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O estudo foi bem tolerado. Todos os seis voluntários completaram o estudo. A duração do estudo basal foi de 58,3±4min. O volume máximo ingerido no período basal foi de 813,3 ±61ml. A doação de sangue elevou significativamente o tempo

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necessário para desencadear a plenitude máxima para 91,7±7min e o volume máximo ingerido para 1298±102ml. (Tabelas 3, 4, e 5 ; Figuras 5, 6 e 7)

Tabela 3. O limiar de volume para as sensações estudadas foi maior após doação de sangue.

Controle Doação Volume Média EPM n Média EPM n

75 0,00 0,00 6 0,00 0,00 6 150 0,00 0,00 6 0,00 0,00 6 225 0,17 0,17 6 0,00 0,00 6 300 0,83* 0,17 6 0,00 0,00 6 375 1,33* 0,21 6 0,00 0,00 6 450 2,00* 0,26 6 0,17 0,17 6 525 2,50* 0,43 6 0,33 0,21 6 600 3,17* 0,40 6 0,83 0,31 6 675 3,83* 0,60 6 1,33 0,49 6 750 3,33* 0,33 3 1,67 0,49 6 825 3,33* 0,33 3 2,00 0,58 6 900 4,00* 0,00 2 2,50 0,56 6 975 4,50* 0,50 2 2,40 0,24 5 1050 5,00* 0,00 1 2,80 0,37 5 1125 3,00 0,32 5 1200 3,60 0,24 5 1275 3,60 0,24 5 1350 4,00 0,00 5 1425 4,60 0,24 5 1500 4,50 0,50 2 1525 5,00 0,00 1

Volume em ml. EPM, Erro Padrão da Média. *p<0,05 teste t de Student pareado (n=6)..

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Tabela 4. A sangria elevou o volume máximo ingerido durante o teste de saciedade.

Controle Doação Volume 813,30 1298,00*

EPM 61,25 102,60

* p=0,0035 em relação ao período controle, teste t de

Student pareado. EPM, Erro Padrão da Média.

Tabela 5. Aumento do volume máximo ingerido para desencadear saciedade máxima após doação de sangue. Volume Controle Sangria

675 3 900 1 1 975 1 1050 1 1425 3 1500 1 1575 1

Volume em ml. Valores representam número absoluto de indivíduos atingindo plenitude máxima no teste de saciedade (n=6).

35 0 250 500 750 1000 1250 1500 1750 0 1 2 3 4 5 Volume (mL)

*

*

*

*

*

*

*

*

* *

*

E sco re de pl eni tude

Figura 5 – O limiar de volume para as sensações estudadas foi maior após doação de sangue. Controle, círculo aberto. Doação quadrado fechado. * P<0,05, teste t de Student pareado (n=6).

Controle Sangria 0 250 500 750 1000 1250 1500 * V o lu m e in g e rid o a m á x im a s a c ie d a d e ( m L )

Figura 6 – A sangria elevou o volume máximo ingerido durante o teste de saciedade. * p<0,05 em relação ao período basal, teste t de Student pareado (n=6).

36 0 250 500 750 1000 1250 1500 1750 2000 0 50 100 * Volume (ml) In d ivi du os at in gi n d o s a ci e d ade m á xi m a ( % )

Figura 7 – Aumento do volume máximo ingerido para desencadear saciedade máxima após doação de sangue. * p<0,05, teste de Log-Rank (Mantel-Cox) e teste de Gehan-Breslow-Wilcoxon. Controle, linha interrompida. Sangria, linha cheia (n=6).

A sangria também elevou o limiar para as sensações de plenitude. O limiar para a sensação de “começando a encher” elevou-se de 19,2±2min para 42,5±4min (p<0,05), o limiar para a sensação de “um pouco cheio” foi de 28,5±2,3 para 54,2±4,2min (p<0,05). O limiar para cheio foi de 42,5±3min para 64,1±6min (p<0,05) e o de “muito cheio” elevou-se de 42,8±3,7 para 80,7±5,6min p<0,05. (Tabela 6 e Figura 8)

 

Tabela 6. O limiar das sensações no teste de saciedade foi maior após a doação de sangue.

Tempo (min) Sensações Controle Doação Começando a encher 19,17 42,5* (2,01) (4,43) Saciado 31,00 50,00* (5,10) (5,63) Cheio 42,50 64,17* (3,59) (5,69) Não agüento mais 58,33 91,67*

(4,77) (6,54)

* p<0,05, teste t de Student pareado (n=6). Erro padrão da média (EPM)

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O limiar para que os voluntários relatassem estar saciados elevou-se para 50±5min (vs 31±5min, p<0,05) após a doação de sangue. (Tabela 6 e Figura 7)

0 25 50 75 100 125

Começando Saciado Cheio Não aguento a encher mais * * * * T e mpo ( m in )

Figura 8 – O limiar das sensações no teste de saciedade foi maior após a doação de sangue. Retângulo aberto: grupo controle, apenas punção venosa. Retângulo fechado: grupo doação. *p<0,05, teste t de Student pareado (n=6).

4.3 Parâmetros hemodinâmicos

A doação de sangue não alterou a pressão arterial (Tabela 1), mas houve uma tendência à elevação do pulso durante a doação de sangue, no entanto essa elevação foi pequena e não foi significativa. No grupo controle não houve alteração dos parâmetros hemodinâmicos. (Tabela 2 e Figura 4)

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5 DISCUSSÃO

Foram estudados apenas voluntários sadios. O protocolo foi divulgado no campus da Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, sendo os voluntários professores universitários, estudantes de medicina, e universitários de outras áreas. Todos os voluntários foram submetidos à avaliação clínica, e quaisquer voluntários com afecções que pudessem alterar a motilidade foram excluídos. Foram estudados apenas voluntários do sexo masculino, por terem menos fatores de confusão, tais como efeitos de mudanças hormonais ou gravidez, que poderiam influenciar os resultados (WALD et al., 1981; DATZ; CHRISTIAN, MOORE, 1987; LISSNER et al., 1988; BISDEE; JAMES, SHAW, 1989; MEARADJI et al., 2001; GONENNE et al., 2006).

A sangria ocorreu pela doação de sangue, método comum na prática clínica, que consiste na sangria lenta de volume pré-determinado de sangue. Isso possibilita uma gama de mecanismos neuro-humorais para manter a pressão arterial bem como a perfusão tecidual, similar ao que ocorre na prática clínica (GRACA et al., 2002). Retirou-se uma quantidade pequena de sangue, em média 0,6% do peso corporal, o que corresponde a 8% do volume sanguíneo circulante dos voluntários, não sendo observada variação significativa na pressão arterial, ou frequência cardíaca. Esses achados estão de acordo com o relato de que até 10% do volume sanguíneo pode ser retirado sem que haja queda da pressão arterial (GUYTON, HALL, 1996). O uso do tilt test, que induz variações discretas na taxa de retorno venoso ocasionadas por súbitas manobras de mudança postural, do decúbito para a ortostase é capaz de sequestrar 600 a 800ml de sangue. Estudos em humanos com essa metodologia induziram alterações na absorção intestinal de eletrólitos, sem alterações de FC e PA (SJOVALL et al., 1986). Da mesma forma, a aplicação de pressão negativa nos membros inferiores, causando um sequestro de sangue de aproximadamente 550ml, não causa alteração na pressão arterial (COOKE; RYAN, CONVERTINO, 2004)

A hipovolemia por uma doação padrão de sangue, causando uma redução que se aproxima das variações fisiológicas da volemia, aumentou a complacência e reduziu o tônus do estômago proximal de voluntários sadios, fenômeno que se manifestou ainda durante os primeiros cinco minutos de sangria e persistiu por, pelo menos, 50min. Observa-se que o fenômeno estudado é reprodutível e reversível quando da normalização da volemia, pois a

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infusão de solução salina, quinze minutos após o final da doação de sangue, trouxe o volume do estômago de volta ao nível basal. Isso indica a alta sensibilidade dos receptores envolvidos. Os achados estão de acordo com os estudos prévios realizados em animais. O estômago de cães submetidos à hipovolemia se torna menos resistente à distensão, ou seja, maior complacência. Já a re-expansão traz os valores de pressão e volume intra-gástricos de volta aos níveis basais. O inverso ocorre quando os animais são submetidos à expansão volêmica por infusão de salina isotônica (CAPELO et al., 1983). Em ratos anestesiados o mesmo fenômeno ocorre, a hemorragia aumenta o volume gástrico, fenômeno revertido pela reposição do sangue ao animal (GRACA et al., 2002).

Os mecanismos de tal fenômeno não são completamente conhecidos, havendo apenas evidências indiretas das possíveis vias envolvidas. Há evidências de que o sistema nervoso central e autônomo possa participar da resposta do TGI à variações volêmicas. A motilidade do TGI é modulada pelo sistema nervoso central, através de aferências para o sistema nervoso entérico o qual apresenta aproximadamente o mesmo número de neurônios encontrados na medula espinhal. Essa vasta rede neuronal, constituída de neurônios sensitivos, motores e interneurônios está distribuída ao longo dos órgãos efetores do TGI, e está conectada ao sistema nervoso central pelo sistema simpático e parassimpático (CANNON, 1902; WOLF, 1981; BHATIA, TANDON, 2005). Observa-se em ratos que a hipervolemia causa uma diminuição da complacência gástrica. Tal fenômeno é prevenido pela vagotomia, sugerindo o envolvimento de vias vagais (GONDIM et al., 1999).

Alterações no sistema nervoso autônomo ocorrem durante a sangria de forma a manter a homeostase. A hipovolemia leve causa um aumento do tônus simpático e diminuição do tônus vagal, retirada vagal (SJOVALL et al., 1986; SCHADT, LUDBROOK, 1991; EVANS et al., 2001). Já existem várias evidências do efeito do sistema nervoso parassimpático no TGI. O estômago mantém um tônus basal durante o jejum (JAHNBERG, 1977; AZPIROZ, MALAGELADA, 1986; MORO et al., 2005). O bloqueio vagal produz relaxamento do tônus gástrico em cães, o que indica que um estímulo excitatório vagal é importante para a manutenção do tônus basal do estômago (DE PONTI; AZPIROZ, MALAGELADA, 1989; AZPIROZ, 1997). Durante o reflexo de acomodação, ocorre o aumento da complacência do fundo gástrico, decorrente principalmente de inibição reflexa por via vagovagal da musculatura lisa do fundo e do corpo, sendo abolido ex vivo (WILBUR; KELLY, 1973; ANDREWS, 1980; TAKASUGI, 1982; (TAKAHASHI, OWYANG, 1997). Aliás, o vago dispõe de fibras eferentes tanto de baixo como de alto limiar. A ativação das

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fibras vagais de baixo limiar evoca contrações no fundo e antro gástrico, sensíveis a atropina indicando serem vias colinérgicas; já a estimulação das fibras vagais de alto limiar relaxa o fundo e antro gástrico, por meio de mediadores não-adrenérgicos não-colinérgicos, peptídeo intestinal vasoativo ou óxido nítrico. Foi demosntrado que o reflexo de acomodação estava diminuido após tratamento com hexametonio ou L-NAME, o que sugere que o reflexo de acomodação envolve a liberação de óxido nítrico do plexo mioentérico, através da estimulação de receptores nicotínicos. Dessa forma, o bloqueio das vias vagais de baixo limiar bem como a ativação de fibras vagais de alto limiar poderiam causar relaxamento do fundo gástrico (TAKAHASHI, OWYANG, 1995, 1997). No modo barostato deste estudo, o sistema manteve a pressão do balão constante. Portanto, variações do tônus da musculatura do fundo gástrico causaram as alterações do volume do balão observadas.

O sistema nervoso simpático é ativado durante a hipovolemia (SJOVALL et al., 1986) e pode estar envolvido no fenômeno estudado, pois sua ativação causa alterações no TGI. Em experimentos com porcos, observa-se que a perda sanguínea causa aumento da adrenalina e noradrenalina séricas, derivados principalmente de nervos do sistema nervoso simpático (MORRIS; KAPOOR, CHALMERS, 1987; COOKE; RYAN, CONVERTINO, 2004). A ativação do sistema nervoso simpático é importante para manter a frequência cardíaca e o tônus vascular durante a perda de sangue. Em humanos, hemorragia lenta, similar à realizada neste estudo, eleva os níveis de noradrenalina sérica sem que haja queda da pressão arterial, demonstrando o efeito compensatório eficiente do sistema nervoso simpático (HABERTHUR et al., 2003). Estudos com pressão negativa em membros inferiores, em humanos, demonstraram um aumento linear das catecolaminas séricas em função do aumento do sequestro de líquido pela pressão negativa (COOKE; RYAN, CONVERTINO, 2004). Observou-se também, um aumento da atividade simpática na musculatura, sendo a vasoconstricção resultante um importante mecanismo compensatório para manutenção da volemia (COOKE; RYAN, CONVERTINO, 2004).

O sistema nervoso simpático causa uma redução generalizada da motilidade do TGI. Os neurônios simpáticos inervam principalmente os gânglios nervosos entéricos e as áreas de esfíncter. Nas zonas de esfíncter, causam um aumento do tônus por efeito direto no músculo. Nas áreas não esfíncter, causam uma redução da motilidade pela ativação de neurônios inibitórios do sistema nervoso entérico (LOMAX; SHARKEY, FURNESS, 2010). Em experimentos in vivo, em animais, observou-se o efeito modulador do sistema simpático sobre o TGI, via ativação do sistema nervoso entérico. No intestino, a ativação simpática

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inibiu a contração mediada pelo sistema nervoso entérico, mas não afetou a contração direta pela acetilcolina. Da mesma forma, no estômago, a ativação simpática bloqueou a contração mediada por gânglios entéricos - após estímulo de fibras vagais -, no entanto não teve efeito sobre a contração gástrica causada por acetilcolina exógena (LOMAX; SHARKEY, FURNESS, 2010). Estudos com micro-eletrodos intracelulares demonstraram que o estímulo simpático causou diminuição pré-sináptica de acetilcolina liberados por neurônios intrínsecos do sistema nervoso entérico. Os neurônios simpáticos que chegam aos gânglios submucosos têm um efeito inibitório direto, pós-sináptico, na excitabilidade dos neurônios secretomotores (LOMAX; SHARKEY, FURNESS, 2010). Dessa forma os nervos do sistema simpático suprimem a ação digestiva, através da inibição do sistema nervoso entérico, pela contração dos esfíncteres e em menor escala, pelo relaxamento da musculatura de áreas não esfincterianas (LOMAX; SHARKEY, FURNESS, 2010), e causa também aumento da absorção intestinal de líquido e eletrólitos (SJOVALL et al., 1986). A hemorragia também aumenta a absorção intestinal de fluido e eletrólitos, efeito que é abolido após denervação simpática do segmento (SJOVALL et al., 1986).

A complacência gástrica foi estudada com o sistema computadorizado de barostato (Synectics®). O barostato é o método padrão ouro para estudo de complacência visceral, pois é o único método que consegue medir volume e pressão viscerais de forma simultânea e contínua (WHITEHEAD, 1997). É invasiva, pois necessita da introdução de uma sonda com balão por via oral, gerando apenas leve desconforto na maioria dos casos. No entanto o procedimento foi bem tolerado pelos voluntários. Qualquer desconforto desencadeado pelo procedimento ocorreu também no grupo controle. Neste grupo, não houve alteração da complacência ou tônus gástricos ao longo do período de estudo.

A venóclise foi realizada antes do início do período basal em todos os grupos, de forma a eliminar o efeito da punção venosa per se nos resultados. A manipulação venosa necessária para o início da doação causa um leve desconforto, essa mesma manipulação foi realizada no grupo controle sem causar variações significativas no volume gástrico ou parâmetros hemodinâmicos neste grupo. No grupo de cinco voluntários, em que foi realizada expansão volêmica, foi infundido salina três vezes o volume retirado de sangue, devido a fuga de líquido para o extra vascular quando solução cristalóide é infundida (DRUMMOND, PETROVITCH, 2005).

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O relaxamento do estômago proximal, observado após a doação de sangue, refletiu em alterações de sintomas clínicos no teste de saciedade. Após a doação de sangue, os indivíduos toleraram a ingestão de um volume maior de refeição teste. Foi observado um incremento de 45%ml no volume máximo ingerido, o que representa um aumento de 45%. O limiar de tempo para desencadear as sensações estudadas, bem como o limiar de volume para desencadear a saciedade máxima também aumentou. A saciedade, após o início da ingestão, depende de mudanças pré-absortivas, como distensão gástrica, taxa de esvaziamento gástrico, liberação de hormônios, estimulação do nutriente no trato gastrointestinal por meio de receptores fisioquímicos e também da complacência do estômago proximal (HERMSDORFF; VOLP, BRESSAN, 2007). Nesse estudo não foram medidos hormônios envolvidos na saciedade, dessa forma não se pode descartar possíveis influências hormonais no fenômeno estudado. Foi observado um aumento da complacência e redução do tônus do estomago proximal. Esses resultados estão de acordo com os achados de Tack et al. (2003) que observaram que uma maior complacência gástrica está relacionada a uma maior quantidade total de calorias ingeridas no teste de saciedade (TACK et al., 2003).

O presente fenômeno de alteração da complacência gástrica pode ser um fator modulador de sintomas. Distúrbios no comportamento motor do estômago caracterizam diversas afecções importantes da prática médica. A acomodação do alimento no estômago proximal, bem como a transferência das refeições do estômago proximal para o distal, encontra-se afetada em pacientes com dispepsia funcional (TACK et al., 2003), cuja distribuição intra-gástrica anormal do quimo está relacionada a sintomas como saciedade precoce e sensação de distensão pós-prandial (TRONCON et al., 1994). Doentes que sofrem de diabetes mellitus podem desenvolver neuropatia autonômica, a ponto de afetar a inervação extrínseca do TGI. Nesta condição, a lesão vagal ocasiona um quadro paradoxal com retardo no esvaziamento de sólidos, pela atenuação da contração antral (gastroparesia diabética), e aceleração no esvaziamento de líquidos, após a perda da acomodação (OLIVEIRA et al., 1984). Na Doença de Chagas, que danifica o plexo nervoso mioentérico, há também uma menor acomodação do estômago proximal a uma refeição liquida, conforme demonstrado em um estudo com barostato (GOMES, 2008).

O estado volêmico, assim como o estado de hidratação do indivíduo ao alterarem o tônus do estômago proximal, podem estar envolvidos como modulador de sintomas nesses pacientes. A correlação entre volemia e sintomas clínicos pode ser corroborada pela grande incidência de queixas de dismotilidade em pacientes com insuficiência renal (VAN VLEM et

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al., 2000). Em estudo realizado em animais nefrectomizados bilateralmente observou-se uma forte correlação entre volume sanguíneo e retenção gástrica de uma refeição líquida (SILVA

et al., 2002).

O método utilizado para avaliação da plenitude e saciedade foi o teste de saciedade (drinking test). Alguns grupos relataram ausência de correlação do teste com sintomas clínicos. No entanto esses grupos utilizaram testes com ingestão rápida de refeição não calórica ou água, para simular a distensão gástrica pelo balão do barostato (KOCH; HONG, XU, 2000; BOECKXSTAENS et al., 2001). O teste utilizado, com ingestão lenta de uma refeição calórica, foi relatado na literatura como tendo boa correlação com a acomodação gástrica pela refeição (TACK et al., 2003). O teste reproduz sintomas clínicos de plenitude e saciedade. O método é reprodutível, não sofrendo variação significativa com estudos repetidos (KINDT et al., 2008). Foi utilizada refeição sem lactose para evitar efeitos possíveis de intolerância à lactose sobre a motilidade digestiva, como aceleração do esvaziamento gástrico (TRONCON et al., 1983).

Ao todo, foram estudados 23 voluntários sadios. Essa quantidade foi baseada na literatura para estudos em humanos com desenho semelhante (SJÖVALL, 1986). No protocolo da complacência, um total de 17 voluntários foram estudados. Todos foram controles deles próprios (comparações pareadas). Da mesma forma, no protocolo saciedade, os seis indivíduos foram estudados duas vezes, em dias diferentes, sendo controles deles próprios.

A sangria ocorreu pela doação de sangue, método comum na prática clínica, que consiste na sangria lenta de volume pré-determinado de sangue. Isso possibilita uma gama de mecanismos neuro-humorais para manter a pressão arterial bem como a perfusão tecidual, similar ao que ocorre na prática clínica (GRACA et al., 2002). Foi retirada uma quantidade pequena de sangue, em média 0,6% do peso corporal, o que corresponde a 8% do volume sanguíneo circulante dos voluntários, não sendo observada variação significativa na pressão arterial, ou frequência cardíaca. Esses achados estão de acordo com o relato de que até 10% do volume sanguíneo pode ser retirado sem que haja queda da pressão arterial (GUYTON, HALL, 1996). O uso do tilt test, que induz variações discretas na taxa de retorno venoso ocasionadas por súbitas manobras de mudança postural, do decúbito para a ortostase é capaz de sequestrar 600 a 800ml de sangue. Estudos em humanos com essa metodologia induziram alterações na absorção intestinal de eletrólitos, sem alterações de FC e PA (SJOVALL et al.,

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1986). Da mesma forma a aplicação de pressão negativa nos membros inferiores causando um sequestro de sangue de aproximadamente 550ml não causa alteração na pressão arterial (COOKE; RYAN, CONVERTINO, 2004).

Outro método de indução de hipovolemia descrito na literatura, com sangria controlada até uma queda pré-determinada de pressão arterial, teria a vantagem de eliminar a variação inter individual, pois nem todos respondem da mesma forma a perda de certo volume de sangue (WIGGERS, 1942). No entanto, esse modelo é mais bem utilizado na pesquisa em animais, pois retira grande quantidade de sangue com objetivo de causar hipotensão (WIGGERS, 1942; LOMAS-NIERA et al., 2005). No entanto nos estudos de motilidade gástrica em animais, proporções maiores do volume sanguíneo foram retiradas. Nos estudos em cães, foram retirados 35 a 45ml/kg (CAPELO et al., 1983). Isso gerou críticas ao estudo, pois o volume retirado poderia provocar isquemia das vísceras estudadas, o que na verdade seria responsável pelos resultados. No entanto o fenômeno estudado era reversível após normalização volêmica. Os estudos mais recentes, em ratos utilizaram proporções menores de retração volêmica, 10ml/kg, e encontraram resultados semelhantes de variação da complacência gástrica (GRACA et al., 2002). O nosso estudo utilizou volumes ainda menores de sangria, em média 5,8ml/kg, encontrando resultados semelhantes.

Nesse protocolo não foi avaliado o esvaziamento gástrico. No entanto já foi demonstrado um retardo de esvaziamento gástrico de líquidos em voluntários submetidos a doação padrão de sangue. Freire et al., em estudo duplo cego, randomizado, estudaram o esvaziamento gástrico, por método cintilográfico, de solução de glicose a 5% (FREIRE, 2005). Observaram que após a sangria ocorria um retardo do esvaziamento gástrico da refeição por maior retenção proximal. Isso está de acordo com os achados de aumento da complacência do estômago proximal e maior volume ingerido no teste de saciedade, sugerindo uma maior acomodação no estômago proximal. O estímulo basal do vago causa uma contração tônica do fundo gástrico durante o jejum. A retirada desse estímulo causa um relaxamento do fundo gástrico, bem como o retardo do seu esvaziamento (MORO et al., 2005). Nos estudos em ratos, observa-se um aumento da velocidade de esvaziamento gástrico, enquanto que a hipervolemia diminui esta velocidade (GONDIM FDE et al., 1998). Diferenças no método de medida do esvaziamento gástrico, na composição, osmolaridade e volume das refeições, bem como diferença entre as espécies podem explicar essas diferenças.

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O estudo caracteriza o fenômeno de diminuição do tônus e aumento da complacência do estômago proximal após uma hipovolemia causada pela doação de sangue. Essa hipovolemia foi leve, não causando alteração nos parâmetros hemodinâmicos estudados. Observou-se que o fenômeno é reversível após correção da volemia com solução salina. Observou-se também, que a hipovolemia leve aumentou a acomodação do estômago proximal a uma refeição líquida calórica em humanos sadios, que pode ser inferida por aumento do volume máximo ingerido, bem como aumento do volume necessário para causar sintomas de

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