critério de territorialidade administrativa adotado, que considera muito mais os aspectos ambientais em detrimento de limites geográficos políticos e legais. Já as bacias hidrogeológicas são conceituadas tecnicamente como o “limite entre as zonas de recarga e descarga de um determinado aquífero290”, possuindo relação direta com um sistema aqüífero, mas sem previsão na PNRH.

A adoção da bacia hidrográfica, como unidade de gestão, representou um dos principais avanços para o gerenciamento hídrico, contudo, tratando-se de águas subterrâneas não guarda correspondência com a bacia hidrogeológica, situação que pode resultar em problemas na gestão conjunta se não houver cooperação entre os atores envolvidos. 291 Apesar desse descompasso, é possível que ambos os conceitos sejam compatibilizados por meio da cooperação entre os agentes que atuam na questão hídrica e do aprimoramento dos dados técnicos que circundam o tema, independentemente da repartição geográfica das atribuições de cada ator dentro do sistema. Na medida em que forem estimuladas políticas públicas de gestão de aquíferos que dialoguem com o gerenciamento dos recursos hídricos superficiais a tendência é que os agentes envolvidos, com o passar do tempo, construam canais de interação e criem novos mecanismos administrativos, a partir da elaboração de Planos de Bacia ou Planos de Recursos Hídricos, que efetivamente congreguem as águas subterrâneas e superficiais.

Esses instrumentos constituem planos de longo prazo, com horizonte de planejamento compatível com o período de implantação de seus programas e projetos, além da previsão de revisões periódicas. O conteúdo contempla questões como o diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos; a análise da evolução de atividades produtivas; o balanço entre disponibilidades e demandas futuras e as metas de racionalização de uso. Destaca Milaré que a previsão dos Planos de Recursos Hídricos como instrumentos estratégicos atende a uma recomendação da Conferência de Dublin, de 1992, segundo a qual o gerenciamento, em referência, significa um planejamento integrado e “leva em consideração

290 ARRAES, Tássia de Melo; CAMPOS, José Guimarães. A importância da delimitação de bacias

hidrogeológicas para a gestão de aquíferos transfronteiriços: o caso do Sistema Aquífero Urucuia SAU).

Disponível em <http://aguassubterraneas.abas.org/asubterraneas/article/viewFile/23289/15382>. Acesso em 21/12/2013.

291 VILLAR, Pilar Carolina. Gestão das Áreas de Recarga do Aqüífero Guarani: o caso do município de

Ribeirão Preto, São Paulo. 2010. 184f. Dissertação (Mestrado em Ciência Ambiental). Universidade de São

Paulo, Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental, São Paulo, 2010. Disponível em <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/90/90131/tde-26052010-100627/pt-br.php>. Acesso em 01/06/2013.

tanto as necessidades de longo prazo quanto horizontes mais curtos, incorporando considerações ambientais, econômicas e sociais dentro de um princípio de sustentabilidade”.292

Infelizmente, ainda que a água subterrânea tenha um importante papel em relação ao abastecimento público e nas atividades econômicas em diversas cidades com percentuais que representam 51% dos municípios abastecidos pelos recursos hídricos do subsolo, total ou parcialmente, acabada não sendo considerada de forma adequada nos planos de gestão dos recursos hídricos, não participando da agenda política do país. 293

Dessa forma, parece recomendável que os órgãos públicos competentes abarquem as águas subterrâneas na construção de tais Planos e considerem as diretrizes obtidas na tomada de decisões em diferentes searas da execução da política ambiental, notadamente na outorga e no licenciamento de atividades potencialmente poluidoras que reflitam na qualidade e na quantidade da água subterrânea em determinada região, seja ela uma bacia hidrográfica ou hidrogeológica.

Nesse sentido, conforme analisado no capítulo anterior, a Resolução CNRH nº 22/2002 tratou de estabelecer diretrizes para a inserção das águas subterrâneas nos Planos de Recursos Hídricos, de modo que sejam considerados os usos múltiplos da água subterrânea na criação e na implementação de tais planos.

Finalmente, importante trazer à cena o entendimento de Villar, a qual ao passo em que destaca a complexidade da inclusão das águas subterrâneas nos Planos de Bacia, defende a relevância de tal inclusão e, por fim, aduz que os Planos em questão poderiam inclusive autorizar a restrição de uso da água subterrânea em zonas de recargas. Para tanto, seria o caso de se lançar mão da previsão presente na PNRH, que atribui aos Planos de Bacia a prerrogativa de propor áreas sujeitas à restrição de uso para fins de proteção hídrica. Obviamente, tal restrição deverá estar baseada em estudos técnicos aprofundados e estar devidamente motivada, além de ter sido objeto de discussão no âmbito do Comitê de Bacia Hidrográfica responsável pela aprovação do Plano.

A relevância do Aquífero Guarani requer que o poder público, em âmbito estadual e federal, efetivamente considere o manancial na elaboração dos Planos de Recursos Hídricos, proporcionando a definição de um planejamento estratégico quanto ao uso da água que

292 MILARÉ. Édis. Direito do Ambiente: a gestão ambiental em foco. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 499.

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SOUZA, Luciana Cordeiro de; HIRATA, Ricardo. As águas superficiais e subterrâneas no cenário legal brasileiro. In: BRAVO, ALVARO SÁNCHEZ (Org.) Agua e Derechos Humanos. Sevilha: ArCiBel Editores, 2012, p. 405-418.

abarque a interação entre o solo e o subsolo, bem como proporcione que os atores envolvidos possuam ambos os elementos para utilizar como ferramenta de decisão na gestão da bacia hidrográfica.