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Polêmicas e controvérsias da Teologia da Libertação

No documento A esquerda católica na formação do PT (páginas 96-99)

1 A Teologia da Libertação

1.2 Polêmicas e controvérsias da Teologia da Libertação

Sobre seu surgimento e reais intenções, a quem serve, a serviço de que classe, grupo ou ideologia está; quais suas propostas e metodologias para a intervenção na realidade concreta encontrarão diversas e opostas proposições.

Num primeiro momento, encontraremos uma forte resistência da ala conservadora da própria instituição que, resiste às inovações propostas pela Teologia

97 da Libertação à Igreja Mundial, insistindo em "separar" a Igreja do Mundo, ou seja, esse setor conservador da Igreja "opta por se abster" dos conflitos sociais e critica a ala progressista, acusando-a de só se preocupar ou se preocupar muito com a política e se esquecer ou deixar de lado as questões religiosas.

A Teologia da Libertação, por surgir no contexto da "Guerra Fria" sofrerá ainda uma forte oposição do Departamento de Estado Norte-Americano que, de forma contundente, combaterá esse movimento, alegando ser ele, subversivo e revolucionário, originado pela infiltração marxista-leninista na instituição:

[...] a perversidade e a falta de escrúpulos dos (elementos) infiltrados nas hierarquias e no clero católico da América Latina não conhecem

limites, como mostra a sua chamada Teologia da Libertação, que não

é outra senão a luta de classes montada a cavaleiro do Evangelho, interpretado dialeticamente ou, como se patenteia claramente, com a edição da chamada "Bíblia da América Latina", que mais não é senão, um instrumento de endoutrinação marxista (...). (Confederação Anticomunista Latino Americana, de Nelson A. Rockefeller e do Departamento de Estado Norte-Americano, apud Otto Maduro, 1983, p. 10).

Outros grandes opositores da Teologia da Libertação foram os Estados nacionais representados, no período em questão, por ditaduras. Esses, em parceria com a ala conservadora da Igreja, denunciavam e reprimiam os movimentos progressistas, colocando-os na clandestinidade e no isolamento.

A repressão aplicada pelo Estado, no caso particular do Brasil, surtiu um efeito contrário ao esperado, pois, em função das arbitrariedades cometidas e pelas constantes perseguições que resultavam em prisões, torturas e assassinatos a membros do clero e leigos ligados à instituição, contribuiu para que a Igreja, como um todo, assumisse um caráter de oposição ao Estado, em defesa dos direitos humanos.

Por outro lado, e no outro extremo da interpretação acerca da Teologia da Libertação, encontram-se grupos marxistas que vêm esse movimento e essa transformação como uma modernização necessária e oportunista da hierarquia da Igreja que teria como meta principal a manutenção da influência e dos privilégios que vinham sendo perdidos em decorrência das mudanças sociais. Em outras palavras, a Igreja não se transforma, apenas se moderniza, para assegurar seu império. Ou nas palavras de Roberto Romano, representante desse ponto de vista:

98

Uma vez atalhada a aplicação de seu programa de reformas a partir "de cima", a Igreja dirige-se às massas, organizando-as comunitariamente nas bases, e procurando, sem o Estado, pregar e promover a consciência modernizadora e a expansão da pequena propriedade, como garantia contra o êxodo rural e a conseqüente perda do controle social. Neste sentido, as comunidades de base constituem o meio criado pela Igreja para veicular seu projeto de reformas sociais e recuperar audiência popular (...) (ROMANO, 1979, p. 184).

Visão esta, como fora citada no início, reforçada por Paiva para quem o conflito existente entre a ala progressista e ala conservadora é superficial e oportuno.

Na mesma direção, outros apontam que a transformação da Igreja se deve também e principalmente a motivos conservadores, ou seja, esta se moderniza porque estava perdendo espaço e influência junto à sociedade: no plano político para grupos marxistas no período pós II Guerra com a redemocratização do país e, no plano da influência religiosa, deparava-se com o crescimento das seitas pentecostais e do espiritismo. Contudo, para os representantes desse ponto de vista, essa transformação foge ao controle da hierarquia e uma significativa parcela da Igreja passa a encarar e se posicionar no mundo de outra forma, isto é, na ótica dos oprimidos buscando sua libertação.

Scott Mainwaring, representante desse ponto de vista fala:

É verdade que a Igreja modificou-se em parte para proteger interesses tradicionais no momento em que a sua influência entrava em declínio. Mas de igual importância é o fato dela ter mudado porque a luta política levou pessoas e alguns movimentos a ter uma visão de fé profundamente preocupada com os pobres e com injustiça social. Esses grupos tinham uma nova visão da missão da Igreja e estavam prestes a abandonar muitos dos interesses tradicionais em nome dessa nova concepção. (p. 33, 1989).

Por fim, para encerrarmos essa discussão, retomamos aquele ponto de vista defendido, na maioria das vezes, por algumas pessoas ligadas aos grupos de base (tanto teólogos religiosos quanto agentes pastorais leigos) que atribuem a transformação da Igreja não a fatores de cima para baixo, mas sim o oposto, de baixo para cima. Nessa concepção, a mudança não parte da hierarquia, mas, ao contrário, são os grupos de base que ocupam os espaços da instituição convertendo-a aos interesses populares, aos interesses da classe dominada em detrimento da dominante.

99 Nosso objetivo nesse ponto do trabalho não é discutir nem aprofundar os diversos e até antagônicos pontos de vista que discutem a Teologia da Libertação e a ação por ela defendida e legitimada. Ao invés de atermo-nos ao debate meramente teórico-ideológico, daremos prioridade ao estudo dos grupos de base e ao seu engajamento social, pois foram esses que possibilitaram o surgimento/elaboração da referida teologia e a partir de então, passam a ser diretamente influenciado por ela. Organização/engajamento esse que defendemos ser o "solo fértil" e impulsionador de uma prática organizativa de resistência popular que resultaria na contribuição para a Fundação do Partido dos Trabalhadores (PT), discussão que retomaremos mais adiante.

Por hora, o importante a ser frisado é que: Teologia da Libertação, Igreja popular, religião progressista formam um tema bastante complexo e, por esse motivo, virá sempre acompanhado de muita polêmica e controvérsia. Ainda mais por se tratar de uma visão de mundo que faz a opção política, ou seja, toma o partido de determinado grupo social, com propostas de intervenção na realidade concreta. Ou seja, mexe diretamente com os interesses de classe.

No documento A esquerda católica na formação do PT (páginas 96-99)

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